Geólogos da USP no combate à ditadura militar
Fotos: Reprodução
Everaldo Gonçalves[1]
Resumo
O presente artigo é um relato pessoal de todo o período de transição entre a Ditadura Militar Brasileira para a Democracia (1964 – 1985), com seu contexto social e político, junto dos principais atores sociais neste período e a participação dos geólogos da USP.
Palavras-chave: Lamarca, ditadura, militar, USP, geólogo, prisão, verdade, estudante
ABSTRACT
This article is a personal account of the entire transition period between the Brazilian Military Dictatorship and Democracy (1964 – 1985), with its social and political context, together with the main social actors in this period and participation of USP geologists.
Keywords: Lamarca, dictatorship, military, USP, geologist, prison, truth, student
A história é escrita pelos vencedores! Se a democracia, no final da ditadura militar (1964/1985), saiu vitoriosa, está-se passando o tempo de contar a verdade: uma obrigação da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, presidida pelo geólogo e deputado Adriano Diogo, assim como é da Comissão da Verdade da USP e a da Comissão Nacional da Verdade.
A Universidade,a USP – Universidade de São Paulo foi um celeiro de cérebros, intelectuais orgânicos, membros, militantes, ativistas e simpatizantes dos partidos políticos marxistas na legalidade e ilegalidade. A lista de universitários cassados, presos políticos, torturados, assassinados e desaparecidos na ditadura civil-militar de 1964-85 é enorme e incompleta.
A Geologia da USP foi importante no Movimento Estudantil e na Luta Armada de resistência ao Golpe, mal apelidado de Revolução de 64.
A diplomação tardia, 15 de dezembro de 2023, de dois ex-alunos meus na Geologia da USP – certamente dariam bons profissionais – , não repara a vida dos jovens perdida no ideal libertário, mas conforta os amigos, colegas, professores, a sociedade democrática e familiares.
Há algum tempo, no papel do qual vivi – como estudante (1965/69), presidente do Centro Paulista de Estudos Geológicos – CEPEGE (1967/68), presidente da antiga Associação Profissional dos Geólogos Paulistas – AGESP (1972/73) e professor (1971/75) da USP –, procurei fazer o perfil do “geólogo ativista político” lutando pela democracia da população.
Sem querer exaurir o tema – mesmo existindo uma longa lista de colegas perseguidos, presos, mortos e desaparecidos na luta revolucionária no campus, na cidade e no campo – aquilo que vi, como um materialista dialético ou marxista avulso que sempre fui, já posso contar.
Aproveito para divulgar o texto que entreguei na fala na Comissão da Verdade Paulista e fazer uma homenagem póstuma aos meu amigos e alunos Alexandre Vannucchi Leme e Ronaldo Mouth Queiroz, assim como aos demais colegas e uspianos assassinados por envolvimento na luta estudantil contra a ditadura (1964-1985).
Não sei de todos os casos ocorridos. Tive de abandonar a USP, esta que nunca saiu de mim. São muitas injustiças que precisam ser compiladas com a verdade nua e crua para que a História fique bem contada. O geólogo de campo e o guerrilheiro se confundem pelos trajes e os métodos de atuação no campo: são cabeças premiadas na luta mineral e política.
Para disfarçar a missão, era comum um se passar pelo outro ou por um cidadão comum. Ambos, no campo, precisam ter muita fibra e não perder o rumo. A prática e a bússola ajudam na caminhada, mas o ponto de chegada – com risco de vida – vai além do ideal.
Minério é um bem comum que faz parte do subsolo: nada mais que uma acumulação primitiva de capital. A espoliação mineral e da nação forjou a luta da UNE com o refrão: “o minério não dá duas vezes!” As campanhas: “O Petróleo É Nosso” e “Abaixo à Ditadura” levaram o povo às ruas. Os geólogos estiveram presentes com as teses da Executiva Nacional da Geologia – ENEGE – e com sangue.
O Código de Mineração vigente é uma colcha de retalhos: fruto da ditadura, outorgado em pelo Decreto-Lei 227/1967, autodenominado Código da Revolução, cuja modificação tem sido postergada e mostra a contradição entre a propriedade privada do solo e a propriedade do Estado do subsolo. Incluídos no subsolo os recursos minerais e facultado ao particular, pelo Art. 176 da Constituição Federal, obter a pesquisa e concessão mineral, com a consequente propriedade do produto da lavra. Então, fique bem claro a mina é da União e o minério pode ser do particular.
Portanto, o subsolo é um bem comum de todos nós, socialista e o solo é capitalista, assim como os demais bens são de poucos.
À luta, geólogos!
- A PRIMEIRA BOMBA, A CADEIA, O EXÍLIO E RETORNO
O primeiro caso deste relato é importante, porém, nunca entendi direito o que aconteceu com o nosso colega Carlos Alberto Gonçalves Leite, o Carlinhos, ex-Presidente do CEPEGE (1963/1964). Seu nome saiu na primeira página do jornal em janeiro de 1966, envolvido no caso da prisão por “atentado à bomba do estudante da Geologia da USP”.
A notícia sensacionalista é sempre assim: o que mudaria se o fato tivesse ocorrido com uma pessoa qualquer de outra profissão, curso e Universidade?
A imprensa, submetida à censura, emitia comunicados oficiais dos órgãos de segurança e mostrava os jovens da elite que começavam a atacar empresas estrangeiras, das quais eram as principais representantes do imperialismo norte-americano em São Paulo, durante a luta revolucionária que explodiu no fim dos anos 60.
Juntamente com outros companheiros, Carlos Leite envolveu-se no “lançamento de um engenho incendiário” nos terrenos de uma unidade industrial da multinacional norte-americana Goodyear do Brasil. Esse tipo de ação – o terrorismo de esquerda – até então era coisa inédita e mais ainda com a participação de um estudante o qual atribuíram ser o mentor intelectual do Partido Comunista Brasileiro (PCB/Base do Tatuapé-SP), conforme saiu na “Folha de São Paulo” em 28 de novembro de 1965.
Foi uma bomba de verdade e estourou como tal em nosso meio. Carlinhos foi preso por um tempo e apanhou muito – como se comentava na escola – num misto de pena da pena, do medo e da indignação. Ninguém sabia explicar o que havia ocorrido.
Carlinhos sofreu torturas e, quando libertado, logo foi processado por aquele ato, mesmo após conseguir se formar geólogo. Julgado à revelia (ainda bem que não compareceu ao julgamento!), foi condenado no auge da repressão política. Para não ser preso, fugiu para o Chile, de onde também teve de sair, com o golpe de Pinochet que derrubou Salvador Allende, em 1973. Na abertura política brasileira, em 1979, retornou ao País, passando a exercer normalmente a profissão no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).
Ainda me lembro bem que Carlinhos era muito amigo de outra personagem histórica: a professora de psicologia do Cursinho do Grêmio da USP, Iara Iavelberg, dirigente da Política Operária (Polop – organização política de esquerda) que trabalhava no cursinho cuja administração estavam seu irmão Samuel Iavelberg e muitos estudantes da geologia.
O Cursinho era muito importante entre os estudantes da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras para a preparação de universitários e de quadros para o movimento político, e, por isso, tinha de ser administrado com eficiência. Em 1968, tomado pela dissidência do PC, houve uma nova divisão na política estudantil: um grupo ficou com a máquina de ensino e as gráficas e deu quadros para a Ação Libertadora Nacional (ALN).
Outro grupo ajudou a organizar o Equipe Vestibulares, origem dos que abraçaram ou a luta armada pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), ou o VP, depois Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (Var-Palmares), quando incorporou os Comandos de Libertação Nacional (Colina).
A Iara foi uma das poucas mulheres envolvidas no campo de treinamento de Guerrilha do Vale do Ribeira (1970), do capitão Lamarca, e terminou chacinada na Bahia junto do seu companheiro, como últimos militantes da luta armada denominado Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), assim chamado em homenagem ao Che Guevara.
À época do Movimento Estudantil, Iara Iavelberg sempre passava pela Alameda Glete, sede do Curso de Geologia da USP, no velho bairro dos Campos Elíseos. Era uma mulher bonita, tipo burguesa, elegante, sempre muito bem vestida, com um lenço vistoso e uma capa da Burberry como se fosse sua marca registrada. Iara esteve sumida por algum tempo envolvida na luta armada.
Soubemos mais tarde da trágica notícia de sua morte suspeita. De origem judia, foi enterrada em caixão lacrado na ala dos suicidas do cemitério israelita de São Paulo, mas a família duvidava e conseguiu dar-lhe, muito tempo depois, o lugar de quem não se entregou em vida, em Salvador (Bahia).
Suicídio, segundo a versão oficial, porém a família conseguiu exumar o seu corpo e o legista, comparando o laudo oficial com as fotos da entrada e saída de bala – cuja apresentação eu assisti – em 04 de março de 2013 numa audiência da Comissão da Verdade de São Paulo da qual concluiu que não foi o que aconteceu de fato. Logo tratou-se de mais uma pessoa que foi capturada e assassinada, mais uma vítima da ditadura. Assim, a família conseguiu, a duras penas, desmontar a versão oficial e dar um novo funeral à vítima.
- RACHA NO PARTIDO COMUNISTA
Aquela prisão do estudante de geologia da USP foi um caso importante que merece ser contado para colaborar com a história da luta pela derrubada da ditadura. Sobre o geólogo Carlinhos, com todo o respeito ao seu comportamento corajoso, é preciso contar alguns fatos, dada a importância do feito para a história.
Em 2009, um amigo recente, o Miguel Nakamura, guerrilheiro da ALN – Ação Libertadora Nacional que havia sido do PC – Partido Comuinsta Brasileiro e mantinha encontros com o Carlinhos na época da “bomba”, disse-me: “era um plano mesmo, que deu errado, colocar a bomba na fábrica!”.
Teria sido uma das primeiras atividades de propaganda e divulgação da luta política, na forma de um atentado a bomba de uma das dissidências do Partidão, na prática da luta de confronto dos Guerrilheiros Urbanos que, já descrentes de que os militares pudessem entregar o poder em eleições livres e restaurar a democracia no Brasil, optaram pela luta armada e atos de terrorismo de esquerda.
Esse racha na célula do PCB/Tatuapé é tido como um marco histórico, um processo de partição na biologia daquela célula de poucos militantes resultando várias facções, duas das quais com a opção de ir firme para a luta armada na libertação nacional.
Assim, o grupo do Carlinhos, uma dissidência do PC, após treinar tiro ao alvo com uma espingarda, num sítio às margens da represa Billings e selecionar vários alvos de impacto, escolheu uma empresa multinacional que “sugava” a economia nacional.
Este ato (um atentado) serviria pelo menos para dar um susto no capital estrangeiro, num atentado com divulgação internacional mostrando que a vitória dos militares não havia sido total e que havia ainda uma resistência armada, a exemplo da das Ligas Camponesas de Francisco Julião, no Nordeste e dos brizolistas no Sul, na Serra de Caparaó.
III. O GEÓLOGO LAMARCA
Lamarca e Iara foram mortos na Bahia; ela, em Salvador, em 6 de agosto de 1971 num caso polêmico até hoje não resolvido. Lamarca, o capitão da guerrilha, foi assassinado 40 dias depois no sertão da Chapada Diamantina, em um recanto bucólico por onde andei prospectando manganês em 1970 e onde, por um lado, dominam as sempre-vivas, e, nos altos, as velózzias conhecidas por “canelas de ema”.
Lamarca, o temido capitão desertor do Exército Brasileiro, por ironia do destino, fazia-se passar por geólogo. No fim a jornada armada foi melancólica, sem a lupa, o martelo e a bússola, não conseguiu ver os detalhes da luta, a dureza das pedras da natureza e da vida que perdeu, sem poder dar ao menos um de seus tiros certeiros durante o movimento guerrilheiro.
A morte de Lamarca marcou o fim da esquerda armada em 1973. Ninguém mais ousava enfrentar a ditadura militar, essa já abalada com a campanha popular das ruas. “Eleições Diretas Já”, da sociedade civil organizada, teve que conceder a “abertura política”, o nascedouro da tão aclamada e esperada democracia.
- CORRUPÇÃO NO CÁRCERE
A bomba na Goodyear falhou, não causou maiores prejuízos nem perda de vidas. Havia inexperiência tanto na luta de libertação quanto na repressão. Miguel Varone, um militante do PC que mais tarde integrou a VPR, ao rememorar casualmente, em março de 2010, como e quando foi preso logo após a prisão do Carlinhos, revelou-me que pertenceu à célula do Tatuapé.
Vale a pena resumir agora a versão de Varone para sabermos como era a luta política no início do confronto armado. Os dois lados estavam ainda despreparados para a luta ideológica e a armada.
O PCB era Stalinista e, pelas regras de Prestes, tinha uma organização burocrática que exigia até ata das reuniões em que constavam todas as presenças e decisões importantes, com nome, apelido, local de trabalho e moradia dos militantes. Preso Carlinhos, o DOPS logo achou as anotações (tal qual as das cadernetas de Prestes) e, a partir daí, caíram todos os membros da célula do Tatuapé, uma dúzia de quadros, se tanto. Miguel Varone, secretário político da célula do Tatuapé, por discordar do centralismo democrático e achar que era necessário um movimento de base, havia abandonado o Partido seis meses antes, não mantinha mais contato com aquela base ou com seus ex-militantes e estava sem atividade política naquele período.
