Newsletter homenageia Cláudio Abramo em seu centenário de nascimento: “Ele foi o melhor de todos nós, um jornalista parceiro da verdade.”

O jornalista Cláudio Abramo na redação do jornal Folha de S.Paulo

Foto: Sérgio Tomisaki/
Folhapress

“Quis o destino que ele nascesse em 6 de abril, véspera do Dia do Jornalista, e que essa fosse a sua vocação inconteste. Agora, no centenário de seu nascimento, nada mais justo e oportuno do que resgatar um pouco do que foi a sua passagem por essas plagas tropicais do Hemisfério Sul.”

Com esse lide a newsletter Jornalistas & Cia abre a reportagem em que homenageia o jornalista Claudio Abramo, nascido em 6 de abril de 1923 e falecido em 12 de agosto de 1987.

A newsletter é uma publicação semanal, dirigida a jornalistas e demais profissionais da comunicação brasileira. A edição especial desta semana é comemorativa do Dia do Jornalista, celebrado neste 7 de abril, que neste ano cai em uma Sexta-feira Santa.

A homenagem inclui uma declaração de “eterna amizade” do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. E finaliza com uma crônica de Leão Serva, contando como foi a sua convivência com esse “monstro do jornalismo brasileiro”.

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Trecho da reportagem-homenagem a Claudio Abramo

Nesta quinta-feira (6), celebra-se também o centenário de seu nascimento. A homenagem relembra fatos que fizeram do jornalista um dos expoentes da “modernização da imprensa brasileira”, antes uma cópia mal feita e nada apurada do jornalismo norte-americano, embora esse modelo persista até hoje no que resta dessa “grande imprensa brasileira”.

O diretor de Jornalistas & Cia, Eduardo Ribeiro, destacou a importância da atuação de Abramo no jornalismo nacional e de como o seu trabalho repercute no noticiário e produção de notícias ainda hoje:

“Em meio a uma família estelar, pode-se dizer que Cláudio foi um Sol, tal o esplendor de sua passagem pelo jornalismo brasileiro e tal a lenda que se criou em torno de seu nome, ainda hoje reverberando em várias gerações profissionais” escreve Ribeiro na abertura da reportagem-homenagem.

Com passagem por importantes jornais brasileiros, no início da carreira Abramo foi convidado por Samuel Wainer, criador do Última Hora nos anos 1950, sob impulso de Getúlio Vargas, a dirigir os jornais do grupo. Mas não aceitou. Preferiu trabalhar no jornal A Nação, publicação de pequena repercussão.

O jornal foi criado pelo empresário Mário Wallace Simonsen, dono da empresa aérea Panair do Brasil e da TV Excelsior, simpático ao governo Goulart, mas que durou pouco tempo.

Nessa tumultuada conjuntura política, que culminou com o golpe de 64, o ex-governador de São Paulo Carvalho Pinto foi convidado por Goulart a assumir o Ministério da Fazenda, para amenizar as críticas de que o seu governo era esquerdista, uma espécie de macarthismo tupiniquim que sobrevive aos tempos atuais.

Ao assumir a pasta, Carvalho Pinto levou junto Claudio Abramo como seu assessor de imprensa. Mas o jornalista autodidata ficou por pouco tempo no governo, mesmo tendo sido convidado pelo então presidente e sua equipe, em especial Darcy Ribeiro, a permanecer no cargo.

Veio o golpe. E assim, historicamente, como nem sempre o jornalista combativo em sua luta pela sobrevivência pode escolher onde trabalhar, adequa-se à regra do jogo.

Em 1962 foi trabalhar no Estado de S.Paulo, da família Mesquita. Ficou pouco tempo. Com os donos dos jornais próximos dos militares e dos civis golpistas (de hoje e de sempre, eles continuam aí), o que já arquitetavam o golpe militar de 1o de abril, pediram a sua cabeça. Abramo foi demitido em julho de 1963.

Pouco tempo depois de sua demissão do Estadão, Abramo foi contratado por Otávio Frias de Oliveira para analisar o conteúdo das edições do jornal Folha de S.Paulo, que ele havia adquirido em 1962.

Pouco tempo depois, o trotskista simpatizante do Partido Socialista, Claudio Abramo, foi para a redação do jornal, primeiro como chefe de Produção – e depois como diretor de Redação. Foi quando ele começou a modernizar o jornal com a cobertura dos acontecimentos, mesmo em tempo de ditadura.

“De um jornal anódino a muito influente, a Folha de S.Paulo − na época em ascensão no mercado paulista, com um esquema de distribuição rápido para o interior do Estado, a partir de sua sede na Alameda Barão de Limeira, no centro de São Paulo − era politicamente anódina, sem editoriais, sem artigos opinativos e críticos ao momento politicamente fechado que o País vivia”, registra a newsletter em sua reportagem-homenagem.

O vetusto jornal foi aos poucos modernizando até virar um dos jornais mais influentes do país, principalmente depois da campanha pelas Diretas Já, tendo sido o primeiro a assumir essa bandeira no bojo da abertura lenta, gradual e segura do regime militar patrocinada pelo general-presidente Ernesto Geisel.

Nesse posicionamento, digamos, progressista, foi de grande relevância a participação de Claudio Abramo. Hoje, a Folha perdeu esse “progressismo”, fazendo jus novamente ao seu passado golpista pré-Claudio Abramo.

Na modernização de sua linha editorial, Claudio Abramo “atraiu para o jornal o polêmico Paulo Francis, que escrevia dos EUA, e Alberto Dines, que fora defenestrado pelo Jornal do Brasil no começo dos anos 1970”. Atraiu também Alberto Dines.

Depois dessa passagem pela redação do jornal em São Paulo, Abramo virou correspondente da Folha em Londres e em Paris, num exílio voluntário que o afastou do país por uma temporada, da qual ele “relembraria com certo fastio”. Muitas das matérias que ele escreveu nesse período, sempre em tom crítico, estão no livro A Regra do Jogo.

Retorno

Ao retornar ao país, abrigou-se na redação da recém-fundada revista Senhor, passando depois para a revista IstoÉ, sempre a convite do amigo jornalista Mino Carta, esse outro brilhante jornalista, que havia sido afastado da revista Veja por pressão do ex-ministro da Justiça Armando Falcão, no governo Geisel, de triste lembrança.

A dupla voltou a trabalhar junta no Jornal da República, lançado por Mino Carta em 1980, no qual Abramo escreveria uma coluna sobre política nacional na primeira página. O jornal durou poucos meses, “não tendo força para enfrentar o duopólio Folha/Estadão”.

Pela regra do jogo, Abramo entendeu que nao existe um só jornalismo, mas vários. Suas reflexões ajudaram gerações de jornalitas entender a dimensão pública da profissão, que não tem uma ética exclusiva.

“Não existe uma etica específica do jornalista. A sua ética é a mesma do cidadão”, ensinou Abramo, para quem também não existe um jornalismo objetivo. Daí que o jornalista deve descobrir qual é a objetividade do jornal para o qual trabalha, o que deve ser feito sempre com inteligência e ética, que é a mesma do cidadão. 

Abramo saiu do Jornal da República antes de seu fechamento e retornou à Folha de S.Paulo, onde passou a escrever uma coluna no espaço opinativo do jornal, que ele havia criado em meados da década de 1970.

Ao falecer de mal súbito, em 1986, lia o jornal ao tomar café da manhã. “Foi homenageado com direito a velório no salão nobre da Assembleia Legislativa de São Paulo.”

 

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