Outubro Itabirano. Crônicas da Itabira do Matto-dentro Imperial – 1890 A história da República na Itabira
Panfleto de propaganda republicana diz: Abaixo a Monarquia Abolicionista e viva a República com indenização
Acervo e Pesquisa:Cristina Silveira
A adversidade é o cadinho em que a virtude se apura…, Conselheiro Bastos
Itabiranos! Desabou-se, afinal, no memorável dia 15 de novembro, como outrora as muralhas de Jericó ao som das trombetas belicosas, o edifício semi-secular da monarquia brasileira; desapareceu o poder pessoal com todo o seu cortejo de privilégios de castas, para dar lugar ao lema: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”.
Sim, é esta a divisa que encima o partido do novo e majestoso edifício que das ruinas do antigo se levanta; eis-nos em plena República. A surpresa causada por tão inesperada nova sucedeu em nosso espírito a convicção da impossibilidade de regresso ao velho regime e, consequentemente, o dever de colaborar na reconstrução da pátria, cuja efígie venerada é, nos dias de perigo para a causa pública, o centro para o qual devem convergir todas as vistas; a seus pés devem-se depor as armas fratricidas, em suas aras sacrificar veleidades que nada significam.
A ideia da confraternização foi, pois, o laboro que nos guiou para, em tablado comum, estendermos as dexiras aos irmãos vencedores no combate de que ninguém saiu vencido. Tomando-a por santelmo entendíamos, como hoje ainda, ser ela a base primordial da nova organização, afim de que ao cabo suceda um novo fial, afim de que seja uma realidade a conquista da democracia, assim firmada em condições de estabilidade.
Por esta estrada enveredamos, vendo com prazer caminhar à nossa frente, com passo grave e majestoso, as sumidades de ambos os partidos monárquicos, ora extintos. Como notas dissonantes, porém, destacaram-se do concerto harmonioso dos brasileiros as vozes dos republicanos genuínos, que aqui e ali apareciam reclamando seu direito de antiguidade.
Serviram-lhe de resposta o esforço e denodo com que se lhes opuseram homens bem intencionados, que, abnegados, tem-se batido em prol da união de vistas, recomendando se desta sorte a benemerência pública. Haja a vista Ouro Preto, por exemplo, onde em boa hora experimentados lidadores de outros tempos, olvidando rivalidades, no presente reputadas questiúnculas de pouca monta –, constituíram-se o Centro Político.
Enquanto isto se passa na capital, vejamos o que tem lugar nesta cidade, em que até hoje parece esperar-se a vinda do Messias, conservando-se os políticos extremados no antigo e bolorento estado de ressentimentos partidários, não tendo ainda conseguido transformar-se em elementos homogêneos de forças vivas.
Aqui ter sido monarquista é trazer na fronte o ferrete da ignominia; ter militado nas fileiras dos sustentáculos do trono, até ontem mantido pela quase totalidade da nação, importa o eterno anátema, a exclusão da comunhão social, à qual só se admitem os que tiveram a felicidade de nascer republicanos.
Liberdade, Igualdade e Fraternidade!
O patriotismo nesta terra é o monopólio de uns com preterição de outros; a nobre aspiração do engrandecimento nacional, para cuja realização as formas de governo, não passando de meios, não podem residir nos corações de homens poluídos pela especulação, força motriz dos trabalhadores carunchosos de 15 de Novembro, – epítetos cavalheirosos com que são mimoseados os que até o dia do movimento militar do Rio de Janeiro não faziam parte do pujante partido de – 13 –.
Liberdade, Igualdade e Fraternidade!
Os cargos públicos, exceção feita dos preenchidos por nomeação vitalícia, são ocupados exclusivamente pelos republicanos natos. É assim que, a começar pelo sr. Elias de Paula Andrade, tem sido demitidos distintos cidadãos, que desinteressada e dignamente exerciam cargos públicos não renumerados, acrescendo o pasmo público ao considerar que esses atos são praticados por motivos ignorados (caveant consules!) e que se desconhece a superioridade dos sucessores destes funcionários.
Liberdade, Igualdade e Fraternidade!
Trata-se, finalmente, da eleição prévia, eleição a qual nem a décima parte do eleitorado compareceu, e desfecham-se os alfanges exterminadores sobre aquele que, abandonando os arraiais da monarquia ainda antes de 15 de novembro, aliou-se em tempo aos republicanos. O dr. Cesário Alvim foi o último dos últimos votados. Edificante!…
Até aqui voltavam-se todas as iras contra os antigos especuladores, hoje cai a seus golpes desapiedados o 1º. Governador dado pela Republica ao Estado de Minas Gerais!
Liberdade, Igualdade e Fraternidade!
Quem, a vista do exposto, pode negar que a linha divisória está traçada, que vento hostil sopra impiedoso, levando em seu remoinhar as flores de que estava juncado o caminho por onde, bem pouco há, confraternizados, passavam entoando hinos festivos os filhos da Itabira?!
Uma vez dado o grito de guerra, empenhamo-nos todos na cruzada santa do Club do Partido Nacional Itabirano, que desfraldando a bandeira branca da paz e adotando como divisa a – confraternização, – deseja que o Brasil seja dos brasileiros.
Seguindo-o, a vitória será nossa e transmitiremos nossos nomes a posteridade, que, referindo-se, à geração atual, dirá com o poeta: “Semper omnes nomenque tuum laudesque manebunt.”
Os Anatematizados. Itabira, 4 de julho de 1890. [A Ordem (MG), 17/7/1890. BN-Rio]