Borba Gato, além do tempo

Por Mauro Andrade Moura

Como já escrevi aqui anteriormente a respeito da escravidão, na crônica Santa Inquisição Católica, o mal que nos assola até os dias atuais, mostrando que no início das colonizações das Américas a escravidão ocorreu com o beneplácito da igreja católica, ou seja, com a permissão do Papa lá dos idos de 1500.

Entretanto, por ser comum a escravidão entre os povos e ainda continua ocorrendo, haja visto que no Brasil sempre temos notícias de trabalhos forçados, também não podemos nos esquecer que essa mesma escravidão de africanos ocorreu com o apoio de tribos africanas contra tribos africanas com menor poder de se proteger.

Também, naquela época e até pelos idos de 1700, sempre existiu os piratas marroquinos ou argelinos que invadiam o Sul da Península Ibérica e ilhas do Mediterrâneo (Sicília e Córsega) a sequestrarem e escravizarem aqueles povos brancos em suas terras no Norte da África.

Terrível!

Outro fato preponderante é o de que cada brasileiro que descender das antigas famílias paulistas, inevitavelmente descenderá de um ou mais índios e todos aqueles que descenderem das antigas famílias do Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais, essas também, inevitavelmente descenderá de um antigo escravo africano.

Para constatar isso hoje em dia é muito simples e até mesmo pouco oneroso: basta fazer um simples teste de DNA, é feito rapidamente e indolor.

Pelos meados do século XVIII a Vila de São Vicente, primeira cidade do Brasil, e Piratininga era formadas por uma população bastante mestiça dentre índios, portugueses, castelhanos e judeus.

Borba Gato

Nascido em 1649 em Santo Amaro, antiga Piratininga e hoje São Paulo, falecido pelos idos de 1717 em Sabará, bem no centro do Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais.

Tinha ascendência em Portugal continental e nos Açores, bem como na Espanha, sendo também descendente de judeus sefaraditas.

Casou-se com Maria Leite, sendo essa filha de Fernão Dias Paes Leme e Maria Beting, tendo ela ascendentes oriundos de Portugal, Alemanha e Países Baixos, além de mais propriamente descender de índios e judeus sefaraditas.

A odisseia

Foram várias as tentativas de entrada no território que hoje conhecemos por Minas Gerais a partir da definitiva entrada de 1573 e uma propriamente a que serviu de base para as posteriores foi a de 1620.

Geraldo Betim, engenheiro de mineralogia alemão, avançou no sertão das minas a partir de Piratininga/São Paulo e retornou com alguma notícia a respeito do que encontrou, queria torná-la pública e foi assassinado. Não se sabe efetivamente se foi para esconder a notícia ou por alguma desavença.

Geraldo Betim era pai de Maria Betim, portanto sogro de Fernão Dias Paes Leme.

Fernão Dias tinha suas propriedades em São Paulo e também participou do aprisionamento de índios nas missões do Guairá em parceria com o português António Raposo Tavares.

Teve papel preponderante na Vila de Piratininga, tendo até mesmo assinado o armistício para a finalização da Guerras de Famílias, também já contado aqui, que ocorria entre os Pires e os Camargos, considerando que Maria Betim também era uma Pires.

Passado esse tempo, inicia-se a grande empreitada aos sertões em buscas da Serra do Sabarabuçú, o Eldorado.

O governador-geral Afonso Furtado de Castro do Rio de Mendonça dirige-se a Fernão Dias Pais Leme para que assuma a organização de uma bandeira com a finalidade de encontrar ouro e esmeraldas.

Fernão Dias é varão de sessenta e seis anos. A tarefa é gigantesca, mesmo para pessoa mais nova. Mas ele atende sem grande delongas. Homem rico, dispõe dos bens e previne-se do necessário para a memorável empresa. Arregimenta índios, mamelucos e brancos, cerca de quarenta; amigos e parentes, e parte de São Paulo a 21 de Junho de 1674. Leva consigo, entre outros, o genro Manuel de Borba Gato, grande figura do sertanismo, o seu próprio filho ainda jovem, Garcia Roiz Pais, e um primo em terceiro grau, Matias Cardoso de Almeida, que é bem experiente em coisas do sertão, e o coloca como capitão-mor ajudante . Embrenham-se pelo interior a dentro começando por Atibaia e Sapucaí, percorrem depois o território mineiro até o Serro do Frio.” (Por José Gonçalves Salvador em Os Cristãos-novos em Minas Gerais.)

