CDA é sempre uma festa

Todas as caras de Drummond por Belchior

Todos artigos redigidos por escritores publicados no Caderno Especial do JB – Drummond 80 Anos – representam, significam profundo reconhecimento daquilo que foi constituído o homem e o escritor.

Na impossibilidade de publicar tudo, a Vila de Utopia recortou alguns trechos, os parágrafos marcantes, e acrescentou duas lindas mensagens dos poetas Jorge de Lima e Manuel Bandeira quando o poeta Drummond completou cinquent’anos. (Cristina Silveira)

Oitenta anos em flor, João Máximo

|É um homem extremamente gentil. De uma mente ágil e brilhante como a de um menino mineiro do seu tempo – um tempo em que cada menino mineiro parecia destinado a ganhar o mundo (“Não eu, que não tenho importância alguma”). Duas coisas, entre tantas outras, impressionam: a modéstia e a juventude desse octogenário em flor.|

Treze anos no JB, Josué Montello

|Três vezes por semana, com a pontualidade do Sol surgindo no horizonte, Carlos Drummond de Andrade, desde 1969, publica a sua crônica no Jornal do Brasil.

Quer isso dizer que, pela regularidade de sua presença e pela continuidade de sua colaboração, o grande poeta está de tal modo identificado com o JB, que é exatamente aqui que os leitores vêm procura-lo, nos dias certos, sabendo que Drummond está à espera deles, dia sim, dia não, para lhes falar do mundo e da vida, com a originalidade de sua visão pessoal.

A cometografia de Drummond, Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, Astrônomo do ON

| Ao que sabemos, três escritores brasileiros sofreram em sua produção literária a influência que a imagem espetacular do cometa Halley deixou em suas retinas quando em 1910, na meninice, assistiram à aparição do cometa. São eles os poetas Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes e o memorialista Pedro Nava.

Dentre eles, só um continuou registrando em suas crônicas e poemas as imagens e impressões dos cometas que surgiram depois da visão majestosa do Halley, talvez em busca daqueles tempos da juventude que não voltam mais, quando a imaginação infantil é tão fértil em belezas e deliciosas imagens. Esse escritor é o nosso poeta maior que um dia confessou:

“O que aconteceu à noite foi maravilhoso. O Cometa Halley apareceu mais nítido, mais denso de luz, e airosamente deslizou sobre nossas cabeças, sem dar confiança de exterminar-nos. No ar frio, o céu dourado baixou ao vale, tornando irreal o contorno dos sobrados, da igreja, das montanhas.

Saímos para a rua banhados de ouro, magníficos e esquecidos da morte, que não houve. Nunca mais houve cometa igual, assim terrível, desdenhoso e belo. O rastro dele media – como posso referir em escala musical as proporções de uma escultura de luz, esguia e estelar, que fosforeja sobre a infância inteira? No dia seguinte, todo mundo se cumprimentava, todos satisfeitos, a passagem do cometa fizera a vida mais bonita”. |

 Claro Enigma, editorial

|Além de grande poeta palpável aos olhos de todos, há em Carlos Drummond de Andrade um homem público a quem o exercício do Poder não desgastou a autoridade para clamar por um Brasil do tamanho da pátria com que sonhamos. Se o poeta está visível, o homem público ocultou-se nas dobras de sua obra numerosa e alta.

É preciso buscá-lo para explicar-nos, ele próprio, isto que a muitos está parecendo um mistério: num país que não costuma reconhecer a grandeza de seus vultos mais gloriosos, senão depois que eles se fazem definitivamente ausentes, chega ele à “altura provisória” dos 80 anos em plena força criadora e este acontecimento ocupa o primeiro plano das atenções gerais, no momento em que estas se concentram na reconquista de um dos direitos populares mais importantes.

Fragmentos negativos, no contexto dos poemas e principalmente da obra, revestem a expressão de um sentimento obsessivo da terra e do povo do Brasil, que transborda dos livros de poesia para as crônicas semanais.

