Aumenta a repressão global ao ativismo climático
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Pesquisa revela perigos crescentes e repressão ao ativismo climático globalmente. O Brasil teve o maior número, com 401 fatalidades, seguido pelas Filipinas com 298, Índia com 86 e Peru com 58
EcoDebate – Um novo relatório revelou os inúmeros riscos enfrentados por participantes de protestos climáticos e ambientais em todo o mundo — e como mais países estão criminalizando e reprimindo essas atividades em uma tentativa de controlá-las.
O relatório, liderado pela Universidade de Bristol, é o primeiro a examinar estatísticas globais sobre esse tipo de protesto e identificar tendências alarmantes. Ele mostra que mais de 2.000 manifestantes climáticos e ambientais foram mortos nos últimos 12 anos e que uma série de novas legislações antiprotesto foi promulgada.
O documento faz um apelo para que governos, forças policiais e o sistema jurídico ajudem a proteger o direito das pessoas à reunião pacífica e à liberdade de expressão.
“Esta pesquisa lança uma luz importante sobre como os protestos climáticos e ambientais crescentes estão sendo tratados globalmente. Nossas evidências mostram claramente uma repressão global tanto em democracias liberais quanto em autocracias”, observa um dos autores da pesquisa, Oscar Berglund, professor sênior de Políticas Públicas e Sociais Internacionais na Escola de Estudos Políticos da Universidade.
“Isso é preocupante porque foca as políticas estatais em punir a dissidência contra a inação em relação às mudanças climáticas e ambientais, ao invés de tomar medidas adequadas sobre essas questões. Também representa movimentos autoritários inconsistentes com os ideais de sociedades civis vibrantes em democracias liberais.”
Os resultados mostraram que assassinatos e desaparecimentos de ativistas climáticos e ambientais são comuns em muitos países, com a ONG internacional Global Witness relatando pelo menos 2.106 mortes entre 2012 e 2023. O Brasil teve o maior número, com 401 fatalidades, seguido pelas Filipinas com 298, Índia com 86 e Peru com 58.
De acordo com a pesquisa, uma proporção significativa de protestos climáticos e ambientais resultou em prisões. A maior proporção, de um em cada cinco protestos, foi registrada na Austrália, seguida por 17% no Reino Unido — muito acima da média internacional de 6,3%.
Manifestantes não violentos também têm recebido longas penas de prisão como forma de dissuasão. Por exemplo, neste ano, no Reino Unido, muitos ativistas climáticos foram presos, com a sentença mais longa sendo de cinco anos.
O relatório define os protestos ambientais como aqueles voltados para impedir projetos específicos ambientalmente destrutivos, como exploração e extração de combustíveis fósseis, desmatamento, construção de barragens ou mineração.
Já os protestos climáticos são descritos como eventos mais urbanos, que tendem a ter demandas políticas mais amplas, como o fim da exploração de petróleo, ou exigências políticas mais abrangentes, como a implementação de um Green New Deal.
Os pesquisadores analisaram dados do Armed Conflict Location & Event Data (ACLED) e da Global Witness para reunir informações globais e explorar tendências, além de novas legislações anti-protesto introduzidas em diferentes partes do mundo.
Foram identificadas quatro principais formas de criminalizar e reprimir protestos climáticos e ambientais: introdução de leis antiprotesto que criminalizam grupos, criação de novos crimes, aumento das punições para crimes existentes, ampliação dos poderes policiais e concessão de impunidade a agentes que prejudicam ativistas. O protesto também é criminalizado por meio de processos judiciais.
“Isso envolve o uso de legislações existentes, incluindo leis anti terrorismo ou contra o crime organizado, para reprimir protestos. Os protestos climáticos estão sendo despolitizados nos tribunais, proibindo menções às mudanças climáticas ou danos ambientais nos processos ou alterando os procedimentos judiciais para aumentar a probabilidade de condenação dos ativistas”, disse Berglund.
A terceira categoria é por meio da ação policial, realizada não apenas por agentes do Estado, como polícia ou militares, mas também por segurança privada, militares ou grupos do crime organizado. Isso inclui tentativas de impedir protestos usando revistas, prisões, violência física e ameaças e intimidações contra manifestantes.
“Talvez o mais chocante seja que encontramos assassinatos e desaparecimentos como algo comum em alguns países. De muitas formas, isso é uma extensão das ações policiais, pois são realizadas ou permitidas pelas mesmas autoridades, frequentemente após ameaças de morte e outras formas de intimidação”, denuncia Berglund.
O relatório faz diversas recomendações, incluindo que as autoridades públicas realizem avaliações regulares e publiquem dados demonstrando como suas ações ajudam a proteger o direito à reunião pacífica e à liberdade de expressão. Também solicita o fim do uso de legislações anti-terrorismo e contra o crime organizado contra ativistas climáticos e ambientais.
“Os marcos dos direitos humanos devem estar no centro das considerações e operações policiais para garantir que o público possa exercer seu direito ao protesto sem impedimentos ou medo”, assinala o pesquisador.
“Protestos climáticos e ambientais estão se tornando cada vez mais comuns, e por boas razões, à medida que a crise climática se agrava, e as respostas a essas atividades estão evoluindo rapidamente. Mais pesquisas são necessárias para compreender melhor a situação, de modo que medidas adequadas possam ser identificadas e implementadas para proteger os direitos humanos e garantir a segurança dos manifestantes”, recomenda o professor e pesquisador.
Referência: ‘Criminalisation and repression of climate and environmental protests’ by O. Berglund et al.
Fonte: University of Bristol