Mestre Tobias é o homenageado, neste ano, pelo bloco Madalena não Gosta de Poema

José Caetano Belisário, o Tobias, 88 anos, garrucheiro nascido nos Gomes, povoado de Santa Maria de Itabira, é o homenageado neste ano pelo bloco pré-carnavalesco Madalena não Gosta de Poema.

O bloco, desde 2016, é uma das maiores expressões carnavalescas da cidade, depois que a cidade perdeu as suas escolas de samba que fizeram sucesso nas últimas décadas do século passado. A homenagem ao Tobias é merecidíssima. Afinal, foi ele quem popularizou o samba e criou um dos primeiros blocos carnavalescos da cidade.

Foi quando, no final dos anos 50, José Caetano Belisário trouxe de Nova Lima, onde trabalhava na mina de Morro Velho, o seu famoso banjo com o qual compôs memoráveis sambas e jingles para as campanhas eleitorais de seu compadre, o ex-prefeito Daniel Jardim de Grisolia (1959/63 e 1967/70).

Segundo Hebert Rosa, fundador e organizador do bloco Madalena não Gosta de Poema, juntamente com mais dez abnegados colaboradores carnavalescos, a homenagem é também necessária – um reconhecimento por tudo que José Caetano Belisário representa para a história do carnaval itabirano.

“Tobias é fonte de inspiração para o nosso bloco”, diz o carnavalesco. “Foi ele quem trouxe o samba para Itabira ao criar a primeira bateria (batuque), que depois virou escola de samba, a Gente Humilde de Itabira”, conta, justificando a homenagem, que irá ocorrer durante toda a programação do bloco no pré-carnaval itabirano (leia programação abaixo).

Samba na alma e nos pés

Nilo Almeida, homenageado em 2018, com Raimundinho, “Claudinha” e “Rebeca”, amigas de Madalena (Fotos: Carlos Cruz)

“Eu nasci sambista”, diz Tobias à reportagem deste site, emocionado ao ser informado que será homenageado pelo bloco pré-carnavalesco.

“Eu que já sou dengoso, fico mais bonitinho ainda. Querem acabar comigo. É chato ser gostoso”, diz o velho e simpático sambista, feliz por ter o seu nome lembrado e a sua história resgatada pelo bloco Madalena Não Gosta de Poema.

Tobias é o quarto homenageado pelo bloco, que nasceu em 2014. Mas as homenagens só tiveram início em 2017. O primeiro homenageado foi o dentista Renatinho Guerra, ex-vocalista e compositor da banda Sobrinhos do Padre.

No ano seguinte foi a vez do bloco homenagear Nilo Almeida, do famoso boteco da pracinha do Pará. No ano passado, a homenageada foi a moradora do bairro Pará Naná Jabour. Todos os anos ela acompanha o bloco em seus cortejos pelas ruas da cidade, com a suas marchinhas e frevo, resgatando parte da tradição dos antigos carnavais. Leia mais aquiaqui e também aqui 

Latas, apito e banjo

Tobias com o seu velho banjo canta uma de suas composições

Com o velho banjo, que ele conserva ainda hoje, Tobias comandou a sua famosa charanga no início da década de 1960, reunindo a meninada do Capim Cheiroso, no bairro Pará, “todos com os pés no chão”.

“Era tudo batido nas latas de querosene, de banha, o que tivesse disponível e de todos os tamanhos”, conta Tobias em entrevista a este site. “Os únicos instrumentos ‘de verdade’ eram o banjo e o apito que eu usava para fazer a marcação.”

Com a charanga do Tobias foi inaugurado o carnaval de rua na cidade – e ele só parou de batucar pelas ruas depois do suicídio de Daniel Grisolia, em 1970.

Anos mais tarde, já na década de 1980, a charanga virou a escola de samba Gente Humilde de Itabira. “Durou pouco”, conta. “Não teve apoio da Prefeitura e nem de empresários”, lamenta.

