Assalto à casa do doutor Cornélio Penna
Infeliz noviciado da malandragem. Como um dos “três amigos” do dr. Cornélio se defende
Os “águias” incipientes revelam “grande queda” por antiguidades artísticas.
Um recado falso – os “amigos” do dr. Cornélio – em que os meliantes se revelam “artistas – a polícia terminou “fisgando-os” e apreendendo tudo.
O dr. Cornélio Penna, conhecido artista e jornalista, residente à praia de Botafogo n.70, é um apaixonado por antiguidades artísticas. Qualquer objeto antigo, ainda quando não tenha valor intrínseco, mas constitua uma preciosidade, pela sua origem ou idade, aquele ilustre colecionador os adquire, seja como for.
Por isso mesmo foi para ele uma surpresa dolorosa e desalentadora, a notícia de que audaciosos larápios tinham feito uma “limpa” na sua inestimável coleção. Mas o caso, só tem graça, se contado como sucedeu, isto é, pondo em chapa a “malandragem” dos “águias” que, diga-se de passagem, não foram lá muito hábeis, mesmo porque, incipientes, em pleno noviciado do crime.
Um recado que não foi do dr. Cornélio
O dr. Cornélio Penna é funcionário público. Daí, passa quase todo o dia fora de casa. Disso sabedores, anteontem, pela manhã, pouco depois daquele cavalheiro se retirar, os três gatunos, que se encontravam justamente, no momento oportuno de agirem, esfregaram as mãos de contentes. E, um deles recorrendo ao aparelho telefônico mais próximo, entrou logo em operação:
– Alô! Alô!
– É o Cornélio… Olha, devem ir aí três moços – são meus amigos que desejam apreciar a minha coleção de antiguidades. Receba-os e deixe-os à vontade, pois são pessoas de minha confiança…
Tal recado foi recebido pela governanta, que muito expedida e maneirosa, prontificou-se:
– Pois não, doutor; suas ordens serão fielmente cumpridas…
Os “amigos do dr. Cornélio
Um quarto de hora depois, três rapazes batem à porta da casa n. 70, em Botafogo. Era a residência do dr. Cornélio. E a governanta, ao primeiro sinal, veio-lhes ao encontro:
– São os amigos do dr. Cornélio, não é mesmo! Os senhores entrem e estejam à vontade, pois não!
Em que os “águias” se quedam pela antiguidade
Os moços entraram. Atravessaram algumas saletas, penetrando afinal, no gabinete-museu, do dr. Cornélio. Demoraram-se alguns quartos de horas.
– Este anel é lindo, heim?
– E esta charutaria de tartaruga?!
– Que belos alfinetes; pertenceram a Napoleão, o…
E os “meliantes” acompanhavam as exclamações com a respectiva “escamoteação” … Isto é, iam “aliviando” os objetos admirados…
Algum tempo depois, os moços se retiravam, avisando, antes à governanta:
– “Diga ao dr. Cornélio que em vista de não podermos esperá-lo, pela premência de tempo, voltaremos depois. Estamos otimamente impressionados com as antiguidades! Admiráveis!
A decepção do colecionador
À tarde, quando o dr. Cornélio regressou do trabalho, recebeu, de chofre, a notícia dolorosa e desalentadora:
– Os moços vieram, doutor. Atendi-os como me cumpria – distintamente.
– Que moços? Indagou surpreendido o artista para quem aquela história era estranha e confusa.
O senhor não telefonou avisando que eles vinham admirar seus objetos de arte?
Foi então que o dr. Cornélio caiu das nuvens. Dirigiu-se, imediatamente, ao seu “museu” e constatou que tinham levado entre outras coisas:
Um anel de bacharel; oito alfinetes de gravatas (antiguidade); um relógio Movado, de ouro com uma châtelaine do mesmo metal; uma charuteira de tartaruga; um binoculo; uma caixinha de madeira contendo uma tartaruga; oito fichas de madrepérola, para jogo, com trabalho chinês e escultura em baixo relevo, que pertenceram ao imperador d. Pedro II; um jogo de paciência chinês que pertenceu ao príncipe D. Luiz, etc.
A polícia “fisgou” os ladrões e apreendeu tudo
O dr. Cornélio Penna procurou, na mesma hora, o 4º. delegado auxiliar, formulando a necessária queixa. A autoridade encarregou o capitão Alberto, chefe de Seção de Roubos e Furtos, das necessárias diligências.
O capitão Alberto, auxiliado pelos seus prepostos, entrou em diligências, conseguindo, em pouco tempo, fisgar, em lugares diferentes, os três “águias”. São eles: Álvaro Nora, Antonio Gaspar da Silva e Luiz Gomes de Moraes, vulgo “Pó de Arroz”.
A polícia aprendeu todos os objetos que haviam sido vendidos por preços incríveis, e reintegrou os ao verdadeiro dono. [Diário Carioca (RJ), 18/1/1931. BN-Rio]
Infeliz noviciado da ladroagem
Como um dos “três amigos” do dr. Cornélio se defende
Noticiamos, em nossa edição de domingo, o roubo de que fora vitima o dr. Cornélio Penna, residente, na Praia de Botafogo, 70, cuja coleção de antiguidades foi admirada e por fim aliviada por trê amigos do…alheio.
Envolvido no caso, como um dos larápios, figura o rapaz Luiz Gomes de Moraes que foi, por isso mesmo, identificado criminalmente.
Entretanto, já agora, apurando a polícia que Moraes nada tem a ver com o caso, pô-lo em liberdade.
O mencionado moço trabalha no Cassino dos Oficiais, no 1º. Regimento de Cavalaria em S. Cristóvão.
Diz ele que conheceu há cerca de vinte dias, Antonio Gaspar, cujo verdadeiro nome é Waldemiro. Por intermédio deste, conheceu, há quatro dias, Álvaro Nova. Não sabia do crime e supunha até serem rapazes de bom comportamento.
E quando menos esperava, estando num café, em companhia dos dois, Moraes foi detido e com eles levado à polícia central.
Depois, não se apurando nada contra ele, foi posto em liberdade enquanto os outros, conduziram-nos à Casa de Detenção, onde estão recolhidos.
[Diário Carioca (RJ), 20/1/1931. BN-Rio – Pesquisa: Cristina Silveira]