Laços de sangue e crimes em Itabira do Matto Dentro – O Cauê como castigo

Foto: acervo IBGE/1952/
ViladeUtopia
Pesquisa:
Cristina Silveira, Rio

1918 O advogado Altivo Drummond de Andrade

Itabira de Matto Dentro – Encerram-se os trabalhos da segunda sessão do júri do corrente ano. Foram julgados os seguintes réus: João Pedro Gomes da Silva (crime de homicídio), João Simão de Araújo (tentativa de morte), José Maria de Arruda (homicídio) e José Fernandes (tentativa de morte), todos defendidos pelo dr. Randolpho Castilho e absolvidos.

Os trabalhos terminaram com o julgamento e absolvição de Dulcina Maria de Nossa Senhora, defendida pelo talentoso acadêmico Altivo Drummond de Andrade, que brilhantemente estreou na tribuna judiciária.

No último dia de sessão, o sr. dr. Olyntho Andrade, em substancioso discurso, agradeceu aos jurados, promotor, advogados, escrivão e oficiais de justiça a maneira porque se houveram durante os trabalhos que encerrava.

Por delegação de seus companheiros de foro e do corpo de júri, o sr. dr. Randolpho Castilho falou, agradecendo e saudando ao juiz pela inteligente direção dos trabalhos, o que tanto concorreu para a ordem e proveito dos mesmos.

Consta que o povo itabirano, em petição já assinada por duas mil pessoas, vai solicitar do sr. núncio apostólico as honras de monsenhor para o querido, virtuoso, inteligente pároco padre Olympio Augusto Hemetério.

Faleceu nesta cidade a virtuosa esposado sr. Salatiel de Andrade Lage, digno avaliador judicial da comarca.

[O Pharol (OP), 30/6/1918. BN-Rio]

Arte na Lapa, Rio, 2022 (Foto: Cristina Silveira)

1920 A Volta de Bulldog Drummond

“Concebido em 1920 pelo escritor Herman Cyril McNeile, que usava o pseudônimo de Sapper, Hugh Bulldog Drummond era um ex-capitão do exército britânico à procura de aventuras. Suas peripécias foram contadas em dezenas de histórias no teatro e no cinema.”

[Diário Nacional (SP), 1920. BN-Rio]

1924 O Cauê como castigo

O pico do Cauê, em 1952 (Foto: acervo IBGE/ViladeUtopia)

Que castigo merece o Sr. Epitácio?

Perante o tribunal da opinião pública!

Uma consulta oportuna.

Incansáveis. Muito bem! Os nossos leitores, que procuram dar o melhor castigo ao Sr. Epitácio Pessoa. Realmente, o ex-presidente do governo passado devia de ser o mais bem castigado possível.

São as culpas que lhe cabem na situação em que deixou o país, até hoje sem saber, pelo menos, como se fez o negócio da letra de quatro milhões.

E a prova melhor de que são incansáveis aqueles que desejam castigar o Sr. Epitácio é que os castigos que pretendem não faltam, e eles nos são lembrados, a toda a hora. Senão vejamos os que, aqui, se seguiu:

– Arrastar uma locomotiva da Rede Sul Mineira, de Cruzeiro até Três Corações.

– Morar em Belo Horizonte, com a obrigação de viajar nos respectivos bondes.

– Capinar o Jardim Municipal de Pitanguy.

– Oferecer quatro milhões para que o Brasil concorra as olimpíadas de Paris.

– Subir descalço, quatro vezes ao dia o Pico do Cauè, em Itabira de Matto Dentro, e dizer lá de cima para o povo da cidade qual foi o fim dos quatro milhões.

– Trabalhar na Ilha das Cobras, separando rebites numa chapa quente, sol a pino e ganhando 5$500 por dia.

– Ser amarrado à cauda de um cometa.

– Ser viajante de casas comerciais pouco conhecidas, e, depois de feita a freguesia, levar o fora dos gananciosos patrões.

[A Noite (RJ), 10/3/1924. BN-Rio]

Pintura na Lapa, Rio, 2022 (Foto: Cristina Silveira)

1928 Um homem é para morrer ou matar

Criminoso aos 16 anos!…

Foi castigado por um homem a quem ofendera e, reagindo, deu-lhe uma canivetada ferindo-o gravemente.

Impressionante cena de sangue verificou-se ontem, à noite, na rua Mal. Hermes da Fonseca, próximo ao quartel de Sant’Anna.

Informada a polícia dessa ocorrência, seguiu para o local o dr. Achilles Guimarães, delegado de plantão na Central, acompanhado de socorros médicos e do dr. Carlos Gonzaga, médico legista.

No quartel do 4⁰. Batalhão de caçadores encontrou aquela autoridade o ferido, que tinha ido até lá em busca de socorros.