Como sambista, Tobias conta que a sua maior inspiração musical foi o “príncipe do samba” Roberto Silva (1920/2012). Ouça aqui: https://www.ouvirmusica.com.br/roberto-silva/. “Foi ouvindo Roberto Silva pelo radinho que aperfeiçoei o jeito de compor e cantar samba”, revela.

Linguagem de macaco

No tempo em que Tobias garimpava minério de ferro na mina Cauê, segundo ele, foi que surgiu a célebre Linguagem de Macaco. Pode-se dizer que ele é um dos autores desse criativo “dialeto itabirano”, que ainda se expressa correntemente no camaquês. “Foi um modo de falar inventado para os ingleses não entenderem o que a gente dizia.”

Foi fazendo uso dessa “linguagem” que Tobias compôs o samba Que gostoso, uma espécie de autobiografia dos tempos que reunia os meninos do Capim Cheiroso. Ele canta para a reportagem tocando o velho banjo:

“Ah, equ tosgoso, ah equ tosgoso. (Ah, que gostoso, ah, que gostoso)./E on lhevo pemto do Paquim Reichoso. (E no velho tempo do Capim Cheiroso)./E a ita Lecicia zafia o lobo, ás Mencletina zafia o facé. (e a tia Cecília fazia o bolo, e sá Clementina fazia o café)./Uem aip Ez ad Vilsa xupava o lofe na saquinha de pasé. (Meu pai Zé da Silva puxava o fole na casinha de sapé)./Ah que tosgoso, ah que tosgoso. (Ah que gostoso, ah que gostoso)./On lhevo pemto no Pacim Reichoso. (No velho tempo do Capim Cheiroso).”

Ue era quepeno, sam era guendoso. (Eu era pequeno, mas era dengoso)./Omc as romeninhas do Paquim Reichoso. (Com as moreninhas do Capim Cheiroso)./Ramia ad Zul e Ramia Sojé, tancavam nobito e bamsavam no ep. (Maria da Luz e Maria José, cantavam bonito e sambavam no pé)./Ah que tosgoso, ah que tosgoso. (Ah que gostoso, ah que gostoso)./Guechava os mondingos eu vada um teijinho, lococava a dorca on eum vacanhinqo. (Chegava os domingos eu dava um jeitinho, colocava a corda no meu cavaquinho). Ah, equ tosgoso, ah equ tosgoso. (Ah, que gostoso, ah, que gostoso).

Alegria e tristeza

Tobias com a prole e vizinhos, após conceder entrevista ao jornal O Cometa, em fevereiro de 1981. À sua direita, a sua mulher Júlia Vieira. E à sua esquerda, sá Amélia, sua mãe. (Foto: Humberto Martins)

No início da década de 1980, Tobias voltou a desfilar na avenida com a escola de samba Gente Humilde de Itabira. Mas essa fase durou pouco tempo, apenas dois anos. No terceiro ano, no seu auge, a escola sucumbiu mais uma vez por falta de recursos.

Para tristeza geral, o último samba-enredo composto por Tobias não chegou a ser apresentado na avenida para o grande público. A composição chama-se Ouro e Esmeralda e é ufanista ao descrever as riquezas minerais de Itabira e da região:

“Como é que pode ser, parte do João Mineiro/, pois eu canto e encanto para Itabira e o Brasil inteiro./O que ele tem que a gente não tem./É falta de união para mostrar para o mundo o que temos também/O quê?/O minério de ferro é a nossa garantia, o ouro e a esmeralda são a nossa economia./Sem falar na ametista, que rola pelo chão, roxeada e linda, símbolo da paixão./Você sabe que a água marinha é extraída em Santa Maria./Perto dali tem a alexandrita, a pedra encanto de nosso Brasil./Como é que pode ser, parte do João Mineiro, pois eu canto e encanto para Itabira e o Brasil inteiro.”