A respeito dessas primeiras entradas aos sertões já escrevemos aqui com a crônica https://viladeutopia.com.br/judeus-e-cristaos-novos-na-criacao-e-colonizacao-do-sul-do-brasil-6/ – 3ª parte , onde dissertamos a forma como essas entradas ou bandeiras procediam os seus participantes para irem conhecendo e ocupando o território e posteriormente iniciarem as explorações mineralógicas.

Essencialmente foram aproximadamente 70 anos de preparativos, idas e vindas, expectativas frustradas ou postergadas, perfazendo três gerações das primeiras famílias paulistas, conhecidas atualmente por quatrocentonas em referência aos quatrocentos anos de fundação da Vila de Piratininga de São Paulo em 1654 no planalto paulista.

Borba Gato, o auto exílio

Distrito de Borba Gato, no município de Ferros, onde o bandeirante paulista passou boa parte de seu autoexílio (Foto: Reprodução)

Com os rumores desta grande empreitada por Fernão Dias Paes Leme e seus comandados, ocorre o falecimento do mesmo no local denominado Sumidouro, no município de Pedro Leopoldo, por malária ou febre amarela, muito comuns na região e esse mal somente debelado há cem anos, embora tenha retornado a febre amarela acompanhada da dengue.

El Rei envia seu representante para avaliar o terreno e tentar encontrar novas minas além das já sob conhecimento dos parceiros de Fernão Dias, nomeadamente seu genro Borba Gato e seu filho Garcia Roiz Paes Leme.

Garcia Roiz passa alguma informação ao representante de El Rei, de nome Rodrigo Castel Blanco (conhecido por nós como Rodrigo Castelo Branco), e vai a São Paulo passar as informações, as boas novas aos seus familiares.

Rodrigo Castel Blanco vai de encontro a Borba Gato, o qual ficou tomando conta do terreno, e começam a circular no território averiguando e avaliando as possibilidades.

Borba Gato incomodado com aquilo, pois o representante de El Rei era conhecido como mineralogista e veio para ele mesmo encontrar novas jazidas minerais, cansou-se de tanto vaguear e em algum ponto do Sumidouro, não se sabe ao certo, mandou Rodrigo Castel Blanco para algum fundo de grota, algum sumidouro, ou  do alto de alguma cachoeira e o empurrou abaixo ocasionando o seu assassinato.

Sabendo das complicações que adviriam deste ato, Borba Gato evadiu-se do local e embrenhou mata a dentro, indo parar nas confluências do Rio Santo Antônio e do Rio Doce. Passou ali 15e anos em meio aos índios, aculturou-se com eles, e ficavam transitando naquele território entre a conhecida hoje vila de Borba Gato no município de Ferros e Coronel Fabriciano.

Foi para o auto exílio. Era isso ou iminente condenação por ter assassinado o representante de El Rei, embora ele tenha justificado que o assassino fora oir outro membro da bandeira.

O retorno

Passado todo esse tempo, uma década e meia, surge o governador da província e aceitou negociar um indulto com Borba Gato.

Portugal e todo o restante do ultramar lusitano precisavam das riquezas de Minas Gerais para a sua manutenção, porém, quem sabia os locais com mais volume de ouro, pois esmeraldas não foram encontradas naquela época, era o próprio Borba Gato.

Ao encontrar com o governador Artur de Sá e Menezes que viera às minas, Borba Gato disse-lhe que “dignando-se prometer perdão em nome do rei, ele iria patentear-lhe minas tão abundantes de ouro que seriam uma nova fonte de riqueza para a coroa e prosperidade para seus vassalos”.

Foi dado o perdão a Borba Gato, que foi investido como tenente-general das minas.

Quadrilátero Ferrífero

Borba Gato retorna e se instala em Sabará, bem no centro do Quadrilátero Ferrífero e suas muitíssimas riquezas minerais, as quais são extremamente exploradas até hoje.