O Varone trabalhava então no escritório de uma empresa de tecelagem na Mooca e, numa sexta-feira, ao final do expediente, um diretor da empresa o avisou que estavam na fábrica agentes policiais à sua procura. Falou: ‘trata-se de um engano e tudo será resolvido o mais rápido possível’. Estávamos no início da repressão política e ambos os lados – esquerda e direita – estavam se preparando para a guerra.
Miguel ao chegar ao DOPS, depois de sofrer uma “limpeza” nos livros da sua casa, levou um tranco, mas falou que, na brutalidade, não falaria nada, o que o caracterizou como “duro na queda”, tanto que um “tira” comentou que era deste tipo de homem que ele gostava.
Ficou recluso, mas, no dia seguinte, um sábado, surgiu uma advogada para defendê-lo, a qual constatou o fato de que se o preso já nem estava mais no Partidão, poderia ser solto logo. Concordaram, com uma condição: ou uma proposta negociada com quem de direito: o preso seria libertado se desse uma grana, quinhentos dinheiros da época, que ele alegou não ter e nem de onde tirar, pois vivia de seu salário, apesar de ao final concordar em pagar a “fiança”. Foi libertado na confiança.
Prestou um depoimento no qual o escrivão, antes arredio e de cara feia, ofereceu-lhe cigarro e o orientou nas respostas, sem registrar todas suas palavras. Ao responder às inconveniências, era alertado: “isso te ferra”. Saiu no sábado mesmo do tenebroso casarão vermelho da Praça General Osório, ao lado da estação de trens da Sorocabana – atual Memorial da Resistência – e voltou para casa. Na segunda-feira estava de volta ao serviço, quando pode informar que não tinha nada a ver com o caso da bomba da Goodyear!
Dias depois, nova surpresa: o Osmar, irmão do Carlinhos, entrou em sua casa, reclamando que ele havia deixado de pagar os “tiras” e isso poderia ser descontado no Carlinhos, que estava no DOPS! Varone alegou que não tinha dinheiro, nem se sentia devedor no caso de que não teve participação alguma, mas iria dar um jeito. Conseguiu metade da quantia negociada e levou à advogada, que deu por cumprida a missão. Varone voltaria à atividade política pela VPR e, em 1970, foi preso e cumpriu uma pena de dois anos e três meses. Não sei por que meios o Carlinhos ganhou a liberdade, retornou ao curso de Geologia e nunca mais foi o mesmo, sempre introspectivo, fechado, meio assustado.
- A GUERRA REVOLUCIONÁRIA
Após o atentado da Goodyear, quase toda nossa esquerda, já bem marxista, muito embora em aliança com movimentos católicos, foi se cansando do regime opressivo e radicalizado, na tentativa de responder à altura ao regime ditatorial. É verdade, o marxismo entrou na USP pelas portas dos fundos, com os “Seminários de Marx”, organizados por alguns professores liderados por José Arthur Giannotti e Fernando Henrique Cardoso.
A partir de então, todos os grupos e partidos de esquerda foram ganhando formação teórica e também se igualando na busca de solução via luta armada. Logo surgiram vários movimentos revolucionários que adotaram a teoria do foco na guerrilha urbana e rural, ambas fracassadas e dizimadas pelas Forças Armadas e seus subordinados, os órgãos de segurança federais, estaduais e as Polícias Militares.
Durante as passeatas estudantis, nas ruas do centro de São Paulo, vários colegas geólogos foram presos e soltos em seguida. O pior veio a partir do AI-5, em dezembro de 1968. Antes, no Congresso da UNE, em Ibiúna, uma vez que o colega Bernardino Figueiredo era o presidente do Grêmio da Filosofia, e um dos organizadores, muitos geólogos foram presos.
Alguns saíram logo, graças ao mandado de segurança, que o advogado Aldo Lins e Silva, marido da colega geóloga e professora Mary Szikszay fizeram a meu pedido. Inclusive o Dr. Aldo, grande advogado e quadro do PCB, a partir de então, assumiu a defesa do Zé Dirceu, de quem ficou amigo até o final da vida, pois o velho comunista, que deixou saudades, faleceu, aos 92 anos, em 2010.
O caso do amigo geólogo Arno Brichta merece explicações, pois protagonizou um erro irreparável. Suas ligações com a luta armada parece nunca terem existido e, mesmo assim que tivessem, não justificariam os abusos sobre seus direitos humanos. Justamente ele que nossa turma chamava de “milico”, por ter cursado o Centro Preparatório dos Oficiais da Reserva (CPOR). O colega Arno nunca foi um radical de esquerda que pudesse estar de corpo e alma na luta armada, pois era um bom camarada, amigo de todos, no sentido carinhoso do termo.
- MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS
Perdi colegas que, direta ou indiretamente, estiveram ligados à luta armada. Honestino Guimarães, de Brasília, um amigo, ex-Presidente da UNE, apontado como desaparecido político, permanece como morto insepulto. O “Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos” considera Honestino um desaparecido político no Brasil e conta detalhes do caso. “Honestino Monteiro Guimarães, militante da Ação Popular Marxista Leninista (APML), nasceu em 28 de março de 1947, em Itaberaí, estado de Goiás, filho de Benedito Monteiro Guimarães e Maria Rosa Leite Monteiro Guimarães.
Casado, tinha uma filha, Juliana. Desaparecido desde 1973, quando tinha 26 anos. Estudante brilhante, passou em primeiro lugar no vestibular de 1965 da Universidade de Brasília, no curso de Geologia. Foi presidente da ex-Federação dos Estudantes da Universidade de Brasília (FEUB) e, posteriormente, eleito presidente da UNE. Por ocasião do AI-5, abandonou a Universidade, quando fazia o último semestre e foi viver na clandestinidade, pois corria de fato perigo de morte. Foi preso no Rio de Janeiro, em 10 de outubro de 1973, tendo estado detido também no Pelotão de Investigações Criminais (PIC) de Brasília e no Centro de Informações da Marinha (Cenimar)”.
Ezequias Bezerra da Rocha, geólogo, aos 27 anos, segundo Elio Gaspari, em “O Globo” do Rio de Janeiro (24 de outubro de 2004), era o “homem” que, mesmo tendo obtido um habeas-corpus de soltura, já estava morto no Departamento de Operações Internas (DOI). As autoridades militares informaram que o preso político havia fugido.
VII. CRIME SEM CASTIGO
Ronaldo Mouth Queiroz foi um dos estudantes de geologia da USP assassinados pela ditadura. Era considerado um dos “cérebros da luta armada”, mas creio que não tenha sido mais do que um bom quadro político e elemento de ligação entre os estudantes, para recrutar companheiros para a Ação Libertadora Nacional (ALN), de Carlos Marighella.
Pelos informes oficiais, Ronaldo teria sido morto num “confronto armado”. Foi armado mesmo, haja vista que o Queiroz foi assassinado na rua e estava desarmado – segundo seu colega falecido Enzo Nico, tinha medo de pegar em armas. Foi o final de uma longa busca, a partir do momento em que abandonou a USP para viver na clandestinidade. Muito procurado, como se fosse um desafio para os órgãos de segurança, que abusou do círculo de relações pessoais desse idealista, que lutou por um ideal, trocando a academia pela “luta armada”, mas não pôde sequer empunhá-la.
O “Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos” da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e do Instituto de Estudo da Violência do Estado, IEVE, (1995: 202), um levantamento oficial dos Governos do Estado de São Paulo e de Pernambuco, mostra que o “caso Mouth” foi outra invencionice oficial.
“Ronaldo Mouth Queiroz, militante da ALN. Nasceu em São Paulo, capital, filho de Álvaro D’Ávila e Elza Mouth Queiroz. Estudante de Geologia e ex-Presidente do Diretório Central dos Estudantes da Universidade de São Paulo, na gestão 70/71. Foi fuzilado no dia 6 de abril de 1973, quando se encontrava na Avenida Angélica, em São Paulo, por agentes do DOI/CODI/SP.
A necrópsia de Ronaldo feita no Instituto Médico Legal/SP, em 11 de abril de 1973, foi firmada pelos doutores Isaac Abramovitch e Orlando Brandão, que confirmaram a morte em tiroteio. A versão oficial, publicada no dia seguinte, é de que Ronaldo teria resistido à prisão, sendo morto em consequência do tiroteio travado, versão desmentida pelos populares que assistiram à cena”.
O “dossiê” menciona as testemunhas de sua prisão em via pública, desmentindo a versão oficial de que houve resistência armada. Quando Ronaldo foi “morto”, divulgaram que o perseguido político estava com um revólver, mas o finado colega Enzo Nico (2021) garantiu que ele não o portava. Aliás, disse que nunca o usava.
Enzo Nico, meu ex-aluno e amigo, agora que já passou podemos contar, tem uma passagem política interessante. Amigo de Zé Dirceu, foi indicado gerente do antigo DNPM, atual ANM e lá permaneceu nos dois governos Lula e início do de Dilma, com uma administração conturbada. O colega era muito espevitado. Em um órgão público sujeito a propinas, criou mal estar por impor normas e por não atender ninguém com bolsas, que ficavam na sua antessala.
Célebre foi a participação involuntária de Enzo no sequestro do empresário Abílio Diniz, em 11 de dezembro de 1989, em São Paulo/SP, no Jardim Europa, na esquina das ruas Sabuji com Seridó. Por uma ironia do destino, o Enzo esteve exilado no Chile e lá conheceu uma jovem, que tempos depois esteve no Brasil. Era a época da campanha do governo de São Paulo, cujo candidato do PT era José Genoíno, Maluf e Fleury, ex-Secretário de Segurança Pública do governo Quércia, que o elegeu governador.
Na presidência, disputavam Enéas, Ulysses Guimarães, Brizola, Covas, Lula e Collor. Os dois últimos foram para o segundo turno e ganhou o último, na eleição feita três dias depois do sequestro, que pôde ajudar Fleury e prejudicar Lula, porque, no sequestro rapidamente resolvido pela polícia de Quércia, mostraram os sequestradores vestindo camisetas do PT, também encontradas no cativeiro.
Foi o geólogo Enzo Nico quem deu à amiga chilena de presente aquelas camisetas do PT que apareceram no cativeiro, mas a polícia criou um fato político ao vestir os sequestradores com camisetas do PT, que não teve nada a ver com o regalo do Enzo!
As interpretações do sequestro e as camisetas do PT foram muito fantasiosas. O site Brasil Paralelo, que tenta dar outra visão aos acontecimentos contados na nossa história, fez um filme sobre o sequestro de Abílio Diniz e diz até que ele se beneficiou com o sequestro, uma vez que ficou sendo um empresário de confiança do partido.
As demais versões, vale a pena copiar do site…, mas adianto que o Enzo Nico, não apareceu no filme e, embora tenha sido o responsável pelo presente, não foi ele que fez os sequestradores vestirem na marra a camiseta do PT. Carrego comigo as lembranças da guerra. Posso dizer que, literalmente, “fiz a cabeça”, deste estudante sacrificado precocemente, Ronaldo Mouth, pelo menos uma vez. Eu estava no terceiro ano da Geologia, em 1967, quando ele era calouro, e o trote na Geologia era pesado.
Além do batismo de óleo, os calouros passavam por outras humilhações e eram obrigados, como proscritos, a rasparem as cabeças. Eu, apesar de ter levado trote, como todos os alunos da escola, nunca dei ou descontei em alguém. Dos calouros que chegavam do trote já escalpados, com a máquina de um colega, Arno Brichta, apenas ajudei a raspar, amigavelmente, muitas cabeças.
E a cabeça do Queiróz ficou marcada indelevelmente em minha mente, pois era um tipo intelectual, que participava do movimento secundarista, trabalhava para se sustentar – usava óculos, com leve estrabismo no olho esquerdo. Era de estatura mediana, a pele clara com cabelos pretos e anelados. Sua fronte era avançada, bem separada pelo nariz e as sobrancelhas cerradas iguais aos lábios. Tinha um sorriso enigmático no rosto magro de maçãs salientes, que faziam lembrar a figura do Velho Prestes.
VIII. ALÉM DO “INTELECTUAL ORGÂNICO”
A seus colegas, passava a imagem de uma figura meio caricata, pois alguns o achavam parecido, ora com o “Fradinho”, do Pasquim, seu apelido, ora com o “Mad”, da revistinha.
Sua cabeça, que recebi meio raspada, aos poucos, fui lapidando até chegar numa esfera. As orelhas eram proporcionais, meio de abano, como se feitas para escutar tudo. Era um tipo calado, que transparecia ser calmo, frio, destemido e corajoso.
Nosso colega Enzo Nico, ao ler este texto, numa leitura corrida de revisão, emocionou-se. Lembrou-se então que Ronaldo não era frio, e sim até muito arredio e medroso, como qualquer mortal, e não sabia lidar com armas de fogo.
