Mineração deve se manter como carro-chefe da economia itabirana mesmo após a exaustão de suas minas em 2028
Carlos Cruz
Mesmo tendo sido confirmado pelo gerente-geral da Vale, Rodrigo Chaves, em entrevista coletiva realizada nessa terça-feira (17), no gabinete do prefeito Ronaldo Magalhães (PTB), que a reserva de minério existente em Itabira deve mesmo exaurir em 2028, a mineradora deve permanecer no município beneficiando minérios vindos de outros municípios em suas três usinas de concentração.
“As reservas que temos hoje medidas terminam em dez anos, mas temos os minérios existentes no Quadrilátero Ferrífero que podem ser processados em Itabira”, projeta o gerente-geral, repetindo mais uma vez a informação de que a empresa não deve sair do município após exaustão de suas minas. Além do minério do Quadrilátero Ferrífero, a empresa dispõe de outras reservas de itabirito em Conceição do Mato Dentro, Morro do Pilar e Guanhães – e que podem ser processadas nas usinas de Cauê e Conceição.
Conforme foi prometido no passado, há ainda a antiga reivindicação para que a Vale instale uma usina de pelotização em Itabira. “Quando se pensa em pelotização, não estamos diversificando a economia local. Não posso dizer se é essa uma saída ou não. O grupo de estudos das alternativas é que vai levantar as opções que se têm para Itabira assegurar o seu desenvolvimento no futuro”, sustenta Rodrigo Chaves. “Nada pode ser descartado. Depende da viabilidade econômica, social e ambiental.”
Recursos
O gerente da Vale admite também que, mesmo após a exaustão novas tecnologias podem viabilizar a exploração dos recursos existentes de itabirito mais duro – e que, para o seu beneficiamento, ainda não existe tecnologia desenvolvida. As reservas e dos recursos atualmente conhecidos são, respectivamente, de 738,6 milhões de toneladas (Mt) e de 181,6 Mt, totalizando 920,2 Mt.
Conforme explicou Rodrigues Chaves, reservas são os bens minerais conhecidos e provados – e que dispõem de planos de lavra com viabilidade econômica e ambientalmente aprovados.
Já os recursos dependem de mais estudos de viabilidade econômica e ambiental – e, também, do desenvolvimento de novas tecnologias, para que se tornem reservas exploráveis. Foi o que ocorreu com o itabirito duro, com a construção de uma nova usina e ampliação e modernização das usinas Cauê e Conceição I.
De acordo com as pesquisas geológicas divulgadas pela Vale em 2003, os recursos existentes nas minas de Itabira são da ordem 3,9 bilhões de toneladas. “São itabiritos mais compactos e mais pobres. Ainda não dispomos de tecnologia para beneficiar esse minério. Se a tecnologia avançar, e estamos sempre trabalhando para que isso ocorra, a vida útil de nossas minas, hoje de dez anos, pode ser ampliada, como já ocorreu no passado.”
Esses recursos, segundo o gerente da Vale, encontram-se dentro dos atuais limites das minas – e não englobam os minérios que estão sob a cidade, principalmente na Vila Paciência e no bairro Pará. “A exploração desses recursos (fora do “pit” da mina) está fora de cogitação, pelo seu alto custo social e ambiental”, descarta Rodrigo Chaves.
Horizontes de exaustão
“A previsibilidade (da exaustão) varia com o tempo, com as mudanças tecnológicas e com as necessidades do ser humano. As nossas decisões de hoje podem ser alteradas ao longo dos anos”, salienta o gerente-geral da Vale.
Foi o que ocorreu com a previsão apresentada com estardalhaço pela empresa em 2003, com a divulgação do resultado de novas pesquisas geológicas. Na ocasião, a projeção foi de que Itabira teria minério para mais de 60 anos. Se essa projeção fosse confirmada, restariam ainda mais 45 anos de mineração no município.
“Quando foram projetados 60 anos de mineração em Itabira, a Vale só dispunha de uma usina em Conceição. Hoje temos duas, que estão interligadas com a usina Cauê. Trabalhávamos com um cenário de produção muito menor de pellet-feed. Hoje estamos produzindo só pellet-feed numa escala maior. Não houve erro (de projeção) no passado. Os parâmetros eram diferentes”, afirma Rodrigo Chaves.
Sem os investimentos nas novas plantas de concentração, diz, o minério de Itabira deixaria de ser competitivo – e tornaria inviável a sua extração e beneficiamento. “A própria história da mineração no município comprova que o desenvolvimento de novas tecnologias tem permitido a continuidade de nossas operações em Itabira.”
O gerente da Vale se refere ao primeiro ciclo da hematita, iniciada em 1942. O segundo ciclo teve início na década de 1970 com as usinas Conceição e Cauê que passaram a processar o itabirito friável.
