Patriarcado e machismo: duas faces da mesma opressão

Rafael Jasovich*

 O patriarcado é um sistema social baseado em uma cultura, estruturas e relações que favorecem os homens, em especial o homem branco, cisgênero e heterossexual.

Na sociedade patriarcal, prevalecem às relações de poder e domínio dos homens sobre as mulheres e todos os demais sujeitos que não se encaixam com o padrão considerado normativo de raça, gênero e orientação sexual.

Por essa perspectiva, se o mundo fosse avaliado como uma escada de privilégios, o homem branco cisgênero e heterossexual seria o que mais acumula benefícios e que estaria no topo dos degraus.

Logo, todos aqueles que não possuírem alguma(s) dessas características, em relação ao gênero, raça ou orientação sexual, estariam abaixo nessa escada.

No patriarcado, o homem desfruta de uma posição de privilégio e poder social, econômico e político, enquanto a mulher e outros sujeitos que fogem da norma são relegados à submissão e invisibilização.

Em outras palavras, o homem possui melhores oportunidades e benefícios na sociedade, enquanto as mulheres e grupos marginalizados, além de não receberem os mesmos direitos, também precisam cumprir com uma série de obrigações.

A sociedade patriarcal é altamente hierarquizada e o centro do poder é essa figura do patriarca e do patriarcado racista cis-hétero-normativo que controla, se apresenta se organiza e se define como centro, foco hegemônico do controle e do poder.

Nesse sentido, aqueles que estão fora dessa identidade hegemônica, são percebidos como objetos.

No patriarcado privado, o sistema se manifesta excluindo as mulheres da esfera pública e relegando sua existência e participação ao lar, onde são controladas diretamente pela figura do pai, avô, marido etc.

Já no patriarcado público, embora as mulheres tenham acesso à esfera pública e participem da sociedade de outras formas além dos muros de suas casas, elas continuam subordinadas aos homens nos distintos âmbitos nos quais circulam.

São minorias em posições de poder, possuem menos benefícios, são vítimas de violências e requisitadas a cumprir certos papéis somente pelo fato de serem mulheres.

A família é uma das instituições sociais mais importantes para a manutenção do patriarcado, isso porque historicamente o homem ganhou o papel de provedor do lar, aquele que sai para trabalhar enquanto a mulher fica em casa cuidando dos afazeres domésticos.

O modelo de democracia liberal moderna e o seu Estado concomitante é um Estado que não só é burguês, mas também é um Estado patriarcal e racista.

Isso porque está organizado a partir de uma forma de legitimação que é essa do contratualismo opressor em relação a gênero, raça e sexualidade. As pessoas são vistas como livres, mas alguns são sempre mais livres do que outros.

Ao fim e ao cabo, o que seria melhor e mais interessante enquanto projeto civilizatório não era ter uma sociedade de domínio das mulheres ou dos homens. O feminismo não quer substituir uma forma de dominação pela outra.

O que se quer é uma sociedade radicalmente igualitária no sentido mais pleno da palavra, sem domínio masculino ou feminino. É a possibilidade de uma sociedade justa, igualitária e livre para todos.

Muitas vezes nos deparamos com imagens na mídia de mulheres com marcas de violência física e nos chocamos. Essa é a
expressão mais visível do machismo.

Entretanto, não é a única. O machismo é o braço cultural da misoginia, e a misoginia é o ódio às mulheres, pregado e perpetuado pela sociedade patriarcal. Mas o que é o patriarcado, de onde vem?

A sociedade nem sempre foi ancorada no patriarcado. Em tempos de uma organização social primitiva, as pessoas se  arranjavam em torno da figura da mãe, a partir da descendência feminina, uma vez que desconheciam a participação masculina na reprodução.

Os papéis sexuais e sociais de homens e de mulheres não eram definidos de forma rígida e as relações sexuais não eram monogâmicas, tendo sido encontradas tribos nas quais as relações entre homens e mulheres eram bastante igualitárias.

