|

Pelo ar limpo, médicos ambientalistas pressionam por protagonismo da saúde e anunciam marcha global em Belém (PA)

Foto: Carlos Cruz

Movimento Médicos pelo Clima participou da elaboração do Plano de Ação de Saúde de Belém e prepara marcha e carta de recomendações para lideranças mundiais

Pioneiro no Brasil ao mobilizar a classe médica no enfrentamento à mudança climática e à poluição do ar, o Movimento Médicos pelo Clima, idealizado pelo Instituto Ar, está articulando ações para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), em Belém (PA), com o objetivo de garantir que as decisões e compromissos assumidos considerem os impactos na saúde humana. O Movimento reúne profissionais de todas as regiões do país e integrou a construção do Plano de Ação de Saúde de Belém, proposta global coordenada pelo Ministério da Saúde para ajudar os países a adaptarem seus sistemas de saúde aos efeitos das mudanças climáticas.

Criado em 2020 com o nome de Médicos pelo Ar Limpo, o Movimento Médicos pelo Clima atua em três frentes principais  — advocacy, produção e disseminação de conhecimento científico e mobilização da classe médica  — para inserir a pauta de clima e saúde em políticas públicas. Com a aproximação da COP30, o Movimento tem intensificado sua atuação para ampliar o debate sobre a relação entre clima e saúde, fortalecendo a pauta junto a tomadores de decisão, entidades médicas e sociedade civil.

“Médicos e médicas engajados na causa ambiental, como porta-vozes da saúde diante da crise climática, têm responsabilidade e poder de influência para enfrentar esse que é o maior desafio para o futuro de nossas vidas”, avalia a médica Evangelina Araújo Vormittag, fundadora do Instituto Ar.

Plano de Ação de Saúde de Belém

O Movimento Médicos pelo Clima integrou o grupo de instituições que participaram da elaboração do Plano de Ação de Saúde Belém, documento desenvolvido pelo Brasil para orientar compromissos internacionais e colocar a saúde como prioridade nas respostas à crise climática. Coordenado pelo Ministério da Saúde, o plano apresenta medidas que podem ser adotadas por diferentes países para fortalecer a resiliência de seus sistemas de saúde diante dos impactos do clima.

O Plano reúne ações voltadas a três eixos. O primeiro trata do fortalecimento da vigilância e do monitoramento em saúde, buscando ampliar a capacidade de resposta a ameaças relacionadas ao clima, como surtos de doenças transmitidas por vetores e impactos na saúde mental provocados por eventos extremos. O segundo eixo propõe acelerar a implementação de políticas baseadas em evidências, estimulando a cooperação entre governos, universidades, organizações da sociedade civil e outros atores estratégicos. O terceiro incentiva a inovação e a produção, com investimentos em pesquisa e tecnologia voltados às necessidades específicas das populações mais vulneráveis.

A participação do Movimento concentrou-se na inclusão de abordagens de saúde pública e do trabalhador. Entre as propostas apresentadas estão a ampliação da proteção a profissionais da linha de frente, com instrumentos adequados e atenção especial a questões psicossociais; a criação de protocolos claros e a garantia de financiamento para atender grupos em situação de vulnerabilidade durante eventos climáticos extremos; e a integração do cuidado climático preventivo à atenção primária, promovendo uma governança local alinhada aos princípios da saúde planetária.

O embaixador do Movimento Médicos pelo Clima, João Silvestre, doutor e mestre em Saúde Pública pela USP e médico do trabalho, explica que os impactos da crise climática não se limitam ao ambiente natural, mas atingem diretamente os locais onde as pessoas exercem suas atividades profissionais. “Quando temos aumento da temperatura, poluição atmosférica ou eventos extremos, esses fatores também se manifestam nos ambientes de trabalho. Isso leva ao adoecimento do trabalhador, aumenta a demanda por assistência médica e gera repercussões para as organizações e até para o sistema público de saúde e previdência”.

