Poluição do ar por partículas de minério é maior em agosto e agrava com as fuligens das queimadas e da usina de ferro-gusa
A “chuvinha boa e prazenteira” que caiu na madrugada desta terça-feira (17) melhorou a qualidade do ar em Itabira, reduzindo a poeira e apagando focos de queimadas.
Mas com certeza a poluição do ar vai continuar com a estiagem e ventos fortes, estendendo-se pelo menos até o mês de outubro.
Com isso, a poeira que vem das minas da Vale pode bater recordes de emissão, no caso de a mineradora não adotar medidas mais eficazes para diminuir a emissão nas minas e a consequente poluição na cidade.
Historicamente, o mês de agosto é o mais crítico pelos ventos fortes que sopram por todas as direções, além da baixa umidade do ar, o que também favorece a emissão de poeira. Sem medidas mais eficazes, agosto pode superar todos os índices registrados no mês passado.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Vale informa que vem realizando diversas formas de controles operacionais para reduzir a emissão do que chama de material particulado –e que cumpre o que determina a legislação.
Como exemplo, cita a umectação de vias, aspersão e hidro-semeadura de taludes, umectação de pilhas com nebulizadores, aplicação de polímeros orgânicos biodegradáveis em frentes de lavras e pilhas de estéril, entre outras medidas. “No período de seca, esses controles são intensificados”, assegura.
Mas pelo visto, só essas medidas não têm sido eficazes para reduzir o volume de poeira que tem caído sobre a cidade, agravando os incômodos que a população sofre com a sujeira e as doenças respiratórias.
Multas
Por superar em pelo menos duas ocasiões o índice máximo de 240 microgramas por metro cúbico (µg/m³), a primeira vez registrado no dia 19 de julho na estação de Chacrinha, com 247,9 µg/m³ – e a segunda no dia 28 na estação do bairro Fênix com 247 µg/m³ – a Vale foi multada pelos dois episódios críticos pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
As multas aplicadas foram, respectivamente, de 650 mil Unidades Padrão Fiscal do Município (UPFM), correspondentes a R$ 2.2 milhões, e de 1,3 milhão de UPFMs, que valem R$ 4,5 milhões, totalizando R$ 6,7 milhões.
Perguntada se vai recorrer das aplicações de multas, como sempre faz, a Vale respondeu que, “em relação aos autos de infração da prefeitura, a empresa está avaliando os documentos”.
Segundo informa o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott, a empresa já recorreu da primeira multa, sendo que em relação à segunda ainda se encontra dentro do prazo para entrar com a sua defesa.
Lott não disse, mas sabe-se que a Vale não vê competência da Prefeitura em aplicar essas multas, que seriam de atribuição exclusiva dos órgãos ambientais estaduais.
Perguntado se tem conhecimento de algum pagamento de multas por poluição do ar em Itabira pela mineradora, o secretário de Meio Ambiente respondeu laconicamente: “Desconheço”, disse ele, na reunião do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Codema), que ele preside, na sexta-feira (13).
Mitigação
De acordo com o secretário de Meio Ambiente, cabe à secretaria aplicar multas, mas ele não as vê como principal meio para forçar a empresa adotar medidas mitigadoras mais eficazes. E alega que a fiscalização da atividade mineradora não é de sua competência, mas da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam).
“Temos tido conversas com a Vale a respeito da poeira. A secretaria não vê vantagem em aplicar multas, por não ser arrecadatória, mas precisamos diminuir a poeira para melhorar a qualidade ambiental no município”, esquivou-se.
Disse ainda que tem mantido conversas com a mineradora no sentido de cobrar melhorias nas formas de controle da poeira. “Essa conversa eu tive com o gerente-executivo da Vale (Daniel Daher) após a primeira ocorrência. Na segunda recebemos a visita do gerente de Meio Ambiente da empresa, o Irineu (Cortez Júnior)”, disse ele.
“Depois disso não tivemos outras ocorrências (que extrapolassem os índices máximos)”. Se neste mês ainda não foram registrados outros episódios críticos da qualidade do ar em Itabira, com certeza irão se repetir com o avanço da estiagem e a repetição de ventos fortes.
“Sobre as ocorrências no mês de julho, foram registrados ventos fortes de cerca de 23 quilômetros por hora que geraram arraste eólico em várias regiões de Itabira. A partir dos dados de monitoramento, a Vale optou por paralisar suas operações, como medida adicional de controle de particulados”, procurou explicar a mineradora em resposta a este portal de notícias sobre os eventos críticos no mês de julho.
