Medidas para diminuir a poeira em Itabira são insuficientes para cumprir a norma municipal mais restritiva, admite a própria Vale
Serra do Esmeril com áreas descobertas gerando poeira mesmo em dia de vento fraco, em foto clicada nesta segunda-feira (18), o que comprova que as medidas já implementadas são insuficientes
Fotos e texto: Carlos Cruz
Na reunião do Codema, na sexta-feira (15), técnicos da Vale apresentaram as novas e velhas medidas para diminuir a poeira da cidade de Itabira, mas sem informar os valores investidos, mesmo tendo sido reiteradamente cobrados pelo órgão ambiental municipal.
Isso para que sejam comparados aos R$ 4,6 bilhões que a mesma empresa está investindo no porto de Tubarão (ES) para conter o pó preto de minério que polui o ar nas cidades vizinhas.
Como a empresa insiste na revogação da Deliberação Normativa (DN) número 2, aprovada por unanimidade pelos conselheiros do Codema, em 12 de agosto do ano passado, mais restritiva em relação à resolução Conama 491, de 19 de novembro de 2018, isso serve como confissão de que, mesmo tendo sido ampliadas as medidas de controle, elas são insuficientes para manter a poeira em níveis admissíveis para se manter a qualidade do ar em Itabira.
Medidas mitigadoras
Embora apresentadas como novidades, muitas das medidas para o controle da poeira nas minas já foram implementadas no passado, abandonadas pela negligência da empresa e falta de cobrança da sociedade itabirana.
Essa cobrança só mais recentemente voltou a ocorrer pela imprensa local, enquanto na Câmara Municipal a omissão dos vereadores permanece como política de esquecimento, omissão e prevaricação.
De acordo com o que foi apresentado pelo conselheiro da Vale, o analista de meio ambiente Denis Duarte, as medidas incluem a ampliação da aplicação de polímeros (material à base de cal e cimento) em áreas descobertas que ainda podem ser mineradas, saltando de 155 hectares para 800 hectares.
O incremento teria ocorrido também com o aumento das áreas internas revegetadas, que teriam saltado de 45 hectares em 2020 para 200 hectares neste ano. Novidade seria a implantação de hidromulch, um componente utilizado na técnica de hidrossemeadura, uma mistura de água e sementes de diversas espécies (gramíneas, leguminosas), com adubos orgânicos, além de fibra de madeira e polímeros adesivos.
O número de caminhões-tanques de pequeno porte, que fazem a umectação das vias de acesso às minas, foi ampliado: de dez, saltou para 21.
A aspersão fixa também teria saltado de 13 quilômetros para 20 quilômetros, cobrindo entre as minas Cauê e Conceição. Entretanto, diferentemente do que se observava no passado, esse sistema fixo não é visto da cidade.
Deve ter sido encoberto pelo cinturão verde que a Vale diz ter implantado em Itabira também em cumprimento da LOC, mesmo estando raquítico em toda a sua extensão com a condicionane considerada parcialmente cumprida pelo órgão ambiental estadual, assim como a implantação de cortina verde ao longo da ferrovia.
Canhão aspersor
Um canhão aspersor foi apresentado como “novidade” capaz de segurar parte da poeira nas minas.
“Projeta uma névoa de água e as gotículas pequenas se espalham formando uma nuvem nas pilhas de minério, capaz de captar as partículas em suspensão, retornando com elas para o solo sem atingir a cidade”, explicou o conselheiro da Vale na reunião do Codema.
Mais uma vez a Vale apresenta como novidade medida de controle já adotada no passado, conforme se lê na edição de julho/agosto de 2014, no informativo da empresa Vale Notícias:
“Para diminuir a poeira, a Vale instalou mais cinco turbinas tipo canhão nas Minas do Meio e Periquito, que se somam as outras duas instaladas no ano passado (…). Como grandes ventiladores, as turbinas dão vazão ao ar, conduzindo partículas de água a uma distância de 150 metros. Cada turbina cobre uma área de até 25 mil metros quadrados.”
E mais: “Um sistema fixo de aspersão mantém umedecidos os taludes e as estradas, numa extensão de 14 quilômetros entre as minas Cauê e Conceição. Nebulizadores também impedem a geração de poeira nas pilhas de minério na usina Cauê”, é o que está registrado na mesma edição do jornal Vale Notícias.
Retaludamento
Outra medida adotada recentemente, embora esteja atrasada em pelo menos 30 anos, trata-se da reconformação de taludes na Serra do Esmeril, que sofrem com erosões pela falta de vegetação, gerando também poeira.
A medida era para ser executada desde 1993, quando a Vale firmou um termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), obrigando-se a dar início à reabilitação paisagística da Serra do Esmeril.
Como tantas outras obrigações de fazer não executadas no município, a Vale não cumpriu essa condicionante para pôr fim à ação civil relativa à degradação paisagística da Serra do Esmeril.
Segundo informou Denis Duarte, no período chuvoso, os taludes já reconformados serão revegetados para impedir o arraste eólico, deixando de levar poeira até a cidade, além de impedir novos processos erosivos. É preciso dar continuidade à essa reconformação, para que enfim se cumpra o que está definido no acordo com o MPMG em 1993.
