“Itabira está nos trilhos e pede respeito” é palavra de ordem do movimento que cobra compensações pela antecipação de concessão da EFVM

Carlos Cruz

O vereador e sindicalista André Viana lidera uma caravana de itabiranos que irá se deslocar, nesta quinta-feira (18), até Governador Valadares para participar de mais uma audiência pública que discute as medidas compensatórias pela antecipação em dez anos da concessão da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), controlada desde 1942 pela empresa Vale.

A nova concessão da ferrovia pelo governo federal, via Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), será por um prazo de 30 anos. “Não somos contra a antecipação da concessão, mas acho que não pode ser feita no afogadilho, por um governo que não tem legitimidade”, defende o vereador.

Viana informa que irá encaminhar um abaixo-assinado, com mais de 6 mil assinaturas, cobrando a realização de uma audiência pública em Itabira – e em todos os municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo por onde passa a estrada de ferro.

André Viana lidera movimento pelas compensações de impactos da ferrovia

“O prazo para concluir as audiências foi prorrogado por mais 30 dias e é a nossa primeira vitória”, comemora o vereador, salientando que já existem recursos em tribunais superiores pedindo que a concessão seja adiada até que o próximo governo tome posse.

De acordo com o vereador sindicalista, o processo de antecipação da ferrovia vem sendo formatado há quatro anos pela ANTT, que quer aprovar a nova concessão com menos de 40 dias de discussão com os municípios impactados pela ferrovia.

“Estamos estudando um decreto legislativo, por meio de nossos representantes no Congresso Nacional, para que seja suspensa a concessão antecipada por esse governo.”

Para André Viana, é um desrespeito a ANTT não ouvir Itabira. “É um tapa na cara de Itabira. E a mão de quem segura o tapa é da Vale”, disparou na reunião na Câmara, nessa terça-feira (16).

Segundo ele, Itabira é o município que fomentou a ferrovia com o transporte de minério – e que tem o maior índice de acidentes na estrada de ferro. De fato, relatório da ANTT relaciona o município como a localidade com maior número de acidentes com o trem, proporcionalmente ao número de linhas férreas. Governador Valadares tem mais registros, mas por lá o tráfego de trens é mais intenso.

Processo

Viana contou também na reunião da Câmara que a sua movimentação em defesa dos direitos de Itabira, dos empregados e dos aposentados da Vale já está incomodando “essa grande corporação”. “A Vale entrou contra mim com um Interdito Proibitório, que estipula multa de R$ 50 mil reais por dia, caso eu provoque algum prejuízo na linha férrea”, revelou o vereador na sessão legislativa.

A ação preventiva da mineradora foi uma consequência de o vereador ter dito, em audiência para discutir o plano de saúde dos empregados e aposentados da Vale, que se as reivindicações não forem atendidas, seria o caso de interditar a ferrovia, impedindo a passagem dos trens com minério.

Essa ameaça já foi feita no passado pelo ex-prefeito Luiz Menezes (1989/92). Da mesma forma, Menezes cobrava os direitos de Itabira que não eram atendidos pela mineradora.

Reivindicações incluem porto-seco e repactuação do projeto da Unifei        

Além das três medidas compensatórias já relacionadas pela Vale, o movimento liderado pelo vereador reivindica a instalação de um porto seco e a repactuação da parceria público-privada estabelecida entre Vale, Prefeitura e governo federal para instalar o campus local da Unifei.

Campus na Unifei está incompleto e vereadores querem repactuar parceria público-privada com a Vale (Fotos: Eduardo Cruz)

“Queremos também recursos para a conclusão do trecho da BR-381 até Belo Horizonte”, inclui o vereador entre as reivindicações.

“Se essas reivindicações forem atendidas, serão dois grandes ganhos que colocam Itabira na rota logística do transporte terrestre, ligando o nosso futuro porto seco à capital mineira e ao porto de Tubarão.”

André Viana relaciona ainda, entre as condicionantes, o investimento nos pontos turísticos do município, inclusive na zona rural. “São medidas para salvar a economia de Itabira sem a mineração”, justifica.

Neidson Freitas também quer repactuar parceria para o campus da Unifei

Com relação à repactuação da parceria público-privada para a implantação do campus da Unifei, Viana é o segundo vereador a reivindicar uma maior participação da Vale.

Em outubro do ano passado, o vereador Neidson Freitas (PP) propôs também a repactuação para viabilizar o que será, em sua opinião, o principal pilar para o desenvolvimento de novas alternativas econômicas para o município. O projeto inclui, inclusive, a implantação de um parque tecnológico, o que, após dez anos da inauguração do campus local, ainda não saiu do papel.

De acordo com Neidson, a Prefeitura não tem como arcar sozinha com os investimentos para concluir o projeto. Pela parceria, o município já investiu R$ 63 milhões na construção de dois prédios – e teria de arcar com mais cerca de R$ 400 milhões até concluir as edificações necessárias para implantar o que está previsto no projeto universitário (leia mais aqui).

