No dia do orgulho LGBTQIA+, ativista cobra tramitação de projeto que cria conselho em defesa da diversidade em Itabira

No destaque, o ativista Gercimar Almeida faz uso da Tribuna da Câmara, enquanto os vereadores se entretém no celular e poucos são os que prestam atenção no que ele diz

Carlos Cruz

Depois de cobrar por diversas vezes, nas reuniões das comissões temáticas, a tramitação do projeto lei nº 10/2022, o ativista Gercimar Almeida fez um duro e necessário discurso na Câmara, cobrando a apreciação e votação dessa proposta governamental.

O projeto é de autoria do prefeito Marco Antônio Lage (PSB). Trata da promoção do respeito, dos direitos e da dignidade das pessoas LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, transgêneros, queer, intersexuais, assexuais e mais o que se quiser ser), além de propor a criação do Conselho Municipal de Promoção da Diversidade (COMLBTQIA+).

Gercimar foi mais contundente com os vereadores e políticos que já se manifestaram contrários ao projeto e que são praticamente os mesmos que, na semana passada, criticaram a inclusão na programação do Festival de Inverno de Itabira de show com o cantor Johnny Hooker, por meio de comentários preconceituosos e homofóbicos. O show acabou sendo cancelado não por essa pressão insidiosa, mas por ter o artista prolongado a sua turnê na Europa.

“Tivemos ciência, na semana passada, que grupos preconceituosos, pessoas homofóbicas e intolerantes, que promovem o ódio, realizaram ataques contra o cantor pernambucano Johnny Hooker, que faria uma apresentação musical muito esperada na nossa cidade”, criticou o ativista sem citar nomes, mas lembrando que essas mesmas pessoas, fundamentalistas e retrógradas, investiram contra a nomeação da secretária de Educação, Laura Souza, que é lésbica e mantém união estável com a sua companheira.

Ativistas LGBTQIA+ compareceram à Câmara para pedir celeridade na tramitação do projeto que defende a diversidade sexual e promove direitos LGBTQIA+ (Fotos: Carlos Cruz)

Contradição

As manifestações contrárias à vinda do cantor, com críticas preconceituosas partiram da vereadora Rosilene Félix Guimarães (MDB) e do vereador Sidney “do Salão” Marques Vitalino (PTB), ambos evangélicos. Contraditoriamente, o vereador denunciou na tribuna da Câmara, em 3 de março, ataques vis que foi vítima pela rede social, pelo fato de já ter sido travesti.

“Estou tranquilo em dizer que o movimento LGBTQIA+ se faz necessário e é importante”, disse o parlamentar petebista, acentuando que o homossexualismo não é crime no Brasil, diferentemente do que ocorre em mais de 70 países, sendo que em 13 ainda punem a orientação sexual com a pena de morte.

“O sentimento que toma conta do meu coração é que eu não devo nada a ninguém. Isso me faz estar aqui de cabeça erguida e tranquilo, diante dos ataques e baixarias que fizeram à minha pessoa nos últimos dias, pelo fato de que eu já fui travesti”, revelou o parlamentar itabirano.

Mas agora, possivelmente por pressão de pastores de sua igreja, Sidney “do Salão” tem-se posicionado de forma diferente, com ataques ao cantor Johnny Hooker, que “cometeu a blasfêmia” em um de seus shows ao dizer que Jesus Cristo teria sido travesti.

Outro político que criticou a nomeação da secretária de Educação e que também se opôs ao projeto de promoção dos direitos LGBTQIA+ em Itabira foi o pastor e vice-prefeito Marco Antônio Gomes (PL).

Em suas críticas ao projeto do prefeito, Gomes falou até mesmo na existência de “demônios” na Prefeitura de Itabira, ao disseminar informações falsas e deturpadas pelas redes sociais.

O seu posicionamento motivou o Conselho dos Pastores de Itabira a também se posicionar contrário ao projeto do prefeito, ao considerar ser um privilégio (sic) a instituição de um Conselho Municipal LGBTQIA+.

Carlos Henrique solidarizou-se e assim como Heraldo Noronha (à direita) cobraram a tramitação do projeto

Mas não foram só eles que criticaram o projeto: “Todos se lembram de um deputado estadual que fez um vídeo condenando e repudiando a nomeação da secretária”, relembrou o vereador Carlos Henrique Oliveira (PSB).

O parlamentar não citou nome, mas ele se referiu ao deputado bolsonarista Léo Portela (PL), que também destilou os seus preconceitos homofóbicos pela rede social, após a nomeação da nova secretária municipal de Educação.

“Parabéns por você ter a coragem de se posicionar e tem o meu apoio”, disse o vereador Carlos Oliveira, dirigindo-se a Gercimar. “Acredito que nenhum vereador nesta Casa vai se posicionar contrário a esse direito. Pode contar comigo no que for preciso”, solidarizou-se o vereador socialista.

Jogo de empurra

Até aqui o movimento contrário à instituição de políticas públicas em defesa da diversidade e da criação de um conselho municipal de apoio e defesa dos direitos da comunidade LGBTQIA+ tem surtido efeito. Conforme lembrou Gercimar Almeida já tem mais de cinco meses que o projeto projeto lei nº 10/2022 está parado na Câmara.

“Disseram que alguns vereadores iriam apresentar emendas. Cadê as emendas? Estamos dispostos a conversar e dialogar para aperfeiçoar o projeto, mas sem preconceitos. O que não dá é para adiar indefinidamente a sua discussão e votação”, cobrou o ativista na reunião das comissões temáticas, na segunda-feira (27).

Com ele concordou o vereador Heraldo Rodrigues (PTB). “Esse projeto precisa ser liberado para votação, quem estiver contra que vote contrário, assim a sociedade itabirana fica sabendo quem é a favor e quem é contra.”

