Bernardo Mucida acredita nas boas intenções da Vale, mas faz apelo à Bolsa de Nova Iorque para que interceda em favor de Itabira
Carlos Cruz
Vice-presidente da Comissão de Minas e Energia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais e deputado estadual majoritário em Itabira em busca da reeleição, Bernardo Mucida (PSB) é, sobretudo, um crédulo.
É que ele acaba de enviar carta à presidente da Bolsa de Nova Iorque, Lynn Martin, com cópia ao presidente da Vale, Eduardo Bartolomeu, pedindo para que interceda junto à mineradora em prol do município de Itabira que, há oito décadas, envia ininterruptamente para o mundo o minério de ferro extraído de seu subsolo.
Mucida acredita que essa intervenção possa mudar o rumo da história, com a mineradora enfim, sob pressão da Bolsa de Nova Iorque, vindo a resgatar a dívida histórica que tem com o município.
Para isso o parlamentar reivindica a inclusão dos danos ambientais e as perdas incomparáveis com a mineração entre as ações socioeconômicas/ambientais que a mineradora deve cumprir daqui para frente como parte de sua agenda ESG (Environmental, Social and Corporate Governance).
A agenda ESG é novo instrumento do marketing empresarial para melhorar a imagem das corporações multinacionais – e assim dar uma roupagem social e ambiental aos seus empreendimentos.
Perdas incomparáveis
“Acionei a Bolsa de Valores de Nova York em busca de apoio para encontrarmos soluções aos danos socioambientais provocados pela extração minerária da Vale S.A. no estado de Minas Gerais, de forma ampla, e em Itabira, de forma específica”, conta o deputado.
Como a empresa tem títulos negociados na bolsa norte-americana, ele acredita ser possível mudar o rumo dessa histórica espoliação da riqueza mineral no município minerado sem que se tenha a contrapartida devida.
Pela Lei Kandir, a Vale é isenta de pagar ICMS que deveria incidir sobre o minério exportado, que representa quase a totalidade do que é extraído das minas de Itabira.
Com isso o município perde receita, mesmo havendo compensação, uma vez que reduz o seu índice VAF (Valor Adicionado Fiscal), um dos principais critérios levado em conta para o rateio do imposto estadual.
E foi só a partir da 1991 que a Vale passou a pagar a Compensação pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), os royalties do minério.
Antes disso, pagava uma merreca do Imposto Único sobre Minerais (IUM), mesmo assim só a partir de 1966, cujo rateio destinava apenas 20% aos municípios minerados, privilegiando o Estado e a União na distribuição desse extinto tributo.
Panaceia
Agora, com a adesão da Vale à agenda ESG, que qualifica empresas que se comprometem com ações sociais para o desenvolvimento sustentável, o que inclui investir na melhoria ambiental nos territórios onde atuam, o deputado acredita piamente ser possível reverter esse quadro de dependência econômica que se arrasta desde a criação da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), em junho de 1942.
O prefeito de Itabira, Marco Antônio Lage (PSB), também acredita nessa possibilidade e aguarda pelo anúncio de um pacote de projetos para o mês de junho, quando será celebrado os 80 anos de criação da companhia estatal, por meio de decreto de Getúlio Vargas.
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Inclusão
“No setor financeiro, as métricas que mensuram as boas práticas nos negócios apontadas na agenda ESG das empresas se tornaram fundamentais nas análises de riscos, contribuindo para as tomadas de decisões dos investidores”, acredita o deputado, que complementa:
“A Vale, em sua agenda ESG, assume o compromisso de ser uma empresa sustentável, catalisadora de desenvolvimento local e agente global de sustentabilidade.”
Só que, segundo o deputado, os compromissos de reparação assumidos pela mineradora, em sua agenda ESG, limitam-se a Brumadinho e Mariana, além dos povoados evacuados em virtude do risco de barragem.
Ou seja, ignora a dívida histórica com Itabira e todas as consequências ambientais negativas que há anos impacta a qualidade de vida em Itabira, além do risco das barragens locais.
Ignora também a extrema dependência que a mineradora causou historicamente a Itabira, inclusive desmantelando a promissora economia diversificada que existia no município antes do advento da mineração em larga escala.
A cobrança do parlamentar é justa e necessária. Mas pode ser inócua, como tantas outras reivindicações negociadas, como ele mesmo admite. “Não há nenhuma previsão de reparação aos demais territórios minerados (na agenda ESG)”, critica.
“Nesse sentido, cobramos que o compromisso de reparação deve alcançar os municípios que atualmente dependem economicamente da mineração, e que tais ações precisam ser praticadas antes do fechamento de suas minas”, é o que reivindica o deputado ao pedir apoio à presidente da Bolsa de Nova Iorque.
Da mesma forma que acredita o prefeito, Mucida também vê no caso de Itabira uma oportunidade para a Vale melhorar sua imagem globalmente, extremamente abalada depois dos crimes ambientais, trabalhistas, sociais e contra a vida ocorridos com o rompimento de barragens em Mariana e Brumadinho.