Parâmetros
De acordo com a resolução Conama 491/2018, o índice máximo de concentração de particulados admitidos na atmosfera é de 240 µg/m³, que não pode ser repetido mais de uma vez por ano. Já pela resolução Codema, de 4 de outubro de 2007, esse índice caiu para 150 µg/m³.
Entretanto, essa legislação municipal caducou com a edição da resolução mais recente do Conama – e precisa ser reeditada pelo Codema, mesmo que a mineradora não reconheça competência para o município deliberar sobre o tema.
Enquanto isso, o secretário de Meio Ambiente disse ter cobrado da mineradora medidas mais eficazes para diminuir a poeira que cai sobre a cidade.
“A Vale tem capacidade tecnológica para melhorar isso aqui (o lançamento de poeira). E precisa fazer a sua parte, não dá mais para Itabira conviver com toda essa poeira”, disse Denes Lott na reunião do Codema.
O conselheiro Sydney Almeida Lage (Rotary) sugeriu que a Vale utilize caminhões-pipa para lavar as ruas da cidade durante a noite. A medida foi discutida no início deste século, em conversa entre o então secretário de Obras Ronaldo Lott e a ex-gerente de Meio Ambiente da Vale Isaura Pinho.
Mas a ação foi descartada pela falta de recursos hídricos, que são escassos durante todo o ano em Itabira – e mais ainda com a estiagem. Além disso, a medida seria ineficaz, uma vez que ventos fortes continuariam carreando as partículas de minério para a cidade 24 horas por dia como sempre ocorre, principalmente nesta época do ano.
Outra sugestão foi apresentada pelo conselheiro Agildo Moreira, da Procuradoria Jurídica do Município. Ele sugere que a Vale faça a pavimentação das vias internas de acesso às minas e demais estruturas industriais.
Essa medida com certeza teria eficácia, a exemplo do ocorreu com a pavimentação asfáltica da estrada Cento e Cinco, no início da década de 1990 – e pode ser feita com mistura de areia (abundante nas minas), cal e cimento.
É preciso também reativar os sistemas de aspersores ao longo das minas, para manter permanentemente irrigada as vias de acesso internas, como também os taludes sem cobertura vegetal.
Isso para reforçar o sistema de controle, uma vez que a irrigação de vias somente por caminhões-pipas, juntamente com a umectação de pilhas com nebulizadores, não têm surtido os efeitos esperados para diminuir a poeira que cai sobre a cidade.
Ferro-gusa é outra fonte de poluição em Itabira
A poluição do ar de Itabira por partículas de minério é grave não só pela sujeira que provoca na cidade, mas também por afetar a saúde da população – e que se arrasta desde pelo menos a metade da década da 1980, quando ocorreu o desmatamento da serra do Esmeril para abertura das Minas do Meio.
Mas não é a única fonte de poluição do ar, já que nesta época do ano ocorrem as recorrentes queimadas que, não raro, resultam também em incêndios florestais.
Outra fonte poluidora do ar é a usina de ferro-gusa instalada no Distrito Industrial. Além da fumaça do alto-forno com forte odor, há ainda a emissão de fuligem da descarga de carvão.
Trata-se de um material mais fino, que chega com mais facilidade aos pulmões – e que em momentos mais críticos é perceptível no perímetro urbano.
Esse material, em parte, já deve estar sendo medido pelos novos equipamentos de monitoramento de partículas inaláveis (PM-2,5) acoplados à rede automática de monitoramento da Vale.
“Estivemos lá (na usina) há cerca de um mês. A usina não faz o monitoramento, que deve ser feito”, cobra o secretário de Meio Ambiente. “A reclamação de outras empresas é constante, a usina precisa fazer adequações para melhor a qualidade do ar.”
Entretanto, Denes Lott conta que, assim como não é competência da Prefeitura fiscalizar ambientalmente a mineração, não é também em relação à usina de ferro-gusa. “A competência é estadual.”
Como o licenciamento da atividade é também estadual, Lott não soube informar se houve anuência do Codema para o funcionamento da usina. “Não sei, desconheço.” A anuência pelo município precede à licença ambiental de operação de qualquer atividade, independentemente de seu porte.