Câmara de Itabira vota, nesta terça-feira, pedido de autorização para a Prefeitura contrair empréstimo de R$ 99 milhões para investimentos diversos

Carlos Cruz

Diz o ditado que quem casa quer casa. Mas nem sempre a pessoa tem o capital necessário para fazer o investimento para construir ou comprar uma residência para a família que certamente irá crescer – e que se fosse esperar para acumular o recurso levaria muitos anos para obter um novo teto.

Pois para antecipar a demanda, se a pessoa tem renda comprovada, recorre a um financiamento da Caixa Econômica Federal (CEF) para pagar a casa própria em até 35 anos, com prazo de carência, que é para fazer uma poupança para outras demandas.

Da mesma forma, essa pessoa pode recorrer a um financiamento para mobiliar a sua nova residência, com geladeira, fogão e outros mobiliários. É assim, graças à invenção capitalista que é o crediário, que essa mesma pessoa consegue antecipar a sua demanda, para felicidade geral, segurança e bem-estar de seus familiares.

É assim que fazem também os municípios: recorrem a financiamentos para assegurar, de imediato, uma infraestrutura urbana adequada, com saneamento básico, o que inclui rede de esgoto e água tratada, além da pavimentação de ruas, escolas, quadras esportivas.

Evidentemente que tanto o cidadão como os governos só devem se endividar de acordo com a capacidade de endividamento, sem comprometer a renda familiar, assim como o orçamento municipal que deve continuar suprindo os demais serviços básicos de saúde, educação, segurança.

Para ambos os casos, antes de liberar o empréstimo, o agente financeiro vai avaliar a capacidade de pagamento do devedor, para não comprometer o capital da instituição com eventuais calotes.

José Maciel (ao centro, com microfone) defendeu o empréstimo para investimentos em infraestrutura básica, com projetos estruturantes (Foto: Carlos Cruz)

Urgência

A analogia serve para explicar o pedido de empréstimo à CEF de R$ 99 milhões, por meio do Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa), que o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) encaminhou para apreciação e votação pela Câmara Municipal

O pedido de empréstimo entra na pauta de votação nesta terça-feira (24), com pedido de urgência, já que em breve o país ingressa no período eleitoral, quando operações financeiras dessa natureza ficam proibidas com recursos estatais, como é o caso da CEF.

Com o financiamento, a Prefeitura de Itabira espera executar itens imprescindíveis constantes do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), aprovado no último ano do governo de Damon Lázaro de Sena – e que até então ficou engavetado nos escaninhos da burocracia municipal.

Itabira, cidade rica, ainda tem ruas sem a mínima infraestrutura urbana, o que depõem contra todos os governantes, o que inclui os vereadores (Foto: Ascom/PMI)

Atraso

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), mesmo sendo Itabira um município rico, graças ao seu recurso mineral explorado ininterruptamente em larga escala desde 1942, 8% de seu território ainda não dispõem de esgotamento sanitário adequado.

Isso enquanto 37,6% desse mesmo território não dispõem de urbanização de vias públicas em vários bairros – e também nos distritos de Senhora do Carmo e Ipoema.

Pois é justamente para acabar com esse déficit urbanístico, que há muito deveria ter deixado de existir, já que desde 1991 o município recebe polpudos recursos da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), os royalties de minério, que se justifica o pedido de empréstimo.

Isso porque, os recursos provenientes dos royalties, que deveriam ser alocados exclusivamente no meio ambiente (o que inclui o saneamento básico) – e em obras estruturantes para atrair novas atividades econômicas – historicamente foram desviados para cobrir despesas na saúde e na limpeza urbana.

Pavimentação da rodovia que liga os distritos de Senhora do Carmo a Ipoema está incluída no pacote de obras (Foto: Ascom/PMI)

Investimentos

“São 97 projetos previstos no Plano de Metas, com previsão de investimentos superiores a R$ 700 milhões”, contabilizou o assessor de Projetos e Captação de Recursos da Prefeitura, José Maciel Duarte Paiva, ao apresentar o projeto de financiamento na reunião das comissões temáticas, nessa segunda-feira (23), na Câmara Municipal.

Segundo ele, para cumprir o Plano de Metas, além de contar com recursos próprios, a Prefeitura negocia mais aportes de capital com a mineradora Vale, espera-se que seja a fundo perdido para outras obras estruturantes, não incluídas no pacote do empréstimo.

São investimentos necessários para tornar o município sustentável mesmo após o fim do minério, o que só deve ocorrer para além da década de 2050, mas que para isso Itabira precisa se preparar desde já, uma vez que essa necessidade está atrasada.

O financiamento pretendido pela Prefeitura é, portanto, para complementação dos recursos necessários ao cumprimento desse Plano de Metas, Nele está incluído também a contrapartida municipal para a necessária e urgente duplicação da rodovia estadual que liga Itabira à BR 381/262.

Esse investimento está orçado em cerca de R$ 300 milhões, o que deve demandar recursos do município da ordem de R$ 100 milhões como contrapartida aos aportes que devem ser feitos pela Vale e governo de Minas Gerais.

Prioridades

Fonte: PMI

Já para o investimento com os recursos da linha de crédito da CEF, as prioridades são investimentos urbanísticos e rurais. Com o empréstimo de R$ 99 milhões, o atual governo espera atingir a taxa municipal de investimento próxima da que foi alcançada no último ano do governo de Ronaldo Magalhães, que foi de 14,30%.

Sem o empréstimo pretendido no ano passado, cuja autorização foi reprovada por 10 vereadores, a taxa de investimento da Prefeitura de Itabira caiu para 3%, ficando restrita apenas aos recursos próprios do município.

