O Brasil tem a sua pior recessão em 2020 e a pior década perdida da História

Por José Eustáquio Diniz Alves*

O decênio compreendido entre 2011 e 2020 já estava marcado para emplacar a segunda década perdida da economia brasileira, antes mesmo do surto pandêmico do novo coronavírus.

Assim como nos anos de 1980, a segunda década dos anos 2000 caminhava para ter um crescimento da renda per capita próxima de zero. Mas como o governo não conseguiu barrar a propagação do Sars-CoV-2 e o Brasil se tornou um dos países mais afetados pela pandemia, o país será também um dos mais afetados na área economica.

Em abril, o Fundo Monetário Internacional (FMI) havia previsto uma queda de 5,3% do PIB brasileiro em 2020. Mas agora em junho, no dia 24/06, o FMI refez as contas para uma queda de 9,1% do PIB. Será a maior recessão da história brasileira, desde que começaram as medições em 1900.

O gráfico abaixo mostra a variação anual do PIB e a média móvel de dez anos entre 1900 e 2020. Nota-se que nas nove primeiras décadas do século XX o crescimento do PIB ficou sempre acima de 2,9% ao ano e as décadas de maior crescimento decenal foram as de 1950 e 1970.

A partir do ano de 1981 os decênios passam a ser cada vez menores. Houve uma ligeira recuperação na primeira década dos anos 2000 e, atualmente, os decênios são os menores da série. A atual década (2011-20) será a primeira da história com crescimento negativo do PIB.

taxas anuais de crescimento do PIB e média móvel

Uma recessão desta proporção no ano de 2020 e um desempenho tão ruim em uma década são sinais inequívocos que o Brasil é uma potência submergente que está jogando fora o seu futuro. Como mostrei em artigo no mês passado (Alves, 29/05/2020), a situação macroeconômica do país esta provocando uma perda dos recursos produtivos, particularmente uma perda enorme da capacidade econômica da força de trabalho.

O desemprego e a subutilização da mão de obra neste momento é uma verdadeira catástrofe, pois estamos em um instante singular da história brasileira, um momento que só acontece uma única vez na história de qualquer país. É quando a proporção de pessoas em idade ativa está em seu ponto máximo e a proporção de pessoas em idade não produtiva ou menos produtiva (crianças e idosos) está em seu ponto mínimo.

Conhecido como “bônus demográfico” este acontecimento especial é aquele evento indispensável para a decolagem do desenvolvimento socioeconômico de qualquer país. Não existe nenhuma nação com altíssimo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que não tenha aproveitado as oportunidades de uma baixa razão de dependência demográfica.

Esta nova configuração demográfica exigiria que as políticas econômicas e sociais se adaptem à nova realidade populacional, fortalecendo as políticas de educação e emprego. Infelizmente a crise econômica que começou em 2014 já estava fazendo o Brasil desperdiçar este momento histórico e que é fundamental para qualquer nação que queira dar um salto de qualidade de vida para a sua população.

Mas com toda a crise econômica e no mercado de trabalho que acontece depois da eclosão do coronavírus, o desafio de aproveitar os momentos favoráveis da estrutura etária parece um sonho cada vez mais distante.

A atual crise sanitária e econômica representam um golpe fatal no bônus demográfico brasileiro (ALVES, 11/05/2020). A irresponsabilidade sanitária do presidente da República jogou milhões de brasileiros na “rua da amargura”.

O Brasil já é o país com o maior número de mortes diárias do mundo, ultrapassando inclusive os EUA nas duas últimas semanas. Até o final do ano, o país latino-americano pode superar o país norte-americano em número acumulado de óbitos pela covid-19. Isto vai provocar muito sofrimento no território nacional.

mortes por Covid-19 nos EUA e Brasil

Toda esta crise sanitária requer que a população mais carente seja apoiada pelo Estado. Mas também seria o momento de atacar os privilégios das diversas elites para promover uma melhor distribuição de renda. Os altos salários e os “penduricalhos” da elite dos membros do Judiciário, Legislativo e Executivo não foram questionados.

Nada ainda se fez de concreto para viabilizar o aumento do imposto sobre as grandes fortunas e o imposto sobre a herança dos super ricos que concentram a propriedade e acumulam grande patrimônio. O fundo eleitoral poderia ceder recursos para a área da saúde. Diversos projetos megalomaníacos – como o do submarino nuclear – continuam absorvendo os parcos recursos nacionais, quando poderiam fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) e outras políticas públicas.

Mas os interesses corporativos e a falta de vontade para atacar as injustiças estruturais da economia brasileira, combinado com a generosidade fiscal da oposição, fez o Brasil aprofundar no desequilíbrio das contas públicas e perder o controle da dívida pública. O relatório do FMI prevê um déficit fiscal de incríveis 16% do PIB no Brasil, com uma dívida bruta alcançando 102,3% do PIB em 2020.

Isto deixa o Brasil em uma situação de enorme fragilidade, pois precisaria elevar as taxas de investimento para aumentar o nível de emprego e para aumentar a produtividade, mas a crise fiscal dificultará tudo. O Brasil vai completar a segunda década perdida e já vislumbra uma terceira década perdida a caminho. O Brasil é uma Potência Submergente que não consegue decolar pois está preso na armadilha da renda média.

*José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Foto em destaque: Shutterrstock

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