Falar de suicídio com ética e responsabilidade é uma forma de prevenir o autoextermínio, defende psicólogo
Para falar do suicídio, tema ainda tabu na sociedade que ainda vê, preconceituosamente, no autoextermínio como sendo um ato tresloucado em momento de fraqueza do individuo, o psicólogo Marcelo Amorim Castro, diretor de Saúde Mental, da Secretaria Municipal de Saúde Itabira, esteve na Câmara Municipal, na terça-feira (30).
Amorim já de inicio rechaçou a ideia de que não se deve falar sobre o tema para não incentivar o autoextermínio. Para o psicólogo, debater o suicídio, como fez o vereador André Viana (Podemos), é uma forma de prevenção com informações, quebrando tabus.

“O suicídio não precisa de divulgação sensacionalista, mas de informações com ética e responsabilidade”, defendeu o psicólogo em entrevista à imprensa, após a sua palestra no plenário do legislativo itabirano.
Amorim desmitificou também a lenda urbana de que Itabira é campeã em suicídio no país. Talvez pelo fato de muitas vezes o autoextermínio na cidade acontecer em situações de forte comoção, com vários casos ocorridos na linha férrea, isso tenha levado à falsa ideia de o município ser um caso à parte no país e do mundo.
De acordo com ele, Itabira não é e nunca foi a capital nacional do suicídio. “Isso é mentira. A cidade onde mais se comete suicídio no país é Viamão, no Rio Grande do Sul”, afirmou. Na cidade gaúcha o índice de suicídio é de 27 casos por ano para cada grupo de 100 mil habitantes.
Em Itabira, o registro é de 18 casos por ano, índice que embora possa estar subestimado, não é diferente do que ocorre em outras cidades. É que os próprios familiares procuram esconder as ocorrências, pela carga de preconceito que o ato carrega.
Embora o índice de suicídio no município esteja acima da média estadual de 12 casos, Itabira ocupa a sétima posição no registro de ocorrências em Minas Gerais. Mas está acima também da média nacional, que registra índice 6,3 casos para cada grupo de 100 mil habitantes.
Ocorrências

Diferentemente do que muitos imaginam, como parte do estigma, o suicídio não ocorre predominante entre pessoas, regiões e países mais pobres. Nos países desenvolvidos o autoextermínio é mais comum que nos países do terceiro mundo.
Na Europa o índice é de 14,1, sendo a Hungria o país onde mais se comete suicídio. Na Ásia o índice é de 12,3. Já na África cai para 8,8, enquanto nas Américas, incluindo os Estados Unidos, o índice é de 9,5 mortes por autoextermínio para cada grupo de 100 mil habitantes.
A mesma correlação se observa no Brasil. Os estados do Sul são onde mais se comete suicídio, enquanto os estados nordestinos têm índices bem menores. A diferença é grande, quase não há suicídio nos estados nordestinos. Isso pode ser consequência da malemolência típica da região, o que leva a pessoa a ter menos estresse, esse outro grande mal da vida moderna.
No mundo, mais de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos. É a segunda principal causa de mortes entre jovens de 15 e 29 anos. No Brasil, são 11 mil pessoas que morrem dessa forma.
As mulheres tentam mais o autoextermínio, mas prevalência de casos consumados é maior entre os homens: 79% das tentativas acabam em mortes, enquanto entre as mulheres o percentual é de 21%.
A Organização Mundial de Saúde projeta que até 2020 mais de 1,5 milhão de pessoas, em todo o mundo, devem cometer suicídio, registrando mais de 20 vezes o número de tentativas de morte por autoextermínio.
Trata-se, portanto, de um caso grave de saúde pública, que deve merecer toda atenção de profissionais de saúde e da sociedade em geral.
Causas
Outro mito desconstruído pelo psicólogo Marcelo Amorim é de que o suicídio ocorre em momentos de fraqueza, como se a pessoa estivesse cometendo uma heresia ao negar a dádiva de Deus, que é a vida. Nada disso. Em toda parte do mundo, o autoextermínio tem como causa principal a depressão.

“Não se trata de uma tristeza profunda. Depressão é doença grave, considerada o mal do século 21”, disse o psicólogo. “É a principal causa do suicídio”, diz o diretor de Saúde Mental, tendo por base o que ocorre no país e no mundo.
Daí que a pessoa com depressão precisa de atenção e cuidados especiais, tanto dos profissionais de saúde, como também de familiares e amigos.
Para reduzir os índices de suicídios na cidade, Marcelo Amorim recomenda às autoridades oferecer mais lazer e cultura à população. “Investir na cultura é também um meio de ocupar as pessoas, sobretudo os jovens. com arte e diversão.”
Atendimento
Além disso, Itabira dispõe de uma rede de atendimento para quem precisa de ajuda. Desde 1992, o município e a região contam com o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) – e também com os Caps Álcool e Drogas (Caps AD) e Caps Infantil (Capsi).
A rede inclui ainda o Centro de Valorização à Vida (CVV), que oferece apoio afetivo e emocional. Isso enquanto os Caps oferecem assistência psicológica e de outros profissionais de saúde.
Em Itabira, o CVV atende pelo telefone 31 3831 4111 – com assistência diária, no horário de 18h às 22h. No Brasil, o atendimento é feito pelo número 188 – e é também gratuito.
Amorim não vê relação de casos de suicídio em Itabira com a mineração
Para Marcelo Amorim, a ideia de que a mineração possa acarretar mais suicídios em Itabira não tem comprovação científica. Isso embora o trabalho estafante, e em situação insalubre e de perigo, possa acarretar mais estresse – e até mesmo depressão.

Ele, porém, ressalta que o desemprego e a insegurança da vida moderna acarretem mais instabilidade emocional.
“Antes da privatização da Vale não havia demissão em massa na cidade. E as pessoas que nela trabalhavam só deixavam o emprego por morte ou aposentadoria.”
Esse quadro de quase pleno emprego na cidade foi alterando antes mesmo da privatização da mineradora. “Quando cheguei a Itabira, deparei-me com um grafite com a antiga logomarca da Vale que dizia ‘Meu pai, 30 anos. E eu?’, uma forma de apelo por um emprego na mineradora, que já não ocorria como antes”, recordou.

Pouco tempo depois, em 2 de abril de 1989, ocorreu a greve dos trabalhadores da Vale. “Foi quando aconteceram as primeiras demissões em massa. Eu estava chegando a Itabira e parecia que a cidade estava sitiada, com helicópteros dando rasantes, ameaçando os grevistas.” Leia mais aqui.
Hoje a crise se agravou – e com a ela as situações que levam ao estresse e à depressão. “O desemprego é grande e já temos visto aumentar o número de pessoas em situação de rua e desocupadas há muito tempo. Essa relação com suicídio certamente é forte”, acredita.
Pode-se acrescentar que o medo de quem vive abaixo das barragens é outro fator que desestabiliza emocionalmente as pessoas. Espera-se que não chegue ao ponto de aumentar o índice de autoextermínio na cidade, mas é uma situação que deve ser parte da atenção dos profissionais de saúde e de apoio ao que precisam de ajuda e de atenção psicossocial.
Não consigo entender a expressão auto extermínio. E penso que o suicídio não deva ser combatido, é um direito da pessoa. E penso também, que o suicídio significa muita coragem