Outra novidade apresentada ao Codema é um sistema de quebra-vento, por meio de cortinas de sombrite nas pilhas de estéril em operação, não tão extensas como as malhas de wind fences instaldas pela Vale nos pátios de estocagem e movimentação de material no porto de Tubarão.
“Esse sistema de quebra-vento é móvel e tem apresentado bons resultados”, assegurou o conselheiro da Vale na reunião do órgão ambiental municipal.
Sem novidades
Portanto, muitas das medidas mitigadoras da poeira apresentadas pela Vale na reunião do Codema pouco têm de novidades. São ações de controle que foram adotadas no passado e que, por negligência e falta de cobrança, foram abandonadas.
Mas se a Vale pretende mesmo mitigar a poeira na cidade, e de quebra reduzir o seu passivo ambiental, além dee contribuir para descarbonizar o seu processo produtivo no complexo minerador de Itabira, uma boa medida é começar a implantar desde já o seu Plano Regional de Fechamento Integrado das Minas de Itabira (PRFIMI), de 2013, que a Tüv Süd Bureau de Projetos e Consultoria elaborou para a mineradora.
Consta da proposta a instalação do Ecoparque Cauê, cujo “driver indutor” deve ser a produção de insumos terapêuticos para hospitais e indústria farmacêutica, com cultivo de plantas medicinais nas pilhas de estéril dispostas nas cavas exauridas – e também no platô da pilha Convap.
O documento foi apresentado ao antigo Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), e possivelmente também ao mercado, exceto para Itabira, somente se tornando público após ser revelado e publicado neste portal de notícias.
Além de propor cobrir as áreas mineradas exauridas com plantas medicinais destinadas a suprir a indústria farmacêutica, a implantação desse plano, desde já, sem que se espere pela exaustão final e a “derrota incomparável”, será também medida de grande relevância para diminuir a poeira.
Adicionalmente, ou até mesmo como objetivo principal, servirá como fator indutor da diversificação econômica, tornando o município polo macrorregional em saúde, com a diversificação e o fortalecimento do setor de atendimento médico-hospitalar-farmacêutico.
É o que está no PRFIMI: “Procurou-se privilegiar, nesse ecoparque industrial, ênfase em áreas das ciências médicas que apresentem um alto potencial de retorno monetário, favorecendo, portanto, a reanimação da economia da cidade de Itabira após o encerramento das atividades de mineração”, frisa o documento, compartilhado aos seus leitores pela Vila de Utopia.
Acesse a reportagem aqui:
E o plano completo para o fechamento das minas de Itabira, e que deve ser implementado desde já em várias áreas, aqui:
Novo hospital
No plano está incluído, ainda, a construção de um novo hospital em Itabira, necessidade atual do município até mesmo pela grande ocupação de leitos por trabalhadores e familiares da Vale e de suas empreiteiras, ao utilizarem a assistência médica supletiva e planos de saúde (Pasa, Unimed).
Isso pelo fato de o hospital municipal Carlos Chagas atender somente pacientes do SUS e, pelo fato de no Nossa Senhora das Dores dispor de apenas 40% dos leitos ao atendimento de pacientes particulares e convênios.
A construção do novo hospital é importante ainda até mesmo para viabilizar a aprovação do curso de Medicina da Unifei, cujo pedido de instalação foi apresentado ao Ministério da Educação em 2014, conforme confirma à reportagem o professor Paulo Sizuo Waki, chefe de Gabinete da universidade federal em Itabira.
“A instalação do curso de Medicina no campus de Itabira foi aprovada pelo nosso conselho universitário. Após isso, entramos com o projeto pedagógico e com o pedido de instalação no Ministério da Educação, o que fiz pessoalmente, acompanhado pelo deputado Reginaldo Lopes. Mas vieram os governos de Temer e Bolsonaro e o projeto não andou”, recorda Waki, que agora vê novamente a possibilidade real de o projeto ser aprovado.
O investimento da Vale no projeto universitário de Itabira, assim como na execução do plano de fechamento das minas, com o cultivo de plantas medicinais das áreas dos diques de rejeitos desativados nas barragens Pontal e Rio de Peixe, são parte do resgate da dívida histórica da mineração com Itabira.
Portanto, cabe à Vale resgatar essa dívida com a implementação desde já do que for possível do PRFIMI, para que não se torne, no futuro já não tão distante, no Plano de Reafirmação do Fim de Itabira.
Saiba mais sobre o investimento da Vale no porto de Tubarão para o controle da poeira aqui:
Para saber mais sobre a legislação e as mudanças necessárias para tornar os índices mais restritivos, leia também aqui:
E também aqui:
As soluções existem. Cabe aos poderes políticos e sociedade civil organizada cobrarem da empresa que cumpra os acordos. E que a imprensa continue divulgando o andamento das soluções. Sou otimista, apesar de. E gosto daqui.
Cadê aquelas torres que jogavam água que o Zé cleves projetou ? Não resolvia mas amenizava .