Todos os membros envolviam-se com a coleta de frutas e de raízes, alimentos dos quais sobreviviam, bem como a todos cabia o cuidado com as crianças do grupo.

Muito tempo depois, com o desenvolvimento da agricultura, da caça e do fogo, as comunidades passaram a se fixar em um território.

Aos homens predominantemente cabia a caça, e às mulheres, também de forma geral, embora não exclusiva, cabia o cultivo da
terra e o cuidado das crianças.

A partir daí, as desigualdades sociais de gênero ancoram-se na divisão do trabalho entre homens e mulheres, assim como as formas de hierarquização derivadas dessa concepção familiar.

A defesa dessa estrutura familiar imposta no público é a  ferramenta mais feroz que alimenta todas as desigualdades, a opressão econômica e, portanto, o sistema de dominação cultural e simbólico.  Esse sistema impõe um modo de funcionamento social que atinge a todos e todas.

O sistema patriarcal sustenta o capitalismo, manifesta-se nas diversas esferas da vida pública e privada, na família, na religião e
na cultura, ou seja: na sociedade como um todo. Ele revela-se no cotidiano, desde comportamentos explicitamente violentos, até frases sutis, que parecem inofensivas.

Aparece em relacionamentos abusivos, quando a mulher é proibida pelo homem de usar determinadas roupas ou maquiagens. Ou quando ele impede que ela tenha amizades e se relacione com familiares.

Acontece, ainda, se o homem impede que a mulher use com liberdade suas redes sociais ou sempre se vê induzida a pensar que
está errada nas discussões do casal, mesmo acreditando que está certa.

Tem mais: quando o homem está sempre fazendo chantagens emocionais com a mulher para conseguir o que ele quer ou quer
fazer com que ela se sinta burra e rebaixada.

O patriarcado também mostra suas garras quando as tarefas domésticas ficam a cargo das mulheres, como se fosse algo natural.

Ora, não são todos moradores de uma casa? Se todos sujam, todos deveriam limpar; se todos comem, todos deveriam cozinhar!

Em contextos profissionais, o patriarcado aparece por meio do assédio sexual, ou quando um colega, homem, exercendo a mesma função que sua colega mulher, recebe mais reconhecimento por isso e ganha mais.

O patriarcado e o machismo nos circundam e guiam nossas relações sociais.

É preciso estar em constante desconstrução de práticas opressoras, pois nem sempre é fácil perceber que estamos vivendo situações de machismo.

Mulher, siga atenta e firme! Denuncie e reivindique seu lugar de direitos. Homem, junte-se a essa luta! Combata o machismo no seu círculo social, com seus amigos, familiares e no trabalho!

A opressão de gênero é definida como originária da opressão de classe

Assim, para falar de machismo e misoginia é necessário entender que essa é uma realidade inserida em um sistema capitalista.

Neste contexto, gênero, raça, classe e orientação sexual ditam privilégios na sociedade, que é patriarcal.

Inseridos na sociedade de classes, tanto homens quanto mulheres não se apropriam totalmente do valor do que produzem, mas estas ficam com uma parcela menor do que estes.

A manutenção da hegemonia, que se dá não apenas nos âmbitos econômicos, mas políticos, culturais e sociais, é possível por meio do exercício de poder de uma classe dominante que consegue angariar apoio ao seu estilo de pensar.

Ele destaca a existência de instituições que constituem a sociedade civil e que podem contribuir para a difusão de pensamentos hegemônicos, dentre elas os meios de comunicação.

Para trilhar um caminho sobre uma possível contribuição da mídia para manutenção ou diminuição de preconceito de gênero e ódio às mulheres, torna-se indispensável um debate teórico sobre as bases dessa problemática, além de uma análise empírica de publicações.

Ou seja, tudo de uma maneira simples de entender se volta sempre para a luta de classes onde está inserido de forma transversal essa problemática.

*Rafael Jasovich é jornalista e advogado, membro da Anistia Internacional.

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