Para o presidente da Câmara, vereador Weverton “Vetão” Santos Andrade (PSB), não cabe a ele dá celeridade à tramitação do projeto, que já foi lido e liberado para a apreciação das comissões temáticas. “Cabe a comissão de Justiça agora pautar a matéria, não depende mais da presidência do Legislativo.”

Parecer jurídico

Bernardo Rosa defendeu o direito à diversidade e deve pautar o projeto na próxima semana

Por seu lado, o presidente da comissão de Justiça, vereador Bernardo de Souza Rosa (Avante), ao responder a Gercimar na reunião das comissões, na segunda-feira, disse que a tramitação depende ainda de parecer jurídico, o que deve ocorrer na próxima segunda-feira.

Já na reunião ordinária dessa terça-feira, Rosa fez, indiretamente, a defesa do projeto, mas sem reiterar o compromisso de pautar o projeto na reunião das comissões temáticas na próxima semana.

“Nós vivemos em uma República Democrática, que se conquistou com perdas de muitas vidas na ditadura. Como operador do Direito e respeitador da Constituição Federal, entendo que o princípio básico de todo cidadão é respeitar o próximo e a diversidade”, conclamou.

Pois é justamente para que esse direito se faça cumprir que cobrou o ativista Gercimar Almeida da Tribuna da Câmara, para em seguida concluir:

“Todos e todas, vereadores e vereadora que compõem esta casa são responsáveis pela garantia da segurança e pela evolução social, assim como pelo combate a crimes contra a população LGBTQIAP+ em nossa cidade. Quero comunicar que hoje é o dia 28 em que se comemora internacionalmente o Dia LGBTQIA+. Eu me orgulho de ser LGBT. E eu também luto.”

Leia a íntegra do pronunciamento de Gercimar Almeida nessa terça-feira (28), Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+
“Vereadores e vereadora que compõem esta Casa, são responsáveis pelo combate a crimes contra a população LGBTQIAP+ em nossa cidade. Eu me orgulho de ser LGBT. E eu também luto.”

Boa tarde a todos, todas e tods, vereadores e vereadora, e público presente.

Hoje, 28 de junho é um dia de luta, pois marca o dia do Orgulho LGBTQIAP+. Eu me chamo Gercimar Almeida e falo como cidadão, em nome de um movimento e uma parte significativa da população Itabirana.

Tivemos ciência na semana passada que grupos preconceituosos e que promovem o ódio realizaram ataques contra o cantor pernambucano Johnny Hooker, que faria uma apresentação musical muito esperada na nossa cidade.

Felizmente, diferente do que foi alegado pelas pessoas homofóbicas e intolerantes que fizeram os ataques, o motivo do cancelamento do show não foi uma concessão do poder público a este discurso de ódio, mas um conflito de agenda, o que foi devidamente explicado pelo artista nas suas redes sociais.

Há pouco tempo, vivenciamos outro caso de homofobia e misoginia sofrido pela servidora pública Laura Souza, quando foi nomeada Secretária de Educação devido à sua experiência e competência na área.

Esta sequência de ataques públicos nos deixa em estado de alerta, pois sabemos dos altos índices de homicídios de pessoas trans, gays, lésbicas e que não se enquadram na binaridade de gênero imposta pela sociedade.

A cada vinte e três horas morre uma pessoa LGBTQIAP+ no Brasil, vítima de homofobia. Somos o país com o maior número de assassinatos por motivação homofóbica do mundo. Seria Itabira uma cidade que compactua com a alto número de tragédias que ocorrem no Brasil?

Esta violência tem crescido muito nos últimos anos, devido à política de ódio promovida pelo governo Bolsonaro e seus seguidores. Política que deve ser combatida para que o povo brasileiro tenha paz e dignidade!

Neste sentido, estamos indignados, pois aqueles que poderiam estar criando leis e políticas públicas para a promoção da dignidade e segurança da população LGBTQIAP+, como os senhores vereadores e senhora vereadora, sequer aprovaram o projeto de lei 10/2020, que Institui a Política Municipal de promoção da Cidadania e Diversidade LGBTQIAP+ e cria o Conselho Municipal de Promoção da Cidadania e Diversidade LGBTQIAP+ no município de Itabira.

Sabemos que existem vereadores contra este projeto, usando como desculpa sua religião e uma suposta defesa da família, quando na verdade defendem interesses próprios e são omissos quanto à violência sofrida por itabiranas e itabiranos que se reconhecem como parte da comunidade LGBTQIAP+.

Nós, enquanto sociedade civil, acreditamos em uma Itabira mais democrática, que respeita a diversidade do seu povo, e visa um futuro que o poder público implemente uma série de políticas públicas para contemplar a todos e todas de forma igualitária, conforme defende a Constituição brasileira.

Portanto, estamos aqui hoje para denunciar os ataques homofóbicos ocorridos na última semana e solicitar que o Projeto de Lei 10/2022 seja aprovado, criando espaços de decisão e controle social no qual políticas públicas que atendam as necessidades da população LGBTQIAP+ sejam criadas, garantindo nossos direitos.

Esta luta é de todas e de todos nós. Nosso movimento está crescendo e se fortalece, pois lutamos pelo amor e pela vida.

Vocês, eleitos e eleita para nos representar na Câmara dos Vereadores de Itabira tem uma responsabilidade com o povo itabirano e isso inclui a nossa causa.

Todos e todas que compõem esta Casa são responsáveis pela garantia de segurança e pela evolução social, assim como pelo combate a crimes contra a população LGBTQIAP+ em nossa cidade.

Quero comunicar que hoje é o dia 28 em que se comemora internacionalmente o Dia LGBTQIA+. Eu me orgulho de ser LGBTQIAP+. E eu também luto.”

 

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