“Os investimentos com esse empréstimo serão destinados ao saneamento básico, urbanização de ruas em diversos bairros e nos distritos, construção de pontes, reforma do matadouro, extensão da rede elétrica urbana e rural, pavimentação e drenagem de morros na zona rural”, enumerou José Maciel.

Incluem ainda construção de quadras esportivas, melhorias de estradas municipais, parte da pavimentação entre Carmo e Ipoema, revitalização do centro histórico, além de investimentos na mobilidade urbana.

São investimentos que irão assegurar desde já, e com atraso, os benefícios da urbanização e saneamento que boa parte da população itabirana ainda não usufrui – e que pode passar a dispor desde já.

Fonte: PMI

Apoio

Foi o que defendeu o aposentado e líder comunitário Zacarias Teixeira na reunião na Câmara, nessa segunda-feira. “Se a população não tem rede de esgoto, não tem saneamento, não tem saúde, que não é só ter médicos no posto (PSF)”, sustentou.

Zacarias Teixeira, líder comunitário: “investimentos em saneamento é para a saúde.” (Foto: Carlos Cruz)

“Tem que ter água tratada, calçamento também. Eu moro no bairro Praia, que é um dos melhores de Itabira, mas que só ficou bom depois de muita luta. E teve vereador que votou contra o canal da Praia, que trouxe muitos benefícios para a nossa região”, acentuou o líder comunitário.

“Vereadores precisam ter responsabilidade e parar com picuinhas. Isso não é empréstimo, é investimento em favor da população. Saneamento é saúde e quem votar contra não quer saúde para a população, não quer o progresso de Itabira”, acrescentou.

Uma outra moradora lembrou que Itabira tem a sétima arrecadação de ICMS no ranking estadual, mas em qualidade de vida ocupa apenas a 33ª posição, um indicador de que muito ainda precisa ser feito para melhorar as condições de quem vive e trabalha no município.

Sibele , do bairro João XXIII: “empréstimo é para beneficiar a população que paga a conta.” (Foto: Carlos Cruz)

A líder comunitária Sibele Almeida, do bairro Gabiroba, também defendeu a necessidade do empréstimo, lembrando que o município tem capacidade de endividamento sem comprometer os serviços básicos.

“Seremos nós que vamos pagar a conta dos benefícios para a população. Foi assim com os empréstimos que o governo passado fez e que o atual está pagando com recursos que são nossos e que devem continuar sendo investidos para melhorar a nossa qualidade de vida.”

Correlação de forças

Mas não é assim que pensam pelo menos os vereadores que se manifestaram contrários ao empréstimo, com o argumento de que o município tem recursos em caixa e o que falta é uma boa gestão municipal, conforme acentuou o próprio Marco Antônio Lage na campanha eleitoral de 2020.

“Eu sou contra o empréstimo quando um pai vem aqui desesperado por não ver o seu filho ser atendido no Pronto-Socorro por falta de médico pediatra. Médicos tiram férias e os pacientes têm que tirar férias também”, criticou o vereador Heraldo Noronha (PTB).

Heraldo Noronha votou a favor do empréstimo obtido pelo governo passado, mas agora acha que a Prefeitura dispõe de recursos e o que falta é gestão (Foto Carlos Cruz)

“O que está faltando é gestão na cidade. Quem sabe no próximo ano, se o prefeito der um jeito e melhorar a administração, eu mude de ideia e vote favorável”, dissse o ex-presidente da Câmara, que na gestão passada votou favorável a empréstimo semelhante junto à CEF.

Assim como Noronha, outros quatro vereadores, em ocasiões diferentes e pela rede social, já se manifestaram contrários ao empréstimo pretendido pela administração municipal.

São eles: Neidson Freitas (MDB), que lidera a oposição, Rosilene Félix (MDB), Luciano “Sobrinho” (MDB) e Sidney “do Salão” (PTB). Todos argumentam ser o empréstimo desnecessário pelo fato de a Prefeitura ter recursos em caixa e pelo que consideram falta de gestão da atual administração.

Favoráveis ao empréstimo já se manifestaram os vereadores Júber Madeira (PSB), líder do prefeito, Bernardo Rosa (Avante), vice-líder, Júlio “Contador” (PTB), Carlos Henrique (PDT), Marcelino Guedes (PSB) e Weverton “Vetão” (PSB), presidente da Câmara, que neste caso vota, pelo fato de ser exigido maioria absoluta (2/3), correspondente a 12 vereadores para a aprovação do pedido de empréstimo.

Ainda não se posicionaram os vereadores Júlio “do Combem” (PP), que não compareceu na reunião das comissões temáticas, Reinaldo Lacerda (PSDB), Robertinho “da Autoescola” (MDB), Rodrigo “Diguerê” (PTB), Tãozinho Leite (Patriota) e Carlinhos “Sacolão” (PSDB).

Se apenas um desses vereadores engrossar o grupo oposicionista, mais uma vez o prefeito será derrotado. E Itabira perderá, mais uma vez, a oportunidade de se antecipar e zerar o déficit em saneamento básico e infraestrutura urbana.

Manterá assim parte da população sem usufruir desse bem-estar a que todos têm direito, como pré-requisito de uma vida digna, com direitos básicos de urbanidade assegurados.

 

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2 Comentários

  1. Quando é que a grande mineradora vai iniciar a captação no ribeirão do Tanque?
    Ano passado já aconteceu a falta d´água grave e, pelo andar da carruagem ou dos vagões, este ano será igual.

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