Inexorabilidade
“Itabira, por ser berço da Vale S.A. e o primeiro grande município minerador com previsão de exaustão de suas minas, é a melhor oportunidade para entregar à sociedade brasileira e internacional um exemplo de cidade mineradora sustentável, pós-exaustão das jazidas”, projeta o parlamentar, que vê como certa a exaustão de suas minas em 2031.
“Essa data para o encerramento da extração de minério em Itabira está no Relatório 20-F, apresentado anualmente pela Vale S.A. à Bolsa de NY, perante a Agência Federal Independente de Regulamentação e Controle dos Mercados Financeiros dos Estados Unidos – Securities and Exchange Commission.”
É nesse relatório, diz o deputado, que a empresa apresenta parte do panorama dos seus negócios, detalhando, inclusive, a “estrutura Ambiental, Social e de Governança (ESG)”, além dos gordos resultados financeiros e operacionais, os investimentos e projetos da mineradora.
“O anúncio desse esgotamento (das minas locais) cria um ambiente de incerteza quanto ao futuro de Itabira, sua sustentabilidade econômica, ambiental e social após o efetivo encerramento das atividades minerárias do município”, argumenta o deputado, reforçando o seu pedido de “intervenção” da Bolsa de Nova Iorque em prol da cidade minerada.
Reparação
“Por isso, reivindico que a Vale deve evidenciar em sua política de ESG a reparação dos danos provocados pela mineração no estado de Minas Gerais, de forma ampla, e no município de Itabira, de modo específico”, cobra o parlamentar mineiro, para quem o documento deve também prever o efetivo investimento na melhoria e ampliação da infraestrutura, capacitação profissional e tecnológica para os municípios minerados.
“Em Itabira, a Vale deve se comprometer com a consolidação de um polo educacional e de medicina especializada, investimentos em infraestrutura viária, atenção ao fornecimento de água limpa e abundante, além da eliminação de qualquer risco futuro com as barragens”, relaciona o deputado entre as reivindicações apresentadas.
Segundo ele, o objetivo é garantir que os municípios afetados encontrem novas vocações econômicas. Ou seja, que diversifiquem as suas bases econômicas e que agora está sendo chamado “modernamente” de rearranjo produtivo.
“Deixo claro que não sou contra a mineração”, afirma o deputado, aulicamente, como se isso fosse preciso dizer. “Como deputado e membro das comissões de Minas e Energia e de Desenvolvimento Econômico, acompanho e fiscalizo ações que envolvem a extração minerária, principalmente após as sucessivas tragédias com barragens em Minas Gerais, que alcançaram a esfera criminal.”
O deputado refirma a confiança, assim como faz o prefeito Marco Antônio Lage, de que a mineradora Vale possa construir um “case” de sucesso em Itabira, exorcizando de vez o fantasma da exaustão, o que deixaria a cidade minerada sem recursos para manter o mesmo padrão de vida e os serviços básicos oferecidos à sua população.
“Como representante de Itabira e região, mantenho a Assembleia Legislativa de Minas Gerais como um ambiente de diálogo, mas de cobrança. Afinal, antes Itabira não tinha deputado, agora tem”, conclui o parlamentar, advogando a importância de sua reeleição em outubro deste ano.
Transparência
Se o deputado acredita mesmo na eficácia desse diálogo com a Vale, poderia também cobrar transparência com ampla divulgação dos projetos que a mineradora tem para Itabira antes e após a exaustão.
Por exemplo, poderia começar cobrando todas as respostas aos questionamentos que a Agência Nacional de Mineração (ANM) fez à empresa antes de aprovar o seu novo plano econômico para as Minas de Itabira.
São questionamentos importantes, que Itabira precisa saber, como por exemplo, como se dará a expansão (do pit) de suas minas com as novas reservas medidas ainda por serem exploradas.
A ANM quer saber, e Itabira também precisa saber, se haverá necessidade de remoção de moradores para que esses novos recursos sejam explorados – e que podem impactar ainda mais a qualidade de vida dos moradores.
Outro questionamento importante deve ser pautado na cobrança de informações sobre o Plano de Fechamento das Minas (PFM) de Itabira, que a empresa deve atualizar a cada cinco anos.
Um dos PFM que a reportagem deste site teve acesso foi apresentado à agência reguladora em 2013, com projetos mirabolantes, possivelmente inexequíveis, a exemplo do plantio de plantas medicinais nas pilhas e minas exauridas para suprir a indústria farmacêutica. Prevê também a construção de um novo hospital na cidade.
É o caso de se cobrar ainda a divulgação dos PFMs de 2018, assim como para que envolva a sociedade itabirana na elaboração do plano em elaboração para ser apresentado à agência reguladora em 2023.
Sem essa transparência, fica difícil acreditar nas boas intenções da empresa para fazer de Itabira um “case” de sucesso.
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Uai, enviou carta ao inimigo, a de NY. Tamo ferrado…
O que se espera é que a Itabira faça uma lista dos bens expropriados e o que decorrente do roubo seja reposto. Cartinha pro imperialismo é coisa pra inglês ver… É preciso maturidade, consciência e encontrar a pessoa certa pro balanço. É melhor ir pra maiame é vender o que sobrou…
Vou pra Rússia….