Água e Sínodo da Amazônia
Por Flávio José Rocha1
Parte da floresta amazônica brasileira está sendo des-matada por grandes corporações do Canadá, da Europa, do Japão e dos Estados Unidos direta ou indiretamente. Algumas das companhias madeireiras terceirizam o serviço do des-mate para empresas brasileiras e assim podem escapar da fiscalização e das denúncias de des-matamento ilegal naquela área.
Comunidades são afetadas já que muitos dos seus habitantes sobrevivem da extração da borracha das seringueiras. Sem as árvores, não há trabalho para as famílias que acabam migrando para as favelas das grandes cidades como Manaus e Belém.
A exploração desequilibrada da natureza força as pessoas a deixarem não apenas o lugar onde cresceram, mas também uma maneira tradicional de viver na floresta que foi desenvolvida por gerações que fazem delas os Povos das Florestas e das Águas.
Cientistas também vêm demonstrado que a presença humana, iniciada com as migrações dos grupos originários, foi muito importante para o aumento da biodiversidade do bioma da Amazônia. Isso prova que o problema não é ter humanos vivendo nas matas, mas como eles interagem com o meio em que vivem.
Depois de des-matar e exportar a madeira, a terra recebe o pasto para o gado ou a plantação de soja. Ironicamente, o Brasil se tornou um dos maiores produtores de soja no planeta sem que a sua população brasileira seja uma consumidora desta leguminosa.
A floresta também está sendo ameaçada pela extração de minério. Multinacionais estão explorando os mais diversos tipos de minérios na Amazônia, principalmente no Pará, causando prejuízos às comunidades locais através da poluição das suas terras e dos seus rios e igarapés. Os produtos químicos jogados nestes mananciais levariam décadas para desaparecer se o trabalho de limpeza fosse iniciado agora, o que não é, infelizmente, o que está acontecendo.
Some-se aos problemas citados acima a construção das grandes barragens a exemplo de Belo Monte. Elas desviam o curso dos rios interferindo na vida aquática, causando mudanças no ecossistema local, além de deslocar milhares de pessoas causando grandes prejuízos na vida econômica dos moradores da região.
Não esqueçamos que 70% da água doce no Brasil está naquela região e existem muitas empresas do Mercado da Água de olho nos mananciais amazônicos. Com a onda de privatização das nossas águas, perder o controle sobre a Amazônia é uma questão de soberania para o nosso país.
Em meio a toda esta crise, o Sínodo da Amazônia acontece em Roma entre os dias 6 a 27 de outubro com delegados e delegadas de várias partes da Amazônia do Brasil e de outros países da região para discutir vários destes problemas. Será uma grande oportunidade para mostrar ao mundo porque pessoas como Chico Mendes e Irmã Dorothy Stang eram tão apaixonados pela sacralidade da Amazônia com milhões de espécies de animais e vegetais e pelos povos que lá habitam.
Será também uma oportunidade para chamar a atenção para o fato de que muitos políticos que estão no poder tomando decisões cruciais para aquela área do planeta não têm o conhecimento necessário para tal por não entenderem a dinâmica da natureza amazônica e, por causa disso, estão promovendo desastrosos projetos de des-envolvimento.
Por outro lado, há também certos ambientalistas que pregam o despovoamento naquela região como uma forma de preservá-la como se a Amazônia fosse um santuário intocável. São extremos que não respeitam com a realidade dos Povos das Florestas e das Águas e suas formas tradicionais de viver.
Estes Povos já dialogam com as tecnologias e sistemas modernos de produção sem desequilibrar o meio ambiente. Sem dúvida, o ideal é promover cada vez mais este diálogo sem imposição do poder econômico e interferência de “alienígenas” com os seus kits de ferramentas importadas com soluções mágicas. A autonomia daqueles Povos nas decisões sobre o lugar onde vivem é essencial para a preservação da Amazônia.
1 Flávio José Rocha é doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 08/10/2019