Pesquisa com “areia sustentável” da Vale avança em Minas Gerais com bons resultados para aplicação em pavimentação rodoviária
Minas de Itabira têm areia em abundância, mais que o itabirito que ainda resta no complexo (foto: Carlos Cruz)
O que antes era material estéril de mina, sem aproveitamento econômico, um passivo a ser descartado em pilhas de contenção, vira novo produto mineral a ser disponibilizado ao mercado pela mineradora: pesquisa desenvolvida em cinco anos pela Vale, em parceria com a Universidade Federal de Itajubá (Unifei), campus de Itabira (MG), e outros parceiros, já demonstra ser viável transformar a areia (sílica), encontrada em grande volume junto ao itabirito, em material aproveitável com ótimo resultado na pavimentação rodoviária.
O que antes era material descartável, transforma-se em alternativa para melhorar as precárias rodovias no estado. E o que é melhor: a aplicação da “areia sustentável”, como a Vale tem chamado o produto, pode aumentar em mais de 50% a vida útil da pavimentação em relação aos pavimentos que utilizam materiais tradicionais (brita, solo, areia natural), conforme já comprovam testes de laboratórios.
E pode resultar em redução de 20% dos custos da obra, por meio da aplicação do insumo em todas as camadas da estrada a ser pavimentada.
Segundo informa a assessoria de imprensa da Vale, a “areia sustentável” já é utilizada com sucesso pela construção civil. Com a nova aplicação, reduz ainda mais a disposição em barragens de material estéril das minas e rejeitos gerados nas usinas de concentração.
As pesquisas para as novas aplicações desses materiais, para que se tornem viáveis e necessárias, tiveram início após os trágicos rompimentos de barragens da mineradora em Mariana e Brumadinho, com mortes e danos ambientais continuados e irreparáveis.
Com a sua viabilização e aceitação pelo mercado, a oferta desse insumo em maior volume pode ter como resultado a queda de seu preço, barateando custos para a pavimentação de rodovias e também para a construção civil.
A areia é o segundo recurso mineral mais explorado no mundo, depois da água. E as minas da Vale, em Minas Gerais, onde estão localizadas as reservas de itabiritos, dispõem desse material em proporção acima do material lavrável.
Testes
Pesquisadores da Unifei estão para concluir o estudo com essa nova aplicação em pavimentação rodoviária, com o monitoramento de uma pista experimental em área operacional na mina Cauê. A pista tem 425 metros de extensão, com quatro camadas empregando diferentes misturas da “areia sustentável”.
O monitoramento está sendo realizado por meio de 96 sensores que medem a pressão, temperatura, deformação e umidade. Os dados permitem avaliar o desempenho das estruturas do pavimento sujeitas ao tráfego constante de cargas e às condições climáticas reais
“Esta é a primeira estrada rodoviária com revestimento asfáltico criada pelo setor de mineração que é toda monitorada por instrumentos”, festeja o gerente-executivo de Licenciamento Ambiental da Vale, Rodrigo Dutra Amaral, já vislumbrando a aplicação desse material com grande aceitação para o mercado, reduzindo impactos ambientais.
Mas essa nova aplicação pelo mercado vai ter que aguardar por um período de dois anos até a conclusão da pesquisa. Os resultados serão avaliados pelos pesquisadores do campus local da Unifei e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“Serão compartilhados também com o Instituto de Pesquisas em Transporte (IPR) do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), criando-se um acervo técnico e normatização do método”, acrescenta Amaral.
Investimento
Para desenvolver essa alternativa de aplicação da “areia sustentável” em pavimentos rodoviários, a Vale já investiu R$ 7,1 milhão só em pesquisa.
Após o resultado final da pesquisa, esse material será disponibilizado ao mercado, abrindo-se boas oportunidades de novos negócios a esse recurso mineral que até então era considerado inservível, um material a ser descartado, sem valor econômico, como foi até recentemente o itabirito compacto, atualmente explorado em Itabira.
“É a economia circular colocada em prática em nossas operações, com o reaproveitamento de um material que seria descartado em pilhas e barragens”, salienta a gerente de Negócios da Vale, Marina Dumont, para quem a expectativa é abrir novas oportunidades de negócios para a mineradora, com ganhos para o meio ambiente e novas oportunidades de emprego e renda.