Começa a administrar e organizar o território, conceder sesmarias e também a cobrar os impostos, o de sempre “quinto” em favor de El Rei ou da Coroa.

A partir de 1693, com a declaração de Carlos Pedroso da Silveira em ter encontrado ouro no Ribeirão do Carmo, Mariana, ocorreu o grande fluxo de pessoas em busca da riqueza, mesmo parecendo ser fácil, de grande esforço a todos que ali se davam em busca do vil metal.

Guerra dos Emboabas

Uma multidão, todos trabalhando com o único fim do encontro do ouro e ninguém a produzir alimentos.

Tudo vinha de fora e o gado bovino era dos campos gerais sob domínio do judeu português Manoel Nunes Viana. Esse, astuto, sabedor deste pormenor dos alimentos, colocou o preço que quis no seu gado bovino e chegando ao ponto de vários mineiros tendo de entregar suas lavras para saldar a dívida pela compra de carne bovina.

Borba Gato percebendo o trânsito de Nunes Viana, a sua sonegação, decretou que saísse de Caeté, o qual não aceitou ocasionando a Guerra dos Emboabas em 1708.

Após o armistício assinado em 1710, Borba Gato segue governando a região de Sabará até seu falecimento em 1718.

A respeito da Guerra do Emboabas, já discorremos a respeito na crônica  Curral do Del Rey, a Guerra dos Emboabas e os cristãos-novos.

Caminho do Ouro

Houve um concurso público para abertura do Caminho do Ouro, atualmente conhecido como Estrada Real.

Participaram Carlos Pedroso da Silveira e Garcia Roiz Paes Leme, tendo esse último vencido o certame, filho de Fernão Dias Paes Leme e consequentemente cunhado de Borba Gato.

Garcia Roiz concluiu o trajeto conhecido como Caminho Novo que tinha seu início na capital da colônia a cidade do Rio de Janeiro, tendo inicialmente findado em Conceição do Serro, atualmente Conceição do Mato Dentro, local onde o mesmo tinha algumas jazidas de Ouro.

Por além de seu tempo

Borba Gato compreendeu muito bem o seu trabalho, a sua lida, a sua responsabilidade quando descobriu as jazidas de ouro do Sabarabuçu, atualmente Sabará.

Não se furtou de suas obrigações. Preocupou-se em repartir várias sesmarias para a devida colonização e principalmente em manter a cobrança do “quinto”, pois sabia muito bem ser esse imposto necessário à manutenção da nova província que ali surgia.

Compreendia os afazeres administrativos e de segurança e o custo de tudo isto.

E bem disse em seu acordo de indulto que “as minas tão abundantes de ouro que seriam uma nova fonte de riqueza para a coroa e prosperidade para os vassalos reais”, incluindo-se aí.

Essas riquezas perduram desde sempre, ainda é explorado o ouro em Caeté, bem próximo do Morro Queimado, local este em que eclodiu a Guerra dos Emboabas.

As minas de minério de ferro também persistem com os muitíssimos empregos diretos e indiretos que geram, apesar de alguns estorvos provocados pela má administração da maior mineradora do Brasil.

Os impostos que gerou, que ainda geram para a riqueza de nosso país, bem como a grande reserva monetária por produtos exportados.

Concluindo

Borba Gato terminou a vida como homem de grande riqueza, obviamente que teve escravos negros, pois isso era o modus vivendi e operandi naquela época.

Descendentes diretos conhecidos não deixou no Brasil, pois o próprio autorizou que suas filhas fossem com seus maridos para os Açores, terra de seus antepassados, bem como passou-lhes dotes em ouro.

A respeito dos primeiros colonizadores que chegaram ao Sul do Brasil em 1532 sob o comando de Martim Afonso de Sousa, aí engloba-se o atual Sudeste, é aquela história de sempre, quem chega primeiro bebe água limpa.

Fizeram o que fizeram os primeiros colonos, avôs dos sertanistas e suas bandeiras de avanço no território.

Todos os brasileiros hoje usufruem destes fatos e longas jornadas, considerando ainda que todos não vieram aqui para passear e sim colonizar essa terra e os seus descendentes criaram essa nação, sejam brancos, índios ou negros, todos fazem parte deste contexto.

