Imunidade cruzada pode explicar o pequeno número de pessoas com sintomas graves e hospitalizadas em Itabira
Carlos Cruz
Uma das explicações para o pequeno número de itabiranos testados positivos e internados em situação grave pode decorrer do fato de a maioria ser jovem, sem comorbidades – e que por isso não apresentam sintomas da doença. Mas podem, ainda que sem saber, contaminar pessoas mais idosas de seu convívio familiar e mesmo no trabalho.
Porém, pelo visto isso não está ocorrendo em Itabira, pelo menos na proporção prevista. Outra explicação, que os cientistas ainda estão pesquisando, pode ser consequência do que chamam de imunidade cruzada.
Talvez, e isso é só uma hipótese, até pelo fato de o itabirano ser mais suscetível, historicamente, a outras doenças virais (outros coronavírus), ele pode ter adquirido a imunidade cruzada.
Poeira
Itabira é conhecida como uma das cidades com maior índice de doenças respiratórias, em decorrência da poluição pelas partículas de minério de ferro em suspensão, a poeira que ataca e abala a saúde de seus moradores, principalmente neste período de estiagem.
Com isso, outros coronavírus aqui encontram pessoas que, no passado recente, foram mais facilmente contaminadas em outros invernos. E é essa contaminação que pode ter criado imunidade ao novo coronavírus.
Trata-se de um paradoxo, sem dúvida: o que poderia agravar a doença pode ter propiciado o surgimento de anticorpos entre os itabiranos no passado, ao facilitar a contaminação por outros vírus.
Outra hipótese é o grande número de pessoas que se vacinaram contra o H1N1 (gripe), o que pode também ter criado anticorpos. Um médico ouvido pela reportagem, que pede para não ser identificado, diz que isso é improvável, mas que tudo é possível. “O fato é que a ciência conhece muito pouco do novo coronavírus”, acentua.
Mas esse profissional de saúde não descarta a possibilidade desse paradoxo. Teria o itabirano adquirido anticorpos para o confronto com o novo coronavírus graças às contaminações anteriores por outros coronavírus que encontraram campo fértil pela baixa imunidade provocada por doenças decorrentes da poeira de minério?
Heresia à parte, essa possível imunidade cruzada merece estudo. É o que pode ser feito no futuro, após passar um período do monitoramento das partículas respiráveis de pó de minério mais finas (PM-2,5), que a Vale promete fazer a partir de outubro em Itabira.
Com esse monitoramento será possível dar continuidade ao estudo epidemiológico iniciado pela equipe do professor Paulo Saldiva (da USP). E, assim, aprofundar as consequências das doenças respiratórias em Itabira, que aumentam nesta época do ano com a estiagem, além dessa possível correlação com o novo coronavírus.
O que é imunidade cruzada
Essa hipótese da imunidade cruzada já vem sendo estudada para entender tantos os casos assintomáticos, como também o fato de que em algumas localidades a pandemia não está sendo tão avassaladora como se observa na maior parte do mundo.
Pesquisadores norte-americanos, por exemplo, desenvolveram um amplo estudo sobre a imunidade celular e humoral para SARS-CoV-2, utilizando-se de metodologias moleculares diversas. E avaliaram diferentes aspectos relacionados à infecção e à doença Covid-19.
Estudo publicado recentemente apresenta uma hipótese esperançosa na luta contra a Covid-19: ter superado outros coronavírus pode deixar alguma imunidade no corpo.
Por que algumas pessoas infectadas com o novo coronavírus apresentam apenas sintomas leves ou ficam assintomáticas, como tem sido o caso da maioria dos empregados da Vale? Essa é uma das grandes dúvidas que a comunidade científica está tentando esclarecer sobre a Covid-19.
Talvez a resposta esteja nessa velha conhecida imunidade cruzada. E é o que pode estar protegendo o itabirano, vítima há mais de 78 anos de doenças respiratórias agravadas pela poeira de minério. De tanto gripar com outros coronavírus, o itabirano pode ter adquirido imunidades. Já pensou?
Conforme explica o professor Estanislao Nistal, virologista e professor de microbiologia na Universidade CEU San Pablo, em Madri, Espanha, imunidade é o conjunto de mecanismos que protegem as pessoas de infecções.
“É uma complexa rede de células, órgãos e tecidos que trabalham juntos para se defender contra microrganismos e substâncias tóxicas que podem nos deixar doentes”, disse ele, em entrevista à BBC News Mundo.
Ainda segundo o professor Estanislao, pesquisadores do Instituto de Imunologia La Jolla, na Califórnia, autores do estudo publicado na revista Cell, usaram amostras de sangue coletadas entre 2015 e 2018 de pessoas que haviam superado os coronavírus sazonais, mas que, pelas datas, ainda não podiam ter sido expostas ao novo coronavírus (SARS-CoV-2).
As amostras foram colocadas em contato com sequência ou fragmentos do SARS-CoV-2. Foi quando observaram que havia uma reativação celular. “Os pesquisadores viram que existem linfócitos, tanto B quanto T, capazes de reconhecer esses fragmentos e ativar”, diz Nistal. “Isso significa que eles têm imunidade cruzada.”
Para o especialista, é o que explicaria, em parte, a existência de pessoas com sintomas muito leves ou mesmo sem sintomas da Covid-19. “Outra parte seria explicada pela imunidade inata”, diz ele.
Pois é essa tal de imunidade cruzada que pode explicar também porque em determinadas regiões os moradores estão sendo menos afetados pelo novo coronavírus. Seria o caso de Itabira?
Saberemos daqui alguns meses
Interessante! Mas..continuemos com as medidas preventivas: isolamento e distanciamento social, máscaras, e higienização das compras. Porque a gente se ama e ama a todos e todas!
Paradoxo ou não estamos lacrados com o Vírus. Em Manaus, não se conta o número de pessoas contaminadas, estão todos, portanto, o pior está por vir, devido as sequelas. O povo do Brasil parece se achar único e infalível na Terra e por isso vamos pagar muito caro.