A quem interessa o sucateamento da Agência Nacional de Mineração

Foto: Divulgação

 Em carta aberta dirigida às autoridades e à população brasileira, servidores da Agência Nacional de Mineração (ANM), que tem a função de fiscalizar as atividades mineradoras do país, que, pelo histórico, embora sejam importantes para o bem-estar social da vida moderna, são altamente impactantes para os territórios minerados, principalmente em relação ao meio ambiente, chamam a atenção para o sucateamento da instituição reguladora, razão pela qual deflagrarão greve, a partir do dia 29 deste mês, para recompor perdas salariais e melhorias gerais das condições de trabalho. 

As consequências do sucateametno da agência reguladora do setor mineral são “VIDAS perdidas com rompimentos de barragens de mineração (Mariana e Brumadinho); aumento da atividade do consórcio do garimpo ilegal e do crime organizado, causando prejuízos aos povos originários e ao meio ambiente; perda de bilhões de reais em impostos e taxas de exploração mineral oriundos da incapacidade da ANM em fiscalizá-los; a ineficiência do estado na fiscalização de atividades de mineração de ouro levando à lavagem de dinheiro e à evasão de divisas, entre outras consequências.”

Leia a íntegra desse importante documento público, com denúncias de omissões que impactam profundamente a qualidade de vida em Itabira, que tem na mineração a sua principal atividade geradora de trabalho, impostos e renda, mas que também impacta a qualidade de vida com a poeira despejada sobre a cidade, o monopólio das outorgas de água, além do temor das imensas barragens de rejeitos de minério, com violações de direitos de moradores e o temor permanente dos riscos que representam para toda a população. (Carlos Cruz)

Das razões da greve da ANM

A Agência Nacional de Mineração (ANM), criada pela Lei nº 13.575/2017, é a sucessora legal do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), responsável pela outorga, fiscalização e regulação da mineração no Brasil, setor que contribuiu com 4 % do PIB em 2021.

A ANM é uma das 11 Agências Reguladoras do Governo Federal, conforme previsto no art. 2º da Lei nº 13.848/2019. Embora esteja incluída na Lei Geral da Agências Reguladoras, a ANM jamais foi tratada pelos Governos como as demais.

A ANM nunca foi estruturada para cumprir as suas atribuições determinadas em Lei, tendo recebido recentemente mais atribuições através da Lei nº 14.514/2022, sem qualquer alteração de sua Lei original, seja em relação à sua estrutura de cargos, à orçamentária, de pessoal ou capacidade física instalada.

Além do descaso de governos anteriores em criar uma Agência sem a mínima estrutura para cumprir as suas atribuições, a remuneração dos servidores da ANM não condiz com os valores pagos aos servidores das demais 10 outras agências reguladoras nacionais pois, apesar de possuir carreiras estruturadas criadas com a mesma estrutura de remuneração, hoje tem vencimentos em  média, 46% menores do que os das demais agências reguladoras para exercer atividades de idêntica natureza, grau de complexidade, periculosidade e responsabilidade.

Trata-se da maior distorção salarial existente entre carreiras semelhantes no Executivo Federal.

A situação da ANM chegou a um limite insustentável

Entramos no terceiro governo desde a sua criação e nenhum deles, até o momento, propôs uma solução para os problemas da ANM que são de amplo conhecimento dos gestores da agência, das instituições que representam o setor regulado, do Ministério de Minas e Energia, do executivo, do legislativo e do judiciário, corroborados por apontamentos da Controladoria Geral da União (CGU), do Ministério Público Federal (MPF), pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e, principalmente, pelo Tribunal de Contas da União (TCU)  que incluiu o capítulo “Estruturação da ANM”  na LISTA DE ALTO RISCO da administração pública federal, indicando grandes deficiências de estrutura e a insuficiência do número de servidores para atendimento das demandas da sociedade.

As consequências para a população brasileira são trágicas: VIDAS perdidas com rompimentos de barragens de mineração (Mariana e Brumadinho); aumento da atividade do consórcio do garimpo ilegal e do crime organizado, causando prejuízos aos povos originários e ao meio ambiente; perda de bilhões de reais em impostos e taxas de exploração mineral oriundos da incapacidade da ANM em fiscalizá-los; a ineficiência do estado na fiscalização de atividades de mineração de ouro levando à lavagem de dinheiro e à evasão de divisas, entre outras consequências.

Para o setor mineral regulado, que trabalha dentro da legalidade, o impacto também é direto: potencial de milhares de empregos não gerados pelos atrasos nos trâmites processuais de autorizações para lavra mineral (novos empreendimentos/minas); concorrência desleal com o garimpo ilegal e; risco jurídico por falta de normativos adequados, o que também ocasiona represamento de investimentos no país, dentre os principais efeitos.

Cabe ressaltar que, a cada mês, a capacidade de entrega da ANM para a sociedade brasileira tem sido gradualmente reduzida, devido à novas aposentadorias sem reposição do seu quadro e pedidos de licença e exoneração em busca de novas oportunidades na iniciativa privada ou, ainda, para ocupação de cargos em outros órgãos da administração pública.

Atualmente, apenas cerca de 30% das vagas previstas em lei estão ocupadas. A defasagem salarial da ANM fica escancarada ao se analisar que no concurso emergencial para fiscais de barragens realizados em 2021, menos da metade das vagas disponíveis foi preenchida, e em menos de um ano após a convocação dos aprovados, restaram 12 servidores das 40 vagas originais.

O salário dos profissionais da área da mineração pago pelo setor regulado é 50% superior aos valores pagos pela ANM. O vencimento inicial de um Especialista em Recursos Minerais da ANM é de apenas R$ 9.909,30. O salário médio pago pelo mercado para o mesmo profissional é de R$ 20.740,34[1].

Também é necessário destacar os impactos diretos na saúde dos servidores que restaram na ANM, com aumento expressivo de casos de “burnout” e outras doenças relacionadas à sobrecarga de trabalho. Os servidores bravamente se dedicam ao atendimento das demandas do setor e de toda a sociedade até o ponto que não há mais possibilidade de continuidade.

Ainda, os valores orçamentários destinados a estruturar a ANM e resolver a distorção remuneratória em relação as demais 10 agências na LOA 2023 (73 Milhões de reais) representam apenas três dias de arrecadação anual da Agência; ou de 1 a 3 dias do que se deixa de arrecadar, considerando as estimativas de sonegação.

Esses recursos, aprovados pelo Congresso Nacional foram vetados duas vezes seguidas pelo o atual governo na Lei Orçamentária Anual 2023, a primeira em janeiro. Agora, após aprovado novamente na apreciação do PLN2/2023 pelo Congresso Nacional, foi novamente vetado, em 28/04/2023 sob a justificativa:

““Em que pese a boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, na medida em não considera o provável impacto no conjunto dos demais planos, carreiras e cargos já existentes, a fim de evitar o aumento nas distorções entre os mesmos e possíveis disfunções em sua gestão

Com a devida vênia, em que pese a intenção do Ministério de Gestão e Inovação em Serviços públicos justificar que a correção da distorção mais grave existente entre todas as carreiras do serviço público federal poderia gerar uma distorção, entendemos que não existe qualquer racionalidade lógica em tal argumento. Inclusive não existe nenhum órgão que esteja listado em uma lei geral em conjunto outros semelhantes, como o que ocorre na lei geral das Agências, que as carreiras dos mesmos não tenham a mesma remuneração.

A proposta parlamentar considerou o nivelamento em consonância com a estrutura remuneratória dos diferentes cargos e vínculos, não havendo nenhuma inovação ou diferenciação do modelo remuneratório vigente nas demais 10 agências.

Não existe qualquer motivo que justifique a diferenciação prevista no art. 9, da Medida Provisória que trata das carreiras das agências reguladoras com a do art. 39, que trata das carreiras da ANM. A ANM é uma agência reguladora que está listada no art. 2° da Lei geral das agências, Lei nº 13.848, de 25 de junho de 2019. O objetivo daquela emenda era justamente corrigir essa, que é a maior distorção de todas.

Considerando todos os argumentos acima expostos, os servidores da ANM decidiram em Assembleia distrital/Regional nacional unificada, realizada no dia 10/05/2023 aprovada pela ampla maioria dos presentes, a decretação de indicativo de greve a partir do dia 10/05/2023, com início efetivo da greve previsto para o dia 29/05/2023.

As reivindicações dos servidores da ANM, visando resolver a situação insustentável e caótica da autarquia especial, são as seguintes:

  • Correção da remuneração distorcida entre a Agência Nacional de Mineração (ANM) e as demais 10 Agências Reguladoras Nacionais: Alinhamento salarial das carreiras da ANM com as demais 10 Agências Reguladoras, respeitando o modelo remuneratório vigente;
  • Reforço na estrutura de cargos: Aumento de unidades DAS para 699 unidades, em patamar semelhante às das demais Agências Reguladoras, que se configurarão em até 95 novos cargos;
  • Recomposição do quadro de pessoal: Concurso público da ANM para preenchimento das 1.400 vagas não ocupadas (aproximadamente), após o nivelamento e estruturação da agência;
  • Reforço no Orçamento: Repasse integral da CFEM, no valor de 7% da arrecadação anual, conforme previsto na Lei nº 13.540/2017, art. 2º;
  • Reforço ao setor mineral: Reformulação do Fundo Nacional da Mineração (FUNAM), conforme previsto na Lei nº 14.514/2022, de conversão da MP 1133/2022 – arts. 14 a 18, vetados pelo governo anterior.

 Do direito à greve aos trabalhadores da ANM

A Greve é um direito de todos os trabalhadores, assegurado na Constituição Federal de 1988 (Art. 37, VII e at. 9º) a empregados da iniciativa privada e servidores públicos das três esferas de poder. A Lei de greve estabelece regras para o movimento de paralização do trabalho. A todos os trabalhadores é assegurado o direito de não ser demitido em razão de adesão à greve.

DA SÚMULA 316 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: “O Servidor Público não pode sofrer penalização pela simples participação em greve”. Nos termos da Súmula 316 do STF fica disposto que: “A simples adesão à greve não constitui falta grave”. Isto significa que é entendimento pacífico da mais alta corte brasileira que o servidor público não pode ser demitido em razão de mera adesão à greve de servidores.

Este entendimento aplica-se a todos os tipos de vínculos de servidores com a Administração Pública, a saber:

– Aos servidores ocupantes de cargos efetivos estáveis;

– Aos servidores em estágio probatório;

– Aos servidores contratados em caráter emergencial.

Sendo assim, o SINAGÊNCIAS informa ao Governo Federal e à população brasileira que seguirá todos os ritos legais para a realização da greve dos servidores da ANM, e irá agir proativamente e incansavelmente na defesa dos direitos dos servidores, de modo que nenhuma penalização recaia aos mesmos pelo simples exercício de seu direito constitucional.

Reforçamos que todo trabalhador tem direito de adesão à greve, em qualquer tempo, sem que sofra prejuízos de retaliações ilegais. Lutaremos, ainda, pela garantia de que uma decisão pelo corte do ponto dos servidores somente ocorra nos casos em que não for possível a reposição das horas/entregas devidas em condições justas para todos, após a negociação pelo fim da greve.

 Do apoio da população brasileira e do setor mineral

Por fim, o SINAGÊNCIAS e os servidores da ANM solicitam o apoio de todos os  cidadãos brasileiros e que atuam ou dependem do setor mineral à greve dos trabalhadores da ANM, pois a falta de estruturação de uma Agência tão relevante para o bem-estar da sociedade brasileira, que tanto carece de melhorias de infraestrutura (recuperação das estradas existentes e construção de novas estradas e moradias), assim como da manutenção e do crescimento da agricultura que está diretamente relacionada às atividades de mineração, e tantos ramos da indústria (alimentícia, farmacêutica, eletrônica, outras) traz consequências graves para o desenvolvimento e crescimento econômico do Brasil.

Além disso, a transição energética depende substancialmente dos minerais críticos, sejam em painéis solares a baterias elétricas. Nossa luta não é apenas por um salário justo, é muito maior: por condições de trabalho, por uma ANM forte, capaz de cumprir sua missão institucional, fomentar o setor mineral, fiscalizar a ilegalidade, proteger vidas e o meio ambiente.

Sabemos que uma greve sempre traz prejuízos a todos. Portanto, desde já, pedimos desculpas pelos impactos negativos que este movimento dos servidores da ANM pode causar à sociedade brasileira. Conforme os fatos descritos nesta Carta, devido à falta de estruturação da ANM por parte do Executivo Federal, não restou outra alternativa aos seus servidores.

Contamos com seu apoio, e deixamos para reflexão: a quem interessa o sucateamento da ANM?

SINAGÊNCIAS

ASANM

Comando de Mobilização da ANM

Comando de Mobilização da ANM

[1]https://querobolsa.com.br/cursos-e-faculdades/engenharia-de-minas-e-energia/quanto-ganha-engenheiro-de-minas-salario

 

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