Crise na Câmara expõe fragilidade de Hugo Motta e fortalece Lula junto à opinião pública
Foto: Kayo Magalhães/ Câmara dos Deputados
Quanto mais a Câmara dos Deputados age contra o governo Lula, mais o governo se reforça ou se fortalece; reeleição de Hugo Motta fica mais difícil
A terça-feira (9) e a madrugada dessa quarta-feira (10) foram marcadas por episódios inéditos e controversos na Câmara dos Deputados, que colocam em xeque a liderança e a possibilidade de reeleição do presidente da Casa, Hugo Motta.
Ao determinar o corte do sinal da TV Câmara pela primeira vez desde a redemocratização, retirar jornalistas do plenário, acionar força policial e ordenar a saída truculenta do deputado Glauber Rocha, Motta “queimou pontes com a esquerda”, avalia o cientista político Fabio Andrade, professor de Relações Internacionais da ESPM. “Com isso, a pretensão de fazer dois anos de mandato fica mais restrita”, afirmou.
Despreparo e alinhamento político
Para o cientista político Paulo Ramirez, professor de Ciências Sociais e de Consumo da ESPM, os episódios revelam o despreparo de Hugo Motta para conduzir a Câmara.
“A situação é absolutamente inaceitável. Mostrou um comportamento bem diferente do Hugo Motta em relação à rebeldia da extrema-direita quando ocupou a mesa da Casa solicitando a anistia de Bolsonaro”, criticou.
“Naquele momento, ele teve uma posição mais cuidadosa, mais delicada e não interviu com o uso da força. Agora, ao agir com truculência contra a esquerda, deixa claro de que lado está: da extrema-direita e não da esquerda”, disse Ramirez.
Ramirez acrescenta que, paradoxalmente, quanto mais a Câmara age contra o governo Lula, mais o presidente se fortalece junto à opinião pública.
“Não dentro da Câmara, porque não tem maioria, mas junto ao eleitorado. Me parece que essa vai ser a grande estratégia do próximo ano: o PT e os partidos aliados tentando aumentar a quantidade de deputados nas Casas Legislativas e no Senado, em função da defasagem atual”, explicou, referindo-se à correlação de forças desfavorável ao governo no legislativo federal.
Redução de pena é insuficiente para a direita
Na madrugada desta quarta-feira, a Câmara aprovou o projeto que reduz penas de Bolsonaro e de condenados por tentativa de golpe. Para Fabio Andrade, mesmo com esse movimento, Hugo Motta não conseguiu fortalecer pontes com a direita.
“Apesar de o avanço da anistia ser considerado positivo, vários atores do movimento mais à direita colocaram que era insuficiente e que basicamente não estava a contento”, afirmou.
Ramirez concorda: “Por mais que Hugo Motta tenha tido certos sucessos, seja na pressão sobre o governo ou ao não aprovar pautas do Executivo, isso tem feito com que a imagem do Congresso fique cada vez mais manchada”, analisou.
“Esse desgaste pode ser determinante para o desempenho dos deputados conservadores no próximo ano. Certamente vão vencer, mas não com a mesma facilidade das duas últimas eleições, quando tivemos o Congresso mais conservador da história”, acrescentou.
Ataque à imprensa agrava crise
O episódio dessa terça-feira também foi marcado por um ataque à imprensa. “O presidente do Congresso disse que não autorizou e não solicitou a retirada da imprensa, mas fato é que ela foi retirada. Não só foi retirada, como depois foi agredida. Isso vai fazer com que ele perca o apoio da imprensa também”, avaliou Fabio Andrade.
Para Ramirez, todas essas situações pioram a imagem da Câmara perante a opinião pública e jogam os conservadores contra o eleitorado. “O Congresso sai menor desse episódio. A truculência contra parlamentares, a censura à imprensa e a tentativa de agradar a direita sem sucesso criam um desgaste que será cobrado nas urnas”, concluiu.