Para ele, o grande mérito do Queiroz na política estudantil foi ter organizado o DCE Livre da USP, do qual foi presidente entre 1970-1971.
Mal sabia ele que o DCE levaria o nome de outro colega de infortúnio na luta contra o poder: Alexandre Vannucchi Leme. Queiroz era uma cabeça boa e, de cara, tive certa empatia pelo “bicho”, diferente de muitos universitários alienados.
Tornamo-nos amigos, ainda que sem muita intimidade, pois logo terminei o curso e, em minha volta à universidade, como professor, tivemos pouco contato, uma vez que ele teve de cair na clandestinidade. Eu morava no centro de São Paulo, perto do Largo do Arouche. Na Rua Bento Freitas 176, em cima da Livraria Duas Cidades, dos freis dominicanos, que nunca soube ser ponto de Marighella!
Uma noite, ao sair do cine Metro, pela rua lateral, cruzei com o Queiroz, com cara assustada, quem sabe indo ou saindo de algum ponto ou aparelho. Meu ex-aluno seguiu sem dar um aceno, nada, e sem me usar para mandar algum recado à sua família.
Não estranhei nada, nem quando soube, pelo livro do Caio Túlio Costa, que ele era o cabeça da turma engajada na Universidade, mas refleti, com meus botões, sobre o que é a vida. A de quem luta por um ideal, que certamente não morreu, levado ao extremo por um materialista, pois, mesmo sem nunca lhe haver perguntado, tenho a certeza de que ele, Queiroz, não era um idealista, nem um ingênuo. Havia lido Marx, Engels, Rosa Luxemburgo, Lênin, Gramsci e, certamente, Lukács.
Era um estudante que, inclusive, trabalhava como professor primário para seu sustento, oriundo de família organizada, com ascensão pequeno-burguesa, e passou a ser um quadro político revolucionário. Foi além do “intelectual orgânico da classe operária de Gramsci” para ser, de fato, um revolucionário, ao estilo de Lukács. Este autor é um pacifista humanista que, no limite extremo de fazer o proletário chegar ao poder, na luta de classes, é forçado a admitir, num esquerdismo moralista, que os fins justificam os meios. Assim é que Lukács, intelectual revolucionário (o que melhor conseguiu dar continuidade ao pensamento de Marx, em seu importante texto: História e Consciência de Classe), diz, conforme seu roteiro de intelectual revolucionário, que é contado no livro de Michel Löwy (Löwy, 1979:168):
“Devemos tomar sobre nós a plena responsabilidade pelo sangue derramado. Também devemos aceitar que nosso sangue seja derramado. Este era o sentido prático do meu comportamento pela manhã, por assim dizer: argumentum ad hominem. Porque não deve haver cisão entre teoria e prática, numa dura prova, enfrentou a batalha de arma na mão e na trincheira. Por isso, qualquer ato que o estudante-revolucionário Ronaldo Queiroz tenha praticado, mesmo se considerado ilegal pela Lei de Segurança Nacional (LSN) daqueles tempos sombrios, ele o fez consciente, em busca do bem comum. Ele sabia dos riscos e desse jogo bruto, o que não justifica a alegação de que “guerra é guerra”, pois, além de injusta, é desigual. No caso, ainda foi covarde.
Que o sacrifício do Ronaldo Queiroz e o do Alexandre Vanucchi, que contarei a seguir, e dos outros opositores ao antigo regime não tenham sido em vão.
- TESTEMUNHAS DA MORTE
Soubemos, mais tarde, conforme o “Cale-se” (Costa, 2003:114-15), que, por uma coincidência, um geólogo recémformado, Paulo Antônio Guerra, na manhã de 6 de abril de 1973, esperava um ônibus na Avenida Angélica em São Paulo, quando viu um jovem ser baleado à queima-roupa por policiais. No noticiário, soube e reconheceu que tinha sido o colega Queiroz, com um visual diferente, de barba e cabelo comprido. Com a sua morte, diminuiu a caçada a seus colegas estudantes.
Na tentativa de chegar a ele, a repressão, como chamávamos o aparelho ideológico de Estado, precisava aniquilar potenciais inimigos políticos para se garantir e perpetuar-se no poder, no conceito exato do termo de Althusser, a máquina de guerra movimentava fortunas e o regime oferecia valiosas recompensas pela morte de seus principais inimigos, motivo, entre outros, para Marx sempre achar que o Estado é opressivo, repressivo e desnecessário, ao final do processo socialista.
Por isso é que a “Ditadura Escancarada”, na afirmação de Elio Gaspari, acabou com a vida do Alexandre Vannucchi Leme e prendeu, conforme consta no mesmo Cale-se (Costa, 2003:150), num período de 70 dias, entre fevereiro – que vai da missa in memoriam (após a prisão e morte) do Alexandre, em 30 de março de 1973, até uma data marcante para o Movimento Estudantil, 26 de maio de 1973, dia em que foi realizado um corajoso show do cantor Gilberto Gil, que, mesmo proibido, foi apresentado, numa tarde, no anfiteatro da Escola Politécnica da USP. Entre outras canções, não faltou a “Cálice” (verbo, não substantivo), a metáfora de protesto cunhada por Chico Buarque de Holanda e Gilberto Gil.
Neste dia, foram presos 44 estudantes: 10 da Geologia, com duas mortes entre estes, 9 da Física; 6 da Geografia; 4 da Psicologia; 3 da Economia; 2 da História; 2 de Direito; 2 de Ciências Sociais; e um da Filosofia, Letras, Comunicações, Enfermagem, Escola Politécnica e uma da Sociologia e Política. Não está incluído o número de pessoas presas na missa ecumênica de Alexandre Vanucchi, na Catedral da Sé. Cale-se, Costa (idem: 150) informa que 10% dos alunos da Geologia da USP foram presos e é possível que tenham sido mesmo.
O clima no campus era de medo, um verdadeiro terror naquele período, porque não se sabia quem era quem, e pareciam confundir, de fato, o estudante de Geologia com um guerrilheiro. Se a experiência política de cada um foi difícil em liberdade, basta imaginar a dos que foram presos, sem motivo justificável algum, inclusive com a morte, pela tortura, de mais um estudante da Geologia. Ela serviu de alerta para a sociedade, a democracia e a luta pelos direitos humanos, e se intensificou com a morte do operário Manoel Fiel Filho e mais intensa ainda, no assassinato do jornalista Wladimir Herzog, em 1975.
- O CELEIRO DE QUADROS
A Universidade, é sabido, foi o celeiro de quadros dos partidos políticos de esquerda clandestinos, que entraram na luta armada para fazer a Revolução, que nunca se encheu de proletários, como os armazéns, de grãos. Sem massa, as organizações se conformaram com os cérebros e estes lotaram as celas dos presídios. Quem já leu Marx e o entendeu sabe que as contradições da sociedade no processo de produção geram uma luta de classes, na qual o estudante, mesmo que tenha uma classe, a da sala de aula na escola, fazem parte de um setor social alijado do processo de produção.
Uma greve estudantil não afeta a economia e o processo de produção. Ou seja, os estudantes não pertencem a classe nenhuma como um todo, não fazem parte do processo de produção, e, individualmente, cada um é oriundo da burguesia ou da pequena burguesia. É verdade que, de algum tempo para cá, muitos estudantes com origem no proletariado trabalham e chegam à universidade, inclusive com possibilidade de acesso pelas cotas preferenciais oferecidas aos pobres, aos negros, aos índios.
Mas vai demorar até que um número considerável de jovens de origem proletária possa ocupar, com igualdade, as vagas nas universidades e nos diversos empregos, porque ele não pode se manter sem trabalhar para o seu sustento próprio e arcar com as despesas da escola. As bolsas de estudo começaram a surgir, mas ainda não geravam revolucionários.
O papel das massas que, na prática, podem atropelar as lideranças e tomar as ruas, as fábricas etc. e até tomar o poder, tem mais a ver com a anarquia, do que com o socialismo. Maio de 68 rendeu muita discussão sobre o poder das massas, mas não achou o caminho do que fazer. Se houvesse tido uma vitória de grupos desorganizados, sem saber aonde chegar, qualquer caminho teria servido. É o caso de se perguntar o que de fato representou o Queiroz para ao ME – Movimento Estudantil e para a ALN da luta armada?
No âmbito universitário, o militante Queiroz, ao ter contribuído para a volta do DCE da USP, fez um bom trabalho a par da vida acadêmica, que teve de abandonar no 3º ano do curso de Geologia. Sobre sua atividade na ALN, antes e depois do abandono forçado do curso de Geologia, não há elementos disponíveis para pesquisa, nem nos arquivos agora abertos pelo DOPS. Um relatório militar tornado público refere-se ao Queiroz de uma forma que não parece confirmar a realidade.
No documento, Queiroz é apontado como um perigoso quadro da ALN, mas isso em sua etapa final com esse grupo armado, que nunca chegou a 2.000 militantes – o segundo maior grupo, abaixo do PC –, entre o pessoal de direção, combate e operações (GTA – Grupo Tático Armado), quadros de apoio e militantes, espalhados por vários estados e concentrados em São Paulo e Rio de Janeiro.
À ALN atribui-se o “justiçamento”, com outros companheiros, de um comerciante, Manoel Henrique, no momento em que abria seu restaurante (o Varella famoso, hoje fechado) na Mooca, onde teriam sido mortos quatro militantes da ALN, por possível denúncia do proprietário. Mas nunca provaram nada. Outras ações armadas são imputadas ao colega, que vivia na clandestinidade e não teve um processo formal para saber e avaliar eventuais acusações e seus fundamentos.
- VIDA CLANDESTINA
Os colegas de faculdade ignoram a vida paralela do Queiroz, até mesmo por questões de segurança da época, com pontos marcados, codinomes, viagens de olhos vendados etc. Pode-se perceber que Queiroz foi um quadro da ALN, voltado para o setor estudantil e sua área de comunicação, obrigada a cair na clandestinidade, quando o Exército e o DOPS invadiram o Conjunto Residencial da Cidade Universitária (CRUSP), na USP, rumo ao Instituto de Geociências, com vários carros, peruas Veraneios, e com centena de policiais armados em busca dos “estudantes subversivos”, Queiroz e Enzo, entre os perseguidos. Nossos colegas conseguiram escapar do cerco policial-militar, porém foram obrigados ao abandono forçado da USP.
A partir deste episódio, Queiroz passou a morar escondido, de pensão em pensão na cidade, com ajuda de colegas, fazendo um trabalho de proselitismo político. Segundo os militares, como um “militante profissionalizado”, arregimentava quadros para a ALN e participou de algumas ações armadas, embora não haja certeza de seu envolvimento nelas.. Isto, porém, se de fato ocorreu, teria sido no final da ALN – que nunca havia conseguido ir além da prática de ações ousadas, sequestros, roubos de bancos, justiçamentos, sem nunca ter ganhado, ao menos, a simpatia da população.
Quando os ativistas estavam isolados, quase na base do “cada um por si”, sem o “deus para todos”, a que marxistas, nem na hora do aperto, pode apelar, por não acreditarem nele. O recrutamento de quadros para a ALN foi migrando dos intelectuais orgânicos, mais bem preparados, para os estudantes universitários simpatizantes e, por fim, para os secundaristas entusiasmados. A atuação dos primeiros num processo revolucionário é louvável e necessária para dar a prática à teoria que sustenta; a dos universitários é queimar etapas e quadros. Já a necessidade de recrutar secundaristas, com base no clamor e rebeldia de jovens imaturos para a luta armada, é o fracasso anunciado da causa.
XII. A MILITÂNCIA ERRÁTICA
Entre as falhas de Marighella, na ALN, há que se reconhecer a falta de um programa de como governar um país. Isto nem o PT tinha, um partido de massas e intelectuais, ao chegar ao governo, em 2002. Não ultrapassaram o limite de um partido de quadros e chegaram a um de massas, porque não somavam talvez nem mil militantes, com membros concentrados em São Paulo, Rio de Janeiro e algumas outras poucas capitais.
Reforçar os quadros com jovens, muito jovens, meninos imberbes e algumas meninas na puberdade, deve ter sido um dos seus mais graves erros. Queiroz não terminou o curso de Geologia e outros também não, sem conseguir mudar o mundo, mas tampouco teriam feito isso, se o tivessem concluído.
Já o Alexandre, por mais que tenha crescido politicamente, não teve tempo de saborear os ensinamentos de Marx e outros gurus da esquerda. Quando acharam que a Revolução seria imediata, erraram. O risco e o preço que pagamos, como se viu, foram altos, mas, se não tivesse havido resistência, inclusive armada, é bem possível que a ditadura militar nunca tivesse terminado.
XIII. A “MORTE” DO ALEXANDRE VANUCCHI
Entre outros casos de perseguição, prisão, tortura e assassinato, o caso do Alexandre Vannucchi Leme é muito marcante e dolorido para mim, que fui seu professor e entendia sua luta, mais do que ele podia imaginar. Dele me recordo muito bem, embora com tristeza, pois foi o único aluno que faltou ao concorrido estágio de mapeamento geológico que fazíamos durante 15 dias, em fevereiro de 1973, em Diamantina (Minas Gerais).
