PL do Licenciamento Ambiental traz riscos para saúde e meio ambiente, dizem pesquisadores

O projeto, apelidado de “Projeto de não-licenciamento” ou “Lei Geral de extinção do Licenciamento Ambiental”, segundo a Abrasco, coloca tanto a saúde da população quanto o meio ambiente em risco, uma vez que são interdependentes

Por ENSP/Fiocruz

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) publicou uma nota apontando para as consequências da aprovação do Projeto de Lei 2159/2021, que segue em tramitação no Senado Federal e que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental.

O texto-base aprovado na Câmara dos Deputados, na primeira quinzena de maio deste ano, é um substitutivo ao Projeto de Lei 3729/2004, apresentado pelo deputado Neri Geller (PP-MT), que retira a obrigatoriedade de licenciamento ambiental para determinados tipos de obras e facilita o processo para outras, resumidamente.

O projeto, apelidado de “Projeto de não-licenciamento” ou “Lei Geral de extinção do Licenciamento Ambiental”, segundo a Abrasco, coloca tanto a saúde da população quanto o meio ambiente em risco, uma vez que são interdependentes.

“Essa interdependência se reflete na concepção de territórios sustentáveis e saudáveis. (…) Quando o ambiente é destruído, o prejuízo recai sobre a população, o Estado e o SUS [Sistema Único de Saúde]. As vulnerabilizações decorrentes dos territórios e das comunidades refletem claramente a fragilização das políticas públicas sanitárias, ambientais e trabalhistas”.

Para Alexandre Pessoa, integrante do Grupo Temático Saúde e Ambiente da Abrasco, o PL cria uma barreira que dificulta o estabelecimento da saúde pública ao ampliar os riscos socioambientais, decorrentes da celeridade no processo de licenciamento, proposto pelo PL.

“Apresenta”, por exemplo, “uma extensa lista de dispensa de licenciamento de atividades eminentemente impactantes e propõe a renovação automática de licenças mediante preenchimento de formulário online, o que viola os direitos dos povos, comunidades tradicionais, dentre outras”, afirma Pessoa.

“A crise socioambiental, além de promover crises emergenciais, é geradora de doenças emergentes, ou seja, novas doenças que aumentam os riscos de surtos, epidemias e mortes”, continua o pesquisador. Exemplo disso é a própria pandemia do novo coronavírus.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o pesquisador Allan Carlos Pscheidt, doutor em Biodiversidade Vegetal e Meio Ambiente e professor das Faculdades Metropolitanas Unidas, em São Paulo, afirmou que o organismo que causa a covid-19 provavelmente estava “há tempos” no meio ambiente.

“Quando verificamos esse crescimento rápido, ocorre que temos o desmatamento, a invasão de territórios antes preservados. Com isso, a gente acaba soltando no meio ambiente doenças que estavam contidas, por exemplo, em cavernas. Tudo sugere que a origem desse coronavírus que causa a covid-19 venha de morcegos que estavam em cavernas”, afirmou Pscheidt ao Brasil de Fato na época.

O pesquisador Alexandre Pessoa traz outros exemplos de crimes ambientais que foram propiciados em cima de brechas legais ou falta de fiscalização: os rompimentos das barragens de mineração de Brumadinho e Mariana, em Minas Gerais, o derramamento de óleo bruto na orla marítima do Nordeste, os incêndios no Cerrado e no Pantanal, o avanço da monocultura com agrotóxicos.

E não “apenas” isso, como enumera o pesquisador, mas também a perda ‘irreversível’ da biodiversidade, a crise hídrica, o garimpo criminoso em territórios indígenas. Esses atos criminosos mostram, nas palavras de Pessoa, “como é vital para a população brasileira que a legislação ambiental no país seja fortalecida em defesa da vida e na perspectiva de territórios sustentáveis e saudáveis”.

No entanto, na mão contrária, o país vivencia “uma avalanche de projetos de leis que estão em curso, que claramente pretendem a extinção do licenciamento ambiental, em um processo erosivo da política ambiental brasileira”, como o PL 490 que flexibiliza a demarcação de terras indígenas; o PL 2.633, que propicia a grilagem de terras; e o PL 984, que permite a construção de uma estrada em meio ao Parque Nacional do Iguaçu.

Além da Abrasco, outras instituições já se manifestaram contra a aprovação do PL, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), a Frente Parlamentar Ambientalista, organizações indígenas, quilombolas e da agricultura familiar e camponesa, dentre outras. Ainda, em uma carta escrita por nove ex-ministros do Meio Ambiente também aponta para os riscos da aprovação.

Principais pontos do PL

Obras dispensadas

Para obras de saneamento básico, manutenção em estradas e portos, distribuição de energia elétrica com baixa tensão e obras consideradas de porte insignificante não será exigido o licenciamento, segundo informações da Agência Senado.

Também receberam dispensa: atividades militares; obras emergenciais de infraestrutura; pontos de logística reversa; usinas de triagem de resíduos sólidos; estruturas para compostagem de resíduos orgânicos; usinas de reciclagem de resíduos da construção civil; e pontos de entrega de resíduos de origem domiciliar.

Na esfera do saneamento básico, estão incluídas desde as obras de captação de água até as ligações prediais e instalações operacionais de coleta, transporte e tratamento de esgoto.

Atividades agropecuárias

Para as atividades agropecuárias, está dispensado o licenciamento ambiental caso a propriedade tenha situação regular no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou  termo de compromisso para recompor vegetação suprimida ilegalmente e esteja em processo de regularização.

Mineração de alto risco

As barragens de mineração de pequeno porte, consideradas de utilidade pública, não precisam ter licenciamento ambiental para funcionar. Já nas barragens de grande porte, há a obrigatoriedade de seguir as normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), bem como as legislações específicas.

Duplicação de rodovias

Em obras de duplicação de rodovias ou pavimentação de obras já existentes, deve-se ter Licença por Adesão e Compromisso (LAC). Mas fica estabelecido somente que a obra não deve causar “significativa degradação do meio ambiente”.

Renovação automática

Um dos pontos mais criticados pelas associações, o projeto permite que a renovação automática da licença ambiental seja realizada apenas a partir de uma declaração on-line do empreendedor, atestando que a propriedade ou obra segue todas as legislações estabelecidas.

Para ver a lista completa de mudanças, acesse o levantamento feito pela Agência Senado.

Edição: Vinicius Segalla

Por: Ana Paula Evangelista

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in EcoDebate

 

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