 

 

 

 

 

 

 

 

Posts Similares

20 Comentários

  1. A questão do significado da exaltação de determinadas figuras históricas na contemporaneidade é uma preocupação do que chamamos de história pública. Para além de genealogias e epopéias dos chamados bandeirantes, sobre seu suposto papel na edificação de vilas do interior, muitos trabalhos já contestam essa essa versão. John Monteiro (em NEGROS DA TERRA: INDIOS E BANDEIRANTES NAS ORIGENS DE SAO PAULO) por exemplo, a partir de ampla pesquisa empírica, contesta essa ideia de que os bandeirantes foram povoadores do interior, demonstrando, através de ampla base documental, é que o fizeram foi escravizar indígenas, do século XV ao XVIII e vende-los nas Vilas de São Paulo, mesmo quando já havia proibição régia para a escravização dos indígenas.

    Outro ponto: a prática da escravidão remonta a Antiguidade e já ocorria em terras africanas, é fato. Porém, sob outros moldes, bem distintos do que veio a se tornar a escravidão moderna da empresa colonial. Os africanos, assim como gregos e romanos, escravizavam prisioneiros de guerras e endividados, e isso não era um mercado transatlântico que envolvia vários continentes e territórios, como foi o caso da empresa escravista empreendida por europeus na costa da África. Esses, estimulando as rivalidades existentes entre tais povos, transformaram o que era uma prática entre tais povos, em uma empresa mercantil sem precedentes na história da humanidade para abastecer suas colônias na América de mão de obra escravizada para manutenção das lavouras de plantation e/ou áreas minerais.

    Voltando a questão da história pública e aos monumentos de figuras controversas da história do Brasil. A reivindicação que se faz a respeito de porque certas memórias são preservadas em detrimento de outras é uma demanda do presente que nem os historiadores nem a sociedade podem se abster.

    Construir monumentos é um ato político. Derrubá-los e incendiá-los também.Não acredito que atear fogo em uma estátua de Borba Gato promova de imediato as mudanças estruturais nas relações sociais que a ação conclama. Mas, acho legítimo enquanto uma reivindicação do presente sobre porque determinadas memórias históricas são reificadas enquanto outras são constantemente apagadas. Aldeias indígenas inteiras também têm sido incendiadas nos últimos tempos e esses atentados não causaram tanta comoção. Aldeias indígenas também são espaços de memória.

    Não penso que essa questão seja simples de ser resolvida e, como historiadora, tenho muitas ressalvas sobre o efeito que isso pode ter.

    A estátua de Borba Gato não era, enquanto elemento artístico, nenhuma obra de Aleijadinho, mas o argumento usado para incendia- lá – a violência das expedições bandeirantes contra os povos indígenas – também pode ser usado para se atear fogo em cada um dos casarios e monumentos que integram a cidade de Ouro Preto, por exemplo. A exuberância da cidade setecentista, patrimônio da humanidade, é resultado da empresa escravista que destruiu famílias e comunidades dos dois lados do Atlântico.

    A questão que urge de todo esse episódio é: há outras histórias que precisam ser contadas.

    Espero que, mais que monumentos, a gente consiga derrubar, com ampliação do acesso à educação e crítica, as ideias que eles representam. Isso sim modifica uma sociedade.

  2. O fogo na estátua não foi iconoclastia, foi ato de rebeldia, ato político. Os Borbas da modernidade continuam a matança dos Bandeirantes. Viver nos grandes centros urbanos mostram que a colonização e escravidão nunca acabaram… e este, é um país constituído por um povo cruel, violento, trapaceiro, tudo borbinha….

    1. O mais engraçado, prezada Cristina, que o Borba foi cruel com os seus mesmo…
      Há de se mudar o panorama dessa terra, temos de chegar a um acordo social que prezem os dois lados de maneira mais igualitária.

