O maquiavélico nacional, o popular e os direitos
Rafael Jasovich*
O escritor florentino, para além das suas múltiplas e diversas escritas, constitui uma singularidade fundadora no campo da teoria política.
Todos os seus grandes leitores, tanto de esquerda como de direita, reconhecem o Príncipe e os Discorsi como o primeiro pensador que exibe com intensidade incomparável o que agora podemos tratar conceitualmente como a primeira teoria em que o político é apresentado sob o disfarce de autonomia radical.
Em Niccolò di Bernardo dei Machiavelli (1469/1527), embora o político seja atravessado pelo econômico – o religioso e a história das idéias devem ser sempre pensados em sua especificidade única e insubstituível.
É o sotaque que as três grandes leituras de Maquiavel sublinham: Gramsci, Althusser, Lefort.
Para além das diferenças, nas três emerge a mesma questão: o Príncipe é a metáfora que encarna a complexa relação entre a correspondência mútua entre o Líder e um Povo, duas figuras que devem combinar Virtude e Contingência.
Ao mesmo tempo, devem estabelecer a combinação entre a arte de governar com sua duração pertinente e amparada pela autoridade correspondente.
Essa autoridade que nada espera do amor, por sua condição volátil e efêmera, deve inspirar respeito. Ou seja, despertar algum tipo de medo, mas nunca ser odiada.
Por fim e em síntese, a articulação do Príncipe com o Povo se realiza para a construção de uma vontade nacional e popular possuída pelo desejo de conquistar a unidade da Nação e culminar na constituição da República.
Nessa perspectiva, talvez possa ser entendido que Maquiavel não era maquiavélico. O adjetivo “maquiavélico” é a grande distorção ideológica que esconde o verdadeiro pensamento maquiavélico.
A ideia maquiavélica não apresenta nenhum traço emancipatório, é uma representação do poder que consiste em o sujeito gozar e contribuir com a sua submissão a um poder que carece de Virtude e não sabe o que fazer com a Contingência porque nunca compreendeu a variações aleatórias do que é popular.
Os representantes políticos da direita são maquiavélicos. Só se rendem ao Poder com o propósito perverso de reproduzi-lo para o “Grande”, como diria nosso escritor florentino.
São os movimentos nacionais, populares e de esquerda, assumam ou não, que só permanecerão na sua causa se forem maquiavélicos.
Para pensar
*Rafael Jasovich é jornalista e advogado, membro da Anistia Internacional