Judeus e cristãos-novos na criação e colonização do Sul do Brasil

7ª parte

Mauro Andrade Moura

A Inconfidência Mineira

FALA AOS INCONFIDENTES MORTOS

TREVA da noite,

lanosa capa

nos ombros curvos

dos altos montes

aglomerados…

Agora, tudo

jaz em silêncio:

amor, inveja,

ódio, inocência,

no imenso tempo

se estão lavando…

Grosso cascalho

da humana vida…

Negros orgulhos,

ingênua audácia,

e fingimentos

e covardias

(e covardias!)

vão dando voltas

no imenso tempo,

– à água implacável

do tempo imenso,

rodando soltos,

com sua rude

miséria exposta…

 

Parada noite,

suspensa em bruma:

não, não se avistam

os fundos leitos…

Mas, no horizonte

do que é memória

da eternidade,

referve o embate

de antigas horas,

de antigos fatos,

de homens antigos.

E aqui ficamos

todos contritos,

a ouvir na névoa

o desconforme,

submerso curso

dessa torrente

do purgatório…

Quais os que tombam,

em crime exaustos,

quais os que sobem,

purificados?

FIM DE “ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA”

Cecília Meireles 

Inconfidência, 1969. Di Cavalcanti-Óleo sobre tela.(Acervo da Caixa Econômica Federal)

A partir do declínio da produção do ouro, a chegada do Marquês de Pombal ao governo, iniciou-se a derrama ou a cobrança do “quinto do ouro” com maior rigor. Faltava o providencial ouro para se manter a administração colonial e sempre fora constatado os muitos desvios da produção.

Sentindo a total dificuldade em manterem suas explorações nas minas de ouro e diamantes, os mineiros passaram a desejar se verem livres do domínio da Coroa portuguesa e com o advento do Iluminismo francês, criaram o movimento hoje conhecido como Inconfidência Mineira e reprimida em 1789.

 

Agora, para que não se diga que é improprio de um bispo

fazer proclamações militares, convêm e é de nosso dever

exhortar-vos a um procedimento christão.

Sabeis que muitos soldados se têm santificado mesmo

no meio das armas, e no tumulto das batalhas;

soldado foi S. Sebastião, soldado S. Martinho,

  1. Maurício, S. Cândido, Santo Exuperio,

e os milhares de Martyres da Legião Thebêia,

que derão a vida por não quebrarem

o 1º mandamento da lei de Deos.

Si sempre devemos estar prontos para aparecer

no divino tribunal, quanto mais no meio das balas,

das baionetas e dos torpedos!

  1. Pedro Xavier da Veiga, Ephemerides mineiras; 1664-1897, Ouro Preoto, Imprensa Official, 1897, 4 v. p. 158-160.

O pressuposto para participar do movimento de libertação era ser membro da maçonaria, esta que carrega como um dos símbolos o “Templo de Salomão”.

Porém, podemos pressupor que o elo ancestral dos inconfidentes mineiros era exatamente por serem descendentes de cristãos-novos.

Maçonaria esta que foi iniciada pelos artífices de origem judia, os ourives, os ferreiros e demais que deixaram suas marcas indeléveis na formação de nossa gente, nossa terra.

Praça Tiradentes, Ouro Preto

Neste aspecto entre as ligações familiares judias dos inconfidentes, notamos que o sistema adotado para o conhecimento da pressuposta revolta, ipsis literis, foi exatamente o mesmo que o tribunal do santo ofício adotava para a aplicação da santa inquisição católica em suplantar, até mesmo suprimir e chegando a extinguir, os judeus sefaraditas dentro dos impérios ibéricos (o de Portugal e o de Espanha), que compreendia boa parte do globo terrestre naquela época.

A inquisição católica no mundo português perdurou por praticamente trezentos anos, conseguindo o seu intento com precisão, pois simplesmente deixou de existir qualquer reverência ou manifestação ao judaísmo.

Passados quase duzentos anos da extinção da santa inquisição católica no império português, por decreto de D. João VI em 1821, o Brasil retoma com o sistema utilizado pelo tribunal do santo ofício ao adotar a tal de “delação premiada”, que nada mais é do que o próprio Joaquim Silvério dos Reis fez com Joaquim José da Silva Xavier e demais inconfidentes, entregou-o para se ver livre das barras dos tribunais e da derrama da cobrança do quinto do ouro.

 

Vestíbulo e escadaria da Casa dos Contos, em Ouro Preto

São palavras no chão

e memórias nos autos.

As casas inda restam,

os amores, mais não. 

E restam poucas roupas,

sobrepeliz de pároco,

a vara de um juiz,

amigos, púrpuras, ecos.