Silvestre aponta que as consequências incluem desde doenças cardiovasculares agravadas pelo calor até sofrimento mental. “A literatura já mostra efeitos do calor piorando condições cardiovasculares, doenças renais, câncer de pele, problemas respiratórios relacionados a queimadas, além de infecções em cenários de enchentes, como hepatite e leptospirose. Também existe o sofrimento mental do trabalhador em situações de maior risco, como inundações e desabamentos”, afirma.

“Falamos muito sobre o trabalhador rural, mas os trabalhadores que estão nos ambientes urbanos, como aqueles que estão na construção civil, que trabalham a céu aberto e estão mais susceptíveis a chuvas intensas e ondas de calor, ou mesmo trabalhadores do setor industrial, que vão sentir piora da sensação térmica no seu local de trabalho, também estão entre os grupos mais suscetíveis”, complementa.

Na avaliação do embaixador, as empresas também precisam assumir maior protagonismo diante da crise climática. “É importante destacar a gestão integrada de saúde, segurança e meio ambiente nas organizações. A agenda ESG já traz essa pauta, envolvendo meio ambiente, responsabilidade social e governança, mas essa integração precisa ser mais efetiva diante da crise climática. As organizações devem se engajar junto à sociedade civil para melhorar tanto o meio ambiente em geral quanto o ambiente de trabalho, garantindo ações de promoção da saúde e prevenção de adoecimentos”.

Marcha e carta de recomendações

Durante a COP30, o Movimento Médicos pelo Clima atuará em duas frentes principais. No dia 11 novembro, em parceria com o Grupo de Trabalho Amazônico, a iniciativa vai liderar a Marcha Global Saúde e Clima, que vai reunir profissionais de saúde, ativistas e cidadãos para chamar a atenção para os impactos da crise climática na saúde e pressionar lideranças políticas por compromissos urgentes. O ato deve ter a participação de representantes de diferentes países.

Além da mobilização de rua, o Movimento também entregará à presidência da COP30 uma carta com recomendações para que a saúde esteja no centro das decisões políticas do encontro. O documento reúne propostas elaboradas de forma coletiva e busca fortalecer o papel do Brasil como referência na integração entre políticas de saúde e ações climáticas, incentivando a adoção de metas claras e monitoráveis pelos países participantes.

Mobilização da classe médica em defesa da saúde e do clima

Com mais de 15 mil profissionais de saúde alcançados e presença em espaços decisivos de debate, o Médicos pelo Clima integra redes como a Coalizão Clima, Crianças e Adolescentes, a Aliança Global Clima e Saúde e o Grupo de Trabalho Saúde Única da Sociedade Brasileira de Pediatria. Suas ações incluem publicações técnicas, eventos, iniciativas educativas e mobilizações públicas, reforçando a saúde como elemento central na agenda climática.

O Movimento ganhou visibilidade já em seu primeiro ano ao articular, junto a mais de dez associações médicas e ao Ministério Público Federal, a defesa da implementação da fase P8 do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve), que prevê a redução de até 95% das emissões de material particulado por veículos pesados. Desde então, tem ampliado sua atuação em frentes como campanhas de mobilização, produção e divulgação de conhecimento científico, participação em coalizões nacionais e internacionais e ações de advocacy.

Entre suas publicações mais recentes, está a cartilha Como as mudanças climáticas impactam a saúde das crianças?. Elaborado por médicas e médicos embaixadores do Movimento, com revisão técnica da Sociedade Brasileira de Pediatria, o material apresenta os riscos climáticos mais frequentes em cada região do país e orientações práticas para que pais e cuidadores protejam as crianças diante da crise climática.

Sobre o Instituto Ar

O Instituto Ar é uma organização sem fins lucrativos fundada por médicos, acadêmicos e profissionais do mercado comprometidos com a causa ambiental. Com mais de 16 anos de atuação, consolidou-se como referência na conexão entre saúde, clima e qualidade do ar.

Protege a saúde humana por meio do enfrentamento às mudanças climáticas e da poluição atmosférica, transformando conhecimento científico em ação, influenciando políticas públicas e mobilizando a sociedade por um ar e um clima mais saudáveis. Saiba mais em http://www.institutoar.org.br

Posts Similares

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *