A cidade de Sudbury, no Canadá, é exemplo para Itabira de como se deve negociar e cobrar da Vale
Carlos Cruz
O professor Dagoberto Almeida, reitor da Universidade Federal de Itajubá (Unifei), disse, por ocasião da solenidade de assinatura de convênio com a Vale e a Prefeitura de R$ 100 milhões para expandir o campus universitário local, na terça-feira (22), que Itabira pode aprender com a cidade de Sudbury, (província de Ontário, Canadá), como se deve negociar seus direitos e projetos de sustentabilidade com a mineradora.
Em Sudbury, a Vale explora a mina de Totten, onde extrai cobre, níquel e metais preciosos. O reitor disse também que a Unifei está para fechar parceria com a Laurentian University, com a qual tem similaridade pelo foco comum na área de engenharia.
Mas também pelo fato de a universidade canadense participar junto com o governo local e mineradoras, entre as quais a Vale que é a maior da província, de vários projetos importantes para a diversificação econômica e melhorias ambientais, o que teria tornado Sudbury, que já foi considerada a mais degradada pela mineração na província de Ontário, na “cidade mais feliz do Canadá.”
“A universidade, há 30 anos, participou do desafio da diversificação econômica de Sudbury, como Itabira está enfrentando hoje”, contou o reitor. Segundo ele, por ter sido uma cidade extremamente degradada, Sudbury acabou virando laboratório de pesquisas de reabilitação ambiental.
“A parceria que estamos fazendo com a Laurentian University é também para compartilhar essa experiência com Itabira”, adiantou Dagoberto Almeida. ”Estamos vivendo um processo de internacionalização de nossa universidade. Sudbury tem um compromisso sério com a educação, a ciência e a tecnologia que Itabira precisa conhecer”, recomendou.
Dagoberto disse que já encaminhou ao prefeito Ronaldo Magalhães (PTB) convite do prefeito da cidade canadense para que uma comitiva itabirana visite Sudbury . Será, segundo o reitor, uma oportunidade de se conhecer os investimentos que foram feitos com a participação da mineradora Vale, também em parceria com o governo local e a Laurent University.
Testemunho
A convite da Unifei, o professor Markus Timusk, coordenador dos cursos de engenharia da Laurentian University, esteve em Itabira para participar da solenidade de assinatura do novo protocolo de intenção, que repactua a parceria público-privada para expansão do campus local.
De acordo com o professor Timusk, a relação harmoniosa com a mineração nem sempre foi constante na história de Sudbury. Com 160 mil habitantes, a cidade convive com a mineração há 100 anos. E, assim como em Itabira, os estragos ambientais foram imensos, com a poluição dos lagos da província.
Foi a partir da cobrança da sociedade que se constituiu uma parceria público-privada entre a Vale, governo e universidade, o que possibilitou, por exemplo, despoluir o lago Sandy Pond , onde a mineração havia despejado 400 mil toneladas de dejetos, de acordo com denuncias de organizações locais.
“A água desse lago estava morta e com a conjunção de esforços da província, da Vale e da universidade ela foi descontaminada. Hoje o turismo é forte na região”, afirmou o professor Timusk.
Antes, a relação da cidade com a mineradora era conflituosa, como ocorre em Itabira, assim como em outras cidades pelo mundo, e que posteriormente se tornou harmoniosa pelos resultados das parcerias. Leia também aqui.
“A fragilidade e a dependência de Sudbury no passado era tão grande que na cidade tinha um ditado que dizia assim: a mineração tira a nossa riqueza e a cidade acaba ficando com os buracos’”, acentuou o professor Markus Timusk. “Hoje Sudbury é reconhecida como uma cidade feliz.”
De acordo com o professor canadense, atualmente a cidade já dispõe de uma econômica diversificada que convive com a mineração, mas sem depender da variação dos preços das commodities. “A Vale teve um papel importante na recuperação ambiental e na diversificacação da economia de Sudbury”, admitiu Markus Timusk.
Exemplo
Dagoberto Almeida diz que, a exemplo do que ocorre em Sudbury, Itabira pode diversificar a sua economia e reabilitar áreas degradadas já de imediato, ainda convivendo com a plena operação extrativista da Vale na cidade, antes mesmo da inexorável exaustão de suas minas a partir de 2028.
“Com a expansão do campus universitário e o desenvolvimento do Centro Científico e Tecnológico, juntamente com a recuperação das áreas degradadas, daqui algum tempo é perfeitamente possível ter uma Itabira feliz, como é atualmente a cidade de Sudbury”, é o que acredita o reitor da Unifei.
O diretor-regional de Sustentabilidade da Vale, Sérgio Leite, admitiu ser possível repetir a experiência canadense em Itabira – e até fazer melhor, mesmo com a situação que vive a mineração no país.
“Com a participação da sociedade itabirana devemos fazer no mínimo igual ao que foi feito em Sudbury. A Vale não deixa Itabira, posso assegurar. Aqui nascemos e crescemos. Vamos construir um momento diferente na cidade”, comprometeu-se o executivo da mineradora
Sérgio Leite participa do comitê de negociações com o município, instituído pelo prefeito Ronaldo Magalhães, já tratando, ainda que o nome não seja designado, do descomissionamento da minas de Itabira.
O que se espera é que não seja mais uma promessa vã, como foram tantas outras no passado.
Mudanças no relacionamento da Vale no Canadá ocorreram com muita pressão da sociedade
Nem sempre a relação da Vale com Sudbury foi “harmoniosa” e colaborativa. No passado recente, a empresa poluía a cidade com emissão de gás com dióxido de enxofre.
Com a pressão da sociedade, do governo e também da justiça local, há dez foram instalados equipamentos de última geração que impedem a liberação do gás para o meio ambiente. Trata-se do projeto denominado Clean Atmospheric Emissions Reduction (AER), que segundo informa a mineradora, teve a sua implantação finalizada neste mês com sucesso.
A relação trabalhista também começou tumultuada assim que a Vale adquiriu a mina de Totten. Em decorrência, entre 2009 e 2010 os mineiros de Sudbury deflagraram a maior greve da história do Canadá, que durou 12 meses.
Em 2012 a “gigante da mineração Vale” foi acusada, em Sudbury, de violar a Lei da Pesca. Além disso, segundo informa a Infomoney, publicação especializada voltada para o mercado, as operações canadenses da mineradora sofreram uma série de incidentes de segurança nos últimos anos.
Em agosto daquele ano, um vazamento de dióxido de nitrogênio ocorreu em sua usina de cobre Copper Cliff, em Sudbury. Provocou uma nuvem amarela, forçando a empresa a declarar situação de emergência. Não houve feridos.
Em 2013, a Vale foi multada em US$ 1,05 milhão canadenses por um incidente que matou dois trabalhadores na mina Stobie, também em Sudbury.
Em abril de 2014 outro trabalhador morreu em uma planta de Copper Cliff. Em março deste ano, o governo da província de Ontário apresentou cobranças contra a Vale relacionadas à saúde e à segurança de seus trabalhadores.
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Com as mudanças no relacionamento com a sociedade e autoridades canadenses, vários prêmios de reconhecimento têm sido concedidos à mineradora Vale.
Foi assim que no início de maio deste ano, a equipe de Meio Ambiente de Sudbury recebeu o prêmio de Excelência Ambiental para Mineração Sustentável (TSM), da Associação Mineira do Canadá (MAC).
Lisa Lanteigne, gerente de Meio Ambiente, recebeu o prêmio durante cerimônia na Convenção CIM 2018 em Vancouver.
O prêmio foi bastante festejado pela mineradora, tendo sido considerado “uma grande conquista, que reflete um dos nossos principais valores, que é ‘Cuidar do nosso Planeta’”.
A premiação foi concedida à Vale no campo da biodiversidade na cidade de Sudbury, “que se concentra nos esforços de regeneração e recuperação para transformar terras e cursos d’água de volta aos seus estados naturais.”
Confira alguns números do projeto da Vale em Sudbury, segundo informa a mineradora
- Cultivo de mais de 300 mil árvores em nossa estufa anualmente para o plantio em toda a cidade de Sudbury.
- Investimento de U$ 250.000 e doação de 50 mil mudas de árvores anualmente para o Plano de Ação de Biodiversidade da Cidade de Sudbury.
- Promoção da polinização com abelhas de nossa propriedade Smelter ao longo da Rodovia 55 em Sudbury e plantio de serralha para borboletas monarcas, que são ótimas polinizadoras.
- Semeio de centenas de acres a cada ano por via aérea através de um programa de semeadura aérea que recuperou aproximadamente 8.000 acres desde 1990.
- Aumento e liberação de mais de 100.000 peixes até hoje em canais locais por meio de um amplo programa de estocagem de peixes.
Muito bom o artigo. E é claro que uma parceria da prefeitura com a Universidade Unifei e a de Sudbury é importante; é nas universidades é que se faz ciência. E ao Canadá deve ir uma comitiva de Itabira composta de professores, jornalistas e sobretudo o Comitê dos Atingidos pelas Barragens. A CVRD/Vale, tem uma dívida histórica (este sítio não cansa de publicar o tema) para com Itabira e só uma modo de rever o que ela deve à Cidade: levando o caso a corte internacional, dado que a justiça brasileira não é confiável em se tratando de Justiça.
Excelente reportagem. Itabira tem a mais antiga e uma das maiores operações da VALE e abriga uma importante universidade de base tecnológica. Tem a conjugação perfeita e a vocação natural para se tornar um grande centro de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico sobre sustentabilidade na mineração.
Com essa mineradora pestilenta?
Quero acreditar…