Macia flor de olvido,

sem aroma governas

o tempo ingovernável.

Muitos pranteiam. Só.

 Toda história é remorso.

Carlos Drummond de Andrade – Claro enigma, 1951

Dos inconfidentes, citamos: 

-Cláudio Manoel da Costa, que também era “Alvarenga”, considerado o mentor. Sendo este descendente do cristão-novo Antônio Rodrigues de Alvarenga;

-Inácio José de Alvarenga Peixoto, primo do Cláudio Manoel, portanto, também descendente do cristão-novo Antônio Rodrigues de Alvarenga;

– Luiz Vaz de Toledo Piza, desdente do cristão-novo Antônio Vaz Guedes;

– Padre Carlos Corrêa de Toledo e Mello, irmão de Luiz Vaz;

– Salvador Carvalho do Amaral Gurgel, descendente dos cristãos-novos Amaral Gurgel do Rio de Janeiro;

-José Lopes de Oliveira, da família Calmon Nogueira da Gama de origem também sefaradita;

-José Álvares Maciel, descendente do Bandeirante e cristão-novo Fernão Dias Paes Leme e Maria Roiz Betinik (Beting);

– Capitão João Dias da Mota; descendente dos cristãos-novos Motta da cidade de São Vicente – SP e também de Martim Afonso de Sousa;

-José Sá Bittencourt e Accioli, de ascendência sefaradita;

– Carlos Correia de Toledo e Melo – Padre Toledo, descendente dos Toledo Piza;

Soldado do Regimento de Cavalaria de Minas do final do século XVIII

-José Joaquim Maia e Barbalho, de alcunha o Vendek, dos cristãos-novos Barbalhos que chegaram primeiramente no Recife e depois migraram para o Rio de Janeiro;

– Joaquim José da Silva Xavier, o mártir Tiradentes, esse que também era descendente dos cristãos-novos Motta da cidade de São Vicente – MG e também de Martim Afonso de Sousa.

E Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira, casada com o inconfidente Inácio José de Alvarenga Peixoto, além de descendente do Carlos Pedro da Silveira, também descendia do cristão-novo Antônio Rodrigues de Alvarenga.

Marília de Dirceu/IV/I

É gentil, é prendada a minha Altéia;
As graças, a modéstia de seu rosto
Inspiram no meu peito maior gosto
Que ver o próprio trigo quando ondeia.

Mas, vendo o lindo gesto de Dircéia
A nova sujeição me vejo exposto;
Ah! que é mais engraçado, mais composto
Que a pura esfera, de mil astros cheia!

Prender as duas com grilhões estritos
É uma ação, ó deuses, inconstante,
Indigna de sinceros, nobres peitos.

Cupido, se tens dó de um triste amante,
Ou forma de Lorino dois sujeitos,
Ou forma desses dois um só semblante.

Tomás Antônio Gonzaga

Breve comentário da historiadora Deolinda Alice dos Santos a respeito de Ouro Preto a partir do minuto 14:00=

https://www.youtube.com/watch?v=0fRucmnCSBA

Escudo do Quartel do Regimento de Cavalaria Regular em Cachoeira do Campo

…”Desgraçadamente, ainda, nos fastos dessa unidade que é hoje o Terceiro Regimento de Cavalaria do Exército, ficaria esquecido ou ignorado que das suas fileiras saíram duas figuras empolgantes de heróis e mártires.

Esses dois precursores da Independência e da República foram o tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrada, seu comandante, glorioso Inconfidente, e o mártir sagrado do civismo, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

Nas fileiras dessa história unidade militar foi soldado, cabo, sargento, e alferes o ínclito Tiradentes.

Nascendo entre as armas desse regimento a ideia redentora do Brasil, quis a Providência Divina, por singular ironia, que, quando o neto de D. Maria I se rebelou contra a metrópole para executar os desígnios da Inconfidência de Minas Gerais, tivesse ao seu lado, garantindo-lhe a eficiência do gesto, os soldados dos esquadrões de Tiradentes.”…

Trecho do livro A Capitania das Minas Gerais, do Augusto de Lima Júnior

Fim!

 

 

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8 Comentários

    1. Bem, Elisa.
      O Prof, José Gonçalves Salvador citou muito bem o Gaspar Vaz Guedes casado com a Francisca Cardoso com suas possibilidades de ser cristão-novo.
      Leia em ver Os Cristãos-Novos povoamento e conquista do solo brasileiro pág. 141, 252 e 253.
      O historiador Marcelo Bogaciovas também o citou em sua tese de mestrado e em seu livro a respeito dos Cristãos-novos em São Paulo.
      Leia em: os Cristãos-novos em São Paulo pág. 256

      Grato pela leitura,
      Mauro

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