  3. Concordo com você, prezada Maura, quando diz que “há outras histórias que precisam ser contadas.”
    Mas que sejam bem contadas.
    O esforço que esse pessoal fez para tentar demolir a estátua de concreto armado, o dinheiro que gastaram, deveriam ter feito isto abrindo o debate e não o embate, pois a cada ação dessa sempre haverá a reação, gostem ou desgostem.
    Atearam fogo no “Borba Gato” alegando que ele assassinou e apreendeu/escravizou índios, pois bem, fizeram com a figura histórica brasileira errada e já explicado isto no texto acima.
    Das etnias que aqui viviam em finais do século XVII e início do XVIII, a que o Borba Gato matou foi a própria branca, a iniciar com o castelhano Rodrigo Castelo Branco e depois na Guerra dos Emboabas, guerra essa, como bem sabe, de portugueses contra paulistas.
    Naquela época, ficou sabido que o silvícola que vivia em Minas Gerais não servia para o serviço de mineração, por conta disto foram deixados de lado pelos bandeirantes e o embate ocorrido na época foi com os botocudos que viviam nas barras do Rio Verde Grande, na confluência com o Rio São Francisco e já escrevi a respeito disto aqui. Ocorreu ali que os índios que não conseguiam combater os botocudos aderiram aos paulistas, foi o início da aculturação por essas bandas.
    Quanto a dizer que a colonização em Minas Gerais e Goiás foi com os bandeirantes, ledo engano, muita falta de leitura de quem afirmou isto, pois São Paulo não tinha população suficiente para tal e, como escrevi também acima, a colonização massiva ocorreu a partir de 1700 com a declaração das descobertas das minas de ouro a ponto de por volta de 1730, não me lembro da data correta, ocorreu o decreto real proibindo das pessoas saírem de Portugal para o Brasil tal foi o êxodo ocorrido lá e o que isto poderia causar com a Espanha montada ali bem ao lado e sempre querendo retomar aquele condado perdido em 1640.
    O início da colonização, sim, ela se iniciou a partir de São Paulo e isto já tinha sido pensado ainda em 1730 quando João III designou Martim Afonso de Sousa para vir e iniciar essa colonização a partir de São Vicente – SP, sendo esta a primeira cidade brasileira e com direito ao fórum do pelourinho.
    Mariana, Ouro Preto, Itabirito, Ouro Branco, Santa Bárbara, Caeté, Barão de Cocais, Rio Piracicaba, Sabará, Santa Luzia, Itabira, Mathias Barbosa, Serro Frio, Conceição do Mato Dentro, Passa Quatro, dentre tantas, foram iniciadas pelos bandeirantes paulistas e para saber disto, basta conferir nos anais históricos destas cidades.
    A respeito da escravidão, isto deve ser bem estudado, pois ela sempre ocorreu na humanidade a ponto de toda uma nação, os judeus, terem sido escravizados na Babilônia, não se esqueça disto.
    Há alguma informação ou alusão que o próprio Zumbi do Palmares tinha lá seus escravos negros no seu quilombo na Serra da Barriga; também deve ser estudado isto a esclarecer se este fato é real ou não.
    A cidade de Lagos, nos Algarves, criou a “Rota dos Escravos”, vá lá saber qual das cidades aderiram ou apoiam essa rota e o Museu que lá existe. Pode ter certeza que a capital da Nigéria tem o nome de Lagos por conta da cidade algarvia.
    E essa rotina da escravidão, infelizmente, continua a ocorrer em África.
    A história está aí para ser bem analisada, estudada e ampliado o debate e não embate.
    Não é acabando, destruindo, demolindo estes monumentos que se resolverá essa questão, pois, os homenageados tiveram o seu papel preponderante na criação dessa terra como a conhecemos hoje, vivemos e usufruímos.

    1. E para ser bem contada, é preciso que se reavalie de que forma as histórias que já foram contadas promovem o apagamento das histórias daqueles que não saíram vencedores das batalhas da passado.

      A escrita da História é hoje, como fora em tempo anterior, um reflexo do contexto e momento em que os historiadores se debruçam sobre seu ofício e sobre os fragmentos do passado. Aliás, essa também é uma característica da história: ela é lacunar. Se hoje, membros de diversas categorias sociais se apresentam como protagonistas esquecidos em parte da versão histórica que é celebrada em momentos nos logradouros públicos , cabe a todos nós refletir sobre isso. O homem cordial de Sérgio Buarque de Holanda e a democracia racial de Gilberto Freyre foram aclamados em sua época. Os historiadores de hoje, a partir de estudos baseados em farto acervo já apresentam outros elementos na perspectiva de uma interpretação do Brasil Colonial. Continuam sendo clássicos? Sim. Mas não são mais lidos como um Brasil tal qual foi. Mesmo porque, são ensaios. Nenhum deles se fundamentou em base documental relevante para elaborar suas interpretações sobre o Brasil.