Procurei saber o motivo e os colegas informaram que Alexandre havia sido operado do apêndice. De volta a São Paulo, almoçando no restaurante “Gato Que Ri”, no Largo do Arouche, li o “Jornal da Tarde” e fiquei pasmo ao ver, no alto da página dois, a foto de Alexandre estampada, com a informação de que ele, estudante de Geologia, fora “atropelado” por um caminhão na área do Brás, no cruzamento da Rua Bresser com a Avenida Celso Garcia.
Era a versão-padrão dos órgãos de segurança. “Atropelamentos”, “suicídios” e “morte por resistência armada” encobriram os assassinatos sob torturas cometidos nos porões do regime militar. Alexandre, preso, teria sido levado “num ponto” para encontrar um companheiro clandestino. Era, portanto, uma “isca” dos homens. Teria tentado fugir da polícia e morreu atropelado por um caminhão. Simples e inconsistente.
A versão oficial não fechava, pois, no local, nem era permitido o tráfego de caminhão a qualquer hora e, muito embora tivessem fornecido nomes de envolvidos e testemunhas da ocorrência, forjaram outra montagem para encobrir um novo assassinato nos porões da ditadura. O Instituto de Geociências e a USP, que se conseguiu avisar, decretaram luto oficial.
O estudante do curso de Geologia, que era um bom aluno e representante discente na Congregação da Faculdade, fora preso, sob suspeita de ligações com os movimentos de Resistência Armada da ALN – Ação Libertadora Nacional, particularmente com um dos “chefes”, o já citado, “perigosíssimo” Queiroz.
Realmente, Vanucchi estava recém-operado ao ser preso e torturado no DOI-CODI da Rua Tutóia, do 2º Exército, conforme me disse o meu amigo e colega (da turma do Vanucchi), João Carlos Moreira – e, tempos depois, um novo amigo e colega no Curso de Jornalismo na Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero – Antônio Acedo, um aluno da Biologia da USP, que estava no mesmo grupo que foi preso, embora não constasse na relação do livro do Caio Túlio. Exceto se for o “Antonius” da Filosofia.
Para mim, deve ter sido um dos melhores quadros do Movimento Estudantil. Escrevia bem, era amigo do Salomão Malina, do PCB, e possuía uma formação intelectual de fazer inveja. Falava várias línguas e era espanhol, vindo de uma família de combatentes. Seu pai havia lutado na Guerra Civil da Espanha, em 1936, e na Argélia.
Acedo saiu do Brasil e voltou com a anistia política. Na prisão, ele soube que o “Minhoca”, o apelido de Alexandre na USP (um tipo baixinho e franzino, com cara de coroinha, que deve ter sido, pois chegou cristão e de espírito humanitário, logo virou um ateu e, imagino, marxista), gemeu a noite inteira na solitária, até perder as forças e a vida, devido às dores nos ferimentos da cirurgia abertos pela tortura. Pela manhã, vieram buscar o cadáver, que foi puxado pelo corredor do cárcere, onde deixou um filete de sangue. Na cela, para justificar a primeira versão da morte por suicídio, que acabaria sendo modificada, seu pescoço teria sido degolado.
O corpo mal necropsiado de Alexandre no IML foi enterrado como indigente no Cemitério de Perus e levou muito tempo até que sua família, de Sorocaba (SP), pudesse encontrar os despojos e lhe dar uma sepultura com uma lápide. O professor e colega José Vicente Vallarelli, da mesma cidade e amigo da família, empenhou-se pessoalmente no caso, mas sem guarida, na ocasião.
Os demais professores da USP e da Geologia, se não deram apoio abertamente, sempre foram solidários com os alunos. Nem a direita, que também existia na USP (a Geologia não era diferente), podia admitir essas crueldades.
Mas, a morte do estudante era um tabu, o laudo de necropsia era uma fantasia e, como ele era uma pessoa com família, profissão e endereço certos, foi enterrado, às escondidas, em cova rasa, como indigente. Que eu saiba, passado muito tempo, com a anistia e a Comissão de Direitos Humanos, sua família teve o direito à indenização oficial de perseguidos políticos. Esse crime hediondo jamais foi devidamente apurado.
XIV. MOBILIZAÇÃO SOCIAL
Mas, seu fantasma, qual um cadáver insepulto, ajudou a mobilizar o Movimento Estudantil, a Imprensa e o meio político progressista, a tal ponto que foi um marco na luta de libertação nacional e na volta da democracia. Em sua memória – repito aqui – o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da USP passou a ser denominado Alexandre Vannucchi Leme.
E na missa ecumênica celebrada na Catedral da Sé, um inesquecível réquiem – do qual não consegui participar devido ao bloqueio do centro da cidade – começou um novo movimento popular de resistência à ditadura, em 1973, que culminaria, mais tarde, com o Povo novamente nas ruas, gritando Diretas Já.
O assassinato deste meu aluno do curso de Geologia, o Alexandre, nos porões da ditadura, é público. A história está no livro de Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio (Boitempo, 2008, 702 p.) “Dos Filhos Deste Solo – Mortos e Desaparecidos Políticos Durante a Ditadura Militar. Também consta do livro de Elio Gaspari, “A Ditadura Escancarada” (Cia. das Letras 2002)., mas o livro que me serviu de base para conhecer , aquilo que nunca precisei saber foi o “CALE-SE”, do jornalista Caio Túlio Costa (Costa, 2003).
A prisão de Alexandre foi o início de uma série delas, entre os estudantes da USP, principalmente entre os alunos da Geologia, que, àquela altura, era tida como um foco perigoso no campus universitário.
Dentre os que foram presos e torturados, lembro-me bem ainda de outros, cuja história é preciso contar, para não ficar perdida.
Outros geólogos presos
Adriano Diogo
O caso do Adriano Diogo (e sua esposa), geólogo que fez carreira política no PT em São Paulo, é um exemplo de luta. Adriano, desde sua entrada na Geologia, era um aluno que se destacava entre os calouros. Veio do ME – Movimento Estudantil secundarista, querendo logo se enturmar na política universitária. Procurava saber de todo mundo na Geologia da Alameda Glete e da turma da Maria Antônia.
Era um tipo atarracado, de cabelo bem preto, baixo e gordinho, que logo ganhou o apelido de “Mug”, aquele bonequinho de roupa xadrez, moda na época, em forma de chaveiro e de boneco, em cima da geladeira, como se fosse um amuleto. Muito falante, era o próprio ativista para o proselitismo político de que a esquerda precisava, e teve uma vida agitada, como todos daquele período.
Quando prenderam o seu colega Alexandre, no DOI-CODI do II Exército, na Rua Tutóia, o Adriano e tantos outros também foram parar lá, onde, como se sabe, foram torturados. No site do “Movimento Estudantil”, sua entrevista, já como homem maduro, revela o quanto sofreu nos porões da ditadura.
Confessa-se um humanista que, em tese, repeliu o confronto armado, o que não o impediu de ligar-se à ALN na universidade. Já se destacava como promotor cultural ligado ao teatro do Grêmio Politécnico. Segundo Adriano, ele passou 90 dias no DOI-CODI. Apanhou muito desde que foi arrancado arbitrariamente do seu lar . O pau aumentou quando esteve preso com outros 45 estudantes da Geologia.
Depois, passou pelo DOPS e pelo Presídio do Hipódromo, no seu bairro, a Mooca, que nem sabia da existência, onde ficou preso um ano e dois meses entre criminosos comuns, sem julgamento legal. Há que se perguntar de que valeu esse arbítrio contra um jovem que dava aulas para poder estudar, que atuava, sim, na reconstrução do M.E., pela democracia inexistente e que, talvez, nem soubesse ou mal sabia o que se passava de fato na ALN.
Ainda assim, passada a prisão arbitrária, voltou ao convívio da universidade e se formou.
Adriano, quando saiu da prisão e voltou para a USP, estava no último ano da Geologia, em que eu era professor assistente (auxiliar de ensino) da cadeira de Geologia Econômica. Nós fazíamos exames, com provas escrita e oral, para os alunos que não tivessem alcançado nota média suficiente (sete), para serem aprovados diretamente, sem o exame final da matéria. Era o caso do Adriano, cuja prisão arbitrária, por tanto tempo, atrapalhou sua vida acadêmica, com perda de aulas e provas.
Quando o ex-preso político chegou a mim, o professor, para fazer a prova oral, olhei bem para ele e pude reparar no pouco que havia restado daquele gorducho que eu havia conhecido como calouro. Estava ainda muito sofrido, um molambo, com sequelas visíveis da tortura e dos maus tratos do cárcere cumprido no Presídio do Hipódromo, na Mooca, no mesmo bairro que o viu crescer e dedicar sua vida política de combativo vereador, ampliada para a periferia da capital e de outras cidades, que lhe garantiram sucessivos mandatos na Câmara e na Assembleia.
A única coisa que perguntei a ele, para não parecer uma nova inquirição, foi em que área da Geologia ele iria trabalhar. Falou que já estava estagiando em Hidrologia e pretendia continuar. Dei-lhe uma nota boa, sem precisar arguir da matéria, certo de que ele sabia tudo na ponta da língua, como se isso pudesse ao menos elevar sua moral e diminuir, já que era impossível reparar, as dores pelos maus tratos recebidos do mesmo Estado que o mantinha na escola pública e pagava a mim para ensiná-lo.
Formou-se e foi trabalhar no Departamento de Águas e Energia de São Paulo (DAEE). Pelo que sei, tornou-se assessor da então deputada Luiza Erundina, eleita Prefeita de São Paulo (PT), deu seu voto e abriu uma oportunidade para o vereador Adriano Diogo, conforme li pela Imprensa na ocasião, . Meu ex-aluno, com boa militância política no partido e forte base política na Mooca, elegeu-se quatro vezes vereador para a Câmara Municipal de São Paulo, em seguida, em três oportunidades (2002, 2006 e 2010), como deputado estadual para a Assembleia Legislativa, fazendo uma carreira louvável. No governo Marta Suplicy, na Prefeitura de São Paulo, tornou-se secretário do Verde e Meio Ambiente.
- OUTROS ALUNOS DA GEOLOGIA DA USP
Os demais estudantes de Geologia presos naquela leva, conforme Caio (Costa, 2003:118) foram: Alberto Alonso Lázaro; Carlos Geraldo Luz de Freitas; Júlio Cesar Arantes Perrone; Luís Antônio Bongiovanni; Mário Antônio Eufrásio; Ruy de Goes Leite Barros. Ainda foi preso o colega que cursava pós-graduação e trabalhava no IPT, Hely Borges Frazão e sua esposa Lílian Frazão. Conseguiu ficar de fora o Enzo Luís Nico Jr., embora tivesse sido intensamente procurado no campus.
Escapou e não voltou mais às aulas, juntamente com Queiroz. A vida clandestina era dura. Queiroz encarou a barra; Nico ficou um tempo clandestino mas , quando percebeu que a barra lá era muito mais pesada do que a em liberdade, e viu o cerco fechar à sua volta, sem saída viável, fugiu para o Chile. Foi obrigado a sair, quando caiu Allende, e foi parar, com outros exilados, em Cuba. Uma vez fora do país, os colegas presos, na tortura, puderam jogar nas costas do Enzo a culpa de alguns atos cuja autoria desconheciam, nem se haviam sido praticados de fato. Do paraíso comunista, já formado em Geologia, trabalhou e seguiu para a França, trabalhou com geofísica de petróleo numa companhia francesa, voltou ao Brasil e foi trabalhar na Themag Engenharia, como consultor.
No exílio, tornou-se amigo de Zé Dirceu. Nas campanhas em que o Presidente Lula era candidato à Presidência da República, como militante do PT, integrou a equipe de apoio logístico e de segurança. Segundo ele, em algumas paradas das caravanas, teve oportunidade de falar sobre a importância da Geologia e da Mineração. Houve oportunidade, inclusive, de mostrar alguns afloramentos em cortes de estrada e enaltecer a importância da Geologia e Mineração ao candidato petista.
Em 2003, com a vitória de Lula, Enzo foi indicado para chefe do 2º Distrito Regional do Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), em São Paulo, onde, apesar de não contar com meios e equipe, quebrou barreiras e vícios da administração pública. Fora do serviço público, Enzo trabalhou em garimpos no Pará e prestou serviços de consultoria.
Fumante inveterado, se safou, depois de duas cirurgias de safenas, da pandemia, mas, em 21 de janeiro de 2022, sofreu uma queda na sala de espera de seu médico otorrino, que lhe causou um traumatismo craniano com óbito. O funeral foi ao som de música revolucionária cubana e o caixão coberto com a bandeira de Cuba, a pátria que o abrigou e onde nasceu uma das filhas. Fui ao enterro do Enzo que sempre me chamava de professor, e me senti tal pai que inverte a ordem da seleção natural, quando ajudei a carregar o caixão do aluno.
XVI. GUERRILHEIROS DO PARÁ
Um grupo de paraenses foi escolhido a dedo para estudar geologia em São Paulo e retornarem, para ajudar o desenvolvimento do ensino e da região. Carlos Alberto Lobão da Cunha, paraense de Bragança, foi um deles, mas não cumpriu a missão.