Segundo ela, para cada quilômetro de rodovia tem potencial de consumo de até 7 mil toneladas do rejeito gerado na produção do minério de ferro. “Somente no estado de Minas Gerais, temos aproximadamente 250 mil quilômetros de estradas sem pavimentação”, vislumbra como nicho de mercado a ser explorado.
“As misturas contendo nossa areia apresentam melhores resistências à fadiga e às deformações permanentes. A areia Vale atua como um agente redutor do consumo de cimento e cal, além de reduzir em até 6% o consumo de cimento asfáltico de petróleo (CAP), considerado um dos materiais mais caros neste tipo de obra”, explica Laís Resende, engenheira da mineradora, responsável técnica pela pesquisa.
Outras aplicações
Para a “areia ambiental” A Vale tem atuado com diferentes parceiros para buscar a certificação do uso de sua areia em pavimentos rodoviários, como já acontece com a sua utilização em concreto e argamassa. Essa aplicação já foi atestada, no ano passado, por diversas instituições de pesquisa.
Com as adequações para o aproveitamento desse material retirado de suas operações em Minas Gerais, a Vale espera vender e doar, neste ano, cerca de 1 milhão de toneladas de “areia sustentável” com a perspectiva de dobrar esse volume em 2023.
Ainda para reduzir a disposição nas barragens, a Vale já dispõe em Itabira de duas plantas de filtragem de rejeitos e outras duas estão sendo construídas. “As duas plantas de filtragem de rejeitos inauguradas no início do ano nas usinas de Cauê e Conceição vão potencializar a produção da ‘areia sustentável’ em Itabira, reduzindo o percentual de água do rejeito, o que viabiliza o empilhamento a seco do material, assim como o interesse do mercado pelo produto”, afirma o gerente-executivo do Complexo Operacional de Itabira, Daniel Daher.
No complexo da Vale em Vargem Grande, em Nova Lima, a tecnologia já é empregada. E uma quarta planta de filtragem de rejeitos deve ser inaugurada, no segundo trimestre, na mina Brucutu, no município de São Gonçalo do Rio Abaixo, ampliando o aproveitamento de estéril e rejeitos.
Produção Sustentável
A “areia sustentável” da Vale é considerada um coproduto do processo de produção do minério de ferro. A partir de adequações na operação em Minas Gerais, o material arenoso, anteriormente disposto em pilhas e barragens, é beneficiado e transformado em produto comercial, seguindo os mesmos controles de qualidade da produção de minério de ferro.
A areia resultante do tratamento de minério de ferro é um produto 100% legal, com alto teor de sílica e baixo teor de ferro, além de alta uniformidade química e granulométrica. O material não apresenta características perigosas em sua composição. Isso porque o processamento mineral para obtenção da areia é essencialmente físico, sem alterações na composição dos materiais.
A “areia sustentável” já pode ser utilizada para concretos, argamassas, pré-fabricados, artefatos, cimento. E não demora a expectativa é que seja empregada em larga escala na pavimentação rodoviária e vicinal.
Investimentos em educação e produção científica
A Vale diz que essa é mais uma alternativa para a diversificação econômica de Itabira. Só em pesquisas científicas da Unifei foram investidos mais de R$ 3 milhões, alocados também na aquisição de equipamentos para os laboratórios do curso de Engenharia da Mobilidade, considerados de referência no estado na área de pavimentação.
Cerca de 120 alunos da instituição já participaram dos estudos de aplicação da areia oriunda do tratamento do rejeito de minério de ferro em revestimentos rodoviários, junto ao grupo de cinco professores pesquisadores. A pesquisa já foi tema de mais de 20 artigos, dissertações e monografias publicados, além de um pedido de patente.
“O modelo de parceria de pesquisa que a Vale desenvolve com a Unifei é extremamente importante para o desenvolvimento da pesquisa científica no Brasil. Os dados da pista de Cauê serão utilizados para alimentar o novo método de dimensionamento de pavimentos nacional, o Medina, que está sendo desenvolvido pelo IPR-DNIT, em parceria com a COPPE-UFRJ”, salientou o coordenador da pesquisa pela Unifei de Itabira, professor Sérgio Soncim.