      A respeito da escravidão, isso já é bem estudado. A historiografia brasileira desde a década de 1980 vem apresentando novas interpretações e contribuições valiosas acerca do período escravista brasileiro, atribuindo a indígenas e escravizados o papel que lhes cabe: de sujeitos históricos. Dessa forma, essa interpretação que visa tratar como equivalentes a escravidão do mundo Antigo e em África do que se transformou no tráfico atlântico é equivocada. Não é à toa que os estudos históricos atribuem à empresa mercantil transatlântica posterior ao século XV o nome de “Escravidão Moderna”. É distinta do que houve no mundo antigo. É outra escravidão, outro processo, com outros moldes, outras justificativas, outros objetivos e outros resultados.

      E se essa rotina da escravidão continua a ocorrer em África, isso é efeito do colonialismo europeu nesse continente, que perdurou até metade do século XX. E trabalho análogo a escravidão também existe no tempo presente do lado de cá do Atlântico.

      Creio ser mais importante e frutífero para o debate público sobre história e memória que se reflita sobre os significados dessas ações que questionam a existência de tais monumentos, do que apenas desqualifica-las.

      Repito: construir monumentos é um ato político. Derrubá-los e incendiá-los, também.

      A história não é estanque. O nosso papel social e político, como historiadores, também não deve ser.

      1. Os historiadores brasileiros haveriam de também ler e estudar, além do Buarque de Holanda e Freyre, o Dr Jayme Cortesão, pois foi este português o primeiro que se preocupou em ler e escrever a respeito dos sertanistas e dos bandeirantes e isto a pedido do Itamaraty.
        É para ler, entender e contextualizar tudo e não meramente criticar ou combater o que já se conhece dessa história, pois o Borba Gato tem seu papel preponderante na criação da província de Minas Gerais e não será um fogo posto na estátua em sua homenagem que o apagará, que o eliminará dessa história aqui da nossa terra no Quadrilátero Ferrífero.
        A crônica foi a respeito da pessoa e dos feitos do Borba Gato e a respeito da escravidão, seja ela de silvículas ou de africanos, deveria ser em outra, para outro debate, outras citações a respeito dessa situação que perdura ad aeternum em África, indiferente da alavancagem que tomou com os navios negreiros.
        Há de se considerar que foram os europeus a abominarem e passar a proibir a escravidão, embora a mesma tenha perdurado no Brasil até 1888.
        E a respeito de derrubar a estátua do Borba Gato, que derrubem de outra personagem da história brasileira, seja ela boa ou má, pois o mesmo tem de receber todo o nosso respeito pelos seus feitos, por seus atos e pela maneira como conduziu essa parte da história em que esteve inserido.
        Borba Gato, além de seu tempo, foi legalista, procurou ser justo e deixou-nos todo esse legado de riqueza, a qual todo o país usufrui por já trezentos e cinquenta anos.

  4. Apesar de o tema básico desta crônica, a personagem histórica ser o Borba Gato, aludiram a respeito dos escravos e um amigo enviou-me oportunamente esse índice de matérias a respeito disto:
    PORTAIS SOBRE A ESCRAVIDÃO NA VIKIPÉDIA

    Escravidão na Idade Média: https://pt.wikipedia.org/wiki/Escravid%C3%A3o_na_Europa_Medieval

    Em Espanha: https://es.wikipedia.org/wiki/Esclavitud_en_Espa%C3%B1a

    Portal:Escravidão
    : https://pt.wikipedia.org/wiki/Portal:Escravid%C3%A3o

    A fim de que seja bem lido e entendido a respeito desse tema da escravidão pela humanidade no decorrer dos milênios de sua existência.

  5. As referências bibliográficas do historiadores brasileiros são bem maiores do que lista de críticas que se pode fazer a exaltação de figuras controversas da história do Brasil, como Borba Gato.

    E um texto nunca é só o seu tema. Ele é também o que reverbera a partir dele.

