Outubro Itabirano. Crônicas da Itabira do Matto-dentro Imperial – 1862 – Souvent la femme varie

Pixação em ruas no Rio

Foto e Pesquisa: 
Cristina Silveira
Pico do Cauê. F. Capixaba, 11/5/1955

Interior. Itabira, 6 de novembro de 1862. (Carta do correspondente). Cada homem tem sua propensão. Eis aí uma verdade que não sofre contestação. E eu acrescento: em cada dia, em cada hora a propensão do homem varia. Nesse sentido bem se podia aplicar ao nosso sexo que disse o rei amoroso de sua elas:

Souvent la femme varie

Para não tornar-me maçante por falta de assunto em matérias de novidade, vou-me hoje ocupar de coisas sabidas. Quero dar alguma notícia do que seja esta Itabira. E princípio:

A Itabira é … é uma cidade de Minas. A fé que se lambiscasse alguma coisa de geografia, e estivesse me exercitado no estilo descritivo, passaria a fazer uma pintura topográfica deste abençoado torrão. Quem puder o faça.

No estado de atual decadência, em que se acham todas as nossas povoações, ainda Itabira apresenta um estado relativamente lisonjeiro, e as causas são: 

Sua riqueza mineral. As lavras da Itabira ainda encerram quantidade fabulosa de ouro. Presentemente a extração é mui reduzida. Porém, aí existem muitas casas que se fizeram ricas e possuidoras de avultados capitais, provindo das lavras.

Do livro, Memória e identidade cultural: a diversidade das expressões culturais e folclóricas de Itabira, de Santos de Souza Guerra

A fertilidade de seu solo. Quem não visitou o interior de Minas, quem ainda não veio a Itabira, quem não conhece seus distritos produtores como Ferros, Joanésia, Lagoa, Alfié etc., mal poderá avaliar seus elementos de prosperidade.

A Agricultura dirigida pela rotina, falta de braços, dificuldade ou quase impossibilidade de levar aos mercados de consumo o produzido, tais são os obstáculos que tolhem o desenvolvimento dessa fonte de riqueza. É um mal comum aos municípios do centro e do norte.

Entretanto, tão fácil é a produção, que o comércio de município a município, em suas acanhadas proporções, parece facilitar o fazendeiro da Itabira. Além disso o nosso fazendeiro também se dedica à criação de animais muares e cavalares.

Entre outros citaremos o capitão Luiz Augusto, que possui uma bela criação de pampas; o capitão João Lage, o sr. Bernardino da Costa Lage, que tem raças escolhidas de cavalos, bois e carneiros, cuja venda anualmente lhe produz subido interesse.

De muitos outros poderia fazer honrosa menção. Concluirei dizendo que a Itabira tem representado, talvez, o primeiro papel nas nossas exposições provinciais. Crentes no futuro, esperamos ainda em tempo pouco remoto uma época de verdadeira prosperidade para Itabira.

Gênio comerciante. O itabirano não deixa inativos os capitais, que a mineração ou a agricultura lhe fornece. Comercia em grande escala com a praça da corte, importando anualmente centenas de contos em fazendas, molhados e miudezas de armarinho. Além disso os produtos agrícolas do município vão abastecer os mercados vizinhos.

Graças a estas circunstâncias, a Itabira, com quanto se ressinta do marasmo geral, que consome a província, contudo mantém ainda um estado de relativa prosperidade.

Quem abre a carta geográfica de Minas, depara imediatamente com o traço sinuoso, que indica a nascente, curso e fim de um grande rio.

É o Rio Doce. Vai desembocar no Atlântico, depois de percorrer grande parte da província de Minas, e na do Espírito Santo.  Que terrenos atravessa? Matas, que surgem de um terreno fértil, e que cultivado iria aumentar o capital público e particular. Em que estado se acha? Naquele, em que deixou a Província.

Como Minas não abre essa via de comunicação com o litoral? Porque o governo provincial diz que não pode e o geral diz que não quer.

Será difícil, impossível mesmo? Minas foi descoberta por Sebastião Fernandes Tourinho, que subiu em canoas o RIO DOCE. Logo… logo é o gênio do regresso, é o demônio do atraso, quem com mão amaldiçoada veda o porvir de Minas.

Paciência! Não passaremos avante sem neste lugar dirigirmos uma suplica ardente a quem quer que administre esta parte do Brasil – lançai os olhos, senhor, sobre este torrão de Minas. Aproveitai esses elementos de riqueza pública, que aí jazem desconhecidos e atirados.

A Itabira compõe-se de sete freguesias. Em cada uma há uma escola de primeiras letras.

Na cidade há três escolas, duas para o sexo masculino, e uma para o feminino.

Há também uma aula de latim e francês.

A cidade possui matriz e hospital. O nome de monsenhor Felicíssimo será sempre recordado por aquele, que ver esses dois edifícios. A seus esforços, secundados pela liberalidade do povo itabirano, devemos a realização de ideia tão cristã.

Hoje deixo em santa paz o Sr. Pereira, e para não perder o correio, faço ponto.

Au tantôt [Diário do Rio de Janeiro, 29/11/1862. BN-Rio]

 

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