Aliás, ajudaram a libertar o Brasil da ditadura. Lobão, com meia dúzia de conterrâneos, foi morar no alojamento dos estudantes, no CRUSP, com a ideia de voltarem ao Pará e fazerem escola, mas acabaram se envolvendo na política e viraram “paulistas” (colega de turma) que optaram pela guerrilha urbana, incorporados à ALN, como o caminho para derrubar a ditadura e construir uma sociedade livre e igualitária.
Acho que Lobão foi um dos primeiros estudantes que entrou de corpo a alma na luta armada, pela ALN, e um dos primeiros que caiu. Seus companheiros deste tempo quente me disseram que o colega geólogo participou, com bravura, de várias ações. Lobão foi preso, torturado e perdeu anos da juventude, desde 23 de outubro de 1969, data de sua prisão, até sua soltura em 23 de novembro de 1973. Esteve preso no Presídio Tiradentes e na Penitenciária do Carandiru.
Quem pode dizer, sem arrependimento, que levou Lobão de fato para a clandestinidade sou eu, embora nenhum de nós soubesse o que fazia. Guerrilheiro urbano da ALN, foi preso, com condenação pelas leis da ditadura. Liberto, ele retornou à USP para terminar o último ano de Geologia, após pagar uma pena que deveria ser dividida por todos nós, a privação do direito à liberdade. Com vocação para o ensino, envolvido no método de Paulo Freire, já na faculdade, fez carreira como professor da Unicamp.
Lobão morava no CRUSP, se não me engano no Bloco B, apto. 402, com os paraenses. Lá ficou uma amarga lembrança dos tempos da repressão política. Num fim de tarde – estávamos no final do curso, em 1969 –, eu estava de saída dos Barracões da Geologia, no campus do Butantã, dirigindo meu fusquinha branco semi-novo (comprado do colega Luiz Vaz), quando a “Loira da Psicologia” veio na minha direção, apavorada, clamando por uma carona para sair do campus, porque a frente estava tomada pela polícia.
Assim, além dos meus colegas de “república”, Obata e Borges, dei aquela carona para o Lobão e a Lilian. Esta colega da Psicologia veio a se casar com o geólogo Frazão e tornou-se conhecida como a “perigosa Loira da Psicologia” e da ALN. Pela primeira vez, saímos pelos fundos da universidade.
A polícia havia fechado a entrada da USP à procura do Lobão e outros estudantes. Nunca imaginei o que poderia ter acontecido, se não tivéssemos conseguido escapar. A partir desse dia, Lobão foi obrigado a abandonar o curso e entrou na clandestinidade. Só voltou em 1974, após longo tempo de prisão. Vejam só o clima em que vivíamos.
Algum tempo depois daquela evasão na USP, ao sair de um almoço na Cantina Posillipo, na Rua Paim, próximo à Avenida Nove de Julho, em São Paulo, nos cruzamos. Clandestino, Lobão teve que me evitar, para me proteger. Eu, na calçada esquerda, ele, na outra, atônitos, nos olhamos. O colega seguiu a passos rápidos, sem nos falarmos. Não pude sequer perguntar se precisava de algo, se tinha algum recado a ser mandado.
Em novembro de 2004, em uma visita cordial que fiz ao Lobão, já professor do Instituto de Geociências da Unicamp mostrei-lhe parte deste meu texto, ainda sem este trecho. Quando saímos, me pagou a velha carona, em seu novo campus, e relembramos aquele arriscado bota-fora da USP que lhe dei. No livro “Tiradentes, um Presídio da Ditadura” (Scipione Cultural, São Paulo, 1997:239) há um depoimento do Lobão em que retrata o tempo de prisão e a vida na cela 7 do Tiradentes, onde ficaram alguns membros da ALN. No cabeçalho, como chamada do depoimento, escreveu aquilo que lhes dava força na lembrança, sempre presente nos versos de Ivan Lins: “desesperar jamais. Aprendemos muito nestes anos”.
XVII. A INJUSTIÇA DE BRICHTA
Nas lutas de resistência, quando houve a invasão da Rua Maria Antônia, sede da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras, da USP, com predomínio de corajosas mulheres nos diversos cursos da Filosofia, a chegada dos geólogos da Alameda Glete, era temida pela tropa do Comando de Caça aos Comunistas (CCC).
Mas, o apoio não era apenas físico, pois o Presidente do Grêmio da Filosofia, à época o mais atuante do Movimento Estudantil, era o colega paraense Bernardino Figueiredo, que teve de terminar seu curso no Chile, para onde fugiu depois de um tempo na prisão. Bernardino e Romualdo Paes levaram sua turma à greve, para tirá-los da prisão, e quase todos teriam sido reprovados por falta, não fosse certa conivência da Universidade da época. Foram soltos, mas tiveram de sair do País, pois estavam na lista de perigosos cassados pelo regime militar. O Bernardino saiu primeiro e, algum tempo depois, o Romualdo, já trabalhando no IPT, também foi para o Chile.
Na abertura política, voltou Bernardino, tornou-se professor-titular da Unicamp e foi laureado como professor Emérito. O colega Romualdo, na volta, trabalhou na empresa Themag, ingressou mais tarde no antigo DNPM, como assessor do Enzo, fez concurso e se incorporou aos quadros da atual ANM no Mato Grosso do Sul, até seu falecimento.
Bernardino, em l967, assumiu a liderança da política estudantil na USP, quando sucedeu um estudante de filosofia – José Roberto Arantes, que havia abandonado o Instituto de Tecnologia da Aeronáutica (ITA). Arantes, mais tarde, teve seu nome incluído entre os estudantes-guerrilheiros assassinados pela ditadura militar.
Arno Brichta, um colega de turma, teve seu martírio e serviu de inspiração a um personagem do filme “Lamarca”, quando, durante o “interrogatório” do pacato cidadão, o delegado Sérgio Paranhos Fleury (o temido “Dr. Barreto”), arrancou-lhe um dente incisivo, a frio, com um alicate, o que aconteceu, de fato, na vida real, quando Arno estava preso na Bahia.
Recém-formado, uma alma boníssima, casado, com a nossa amiga Carmem, da veterinária da USP, foi lecionar na Universidade Federal da Bahia. Seu apartamento virou ponto de encontro de todos os paulistas, no início da moda da “baianidade”. Soube por terceiros que um dos seus visitantes “caiu”, por supostas ligações com o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), guevarista.
Sob tortura, teria dado o roteiro cumprido na Bahia. A UFBA, num ato comum à época, até no meio universitário, por medo ou a serviço da “Revolução”, simplesmente rompeu o contrato de trabalho do professor Arno Brichta. No meu período de professor na USP, o visitei em Salvador, o convenci a mudar de ambiente e dar aulas em Diamantina (MG), em 1973, no Instituto Eschwege.
Esta entidade, com a qual eu já mantinha ligações, à época ainda era vinculada ao convênio Brasil-Alemanha e o professor Reinhard Pflug, seu fundador, achou que os militares não iriam interferir na contratação de um ex-preso político. Arno Brichta é pai do famoso ator que carreguei no colo, Vladimir Brichta, cujo nome se explica tanto pelo Lênin, como pelo Herzog e por ser mineiro perdido, nascido em 1976, lá na minha Diamantina.
Anos mais tarde, o professor Arno passou um tempo na Alemanha, fazendo curso de pós-graduação e voltou para Salvador, na mesma UFBA. Justificou-se, dizendo que não era um mentor da guerrilha de Lamarca, por dever de ofício, e sofreu o que se pode imaginar, mas que nunca me falou do assunto, nem eu lhe perguntei. Acho que o colega Arno Brichta pagou por um crime que nunca cometeu por ser geólogo, por dentro e por fora.
XVIII. MELINHO, BOM DE BOLA, APANHOU CALADO
Antônio Carlos Melo Pereira, um contemporâneo de escola, abandonou o curso no último semestre e entrou na luta armada, na guerrilha urbana da ALN de Marighella. Depois, esteve na Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (Var-Palmares). O comandante “Tadeu”, da Var-Palmares, havia sido o nosso bom jogador de futebol Melinho, do time da Geologia.
Esse grupo guerrilheiro, entre outras façanhas, teria sido responsável por inúmeras ações de obtenção de armas, fundos e libertação de presos políticos. Uma ação famosa foi a do célebre roubo do cofre que continha a “famosa caixinha do Adhemar”, escondido numa mansão-sobrado, no Rio de Janeiro, onde a guerrilha encontrou 2,8 milhões de dólares, mas não os importantes documentos que procurava, as provas da corrupção do ex-governador Adhemar de Barros.
Este estudante da Geologia, morador no CRUSP, abandonou a escola e lançou-se, de corpo e alma, na resistência armada. Segundo Antônio Roberto Espinosa, uma ação que passou despercebida pela repressão ocorreu em seguida ao Congresso da UNE, em Ibiúna. Melinho e outros militantes da VAR foram presos com vários fuzis no carro, mas soltos em seguida, pois acharam que a ação foi feita pela equipe de segurança do fracassado Congresso.
Na verdade, queriam tentar soltar companheiros que estavam detidos e corriam risco de morte numa delegacia. Melinho abandonou o curso de geologia, no último ano, e foi preso, segundo os colegas dizem, em Goiás. A partir da prisão passou por vários locais de interrogatório e tortura, tão bárbara que ele sempre foi apontado como um daqueles que mais sofreu e resistiu aos maus tratos nos porões da ditadura.
Apresentava sequelas físicas e psíquicas. Até sua morte (câncer no pulmão) alternava momentos de lucidez entremeados com a loucura da tortura. Mesmo em tão deplorável estado, após mais de três anos de prisão, no Presídio Tiradentes e em Franco da Rocha (SP), ingressou no curso de Geologia da USP. Conseguiu se formar e exercer, com limitações, a profissão que escolhera.
A luta armada havia sido uma opção ideológica. Eu achava o Melinho um tipo meio alienado na escola. Baixinho, bom jogador de futebol, tinha uma voz aguda que perturbava o refeitório da Alameda Glete, discutindo futebol em altos brados, em vez de política. Eu ignorava seu nível político, sua atuação no CRUSP, onde morava, e suas atividades clandestinas.
Seu colega Hugo, aluno de Letras, também morador do CRUSP (ambos com residência em Mogi das Cruzes), recordou-me, em março de 2010, com saudades., categoricamente, que colega era bem consciente e politizado, a ponto de haver se voltado totalmente para a luta de libertação no Brasil, nos anos 60, quando tudo era válido para denunciar aquela situação do Estado opressor. Melinho guardava explosivos e sabia usá-los.
Um alvo pretendido teria sido a agência do INSS, da cidade de Mogi das Cruzes. Estava disposto a dinamitar o posto oficial, como aconteceu mesmo em Santo Amaro, em meados de 1969. Em Mogi, abortou-a, mediante a ponderação do conterrâneo sobre os riscos que tal ação comportaria. Não era recomendável, porque logo descobriram seus possíveis autores, entre os poucos militantes de esquerda da cidade, nos quais os dois estavam incluídos.
Em plena Anistia, Melinho procurou na Justiça a justa indenização pelos maus-tratos e danos sofridos nos presídios por que passou, como hóspede do Estado, mas a Justiça, tardia, nem isso lhe deu em vida. Nosso colega faleceu em 16 de abril de 2008. No obituário, a causa mortis: um carcinoma, que, a partir do pulmão de fumante, espalhou-se por todo o corpo.
Essa morte não foi repentina e deve ser debitada, ainda, à ditadura, que nem a dívida pecuniária da indenização (120 mil reais) pagou-lhe em vida. A indenização e a pequena pensão vitalícia estava para ser paga, com edital em vias de publicação, quando houve o falecimento do beneficiário. Os colegas procuram alguma solução e ajudei a sustar a tal publicação, para que, sem maiores burocracias, sua esposa pudesse se habilitar ao recebimento do benefício financeiro, embora dinheiro algum pudesse compensar o que esse colega sofreu nos porões e salas de tortura da ditadura.
No Presídio Tiradentes, numa de suas crises, foi tido como “louco” e levado para o Presídio do Juqueri, onde certamente mofaria esquecido, não fosse, ao que se sabe, ter sido descoberto por uma Juíza que, desconfiada do nível de vários textos de outro “louco”, foi averiguar in loco e descobriu o legítimo intelectual Melinho, que, depois de superar os caminhos da Justiça, foi libertado.
Roberto Espinosa, meu amigo pós-abertura já falecido, companheiro do Melinho na luta armada e colega de infortúnio, como um dos líderes da VAR-Palmares, confidenciou-me que ele se considerava um combatente espartano, mesmo atrás das grades. Nem se dignava a dirigir palavras aos que considerasse atenienses. Ele era o verdadeiro espartano Páris, escrevia versos e prosas para sua Helena de Tróia, cujo nome pronunciava em alto e bom som na cela, escutado pelos corredores do Tiradentes.