    Um abraço, Mauro!

  6. Em complemento a esta crônica quando tentam colocar Borba Gato como dizimador de índios, inserimos este parágrafo extraído do livro “O Cabo-maior dos Paulistas na Guerra com os Emboabas, de autoria de Aureliano Leite, na página 32:
    “Tornou-se provavelmente parceiro de Garcia Rodrigues Pais, primogênito e continuador das explorações de Fernão Dias Pais, o chamado “Caçador de Esmeraldas”, no poema sonoroso de Olavo Bilac. Garcia Rodrigues Pais foi ainda aquele bandeirante que, aos 1681, procurou o infortunado Dom Rodrigues Castelo-Branco, em pleno sertão e lhe entregou as esmeraldas (supostas esmeraldas!) que o velharão Fernão, seu api, havia descoberto, rogando ao dito castelhano que as enviasse a sua majestade, D. Pedro II, pelo impedimento que ele, Garcia, tinha de naquela ocasião marchar para São Paulo, por causa da epidemia que levara à cama, gravemente enfermos, todos os índios da tropa de seu progenitor, morto por aquelas febres demoníacas, pouco antes.”

  7. Caro, Mauro,

    Eu poderia fazer uma extensão lista de referências bibliográficas de trabalhos recentes que contestam essa versão. O primeiro que citei, do John Monteiro, nem é tão recente (é vdd 1994) e já defaz essa interpretação. Mas o debate histórico é também o espaço da controvérsia. Hoje em dia é muito fácil ter acesso a trabalhos acadêmicos pela internet. Deixo esse trabalho para os leitores, leigos ou especialistas, que se interessarem pelo tema.

    Um abraço e bom domingo!

  8. Coitado do Borba Gato, um incompreendido.
    Gostaria de poder contar pessoalmente a ele essa azáfama com a imagem dele, tomando um gole de cachaça e saboreando um queijo minas criado na terra que ele ajudou a transformar.
    Dizer a ele que de nada adiantou tanto esforço pessoal, deixar a mulher e filhas em lugar distante, vender as joias da família a patrocinar a expedição.
    Contar que não foi criminalizado pelo banho que mandou o castelhano tomar, sem volta, mas que, depois de exatos trezentos anos do desaparecimento dele, ser condenado por coisas que fez, praticou e outras que aludem ele ter feito sem tê-lo em si, aos olhos de quem vive no século XXI desconsiderando quem foi criado no século XVII e muito mais ainda o modus vivendi daquela época.
    Além de não considerarem todo o risco de morte antecipada que sofreu aquando da guerra que participou, de irmãos contra irmãos, excencialmente, de judeus contra cristãos-novos, todos sefaraditas.
    Mas diria, explicaria que os incautos de hoje excluíram a palavra “contextualização” do léxico da língua mater, a qual vem sofrendo horrores também.
    Por último, ao sabor de alguma boa lembrança, contaria que todo o reino daquela época e hoje em dia todo um país vive do legado que nos deixou em herança, embora seja uma herança dita maldita aos incautos.
    E, finalizando, possivelmente ao regozijo dele, diria que gostaria muito de assistir in loco o imbecil que pôs fogo na estátua dele em São Paulo fazer o mesmo em Sabará com a pequena estátua e ao nível de qualquer um; assistir o tal ser defenestrado, linchado em praça pública por ato tão impensado e desprovido de motivação válida e sem nenhuma contextualização de toda a história e percurso que ele fez em sua vida terrena.
    Toda essa ignorância, in lato sensu, nestes dias estranhos, soçobra.
    Que triste!

  9. Nem a escrita da História e nem a preservação da(s) memória(s) saem ganhando quando a sociedade trata por ignorância aquilo que é a própria História se manifestando. Refletir sobre tais ações é muito mais válido e proveitoso para todos, do passado e do presente, do que apenas desqualifica-las. A História é dinâmica e continua acontecendo…

  10. Eu sempre procuro contextualizar tudo que leio, percebo e vejo nos muitos documentos que tenho estudado nestes últimos oito anos, diferentemente de muitos brasileiros afoitos e outros tantos sem noção alguma de tudo ou de nada mundo afora.

