Itabira está cercada por pilhas de estéril/rejeito, além das barragens; Codema cobra explicações da Vale sobre riscos de deslizamento

Pilha de Depósito de Esteril Canga

Fotos: Carlos Cruz

Conselho Municipal de Meio Ambiente solicitou esclarecimentos da mineradora após o deslizamento de uma pilha em Conceição do Pará. Vale afirma que estruturas em Itabira são estáveis e seguem normas internacionais de segurança

O engenheiro geotécnico Elder Ribeiro, da Gerência de Geologia da Vale, afirmou na sexta-feira (12), durante reunião do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema), que todas as estruturas novas a seco e antigas de pilhas de estéril/rejeito, “estão estáveis, sem qualquer patologia estrutural ou movimentação em andamento”.

A declaração foi feita em resposta ao convite do órgão ambiental, que solicitou esclarecimentos sobre as pilhas de estéril e rejeito a seco instaladas em Itabira, após o deslizamento de uma estrutura semelhante em Conceição do Pará, que desalojou cerca de 250 moradores.

O conselheiro da Vale no Codema, Breno Brant, apresentou as medidas de controle de poeira nas pilhas, enquanto o engenheiro Elder Ribeiro detalhou os procedimentos de monitoramento e estabilidade das estruturas de estéril e rejeito: sem questionamentos

O episódio que motivou o convite ao Codema ocorreu em 7 de dezembro de 2024, na Mina Turmalina, operada pela Mineração Serra Oeste (Jaguar Mining), no município de Conceição do Pará.

Na ocasião, o deslizamento de uma pilha de rejeitos de ouro atingiu a comunidade rural de Casquilho de Cima, forçando a evacuação de mais de 300 moradores e a interdição de 160 residências.

Em decorrência, o Ministério Público de Minas Gerais firmou um acordo com a empresa para reparação dos danos, incluindo o pagamento de R$ 42 milhões, implantação de sistema de videomonitoramento 24h e auditoria técnica independente.

“Características são distintas”
Sobre a cava exaurida da mina Cauê surge nova pilha de estéril/rejeito, quem sabe com a Vale restituindo o antigo pico

Segundo o engenheiro da Vale, as pilhas estéril/rejeito operadas pela empresa em Itabira possuem características geotécnicas distintas. “Além de serem constituídas por materiais diferentes, nossas pilhas passam por compactação técnica, drenagem controlada e monitoramento contínuo. A engenharia aplicada aqui é muito mais robusta”, garantiu.

Itabira conta atualmente com 14 estruturas dessa natureza geotécnica, sendo 12 pilhas de estéril e duas pilhas a seco de estéril compactado. Conforme explicou Ribeiro, as pilhas de estéril armazenam o material sem valor econômico extraído da rocha (solo, brita e fragmentos) – e são formadas por meio do depósito sucessivo desse material, transportado por caminhões fora de estrada e espalhado com o auxílio de tratores de esteira e escavadeiras.

Diferentemente das pilhas de rejeito seco, essas estruturas não exigem compactação técnica controlada, ou seja, o material não passa por testes de densidade ou umidade para garantir resistência mecânica.

Segundo nota técnica da própria Vale, essas pilhas são consideradas estruturas de aterro, constituídas por material compactado naturalmente, sem o mesmo rigor exigido para estruturas críticas como barragens ou pilhas de rejeito. Ainda assim, são monitoradas continuamente, com atenção especial à estabilidade dos taludes, drenagem superficial e controle de erosão.

Já as pilhas de rejeito seco, como as que recebem o material filtrado das usinas de beneficiamento de minério de ferro Cauê e Conceição, exigem um processo mais rigoroso. “Essas pilhas passam por ensaios laboratoriais, controle de umidade, compactação em camadas e instrumentação geotécnica. São estruturas de alta complexidade e exigem inspeções regulares”, afirmou o engenheiro.

Ainda de acordo com ele, todas as pilhas seguem normas internacionais de segurança, como o GCMS (Ground Control Management System), já que a Agência Nacional de Mineração (ANM) ainda não possui regulamentação específica para esse tipo de estrutura. A Vale informou ainda que a ANM deve abrir consultas públicas em 2026 ou 2027 para tratar do tema.

Trecho da pilha de depósito de estéril Canga, visto da rodovia antes da barragem Itabiruçu

Monitoramento

O engenheiro Elder Ribeiro informou que a Vale mantém um Centro de Monitoramento Geotécnico (CMG), que acompanha em tempo real as condições das pilhas e barragens, utilizando sensores como piezômetros, inclinômetros, medidores de recalque e vazão. “Todas as estruturas passam por inspeções periódicas e são avaliadas por equipes técnicas independentes”, acrescentou.

“A maior parte dessas pilhas já está inativa e em processo avançado de revegetação. Algumas têm mais de 30 anos e já estão tão integradas ao ambiente que não parecem mais estruturas de mineração”, disse Ribeiro. “O tempo médio para estabilização de uma pilha é de três a cinco anos.”

Após a exposição do material, inicia-se o processo de revegetação com espécies nativas cultivadas em viveiro próprio da Vale. “A gente coleta as sementes antes da supressão da vegetação, desenvolve as mudas e reintroduz na mesma área. A intenção é sempre devolver à natureza o que foi retirado”, explicou o engenheiro Breno Caldeira Brant, conselheiro da Vale no Codema.

De acordo com ele, a empresa também realiza inventário das espécies suprimidas e aplica medidas compensatórias conforme critérios técnicos. “Em áreas de vegetação rara ou ameaçada, a compensação pode exigir replantio em escala ampliada.”

Controle de poeira nas pilhas
Taludes expostos, sem cobertura vegetal ou aplicação de polímeros, tornam-se fontes de poeira, agravada pela movimentação constante dos caminhões fora de estrada

Questionado sobre o controle de poeira nas pilhas, Brant explicou que são utilizadas biomantas, polímeros verdes e umectação com água, aplicados ao longo das pilhas, nas faces expostas ainda sem revegetação. “O controle é contínuo e adaptado à geometria da pilha. A gente sabe que está funcionando porque conseguimos ver os resultados no campo”, afirmou.

A emissão de particulados finos é uma preocupação recorrente em Itabira, onde a qualidade do ar já sofre há décadas os impactos da atividade mineradora. Diante disso, o Codema deve agendar uma nova apresentação da Vale especificamente sobre o controle de poeira nas minas.

Essa prestação de contas, aliás, deveria ocorrer de forma sistemática ao menos duas vezes por ano: no início da estiagem, com a apresentação das medidas preventivas adotadas, e ao fim do período seco, já com o início das chuvas, para avaliar os resultados e impactos das ações implementadas.

Codema quer mais transparência

Apesar da apresentação técnica ter sido considerada satisfatória pelos conselheiros, que pouco perguntaram, a secretária municipal de Meio Ambiente, Elaine Mendes, reforçou a necessidade de transparência e fiscalização contínua. “Estamos cercados por estruturas que exigem atenção constante. O que aconteceu em Conceição do Pará não pode se repetir aqui”, afirmou a secretária, que também preside o Codema.

A expectativa é que a ANM avance na regulamentação das pilhas de estéril e rejeito nos próximos anos. Enquanto isso, o Codema e a sociedade civil de Itabira precisam seguir atentos, cobrando da mineradora não apenas dados técnicos, mas garantias de que a cidade não será palco de mais um desastre com deslizamento de pilhas e ou mesmo de barragens.

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