Astor Piazzolla reinventado por Nico Sorin e a banda congolesa Jupiter & Okwess foram as atrações do MIMO, nesse sábado, no Pico do Amor
Fotos:Rogério von Krüger/ Divulgação
A Itabira musical, e às vezes poética, provisoriamente livre da infestação breganeja que assola a cultura brasileira e que tradicionalmente viceja por aqui, pela força da indústria cultural predominantemente, teve o privilégio, no início da noite desse sábado, de apreciar o “biscoito fino” da música portuguesa, com a apresentação de Valter Lobo, artista nascido na cidade de Fafe.
Ele apresentou músicas de seu álbum Primeira parte de um assalto (2022), no teatro da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade (FCCDA), no segundo dia da primeira edição do MIMO (Mostra Internacional de Música de Olinda) na terra de Drummond.
Cantor e compositor independente, Lobo lançou o EP Inverno, em 2012, e o primeiro disco, “Mediterrâneo”, em 2016, sobressaindo entre a geração que integra a chamada “música popular contemporânea” – uma safra de autores da nova canção, que trata do amor e das questões ligadas ao nosso tempo, sabendo que a vida é breve e que é preciso mergulhar nas sensações que proporciona.
Corpo estável e música eletrônica
Em seguida, o público privilegiado que compareceu ao teatro da FCCDA, pode ouvir e apreciar a execução de peças de compositores itabiranos (Meiriane Vieira, Raiene Silva, Nélton Assis, Luiz Bira, Geraldo Reis, Daniel Soares e Newton Baiandeira), adaptadas para execução pela Orquestra de Câmara da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade (FCCDA), sob a regência do maestro Claudio Lage, abrindo a temporada de concertos de 2023.
“São diferentes vertentes musicais. A proposta é dar luz à rica criação local por meio de uma leitura diferenciada em arranjos orquestrais”, explica o maestro.
Já na encosta sul do Pico do Amor, no Parque Municipal Natural do Intelecto, a programação do MIMO prosseguiu com Don Letts DJ Set, da Inglaterra, com a explosiva combinação do punk rock com o reggae.
Londrino e filho de jamaicanos, Don Letts é músico, DJ e diretor de cinema. Ganhou notoriedade ao receber o Grammy de 2003 pelo documentário The Clash: Westway to the world (2000), sobre a banda punk rock.
A sua reputação se estabeleceu no mundo do cinema e da música por um conjunto vultoso de trabalhos a partir de meados dos anos 1970. Dirigiu o documentário The punk rock movie, estrelado por Sid Vicious, John Lydon e Soo Catwoman – e mais de 300 videoclipes para artistas variados, de Public Image Ltd. a Bob Marley.
Tango jazz progressivo
Na sequência, um público menor que da noite anterior, mas não por isso menos entusiasmado, pôde ouvir uma versão progressiva de clássicos de Astor Piazzolla (1921-1992), que foi de deixar o mestre que revolucionou o tango com seus arranjos jazzísticos, e o público presente, extasiados com o resultado dessa tamanha ousadia, assim como foi toda a obra desse genial músico argentino.
O seu conterrâneo, o músico e compositor argentino Nico Sorin, com o seu Octeto Eletrônico, veio a Itabira para reproduzir, com novos e ousados arranjos, um dos momentos mais ovacionados da carreira do mestre Piazzolla, que revolucionou o tango, ao adicionar em suas composições elementos do jazz e da música erudita.
Foi uma apresentação exuberante, com uma sonoridade brilhante, aproximando-se do jazz rock com grande maestria e ousadia. No repertório, sobressaíram Libertango, a obra-prima Adiós, Nonino, Meditango, Zita, Violentango, entre outros clássicos piazzollanos, transcritos e com arranjos de Sorin, com o octeto em que reuniu músicos de vários gêneros.
Congolês dançante
E para encerrar a noite musical itabirana, não teve como o público presente na concha acústica ficar indiferente à apresentação do rock congolês da banda Jupiter & Okwess, com músicas de seu terceiro álbum, Na Kozonga (De volta para casa).
A banda foi a principal atração do festival Coachella deste ano. Já excursionou pelo mundo – África, América, Ásia e Europa. O sucesso foi tanto que foi parar no Top 10 do jornal The New York Times, com o disco Kin Sonic (2017).
Figurou também na célebre playlist do ex-presidente Barack Obama, de 2018, com a música Ekombe.
Definido como “uma explosão de energia que enfeitiça o corpo e alimenta a alma”, o novo trabalho foi gravado nos estúdios do premiado produtor brasileiro Mário Caldato Jr.
As canções de Na Kozonga foram interpretadas tendo ao fundo do palco imagens da guerra civil no Congo, com mensagens políticas de paz e justiça social, com críticas contundentes à colonização que penalizou – e ainda penaliza – os países em desenvolvimento não só no continente africano, mas em todo mundo, com críticas aos danos ambientais, inclusive citando a devastação da floresta Amazônica.
Ao final do espetáculo, Nico Sorin e o baterista de seu octeto se juntaram aos congoleses, numa apoteose musical que encerrou mais esta noite do MIMO, que tem patrocínio do Instituto Cultural Vale e apoio da Prefeitura de Itabira, por meio da FCCDA.
Os muitos itabiranos que não compareceram para curtir essas apresentações na concha acústica podem até não terem virados “mulher de padre”, mas que correram risco ao ficar em casa ou na mesmice pelos barzinhos da cidade e em outros rolês etílicos breganejos, isso correram.
Como tudo que é bom dura pouco, a primeira edição do MIMO em Itabira encerra neste domingo, com muitas e boas atrações. Confira:
https://mimofestival.com/itabira2023/