É ele o garçom Joaquim José Rodrigues, de 31 anos idade, casado, brasileiro, residente à rua Marechal Hermes da Fonseca número 9-A.

O agressor, um menor de 16 anos apenas, tinha-se evadido após o crime, sendo preso, meia hora depois, na rua Voluntários da Pátria, por dois soldados do exército.

Conduzido no carro do delegado para a Central de Polícia, ali foi interrogado pelo dr. Achilles Guimarães.

Outras testemunhas também foram ouvidas, entre elas Etelvina Moreira Luiza Gonzaga, amasia de Joaquim José Rodrigues.

Os depoimentos – Pelo que declararam as testemunhas e o menor, ficou apurado o seguinte:

Esse menor se ocupa em vender jornais nesta capital e mora na casa de Etelvina, amazia de Joaquim José Rodrigues, à qual paga, todas as noites, 1$ pela semana.

Ficou, apesar disso, a dever-lhe dez tostões. Ontem, às 23 horas, mais ou menos, foi interpelado pelo garçom Joaquim sobre o pagamento e depois posto na rua por ele, que lhe disse para procurar outro cômodo.

O menor, sabedor de que Joaquim José Rodrigues também não havia pago o cômodo que ocupava em casa de Etelvina, lançou lhe isso no rosto, e, saindo para o quintal, se pôs a provoca-lo:

– Caolho! Vagabundo! E outras coisas desse jaez.

José Joaquim, indignado com a insolência do menor, deu-lhe uma bofetada. O menino, sacando então de um canivete, deu-lhe um golpe, atingindo-o no abdômen.

José Joaquim, gravemente ferido, foi até o quartel de Sant’Anna e pediu socorros, sendo o fato comunicado à polícia.

O ferido foi examinado pelo dr. Carlos Gonzaga, médico-legista, que constatou um ferimento perfuro inciso no abdômen, penetrante da respectiva cavidade, com hernia dos intestinos.

Depois de receber os curativos de urgência no posto médico da Assistência, José Joaquim foi internado na Santa Casa, em estado grave.

Uma vida dolorosa – O menor, interrogado pela autoridade, revelando tristíssima precocidade, calmamente narrou a sua vida.

Não conhece o seu pai e sua mãe é viva e reside em Itabira do Mato Dentro, no estado de Minas Gerais, de onde veio ele, arrolado numa turma de trabalhadores rurais, que procuravam melhores salários nas fazendas deste estado.

Esteve trabalhando em fazendas do interior e, aborrecido, veio para esta capital, onde trabalhava como vendedor de jornais vespertinos, fazendo carretos, de manhã, nas feiras livres.

Conseguia, assim, ganhar de 6$ a 7$ por dia. Na última feira da avenida Tiradentes, comprou, para revender, uma cesta de figos e alguns canivetes baratos.

Vendeu os figos e os canivetes, e, mais tarde, comprou um para seu uso. Foi com essa arma que cometeu o crime.

Morava em casa de Etelvina Moreira Luiza Gonzaga, a quem pagava 1$ pelo pouso e comia em restaurantes baratos ou sanduiches e frutas que comprava ao acaso. O que ganhava na venda de jornais e carretos empregava em despesas pessoais e, para comprar roupas e calçados.

Interrogado pelo dr. Achilles Guimarães se ontem havia bebido alguma coisa, o que o incitara ao crime, declarou que não. Havia bebido apenas um tostão de pinga…

O crime – Ontem entrou na casa de Etelvina, a quem devia 1$, e foi interpelado por José Joaquim, homem com quem jamais trocou palavra, por ser muito implicante.

Este o despediu de casa, dizendo-lhe que fosse procurar outro cômodo e então ele o insultou.

Estava no quintal, quando José Joaquim investiu contra ele e, segundo declaração textual, “ele me lavou uma lavada na cara”, isto é, deu-lhe uma bofetada.

Perdeu o juízo e, tirando do canivete, “cutucou-o”, pensando em não o matar, tanto assim que, depois, experimentou em si próprio a ponta do canivete, constatando que a mesma estava quebrada. Diz que feriu-se levemente nessa experiência.

Não sabe também se deu a canivetada com força, o que bem podia acontecer na exaltação do momento.

– Um homem é para morrer ou matar. Assim como ele podia me matar, eu também podia matar ele… – declarou ainda ao dr. Achilles o menor.

Trata-se evidentemente de um tarado. É um menor de 16 anos de idade, ligeiramente bronzeado, cabelos negros e anelados, esbelto, tipo de mestiço.

O que não terá esse infeliz passado desde que abandonou, tangido pela ambição, a sua aldeia de Itabira do Mato Dentro? Más companhias, pingas e a miséria a espiar-lhe os passos… As suas declarações foram tomadas por termo e sobre o fato há inquérito.

[Diário Nacional (SP), 8/2/1928. BN-Rio]

 

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