Ao longo de anos de divisão e desânimo da nação, a figura de Drummond acabou por se definir como síntese das aspirações e preocupações mais fundas da gente brasileira, além das facções e “acima das profissões e dos vãos disfarces do homem”.

Eis por que as comemorações de seu octogésimo aniversário, apesar de seu temperamento recolhido e de sua conhecida timidez, tomaram dimensões nacionais e caráter universal pela unanimidade. O Brasil se reconhece em sua obra. |

 Nosso clássico moderno, José Guilherme Merquior

| Entre os atributos de um verdadeiro clássico, T. S. Eliot discernia: a consciência histórica; a capacidade de abranger toda uma pauta de sentimentos; e a “catolicidade”, isto é, a superação de qualquer ótica provinciana – inclusive daquele “provincianismo não de espaço, mas do tempo” a que, tantas vezes, o espírito moderno se entregou, perdendo com isso o senso da universalidade do humano.

Em Carlos Drummond de Andrade nossas letras contemporâneas encontram seu clássico, detentor em grau eminente de cada uma dessas três qualidades. Pela sua própria saga intima, o verso de Drummond exala consciência histórica.

A parábola do fazendeiro do ar é metáfora de nossa evolução social. Filho de fazendeiro, sentindo e sofrendo a grande cidade nos anos mais tempestuosos do seu século, ele captou como ninguém o significado emocional de nossa complexa metamorfose de subcontinente agrário em sociedade urbano industrial. |

 O segundo governo, Fernando Pedreira

| Hoje, neste domingo, véspera de Finados, estamos também às vésperas de uma eleição que é a mais importante dos últimos vinte anos.

Boa hora para reler Drummond, para festejá-lo, para reaprender com ele a sua lição de tolerância, de generosidade, a ironia fina, a sabedoria. (E, quem sabe, talvez até um pouco do seu talento passe para nós…)

Nós somos o Brasil que passa. O poeta, que nos forma e reforma, que nos reinventa e nos redime, é o que fica. Melhor assim.

Hoje é, pois, dia de festa. O Brasil é um país de crianças, um povo com alma de criança, que não vai muito fundo nas coisas, e onde a inocência (impura) muitas vezes se mistura à crueldade.

É curioso que uma terra assim produza autores como Machado e Drummond (um fluminense e um mineiro), sábios, finos, tolerantes, irônicos, civilizadíssimos, quase que se podia dizer britânicos. |

Francisco Mignome, compositor

|Toda a obra de Carlos Drummond de Andrade é amparada pelo bom gosto e pela alta musicalidade que ela contém. |

Gilberto Freyre, sociólogo

| Considerando-se homem de ferro, Drummond dá nova associação de ferro a um tipo superiormente humano. Ele é um poeta triunfalmente de ferro. |

Ferreira Gullar, poeta

|Clara, densa e sempre jovem, a sua poesia lembra a água. |

Fernanda Montenegro, atriz

| Drummond é o poeta da nossa nacionalidade, é o norte, a nossa

Carlos Drummond de Andrade – 50 Anos

Jorge de Lima

| Louvo este cinquentenário drummondiano como data da Pátria em que o poeta a faz maior e ainda vivo já é monumento, exemplo, história.

Dá-me em minha velhice a alegria de escolar festejando nome e imortalidade cívicos; e esta alegria extra temporal que volta dentro de mim, convence-me cabalmente de meu aprendizado diante deste poeta maior em que na verdade vejo um mestre imitado, amado, louvado.

Decretei-me uma semana de férias para regozijos íntimos. Tenho também descendentes que a festejarão. [Correio da Manhã, 1/11/1952. Hemeroteca da BN-Rio] |

Manuel Bandeira

|Carlos Drummond de Andrade é o meu poeta predileto. Se eu não tivesse feito a minha obra, era a obra dele que gostaria de ter feito. [Correio da Manhã, 1/11/1952. Hemeroteca da BN-Rio] |

 

 

 

 

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