Outras vezes, sua musa era Julieta e ele o Romeu; ou sua inspiradora era Joana D ́Arc, Anita Garibaldi, a militante vermelha, Rosa de Luxemburgo, ou ainda, a companheira de luta armada “Vanda”, “Vânia”, “Estela” ou “Luísa”, a Dilma”, por quem tinha profundo respeito e paixão, um amor platônico, cujos escritos rasgou , pela heroína que se tornou uma figura pública conhecida nacionalmente, Dilma Rousseff, a Presidente, ex-Ministra das Minas e Energia e da Casa Civil no Governo Lula da Silva, sua companheira de guerrilha na VAR, com quem dividiu a senha – cada um com parte dela num pedaço de papel – do local onde estava guardado o arsenal da VPR-VAR-Palmares.
O que mostra que, se o caminho para se chegar ao poder, na democracia, é possível pela arma do voto, aquela luta valeu a pena? . Dilma, já ministra, foi informada quando o ex-companheiro de guerrilha morreu, mas o Tadeu já era uma simples recordação.
Esse é o filme a que assisti, se é que não fui um figurante, e agora, como diz o ditado: “meninos eu vi e agora eu já posso contar”. Mas, nenhum filósofo, como um capacho da ditadura, mesmo “sob tortura”, negará ad hominem que Ela (A Ditadura) não foi assassina, como defendem gratuitamente em seus manifestos, ou justificará, como tem sido feito, que houve mortes dos dois lados, “guerra é guerra” e esta foi contra comunistas! Nada pior que ex-comunista, comum em nosso meio.
Atuação política dos geólogos
Muitos geólogos se destacaram na vida pública, desde os irmãos Bonifácio Andrada, o Intendente Manoel Câmara Ferreira, no Distrito Diamantino; Pandiá Calógeras, único civil Ministro do Exército; na Constituinte, dois colegas, que me lembro, eram geólogos: Gabriel Guerreiro, do Pará, e João Almeida, da Bahia. Este ainda foi parlamentar reeleito, em 2002 e 2006 pelo PSDB, depois de ter sido eleito pelo PMDB. Foi Presidente do Diretório Acadêmico e do Diretório Central dos Estudantes da Bahia. Preso político por algum tempo, conseguiu fazer vida profissional e política, a partir de sua eleição a deputado estadual, na Bahia.
Essa mesma Bahia reelegeu o Governador Paulo Souto, geólogo de profissão, com mestrado na USP. Renildo Calheiros é outro geólogo eleito pelo PC do B, em Pernambuco. Na legislatura de 2002, ainda foi eleito deputado federal e, em 2008, prefeito de Olinda. O geólogo Nilson Pireto foi professor e ex-Reitor da Universidade Federal do Pará. No Estado do Amapá, elegeu-se deputado o geólogo Antônio Feijão. Octávio Elísio, de Minas Gerais, engenheiro de Minas de Ouro Preto, foi deputado federal em duas oportunidades.
César Maia, ex-Prefeito e ex-Governador do Rio de Janeiro, estudava na Escola de Minas em Ouro Preto. Foi preso no Congresso de Ibiúna e, depois de ter sido solto, saiu com passaporte, meio que fugido, num autoexílio, para o Chile, de onde retornou economista. O quase xará Everardo Maciel, que por oito anos cuidou das Receitas da União, tem como sua formação básica a geologia, acho que poucos o sabem.
O finado geólogo Eduardo Dutra atuou profissionalmente na Petromisa e enveredou pela política sindical da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e pelo Partido dos Trabalhadores (PT), pelo qual foi deputado, senador (Sergipe) e candidato ao Governo daquele estado. É um dos raros colegas que, sendo funcionário da Petrobrás, chegou à Presidência da sua subsidiária BR Distribuidora de Petróleo e, em 2009, elegeu-se Presidente do PT.
Em São Paulo, já contei, o Adriano Diogo (PT) fez carreira de vereador a deputado estadual. Há até um geólogo, artista formado nos Estados Unidos, que, quando voltou, trocou o martelo pelos holofotes dos palcos e fez carreira na televisão. Mas, e enquanto houver injustiça, corpos insepultos e abusos nos cárceres, a luta continua!
A Universidade e seu papel de transformação da sociedade
O geólogo possui uma formação eclética, humanística, cartesiana e, se for dialético, domina muitos campos, apesar de exercer o papel principal no campo, em contato direto com a natureza, transformando-a.
Os estudantes, contrariando o conceito de classe revolucionária, pois nem sequer formam uma classe em si, têm mostrado que a práxis é fundamental, uma vez que jovens estudantes e intelectuais tiveram um papel importante na redemocratização do Brasil, na formação de quadros e no movimento de massa, que resultaram efetivamente na criação e fundação de partidos populares como o PT – Partido dos Trabalhadores.
Os jovens de cara-pintada foram o estopim da derrubada de Collor. Muito embora, lembro-me muito bem, numa greve dos metalúrgicos, fomos dar apoio aos trabalhadores e o então jovem presidente do Sindicato falou que o papel do estudante era estudar. Vimos que Lula, nos dois governos, em parte graças à militância estudantil, virou Presidente e, de fato, proporcionou ensino gratuito para muitos, além do Prouni, cotas e de financiamento, com a criação de grande número de Universidades Federais. Esse é papel do Estado, além de outras coisas.
A respeito, o Velho Prestes disse ao meu finado amigo Wagner Benevides – líder petroleiro como criador do PT, juntamente com outros seis sindicalistas: Olívio Dutra, Jacob Bittar, Paulo Scromov, José Cicote e Henos Amorina -: “vocês do PT foram ousados, criaram um partido de massas, o PC tinha apenas bons quadros.”
Um caso para ser bem estudado e avaliado é o da chegada ao governo e, quem sabe também ao poder, pelo voto democrático, depois de um período de Ditadura Militar, daquela juventude, Geração 68, que sonhava com um Brasil, livre, justo e com o povo feliz, com suas necessidades básicas supridas!
A revolução socialista baseada no marxismo, uma vez que há desigualdade no mundo e, com isso, uma luta de classe, afirma que o meio para o proletário se libertar é a organização por meio de um partido político. Os bolchevistas, na Rússia, mostraram que isso era possível, em 1917, com Lênin no comando; depois, em 1949, na China, com Mao Tse Tung. Já em Cuba, a revolução começou sem a bandeira vermelha, com a foice e o martelo, mas, no decurso da caminhada, virou socialista. No Vietnã, o povo tanto lutou, que viu no socialismo a saída contra o imperialismo.
Mas, em 1968, as massas mudaram, ao menos naquela ocasião, o conceito de luta popular e de libertação, sem saber quem era a vanguarda. O proletariado foi a reboque da revolta estudantil, que ganhou as ruas de Paris e do mundo todo, inclusive as do Brasil. Mas perderam-se no meio do caminho, sem saber aonde chegar. Os intelectuais de esquerda não souberam identificar e interpretar o momento e o que fazer para aproveitar aquela “revolução”, que abalou e colocou em xeque as instituições, na França, principalmente. O Grande General De Gaulle ficou perdido no meio da confusão.
Na Alemanha, a invasão da Escola de Frankfurt deixou a “Teoria Crítica” arrasada; na Sorbonne e demais Universidades da França, nem os catedráticos do PC francês deram conta da confusão, muito menos os estruturalistas de Lévi-Strauss e tampouco os pós-estruturalistas de Lacan e Foucault.
No Brasil, 1968 é tido, até no livro de Zuenir Ventura, como o ano que não terminou.
O pensamento racional da Universidade e do meio culto brasileiro é recente. No Império, o conhecimento era religioso, dogmático, sujeito ao Códice da Santa Igreja. O Iluminismo e a Revolução Francesa de 1789 passaram meio distantes da República.
O ceticismo, o racionalismo, o niilismo tiveram influência em alguns intelectuais e escritores brasileiros. Os socialistas libertários, ou anarquistas, foram mais ativos que os marxistas. Entre os do primeiro grupo, destaca-se nosso escritor maior, Machado de Assis, que se não leu Marx, aprendeu alguma coisa com Nietzsche e até, não se sabe quem teria influenciado quem, uma relação com Freud, pois o nosso analista usou tudo do consciente e do inconsciente, em um caso estranho, como se Freud é que tivesse lido Machado. O conto dos loucos e o hospício é autoexplicativo ;
Euclides da Cunha, engenheiro com formação cartesiana, reconheceu a preferência pelo positivismo de A. Comte, mas também era um naturalista, mostrando que a ciência ajuda até o repórter da Guerra em Canudos.
E muito se valeram da ajuda dos livros e crítica dos geólogos: Hartt, Derby, Branner e Teodoro Sampaio.
Leandro Konder, (idem), coloca o nosso grande Euclides, no pequeno grupo dos escritores que leram e assimilaram as ideias de Marx, a partir dos poucos textos que havia disponíveis Mas, Euclides foi rejeitado no concurso de professor de Elementos de Mineralogia e Geologia da Escola Politécnica do engenheiro Paula Souza, a nossa velha e querida USP, exatamente por ser de outra turma da ciência e haver condenado o método suíço da escola de engenharia de São Paulo.
Monteiro Lobato, um dos nossos maiores escritores por muitos anos no index de livros proibidos aos cristãos pela Igreja, taxado de comunista, o que não foi, hoje passa em capítulos reprisados na Rede Globo, com suas histórias do Sítio do Pica-Pau Amarelo até em CD. Foi, sim, o grande livreiro que foi engolido pelo capitalismo selvagem e provocou a quebra de suas empresas várias vezes.
Naquela época, Lobato se batia para que o povo pudesse ler e os postos de correio, que apenas atualmente se tornaram agências de pagamentos e serviços diversos servissem de livraria. Lobato era materialista e, sem dúvida, leu Zaratustra. Nas Arcadas de São Francisco, fez Direito e, às custas próprias, estudou o suficiente de Geologia para especular em suas fábulas, de despesas e de histórias, e nos contos literários ou não.
O verdadeiro papel de Monteiro Lobato, meu ídolo, não o dos livros, mas sim o da indústria gráfica e do petróleo, é um livro em branco, que está por ser escrito. Meu projeto, já antigo, é um dia descobrir esse notável Lobato.
A Semana de Arte Moderna Paulista de 1922, o início da revolução nas artes, que comemorou em março cem anos, buscava valorizar o nacional, com o Manifesto Modernista, cópia longínqua do de 1848, de Marx e Engels. Oswald de Andrade reconheceria que foi a Londres, numa época que inclusive estava barbudo, e se arrependeu de não ter visitado o túmulo daquele que Marshall Berman (Aventuras no Marxismo, 2001:108) chama de um dos pais do modernismo.
Carlos Drummond de Andrade era ateu confesso e, por algum tempo, leu a cartilha vermelha, mas logo se desencantou com o stalinismo. Pedro Nava, grande médico e escritor mineiro, em seu Baú de Ossos e outros livros, dá uma lição de vida e belíssimas aulas de profissão de fé na medicina e na morte como coisa natural, um caminho sem volta. A história do pensamento de esquerda, ou socialista-materialista é muito recente no nosso meio culto. Graciliano Ramos, nosso escritor ateu de Memórias no Cárcere é um belo exemplo da vida de um homem de esquerda.
O autor de Capitães de Areia, Jorge Amado, foi membro histórico e deputado pelo Partido Comunista. Caio Prado Júnior, oriundo da alta burguesia do café, também foi um parlamentar comunista, cassado por Getúlio Vargas e pelos militares, e esteve vinculado à Faculdade de Filosofia da USP. Seus livros fizeram escola na esquerda intelectual brasileira.
Foi um empresário dos livros da Editora Brasiliense, um comunista que, na prisão, no Tiradentes, era uma figura elitista e folclórica. Na sua cela, quando todos no coletivo tinham alguma missão e trabalho do dia a dia, o abastado comunista arrumou um meio de fazer de um preso comum seu garçom e tarefeiro.
Preso no Tiradentes, tempos depois de cassado, por ter sido ativista da VPR e por haver dado uma entrevista ao meu amigo Paéco – Antônio Pádua Mendes Prado –, que, à época, nem era jornalista, e foi preso com ele, publicada na Revista Revisão (que poucos devem lembrar, por isso relembro, era editada pelo Grêmio da Filosofia, uma brochura de capa amarela, em papel sulfite e impressa na gráfica do Cursinho do Grêmio), Jacob Gorender, outro professor da USP, sem dúvida é um dos melhores quadros intelectuais que esteve filiado ao Partido Comunista do Brasil – PCB e ao Partido Comunista Revolucionário – PCBR, assim como o professor Mário Schemberg- PCB.
Outro professor da USP, depois na UNICAMP, que se engajou na luta armada como intelectual da Vanguarda Popular Revolucionária – VPR, da qual em dezembro de 1968 seria expulso, foi o João Quartim de Moraes. Segundo Wilma Maciel (Alameda, SP, 2006:25), ele havia formulado as estratégicas e táticas e dado o nome da revolução com caráter socialista, com luta imediata, sem etapas a cumprir, fazendo ações armadas na cidade, com vistas a montar a guerrilha rural.
