Queda na produção e no preço do minério afeta arrecadação e acende alerta para futuro incerto em Itabira

Foto: Carlos Cruz

Nos quatro primeiros meses deste ano, Itabira registrou uma queda expressiva na arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem), os royalties do minério. O recuo é resultado da menor produção de minério de ferro no complexo minerador local e da desvalorização da commodity no mercado externo.

A arrecadação deste ano, nesse primeiro quadrimestre, caiu R$ 75 milhões em comparação ao mesmo período do ano passado. Em 2024, Itabira arrecadou R$ 104,9 milhões de Cfem, enquanto em 2025, no mesmo período, esse valor ficou em apenas R$ 75,1 milhões, segundo relatório da Agência Nacional de Mineração (ANM).

Essa redução está diretamente ligada à menor extração no complexo minerador local, cuja capacidade nominal é de 50 milhões de toneladas anuais (Mta).

No entanto, devido à baixa qualidade dos itabiritos compactos e dificuldades na extração e beneficiamento, a produção tem caído gradativamente.

Com as dificuldades, o complexo de Itabira produziu cerca de 28 Mta em 2024, registrando leve recuperação em relação a 2023. Entretanto, a tendência é de estabilização em 25 Mta nos próximos anos, com quedas progressivas.

Segundo o relatório Form-20  da Vale, enviado à Bolsa de Nova Iorque, as reservas de Itabira devem se esgotar em 2041, caso não sejam viabilizadas novas soluções para a extração e beneficiamento de recursos.”

Arrecadação mantém viés de queda

Apesar da menor produção, o impacto ainda não se reflete na arrecadação do Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o que deve ocorrer a partir de 2026.

Isso ocorre porque o cálculo do repasse do ICMS aos municípios segue critérios da Lei Complementar 63/90, que destina 25% do total arrecadado pelo Estado aos municípios, considerando a produção e venda de minério de ferro dos dois anos anteriores. Ou seja, os valores de 2025 ainda refletem os resultados de 2023 e 2024.

Com isso, a administração municipal já adota medidas para contenção de despesas, prevendo a queda na arrecadação também do ICMS e a necessidade de novo planejamento para evitar prejuízos financeiros mais graves.

Para manter a produção em Itabira no patamar de 25 Mta, a Vale vai ampliar as cavas das minas do Meio e Conceição. No entanto, essa produção com certeza não será mantida até exaustão inexorável em 2041.

Dependência econômica e alternativas para o futuro
Assim era Itabira antes de ter início a exploração mineral na Serra do Esmeril e a sua descaracterização paisagística (Foto Tibor Jablonsky e Ney Strauch/IBGE)

A dependência da economia de Itabira na mineração tem sido motivo de preocupação para autoridades e moradores desde, pelo menos, a inauguração do complexo Carajás, no Pará, em 1985. Foi quando Itabira perdeu o “status” de maior mina a céu aberto do país, o que resultou em uma redução de sua influência e poder de barganha junto à então estatal Companhia Vale do Rio Doce.

Atualmente, mais de 80% da economia do município está ligada à mineração. Como alternativa para mudar esse quadro, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) propôs a criação de um Fundo Soberano, espécie de poupança financeira para investimentos futuros, visando mitigar os impactos do esgotamento mineral.

O fundo deve destinar um percentual da Cfem à diversificação econômica e à manutenção dos serviços públicos pós-mineração. A medida já deveria ter sido adotada desde a regulamentação dessa compensação financeira pela exaustão mineral, com a Lei Federal nº 7.990, de 1989.

Ou seja, a proposta do fundo soberano está atrasada há mais de 35 anos, mas antes tarde do que nunca.

A queda na arrecadação dos royalties e a futura redução do ICMS reforçam a urgência dessa diversificação econômica, que até agora não se concretizou.

Sustentabilidade sob ameaça

Outras iniciativas, como as constantes do programa Itabira Sustentável, parceria da Prefeitura com a Vale, lançado com toda pomba e circunstância em dezembro de 2023, ainda não saíram do papel – e muitos projetos ditos estruturantes são anteriores.

É o caso da captação de água do rio Tanque para abastecer a cidade, por exemplo, que deveria ter sido realizada há pelo menos 25 anos, conforme previsto na Licença de Operação Corretiva do Distrito Ferrífero de Itabira, concedida em 2000. Essa demora na captação prejudicou a população e também a diversificação da economia local.

A execução desse projeto agora só ocorre devido a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre a Vale e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), evitando uma ação civil pública por danos coletivos.

Além disso, não basta incrementar o polo universitário, inclusive com a Unifei, que ainda não entregou ao município o que prometeu por ocasião de sua instalação em Itabira, em 2008 – e isso não deve ocorrer mesmo após a conclusão dos três novos prédios no campus universitário instalado no Distrito Industrial Maria Casemira Andrade Lage, cuja execução segue a passos de tartaruga.

Como se observa, o corpo discente da universidade federal não tem crescido. Ao contrário, tem sofrido queda do número de estudantes nos últimos anos pós-pandemia.

A instalação do curso de Medicina, privado e oneroso, voltado para estudantes da elite, do UniFuncesi, também foi negociado com a Vale antes do projeto Itabira Sustentável.

Futuro incerto

O presente e o futuro de Itabira dependem da capacidade da cidade se adaptar às mudanças econômicas e sociais, que já começam a ser sentidas antes mesmo da exaustão mineral prevista para 2041.

Enquanto isso, a cidade enfrenta uma lenta e persistente agonia diante das incertezas causadas pela falta de informações. A ausência de planejamento e transparência sobre o futuro do município diante da exaustão mineral coloca Itabira em um cenário de indefinição

Isso ocorre sem que a mineradora Vale abra discussão sobre o descomissionamento das minas locais. A mina Cauê já foi exaurida no início deste século, e novas exaustões ocorrerão nos próximos anos.

Sem informações concretas e sem um debate amplo sobre o descomissionamento das minas, e a consequente e urgente diversificação econômica, a cidade corre o risco de enfrentar um colapso econômico sem precedentes – um desfecho já previsto por Tutu Caramujo antes mesmo do início da mineração em larga escala, em 1942.

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