Atualmente, a mineração em Itabira desenvolve o terceiro ciclo tecnológico, com a concentração do itabirito compacto, que antes era considerado material estéril. “As usinas de Itabira são as mais avançadas tecnologicamente, inclusive em comparação com as outras usinas da Vale”, avalia o gerente da Vale.
A produção anual de pellet-feed no complexo de Itabira se mantém em torno de 45 Mt, sendo que a capacidade produtiva das três usinas é de 50 Mt.
Barragens
Outra possibilidade de prolongamento da vida útil da exploração mineral em Itabira está na futura viabilização do beneficiamento do rejeito de minério depositado nas barragens, com teor médio de 28% de ferro.
“Ainda não dispomos de tecnologia para beneficiar esse minério”, afirma Rodrigo Chaves, para quem a sua exploração futura depende do desenvolvimento de novas tecnologias e investimentos, caso se comprove a viabilidade econômica e ambiental.
Atualmente, a empresa já está extraindo o minério depositado na grota do Minervino (Pontal) e na barragem do Rio de Peixe. “Não são rejeitos, mas minérios já concentrados que seguem para essas barragens quando há queda de energia”, explica. “Mas isso (o reaproveitamento desses minérios) ainda não significa aumento de nossas reservas.”
Ouro
Rodrigo Chaves confirma que há possibilidade de a Vale extrair o que restou de ouro na grota do Minervino, que para lá foi carreado na década de 1980 com o rejeito da usina Cauê. É que, segundo ele, por ser o ouro um material mais pesado, o metal pode estar depositado a uma profundidade entre 40 a 50 metros. “Podemos ter uma faixa que seja rica em ouro. Se isso for confirmado, vamos explorá-lo.”
Na década de 1980, a Vale negava a existência desse ouro, até que garimpeiros o descobriram em meio ao rejeito depositado na grota do Minervino. Dizia-se que a ocorrência era insignificante, menos de 50 miligramas por tonelada, conforme declarou o ex-superintendente Mário Pierre ao jornal O Cometa.
A existência do garimpo inspirou Carlos Drummond de Andrade a escrever a crônica Chove ouro em Itabira, publicada no Jornal do Brasil, em 22 de outubro de 1983.
“Na verdade, o ouro de Itabira não baixou das nuvens; simplesmente vem incrustado no rejeito de ferro explorado por uma grande estatal, a Companhia Vale do Rio Doce. A empresa sabia do ouro e estudara a fundo a possibilidade de explorá-lo economicamente. Concluiu que não era rentável, e deixou-o rolar serra abaixo, depois de montar uma usina destinada a elevar o teor ferrífero do itabirito, última reserva de minério a substituir a hematita exaurida.”
Comissão será formada em agosto para indicar as alternativas econômicas
Não é a primeira vez que um prefeito de Itabira anuncia a criação de uma comissão para estudar as alternativas e os meios para diversificar a economia itabirana. Foi o que voltou a fazer o prefeito Ronaldo Magalhães, depois de ter-se encontrado no dia 11 deste mês, no Rio, com o diretor-executivo de Sustentabilidade e Relações Institucionais, Luiz Eduardo Osório, da Vale, para tratar da projeção da exaustão das minas itabiranas.
No início da década de 1980, a Acita lançou o projeto Itabira 2025 com esse mesmo propósito. Como parte desse esforço, a Prefeitura instituiu o Fundo de Desenvolvimento Econômico e Social (Fundesi), com o objetivo de fomentar o desenvolvimento de novas indústrias, com recursos subsidiados.
O resultado dessa política foi pífio. Passados todos esses anos, no distrito industrial, projetado para gerar mais de 10 mil empregos diretos, hoje emprega pouco mais de 2 mil trabalhadores. Além disso, parte significativa dos recursos emprestados não foi recuperada, causando prejuízos ao erário municipal que ainda persistem.
Já no fim do século passado, com a aprovação da Licença de Operação Corretiva (LOC) do Distrito Ferrífero de Itabira, novas comissões de estudo foram criadas para buscar as tais alternativas econômicas. Essa obrigação de participar do processo foi imposta à Vale em uma das condicionantes. Também não deu certo.
“Vamos montar um grupo de discussão para já em agosto começar a estruturar projetos e alternativas”, informa o prefeito Ronaldo Magalhães. “A Vale vai indicar os seus representantes e vamos dar início aos trabalhos com participação inicial da Prefeitura e da Câmara. Depois vamos abrir o leque, convidando outros atores da sociedade civil para que também participem dessa discussão.”
Como São Tomé, é ver para crer. Enquanto isso, Itabira segue a sua história de cidade mineradora até que chegue ao fim o horizonte temporal de exaustão mineral. E que sejam encontradas outras alternativas enquanto ainda há minério, e para que persistam enquanto as usinas de Itabira concentram os minérios vindos de outras localidades.
Mas, a mais valiosa crônica do poeta Drumonnd, ainda é Só isso?