Já, os professores Florestan Fernandes, Sérgio Buarque de Holanda, Antonio Candido, Fernando Henrique Cardoso, Marilena Chauí, Francisco Weffort, Aziz Ab’Saber, Warwick Estevam Kerr, Francisco de Oliveira e vários outros foram os primeiros intelectuais paulistas a manifestar apoio ao Partido dos Trabalhadores e alguns, a se filiar. Se não falo dos intelectuais do Brasil todo, é mais por desconhecimento que por bairrismo e nem é minha pretensão exaurir o tema.
O papel do intelectual na política é paradoxal. Platão achava que o poder na pólis deveria ser exercido pelos sábios – os filósofos. O Brasil acaba de sofrer uma guinada, com a saída, em 2002, de um grande intelectual da Presidência da República por dois mandatos seguidos. Mesmo em cima do fato recente, parece que Fernando Henrique Cardoso, talvez, não entre para a história como um grande Presidente.
Assumiu, em seu lugar, também reeleito em 2006, por ironia do destino, um ex-operário, metalúrgico, sem diploma universitário, que tem inegável valor de líder popular com enorme carisma e poder de persuasão. Lula concluiu dois mandatos (2002-2006 e 2006-2010), com sucesso no âmbito social e econômico e conseguiu eleger sua sucessora. Dilma Rousseff (2010-2014 e 2014-2016) que foi reeleita e cassada, por perda de maioria no Congresso, sob o pretexto de descumprir o orçamento.
Lula foi processado, por supostos envolvimentos com corrupção, e ficou preso pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, depois de sua condenação em segunda instância, durante 580 dias. Foi solto em 8 de novembro de 2019, por erro processual nas ações e deu-se o fim da sua prisão por condenação, antes de exaurir o trâmite processual. Em 2022, Lula disputou, novamente, a presidência da República e venceu.
Ainda é cedo para saber se o torneiro-mecânico é melhor que o laureado da Academia. A tese do sucesso do PT no governo, se as minorias chegarem de fato ao poder, mesmo que numa aliança antagônica entre o Capital – do vice-presidente José Alencar –, e o Trabalho vai mostrar que a quantidade das massas, quando se organizam, mostram sua força e, democraticamente, podem vencer os donos do poder. Nisso, aquela direita que se acha a dona da verdade tem alguma razão, quando acusa muitos professores da USP como “perigosos comunistas”, pois tudo começou na USP.
Antes, no Brasil, quase não se pensava, tudo vinha de fora, não apenas as louças, as pratarias, perfumes, roupas, os champanhes, as máquinas, mas também os livros e as ideias eram estrangeiras. Com a criação da USP em 1934, seguida de outras, o Brasil passou a pensar.
Uma profissão de fé
Repito, pois, afora na guerra, posto que irracional, e em outros raros casos que não seguem o bom senso, tudo fica mais fácil, quando se aproveitam bem as contradições dialéticas materialistas, particularmente na Geologia, para justificar, prever e encontrar jazidas baseado no clarke de concentração – índice mínimo e máximo do elemento para que uma anomalia, um metalotecto, forme um depósito econômico – de cada elemento químico e da distribuição das rochas e dos minerais na crosta.
Essa é a diferença essencial dos profissionais. não basta ser bom aluno, Há que ir além dos livros clássicos que mostram como se medem as jazidas, um corpo espacial, com largura, extensão e profundidade, volume e massa. É preciso ir ao fundo da questão, conhecer a natureza em todos seus detalhes, o que só é possível quando se possui uma visão realista e transformista dela, em vez de como ainda ocorre, uma mística ou metafísica.
O bom geólogo usa os conceitos gerais da distribuição dos minerais e seus desequilíbrios na crosta, as anomalias, as jazidas minerais. (Já imaginou, se rezar, no nosso caso, surtisse algum efeito?). Um geólogo de muita fé se baseia apenas na fé no seu grau e na certeza cega de que, assim, vai achar uma jazida.
Para tanto, bastaria rezar antes de sair ao campo, quem sabe à noite, se ajoelhar contrito, até se confessar pecados que não cometeu e orar em alto e bom som, pedindo a Deus um milagre, na esperança de que um dia encontrar uma jazida, batendo de frente com ela, ao acaso, andando sem rumo, na busca de encontrar o que não guardou, como os garimpeiros e visionários fazem ainda nos dias atuais, tal qual na busca da pedra filosofal ou da fonte da juventude.
Ou, de forma mais simples, botar um pêndulo em cima de um mapa, ainda no escritório, para que indique a mina existente exatamente num certo lugar no campo. Se não der certo, há uma opção que ainda está na moda para procurar jazidas e outras coisas, em vez de consultar um geólogo, pegar uma varinha em forma de forquilha de pessegueiro , e andar com ela segura pelas mãos, com a ponta curva para baixo.
Fala-se que, quando está em cima do olho d’água, do lençol de petróleo, da jazida de ouro ou de pedras preciosas, ela vibra tanto que, em certos casos, quase salta das mãos, de tanta atração pelo magnetismo de ambos. Tudo balela, a mais pura fantasia e imaginação.
Assim, o marxismo e a geologia têm tudo a ver um com outro e se completam. Basta que se troque ou se acrescente apenas a palavra minério e mantenha-se a exploração, que é própria da mineração.
O aforismo de Marx e Engels serve tanto para o proletário, que é o próprio explorado, como para o minério, explorado na Natureza, no rumo da universalização, da paz e unificação dos países, que vai demorar muito ainda, mas não se justifica, o fato de um mundo de natureza una e contraditória, dialética, dominado pelo homem, ser tão mal dividido, de forma aleatória, às custas de ocupação pacífica ou por invasões das guerras dos impérios grego, macedônico, romano, bizantino, das Cruzadas, do mercantilismo italiano, hispânico, lusitano, britânico, franco-napoleônico; germânico; americano, comunista russo, chinês…
Mas, nesse rumo, houve um avanço que não se imaginava. Na Europa, que unificou a moeda e com o mercado comum, já existe um trânsito quase livre de produtos e pessoas. O comércio e a comunicação instantânea obrigam a adoção de signos e língua comuns, porque, mesmo próprias e características de cada povo ou etnia, tendem à universalização, como já ocorre com o inglês, nas relações políticas e comerciais. E na música, cujas notas do som já eram quase universais, agora se aproxima nos instrumentos e na língua usados nas livres canções de artistas e das bandas de rock internacionais.
Não, não e não, a geologia não é acidental, é previsível, ela é dialética, minério não ocorre por acaso, nem por desígnios ou vontade de quem quer que o seja. É um bem comum, de toda a humanidade, que não dá duas vezes. A distribuição é geológica, não é geográfica. Ele não tem dono, pois é de todos, nem pátria, assim como os proletários, como nos ensina o marxismo, de Marx (Marx e Engels, 1848; 2001:57):
“À medida que se suprime a exploração de um indivíduo por outro, suprime-se igualmente a exploração de uma nação por outra. Desaparecendo o antagonismo de classes no interior de uma nação, desaparece igualmente a hostilidade entre as nações.”
Assim, o marxismo e a geologia têm tudo a ver um com outro e se completam. Basta que se troque ou se acrescente apenas a palavra minério e mantenha-se a exploração, que é própria da mineração. O aforismo de Marx e Engels serve tanto para o proletário, que é o próprio explorado, como para o minério, explorado na Natureza, no rumo da universalização, da paz e unificação dos países, que vai demorar muito ainda, mas não se justifica, o fato de um mundo de natureza una e contraditória, dialética, dominado pelo homem, ser tão mal dividido, de forma aleatória, às custas de ocupação pacífica ou por invasões das guerras dos impérios grego, macedônico, romano, bizantino, das Cruzadas, do mercantilismo italiano, hispânico, lusitano, britânico, franco-napoleônico; germânico; americano, comunista russo, chinês… Mas, nesse rumo, houve um avanço que não se imaginava.
Na Europa, que unificou a moeda e com o mercado comum, já existe um trânsito quase livre de produtos e pessoas. O comércio e a comunicação instantânea obrigam a adoção de signos e língua comuns, porque, mesmo próprias e características de cada povo ou etnia, tendem à universalização, como já ocorre com o inglês, nas relações políticas e comerciais. E na música, cujas notas do som já eram quase universais, agora se aproxima nos instrumentos e na língua usados nas canções de artistas e das bandas de rock.
A Universidade é o centro do saber e difusão do conhecimento e a USP é importante no panorama Global, agora mais democrática, depois de meio século, com a Diplomação, post mortem, dos dois estudantes assassinados pela ditadura.
Então, já posso terminar a aula com a chamada, pelo nome do aluno, e todos digam, em alto e bom som, que em nossa memória estão presentes os geólogos: Alexandre Vannucchi Leme e Ronaldo Mouth Queiroz! Vivam Alexandre e Queiroz!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
- AB’SABER, Aziz Nacib. O que é ser Geógrafo. Rio de Janeiro: Editora Record, 2007, 207 p.
- ACKERMANN, Fritz Louis. Recursos minerais do Território Federal do Amapá. R. Janeiro: Imprensa Oficial da União, 1948.
- AGRICOLA, Georgius. De Re Metallica. (1ª. Edic. 1556) New York: Dover Publication, Inc., 1950, 638 p.
- ALKIMIM, Mônica, Guieiro Ramalho de. PIQUES E REPIQUES: A linguagem dos Sinos de Diamantina. Diamantina – MG: Cadernos da FAFIDIA. Vol. 1; n. 2; julho de 1993, 98 p.
- ALTHUSSER Louis et Badiou, Alain. Materialismo Histórico e Materialismo Dialético. São Paulo: Global Editora, 1986, 2ª ed, 93 p.
- POSIÇÕES – 1; Resposta a John Lewis. São Paulo: Graal, 1978, 167 p. Aparelhos Ideológicos de Estado. São Paulo: Graal, 2003, 9ª. ed., 127 p.
- ARANTES, Paulo E.. Um Departamento Francês de Ultramar: estudos sobre a formação da cultura filosófica uspiana, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
- ARRIGUCCI, Davi Jr. Coração Partido. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, 153 p.
- ARISTÓTELES, 384 – 322 a.C.
- DA GERAÇÃO E DA CORRUPÇÃO. Trad. Renata M.P. Cordeiro. São Paulo: Landy, 2001, 181 p.
- ÉTICA DE NICÔMACOS. Mário Gurua Kry, 4ª ed., Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001, 2037 p./ p.88.
- HISTÓRIA ANIMALIUM. Livro 2; tomo 8.
- O HOMEM DE GÊNIO E A MELANCOLIA, O PROBLEMA XXX, 1; trad. do grego e notas Pigeaud; trad. de Jackie Alexei Bueno. Rio de Janeiro: Lacerda Editores, 1988, 128 p;
- A POÉTICA. Nova Cultural: São Paulo, 2004, 315.
- BAHIA, Ricardo. DAS LUZES À DESILUSÃO. Belo Horizonte: Autêntica, 2004, 149 p.
- BAKHTIN, Mikhail. O FREUDISMO, um esboço crítico; Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Perspectiva, 2001, 110 p.
- MARXISMO E FILOSOFIA DA LINGUAGEM; Trad. Michel Lahuad et all. c. São Paulo: Hucite, 2002.
- BARNES, Jonathan. ARISTÓTELES, Bibliografia. São Paulo: Edições Loyola:, 2001, 156p.
- BERMAN, Marshall; Aventuras no Marxismo: Rio de Janeiro: Cia das Letras, 2001, 306 p.
- BUICAN, Denis. Darwin e o Darwinismo; Trad. Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990, 118p.
- CALS, Cesar. O garimpo de Serra Pelada. Pronunciamento na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. Brasília: MME, 1983.
- CARVALHO, Olavo de. O JARDIM DAS AFLIÇÕES. Prefácio Bruno Tolentino. São Paulo: É Realizações, 2000; 335 p.
- ARISTÓTELES EM NOVA PERSPECTIVA. Rio de Janeiro: Topbooks, 1996, 204 p.
- O IMBECIL COLETIVO. Rio de Janeiro: Ed. Faculdade da Cidade, 1996, 386 p.
- UM CLÁSSICO E UM PARALELO. Rio de Janeiro: Jornal O GLOBO, de 07/06/2003, Opinião p. 7.
- O GLOBO, 23/02/02, Opinião, p. 7.
- REQUERIMENTO. Folha de São Paulo. São Paulo: Folha S. Paulo., 03/03/03, Debates p. 7.
- CASSIN, Bárbara. ARISTÓTELES E O LOGO São Paulo: Loyla, 1999, 239 p.
- CHATELET, Français. UMA HISTORIA DA RAZÃO. Rio de Janeiro: Zahar. 1994, 159 p.
- CHAUÍ, Marilena. O QUE É IDEOLOGIA. São Paulo: Brasiliense. 2003, 2ª ed., 118 p.
- COSTA, Caio Túlio. CALE-SE. A Saga de Vannucchi Leme. São Paulo: Girafa, 2003, 350 p.
- DELACAMPAGNE, Cristian. HISTÓRIA DA FILOSOFIA NO SÉCULO XX. R. Janeiro: Jorge Zahar. 1997, 312 p.
- DUARTE, Rodrigo A. P., MARX E A NATUREZA EM O CAPITAL. São Paulo: Loyola, 1986.