“A Vale tem condição e obrigação de rever a sua participação na conclusão do campus da Unifei. Sem isso, além de deixar buracos após o fim da mineração, deixará aqui mais um sonho irrealizável”, cobrou o presidente da Câmara na ocasião.

Neidson participa da comissão nomeada pelo prefeito Ronaldo Magalhães (PTB) para negociar com a Vale o descomissionamento (fechamento) das minas de Itabira, previsto para ocorrer após 2028.

Por meio de sua assessoria de imprensa, a Vale informa que já investiu R$ 38,5 milhões na aquisição de equipamentos e na implantação de laboratórios para o campus da Unifei em Itabira. Com isso, diz, já cumpriu integralmente o acordo celebrado.

Mitigação de impactos prevê mudança em pequeno trecho da ferrovia

Transporte de passageiros é obrigação legal da concessão

No documento apresentado pela Vale, Itabira figura na sétima posição entres os municípios prioritários impactados pela EFVM. Já pelo ranking da ANTT, está em quarta colocação, mas deve prevalecer a posição apresentada pela mineradora (leia também aqui).

O ranking será utilizado para priorizar os investimentos que irão solucionar ou pelo menos minimizar os conflitos urbanos nos municípios impactados pela ferrovia.

De acordo com o secretário municipal de Obras, Ronaldo Lott, de um total de R$ 9 bilhões que a Vale pretende alocar na melhoria e expansão de suas malhas ferroviárias em todo o país, apenas R$ 370 milhões serão investidos na compensação de conflitos urbanos.

“Concordamos com algumas propostas apresentadas pela Vale, mas temos divergências em outras”, disse o secretário em entrevista a este site, após ter participado de uma audiência em Belo Horizonte, na Assembleia Legislativa.

Entre as medidas que a administração municipal concorda está a relocação do ramal ferroviário que sai da estação João Paulo, próximo do estádio do Valério, e que segue até um trecho que fica no final da avenida Mauro Ribeiro.

Parte desse trecho pode também ser transferido para onde está a estrada 105, que mudaria para o atual leito da ferrovia, seguindo pela mina Periquito até encontrar o ramal que vem da mina Conceição. “Com a modificação, serão eliminadas três passagens de nível (Vila Paciência, Vila Amélia e Alto Pereira)”, adianta o secretário municipal.

Divergência

A divergência da Prefeitura com a mineradora se encontra na localização de uma passagem inferior (viaduto), a ser construída sob a linha férrea. Segundo Lott, a Vale quer construir essa passagem próxima do campo do Bazuca, o que ele discorda.

Trecho da ferrovia na região da 105 que será modificado

“Queremos que seja construída para ligar os bairros São Cristóvão e Juca Rosa, o que viabilizará o término da avenida Espigão (projetada no passado pelo arquiteto urbanista Radamés Teixeira).”

Já a mineradora quer construir essa passagem inferior em uma outra localidade, atrás do Bazuca. “A localização apresentada pela Vale está em desacordo com o Plano Diretor e com o Plano de Mobilidade Urbana da cidade”, se opõe o secretário de Obras. “Esperamos que seja respeitado o planejamento municipal e não o que é de interesse da empresa.”

Outra medida relacionada pela Vale é a construção de um muro por toda a extensão da ferrovia que passa pelo perímetro urbano – uma medida compensatória que foi incluída, na forma de cercamento, em uma das condicionantes da Licença de Operação Corretiva (LOC), aprovada em 18 de maio de 2000 pela Câmara de Mineração, do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). Essa condicionante só foi parcialmente cumprida, até por enfrentar oposição de moradores de algumas localidades.

Posicionamento da Vale

Em nota à redação deste site, a Vale disse que participa do debate pela renovação antecipada das concessões ferroviárias, o que inclui a Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM).

Para isso, a empresa apresentou um pacote de investimentos para mitigação de conflitos urbanos – e que está sob análise da ANTT. “Dentre os investimentos, a empresa propôs a implantação de variante para uma parte do ramal ferroviário de João Paulo, localizado em Itabira.”

Ainda segundo a empresa, a ANTT já realizou uma primeira análise de toda a proposta de renovação. E está submetendo os estudos técnicos ao processo de participação social, por meio de audiências públicas, para “discussão com toda a sociedade”.

Informa também que os documentos por ela apresentados estão disponíveis no site da Agência Reguladora, item “Audiência Pública 008/2018”. Para saber mais, acesse http://portal.antt.gov.br/index.php/content/view/53968.html.

Nesses documentos, segundo a Vale, estão contemplados todos os investimentos em conflitos urbanos propostos para Itabira.

“Após a etapa das audiências, a ANTT irá avaliar todas as contribuições recebidas e poderá realizar ajustes, inclusive em prazos e escopos apresentados para os investimentos”, finaliza a nota da empresa.

 

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