E quando essas luzes se apagarem de vez

Carlos Cruz*

(Reportagem publicada originalmente neste site em 3 de maio de 2017. Fernando Carneiro não é mais gerente em Itabira, mas continua na Vale, na gerência das Minas Centrais. As suas informações e opiniões continuam válidas para se pensar o presente e o futuro do município com e sem a mineração)

Carlos Cruz*

Com o terceiro ciclo tecnológico da mineração, inaugurado neste ano, Itabira passa a viver o crepúsculo da atividade em seu território. De acordo com o Formulário 20F Vale, apresentado no ano passado pela empresa às Bolsas de Valores dos Estados Unidos, o município dispõe de reservas de 1.019,3 bilhão de toneladas de minério de ferro em suas minas itabiranas.

O interessante é que, passados 75 anos de mineração em larga escala, a completar-se no dia primeiro de junho, o município ainda dispõe de quase o mesmo volume de minério de ferro da reserva que era conhecida, no pico do Cauê, antes do início da mineração, conforme registra Carlos Drummond, na crônica Vila de Utopia:

“É curiosa a vila de Utopia, posta na vertente da montanha venerável e adormecida na fascinação do seu bilhão e 500 milhões de toneladas de minério com um teor superior a 65% de ferro.” A diferença é que antes, no Cauê, o minério existente era a hematita, com cerca de 70% de ferro – hoje resta um volume de minério idêntico ao encontrado no pico, só que de itabirito compacto, um minério com 40% de teor de ferro.

Usina Cauê foi a primeira a processar o itabirito, inaugurando o segundo ciclo tecnológico (fotos: Geraldo Andrade)

A Vale não tem uma data prevista para o fim do minério em Itabira. “Se eu cravar uma data para a exaustão das minas de Itabira, estarei cometendo o mesmo erro do passado, quando se falou que elas iriam exaurir em 2018 e depois em 2025”, tergiversa Fernando de Rezende Carneiro, gerente de Mineração da Vale em Itabira.

Entretanto, com base na produção prevista de 50 milhões de toneladas anuais, já a partir do segundo semestre, a exaustão das atuais reservas ocorreria em 20 anos, no ano não muito distante de 2037, o que é bem próximo quando se pensa em planejamento estratégico para o município. É pouco tempo para se encontrar e consolidar a propalada e nunca realizada diversificação de sua economia. Isso para que a derrota não seja incomparável, como cismava Tutu Caramujo.

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Fernando Carneiro, gerente da Vale em Itabira (Foto: Carlos Cruz)

Recursos adicionais

“Tenho certeza que ficaremos por muito mais tempo em Itabira”, é a aposta que faz o gerente da Vale. É que, segundo Carneiro, existem em Itabira recursos adicionais que podem virar reservas e prolongar ainda mais a vida útil das minas locais.

Segundo o planejamento estratégico divulgado pela empresa em 2004, as minas de Itabira contam com recursos da ordem de 3,9 bilhões de toneladas. “Recursos são formações ferríferas conhecidas, mas que ainda não contam com um plano de lavra. Podem ser transformados em reservas, assim que comprovada a viabilidade econômica e ambiental”, explica Fernando Carneiro.

A mineradora estuda também trazer minérios de outros municípios para que sejam processados nas usinas Conceição e Cauê. A empresa dispõe de recursos de minério de ferro em Conceição do Mato Dentro, Morro do Pilar e também em Guanhães.

Ele, porém, adverte: “É fato que a exaustão se aproxima a cada ano que passa. E Itabira não pode ficar parada de braços cruzados.” A mina Cauê, que deu origem à Vale, em 1942 com a extração da hematita, exauriu-se em meados da década passada. Hoje, a usina só processa minérios extraídos das Minas do Meio, enquanto a cava da antiga mina é usada para dispor material estéril e parte do rejeito da usina.

Perdas incomparáveis

Luzes da cidade e da usina Conceição, que foi revitalizada para processar o itabirito compacto

No futuro, exauridas as minas, mesmo com a indústria de beneficiamento processando minérios de outras localidades, Itabira perde parte considerável de suas receitas com o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), tributo que dividirá com os municípios onde localizam as minas que abastecerão o complexo.

Perde também o que recebe com a Cfem (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), o chamado royalty do minério. É que a Cfem é paga ao município onde está localizada a jazida. Com a exaustão das minas, mesmo com a operação das usinas de concentração de minério, serão reduzidos os empregos e as oportunidades de serviços e negócios no município.

*Carlos Cruz é jornalista, editor da Vila de Utopia.

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