- ENGELS, Friedrich. DIALÉTICA DA NATUREZA. São Paulo: Paz e Terra, 1991, 5ª ed., 238 p.
- CARTA SOBRE A FELICIDADE. Trad. Álvaro Lencione e Enzo Del Carone. São Paulo: Editora UNESP, 1977, 51p.
- FEDELI, Orlando, im: http://www.montfort.org.br/cadernos/guenon10.html
- FOLHA DE SÃO PAULO – matéria paga do Objetivo/UNIP – de 27/03/2003.
- FREITAS de, Marcus Vinícius. CHARLES FREDERICK HARTT, Um Naturalista no Império de Pedro II; Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002, 286 p.
- FREIRE, Alípio ET all. Tiradentes um presídio da ditadura – memória de presos políticos. São Paulo: Scipione, 1997, 519 p.
- FEUERBACH, Ludwig: A Essencia do Cristianism Tradução José da Silva Brandão. 7ª reimpressão – Editora Vozes; Petrópolis-RJ- 2021, 344 p.
- FEUERBACH, Ludwig. PRINCÍPIOS DA FILOSOFIA DO FUTURO (1842). Trad. Artur Morão. Textos Filosóficos: Lisboa, Portugal: Edições 70, 1988, 100 p.
- HADDAD, Fernando: O TERCEIRO EXCLUÍDO: Contribuição Para Uma Antropologia Dialética. 1ª ed. – Rio de Janeiro, Zahar, 2022, 285 p.
- HEGEL, Georg W. F.(1770-1831).
- PRINCÍPIOS DA FILOSOFIA DO DIREITO. Trad. Norberto de Paula Lima. São Paulo: Icone. 1997, 329p. – p.37.
- ENCICLOPÉDIA DAS CIÊNCIAS FILOSÓFICAS, II Filosofia da Natureza, em Compêndio 1830. São Paulo: Loyla, 1997, 556 p.
- http://www.atheistempire.com/reference/statstext.html
- GALILEU, Galilei. – VIDA E PENSAMENTO – Livro Cliping. São Paulo: Editora Martin Claret, 1988, 128 p; p.106.
- GASPARI, Elio. Jornal O GLOBO. Rio de Janeiro: O GLOBO, 24 outubro de 2004, p.16.
- GAZETA MERCANTIL. p. B-12, 28 de abril de 1997. São Paulo.
- Germer, Claus. Vários para listar
- GIANNOTTI, José Artur. CERTA HERANÇA MARXISTA. São Paulo: Cia das Letras, 2000, 333 p.
- GOODLAND, Robert et FERRI, Mário Guimarães. ECOLOGIA DO CERRADO. Belo Horizonte: Editora USP/Itatiaia, 1979, 193 p.
- GOMES, Celso Barros Gomes. 50 anos da Geologia da USP. São Paulo: EDUSP, 2008.
- GONÇALVES, Everaldo. USO LEGAL DAS PEDRAS PRECIOSAS. São Paulo: Ed. Fiúza, 2002, 319 p.
- ABRÃO, et. Serfatty. Perfil Analítico do Manganês. Rio de Janeiro: 1973, …
- A MISÉRIA DO FILÓSOFO. Belo Horizonte, MG: Jornal O Tempo. Opinião. P. 7; 14/04/2003.
- O FALSO FILÓSOFO. Belo Horizonte, MG: Jornal O Tempo. MG. Opinião. P. 7; 16/08/2003.
- GUEVARA, Che. A GUERRA DE GUERRILHA: Um Método. São Paulo: Editora Base, 1968.
- KONDER, Leandro. A Derrota da Dialética. A recepção da idéias de Marx no Brasil, até o começo dos anos 30. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2009, 264 p.
- LAFARGUE, Paul. O DIREITO À PREGUIÇA. São Paulo: Claridades, 2003.
- LESSA, Sérgio A. Filho. LUKÁCS, ENGELS, HEGEL E A CATEGORIA DA NEGAÇÃO. Ensaio 17/18;1989.
- LIMA, José Ailton: Geologia e Capitalismo. Site https//:www.academia.edu.com (acesso em 26/08/2022).
- LOBATO, Monteiro. Zé Brasil. Almaque, com ilustração de Cândido Portinari, em homenagem à Luiz Carlos Prestes; edição avulsa, 1951, 23 p.
- Slang e o Brasil e o Problema vital. Editora Brasiliense, 4ª Ed. 1955.
- O Escândalo do Petróleo e Ferro. Editora Brasiliense, 4ª Ed. 1955,
- O Poço do Visconde. Editora Brasiliense, 4ª Ed.1955, 253 p.
- MACIEL, Wilma Antunes. O Capitão Lamarca e a VPR. Repressão Judicial no Brasil. São Paulo: Alameda/USP, 2006, 205 p
- MARX, Karl (1818-1883), et Engels, F.A IDEOLOGIA ALEMÃ. São Paulo, 1999, 138 p.
- MARX, Karl. (1818-1883):
- A QUESTÃO JUDAICA. São Paulo: Centauro, 5a Ed., 2000. 103 p.
- MANUSCRITOS ECONÔMICOS-FILOSÓFICOS, Contribuição à critica da Filosofia do Direito de Hegel, 1a ed.1844; São Paulo: Martin Claret, 2001, 198 p.
- MISÉRIA DA FILOSOFIA. 1ª Ed. 1847; Trad. José Carlos O. Morel. São Paulo: ICONE, 2004, 215 p.
- O CAPITAL. Crítica da Economia Política; V. I. 19ª; 1ª Ed.1867;Trad. Reginaldo Sant’Anna. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. 19ª. Ed., livro vol. 1, 2002, 571 p.; e 20ª. Ed. livro 1 vol. 2, 572-929 p.
- O DEZOITO BRUMÁRIO DE LOUIS BONAPARTE. 1ª ed. 1852; Trad. Silvio D. Chagas. São Paulo: Centauro, 2000, 149 p.
- O MANIFESTO DO PARTIDO COMUNISTA. Porto Alegre: L P M Pocket, vol.227, 2001, 132 p.
- A Origem do Capital, A Acumulação Primitiva. São Paulo: Centauro Editora, 2ª. Edição, Tradução Klaus Von Puchen, 2004, 116 p.
- MIZENER, Arthur. Modern Short Stories. THE USES OF IMAGINATION: Henry James: The Lesson of de Master, p. 261- 321. New York, USA: Norton, 1967, 744 p.
- MORLEY, Helena. MINHA VIDA DE MENINA. São Paulo: Cia Das Letras, 2000, 335p.
- NIETSZCHE, Friedrich Wilhelm, 1844-1900. CREPÚSCULO DOS ÍDOLOS, ou, como Filosofar com o Martelo; trad. Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro: Relume Dumara, 2000, 119 p.
- OLIVEIRA, Francisco. CRÍTICA À RAZÃO DUALÍSTICA – O Ornitorrinco. São Paulo: Editora Boitempo, 2003, 150 p.
- PEROGGIA, Alex. SOBRE A DIALÉTICA E AS PARTICULARIDADES DAS CIÊNCIAS DA NATUREZA E DA SOCIEDADE. São Paulo: SBG, 1994.
- A DIALÉTICA DA GEOLOG São Paulo: Revista da SBG, 1995 V. 25: p.107-110.
- O HOMEM E O AMBIENTE GEOLÓGIC São Paulo: Xamã, 1998, 271 p.
- PEREIRA, Osny Duarte. FERRO E INDEPENDÊNCIA. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 1977. 591 p.
- PAULO NETO, José – Introdução Ao Estudo Do Método de Marx: Expressão Popular – 1ª ed. São Paulo, 2011, 64 p.
- PENDU, Yvanovick Le – FUNDAMENTOS DE ETOLOGIA – Mestrado Teoria e Pesquisa do Comportamento 7 p. www.cpgp.ufpa.br/fundamento/aulaPDF;
- POLITZER, Georges. A FILOSOFIA E OS MITOS. Trad. Eduardo F. Alves. RJ: Civilização Brasileira, 1988, 310 p.
- REICH, Wilhelm: Materialismo Dialético e Psicanálise – 3ª ed. Tradução Joaquim José de Moura Ramos – Editorial Presença/Livraria Martins Fontes – Lisboa/Portugal, 1977 167 p.
- REIS FILHO, Daniel Aarão e all. Imagens da Revolução. São Paulo: Expressão Popular, 2006, 464 p.
- SADE, Marques de. DISCURSOS ÍMPIOS. Plínio A. Coelho. São Paulo: Edit. Imaginário, 1998, 96 p.
- SCHAWRZ, Roberto. DUAS MENINAS. São Paulo: Cia das Letras, 1997.
- SEQUÊNCIAS BRASILEIRAS. São Paulo: Cia das Letras, 1999.
- SHCHEGLOV, A. D.. Fundamentals of Metallogenic Analyses. Translated fron the Russian by V. Shiffer. Moscou: MIR, 1979.
- SCHOPENHAUER, Arthur (1788-1860). COMO VENCER UM DEBATE SEM PRECISAR TER RAZÃO, Dialética Erística; trad. de Olavo de Carvalho e Daniela Caldas; introdução notas e comentários de Olavo de Carvalho. Rio de Janeiro: Topbooks,1997, 258 p.
- SHAKESPEARE, William. Hamlet. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2004, 128.
- SILVA, Eumano e Morais Taís. Operação Araguaia. Os arquivos secretos da guerrilha. São Paulo: Geração Editorial, 2005, 656 p.
- SILVERIO, Maria José. ELEONOR MARX, A FILHA DE KARL. São Paulo: Francis, 2002, 175 p.
- SIRO, Publio, AFORISMOS LATINOS: JOÃO WERTER JÚNIOR. Londrina: Editora UEL, 1996. 52 p.
- SMITH, Adam. A RIQUEZA DAS NAÇÕES, Trad. Norberto P. Lima. Curitiba: Hermics, 2001.515 p.
- Sociedade da Terra Redonda http: //www.str.com.br
- SOKOL, A. et Brincmont, J., IMPOSTURAS INTELECTUAIS. Rio de Janeiro: Record, 1999.
- RUYER, Raymond: LA GNOSE DE PRINCETON. Des Savants à la Recherch d’une Réligion, 2ª ed., Paris, 1977.
- VARGAS, Milton. HISTÓRIA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA NO BRASIL: uma Súmula. São Paulo: Humanitas. FFCL USP, 2001, 147 p.
- VEJA, Revista. Edição 1873, ano 37, No. 39, 24/09/2004.
- VIOTTI, Eduardo B, et Macedo, Mariano de Matos. INDICADORES DE CIÊNCIAS,
- TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NO BRASIL. Campinas – SP: Unicamp, 2003, 616 p.
- WILDE, Oscar (1854-1900). A vida Imita a Arte.
- ZIZEK, Slavoj. UM MAPA DA IDEOLOGIA. Contraponto. Rio de Janeiro, 1999, 337 p.
- WEBER, Max. A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO CAPITALISMO. São Paulo: Martin Claret, 201, 224 p.
- WEISCHELDEL, Wilhelm. A ESCADA DOS FUNDOS DA FILOSOFIA. São Paulo: Angra, 2002, 335 p.
[1]Everaldo Gonçalves everaldogoncalves@uol.com.br
Geólogo, ex-professor da USP Universidade de São Paulo e da UFMG Universidade Federal de Minas Gerais. Foi diretor da Eletropaulo e presidente da CPFL Companhia Paulista de Força e Luz.
Parabéns ao Everaldo pela elaboração do texto que tem o mérito de expor a participação idealista de estudantes de Geologia da USP no enfrentamento da ditadura imposta ao país durante 21 anos. Nesse sentido, ao mérito em si do texto agrega-se seu ineditismo.
Um ligeiro reparo ao texto e que não o compromete: nele não há referência à Dinalva Conceição Oliveira Teixeira, a Dina, militante do PCdoB, geóloga formada na UFBA, assassinada por sua participação na Guerrilha do Araguaia.
Agrego também o nome do geólogo Antônio Carlos Monteiro Teixeira, formado na UFBA, militante do PCdoB e dado como desaparecido na região da Guerrilha do Araguaia, certamente assassinado pelas forças da repressão.
Prezado colega Carlos Alberto Leite, fico muito feliz em reencontrar o amigo nesta sua postagem que valoriza meu texto vindo de quem teve importância na participação política universitária na luta contra a ditadura. Os colegas baianos aqui não foram citados nem outros do Brasil devido ter destacado os da nossa USP. Na verdade este texto faz parte de um livro mais amplo “Geologia e Marxismo”, cujos geólogos são intelectuais dos planos de mineração ou meros executores da apropriação da acumulação primitiva da Natureza. Os recursos minerais são finitos e mal distribuídos igual a riqueza humana em dinheiro. Os geólogos baianos são lembrados em outro texto inédito, “O Golpe em Carajás”, e digo sobre a Guerrilha do Araguaia naquela região do Para. Será muito bem vinda qualquer contribuição sua à história, para aprimorar este meu texto que não tive oportunidade de consultar o amigo e peço desculpa. Grato, abraços Everaldo.