Mas mesmo com o fim de sua escola Tobias Belisário não deixou de compor os seus sambinhas. “A música é herança que herdei do meu pai José da Silva, bom sanfoneiro. E a alegria vem da minha mãe, a Sá Amélia”, ele homenageia, com orgulho de ser o que é: um sambista itabirano.

Essa mesma herança musical Tobias compartilha com os filhos Nonoca (multi-instrumentista e cantor), Osny (percussionista) e João Tobias (violão e voz). E assim, ao lado dos filhos, filhas e netos, Tobias segue nessa vida com alegria, sem perder o samba no pé.

“Eu nasci compositor”, repete. E levanta-se, dando por encerrada a entrevista. “Chega, tá bom, né? Já falei mais do que devia.” E lá se foi o sambista com o banjo e as suas lembranças de volta ao quintal de sua casa. “É aqui que eu tenho sossego, com as minhas ervas medicinais e frutas.” Leia entrevista completa aqui e aqui.

Irreverência e alegria no bloco que já é tradição em Itabira

A chegada triunfal de Madalena, em cortejo em dezembro de 2017, saindo da praça do Centenário em direção ao bar de Raimundim, no bairro Pará

Há cinco anos surge em Itabira o bloco pré-carnavalesco Madalena Não Gosta de Poema, uma alegoria que brinca com o fato de em Itabira ter nascido um dos maiores poetas da língua portuguesa, mas que muitos na cidade, por ignorância ou má fé, ainda não compreenderam a obra de Carlos Drummond de Andrade.

Como é tradição, o bloco se desfaz quando chega o tríduo momesco, com os seus componentes dispersando por outras praças carnavalescas. O bloco é uma das maiores expressões do que resta do carnaval itabirano. “Procuramos resgatar as marchinhas e frevos dos antigos carnavais”, conta Hebert Rosa.

Banho de piscina no cortejo, em frente ao boteco do Helton, no barro Pará

Desde então, o bloco anima o pré-carnaval itabirano com muita alegria e descontração, a cada ano angariando um maior número de seguidores dos cortejos e bailes que promove.

O primeiro cortejo aconteceu em 2016, abrindo o carnaval itabirano. Desde então, virou tradição na cidade.

Em 2018 o bloco viveu o seu auge com a chegada da boneca gigante da Madalena. Ela veio de Olinda, Pernambuco, para fixar residência na terra do minério de ferro. Desde então, todos os anos tem a missão de “distribuir amor e felicidade”.

Para a sua aquisição, encomendada ao artista plástico Gustavo Alex, foi feita uma “vaquinha virtual”. Madalena mede quatro metros e do alto, com a sua visão privilegiada, contempla sorridente a farra dos foliões. Para este ano, ela espera rever velhos amigos e fazer novas amizades.

Agende-se para a programação do bloco neste pré-carnaval 2020

Dia 18 de janeiro – sábado

Prévia carnavalesca: Baile Roxo e Amarelo – Bloco Madalena de Itabira

Local: Barril Beer

Horário: 20h

Orquestra Mistura e Manda, com Marquinhos Maestro, Ronotil, Nonoca e Romário Araújo.

*Ingressos na Contém 1 g, Carolina Modas, Estante Papelaria e Estúdio Fitiness Academia: R$ 20 antecipado.

Dia 01 de fevereiro- Sábado

Prévia Carnavalesca infantil Madaleninha não Gosta de Poeminha

Local: Rua Irmãos De Caux (Em frente ao ginásio poliesportivo)

Orquestra Mistura e Manda

Apoio: Prefeitura de Itabira (Secretaria Municipal de Esporte Lazer e Juventude)

Dia 08 de fevereiro – Sábado

Cortejo do bloco Madalena não Gosta de Poema

Local: Praça do Centenário (Concentração)

Orquestra Mistura e Manda

Concentração a partir das 12 horas, com saída do bloco às 16h, com término do cortejo às 20h no paredão da rua Tiradentes.

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