  11. Insiro aqui comentários pessoais que recebi a respeito dessa crônica:
    Muito bom relato, Mauro. Parabéns! Abraços
    Marcelo

    Minha resposta:
    Grato pela leitura, Marcelo.

  12. Insiro aqui comentários pessoais que recebi a respeito dessa crônica:
    Rio, 14/ago/2021.
    Olá Mauro:
    Obrigado pelo envio do artigo. Ficou boa essa matéria!
    Vou repassar a alguns interessados nessa História.
    Um abraço,
    Jorge.

    Minha resposta:
    Mui grato pela leitura.
    Fique à vontade para compartilhar.

    Réplica:
    Olá Mauro! Já distribuí. Muitos gostaram. Estamos atravessando tempos difíceis, de “revisionismo” e outros “ismos”. É pura boçalidade (desculpe a palavra, mas não há outra!).
    Um abraço, Jorge.

    Tréplica:
    Muito bem, Jorge.

    Infelizmente essa moda do “ismo” anda gracejando pelo Brasil e provocando toda essa boçalidade e de maneira torpe.

    Vamos em frente e contra essa maré de retardados,
    Mauro

    1. Parabéns Mauro , minha família é quase toda de Borba Gato, único de Ferros , 9 irmãos nasceram nos idos anterior a 1897 nascimento de meu pai no Querido distrito de Borba Gato c o nome José Marinho de Souza ( José Paixão) .
      Seu trabalho é muito importante p nossa História. Um abraço

      1. Prezado, Marco Antônio.
        Naquela altura, em finais do século XIX, havia mais produção agrícola e de gado na região em proporção à população atual na região de Ferros, tanto é que exatamente em 1890 ela foi elevada a município separando-se de Itabira.
        Grato pela leitura e comentário,
        Mauro.

  13. Insiro aqui comentários pessoais que recebi a respeito dessa crônica:
    Mauro, meu amigo, seu texto é fabuloso. Como dizia meu pai, eu o assinaria e o rezaria em público. Parabéns. E vejo que estou passando da hora de rever Sabará, onde não vou há muito tempo.
    Grande abraço. Saúde, Nelson

    Minha resposta:
    Olá, Nelson.

    Procurei apresentar a pessoa do valoroso Manoel de Borba Gato, muito disto já tinha pronto em minha própria memória.
    Estão querendo esculhambar, desculpe-me a expressão, com a figura dele e da minha parte eu não posso permitir isto e vou-me esforçar sempre para que não o façam da maneira chula como estão fazendo.
    É uma tentativa de desmerecer tudo o que ele fez, como se fosse um qualquer e movido por razões mínimas.

    Grato pela leitura e comentário,
    Mauro

  14. Insiro aqui comentários pessoais que recebi a respeito dessa crônica:
    Grato pela sua excelente informação histórica baseada em acontecimentos bem claros… gostei de ler
    Houve e continua a haver escravaturas diversas… deixemo-nos de estórias piegas e falsas interpretação acerca da escravatura.

    um abraço,
    José

    Minha resposta:
    Bom dia, José.

    Aqui no Brasil é assim, indiferente ao grau de formação escolar, as pessoas acham que as relações comerciais transnacionais e ida e vinda de pessoas, livres ou cativas, iniciou em 1500 com a declaração de descoberto do Brasil.
    Então, por conta disso, ficam por aí e aqui reverberando as estórias piegas e falsas interpretação acerca da escravatura.
    Esses que reclamam diretamente comigo, já perguntei, nenhum deles ainda conseguiu responder-me o nome de um europeu que tenha buscado algum negro no interior da África e o tenha trazido para ser escravo…

    Réplica:
    Estamos em perfeita sintonia… e eu tenho 14 anos de África e visitei

    Africa do Sul
    Zambia
    Nigeria ..esta foi dura visita
    Congos (dois )
    Sudão
    Moçambique
    Guine Bissau

    algo vi …

    Minha resposta:
    faltastes com as ilhas criolas, pá… rs
    já quis muito ir em outras paragens d´África, desanimei-me

    Tréplica:
    Naquele tempo, São Tomé a Cabo Verde eram Portugal !!! esqueci mesmo. Desanimou ???—Não censuro !!!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *