Santa Inquisição Católica, o mal que nos assola até os dias atuais

Mauro Andrade Moura

O ofício inquisitorial em Espanha foi decretado pelos reis católicos Fernão de Aragão e Isabel de Castela em 1478 e, por acordo nupcial, por D. Manuel o Venturoso em Portugal em 1496.

Em Espanha foi colocado o ofício da inquisição imediatamente e logo após a tomada do reino sarraceno de Granada pelos cristãos, a qual era a capital da Andaluzia, foi decretada a expulsão de todos os judeus sefaraditas e sarracenos que não se convertessem ao catolicismo.

Isso ocorreu um dia antes da partida das três caravelas capitaneadas por Cristóvão Colombo a 3 de Agosto de 1492. Os que não saíram de Espanha e converterem-se ao catolicismo passaram a ser dominados ali como conversos.

Manuel o Venturoso decretou a inquisição em Portugal para satisfazer seus sogros, os reis católicos espanhóis, mas, na contrafeita, apesar de a ter oficializado em 1515, não a colocou em funcionamento e muito menos expulsou ninguém de seu reino.

Isso por ele saber muito bem  que, devido à extensão dos descobrimentos marítimos portugueses, precisava de todos os portugueses, fossem eles cristãos, sarracenos e judeus sefaraditas a seu serviço.

Manuel o Venturoso determinou um prazo de vinte anos para que os não cristãos fossem se convertendo ao catolicismo. Mas, o tempo corre, D. Manuel o Venturoso falece, rei morto rei posto. Assume o reinado português seu filho João III, de triste memória.

João III, por impulsão dos avós espanhóis e até mesmo o seu irmão cardeal, deu a definitiva partida na santa inquisição católica em Portugal, após uma compra e recompra da bula do Papa Paulo III, nome Cum ad nihil magis, consumindo verdadeira fortuna em Roma que tanta falta fez ao seu reinado logo em seguida.

O Cardeal Henrique de Portugal, irmão de João III, foi o primeiro inquisidor-mor de Portugal.

A fundação foi a 23 de maio de 1536 e foram instituídos os tribunais inquisitoriais em Lisboa, Coimbra, Évora, Tomar, Lamego e Porto. Após 1560 ficaram funcionando os tribunais inquisitoriais em Lisboa, Coimbra e Goa.

Tendo sido o primeiro auto da fé da história do Santo Ofício lusitano aconteceu em Lisboa, a 26 de Setembro de 1540. E naquela dita compra e recompra das bulas papais, a santa inquisição católica em Portugal funcionou efetivamente a partir de 1540.

Os padres católicos, tanto em Espanha como em Portugal e nos seus domínios, passaram a ter total controle de todos os viventes, crentes ou descrentes (os tais criptojudeus).

Muitos sarracenos tiveram a opção de atravessar o Mar Mediterrâneo e aportar na terra de seus pais em Marrocos e Argélia. Os judeus sefaraditas que tinham mais recursos financeiros conseguiram partir para a Holanda, Inglaterra, Itália, Grécia e Turquia. Alguns poucos foram ter em Marrocos.

Os judeus sefaraditas que ficaram em Portugal e devido a pouca gente ali face o novo mundo descoberto, com o tempo muitos conseguiram vir para o Brasil a colonizar o país. Era uma terra nova e bem distante da administração da santa inquisição católica. Uns tantos judeus sefaraditas foram ter em Goa.

Nos controles e registros das pessoas, por administração dos padres católicos e de acordo com os decretos inquisitoriais católicos, os judeus ou cristãos-novos não podiam assumir cargos da administração dos reinos espanhol e português, eram denominados de “gente da nação” ou de “raça infecta”.

Nessa linha do controle das almas viventes e também das mortas, a santa inquisição católica, por já haver antecipado o contato dos cristãos com os africanos, esses também eram proibidos de assumir cargos da administração nos reinos e suas colônias e eram denominados mesmo como “negros”.

Na chegada às colônias nas Américas, como os silvícolas/ameríndios ainda não tinha contato com os cristãos, houve um relaxamento pelo fato de a igreja católica os considerar como de “almas puras”.

Nos vários registros nos livros paroquiais do Brasil, sempre vemos essa distinção e há até mesmo, como em Ferros – MG, um livro de batismo somente para os filhos dos escravos, obviamente negros.

Nesses registros dos escravos encontramos as seguintes denominações: -escravos, criolo/africano, mina, banto, benguela, congo, angola, moçambique, negro (nascido no Brasil), pardo e cabra (índio com negro).

Por conta disto, ficou instalada a distinção entre brancos e negros na colônia brasileira, considerando que os judeus sefaraditas que para cá vieram tinha o tom de pele branca os diferenciando dos escravos negros.

Outro fato a ser posto é que a escravidão dos negros nas colônias das Américas ocorreu com a benção papal, embora isto não seja lembrado por algum descaso ou mera aceitação de todos, indistintamente.

Em decorrência de toda essa maledicência da igreja católica e sua santa inquisição e mesmo após a libertação dos escravos pela Lei Áurea, foi criado agora em finais do século XX no Brasil o verbete “coisificação” do negro, uma torpeza do ser humano no geral.

Mas tudo em função da dissenção provocada a todos pela igreja católica quanto à distinção das pessoas e a forma como os padres católicos tratavam a todos, pelo menos até a chegada do papa João XXIII ao Vaticano em 1958.

Quanto aos judeus sefaraditas, sim, foram os que mais sofreram com a santa inquisição católica de Espanha e de Portugal.

Contam 200 mil processos em Espanha e 40 mil processos em Portugal contra os judeus sefaraditas. Sendo que pelo menos 2% desses morreram nas masmorras ou fogueiras em Portugal, o número de Espanha me foge à memória.

Os meios que os inquisidores católicos utilizavam para a obtenção das declarações dos judeus eram de várias formas quando torturas faziam por enforcamento, afogados em tanques de água, a polé, o potro, o garrote, a queima dos pés e, como sempre, sendo a parte do ritual eram os queimados nas fogueiras no Terreiro do Paço com grande plateia.

Aqueles judeus e judias que eram presos, condenados e posteriormente libertos, eram obrigados a trajarem o “sambenito”, com o fim de distingui-los das demais pessoas.

A polé foi melhorada no Brasil pelos algozes da ditadura militar, a dinamizaram e transformaram-na no “pau-de-arara”, sendo este um dos instrumentos de tortura de maior eficiência que se conhece.

Outro fato determinante é o de que a santa inquisição católica, por meio de seus delegados, ao prenderem qualquer denunciado, imediatamente todo o seu patrimônio era confiscado e repartido entre os administradores inquisitoriais e a coroa real.

Foi uma enorme fonte de receita, sem contar as várias taxas e as denominadas “fintas” que se cobravam dos cristãos-novos para que não fossem molestados na premissa de serem imediatamente trancafiados nas masmorras da santa inquisição católica.

Simplesmente o judaísmo deixou de existir nos reinos ibéricos, nada ficou a não ser algumas memórias e costumes familiares, pois ninguém podia manter a prática religiosa dos seus avós que não fosse logo detectado pelos tribunais da santa inquisição católica.

Atualmente no Brasil, parte da inquisição católica foi reinstalada a partir da lei da “delação premiada”, a qual funciona exatamente nos mesmos moldes como nos tempos da inquisição, sendo a maneira utilizada a de um entregar o outro com o fim de minimizar sua pena ou mesmo a vê-la comutada em penas administrativas.

Em 25 de maio de 1773, por decreto real de Dom José, sendo o Marquês de Pombal seu primeiro ministro, foi abolida a distinção entre cristãos-velhos e cristãos-novos, podendo esses, portanto, passarem a assumir cargos da administração do reino português.

Com esse decreto real de 1773, o tribunal inquisitorial deixou de ser eclesiástico e passou a ser jurisdicional. Foi utilizado bem como para crimes comuns ou políticos. Após essa transformação, o Marquês de Pombal, utilizando-se desse tribunal, praticamente exterminou a família dos “Távoras”.

Com o advento da Inconfidência Mineira em 1789, Tiradentes e os demais inconfidentes também foram processados e sentenciados de acordo com os trâmites deste tribunal da inquisição, a iniciar pelo sequestro dos bens de todos os indiciados.

A santa inquisição católica perdurou 300 anos em Portugal e suas colônias. E só foi decretado o seu fim por D. João VI a 31 de março de 1821.

Imagens extraídas do livro Vínculos do Fogo, de autoria do jornalista judeu Alberto Dines.

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3 Comentários

  1. A despeito do Estado assassino tudo continua igual. Nos morros das favelas, o Estado mata e mata e mata, não há folga é todo o dia e toda hora. E não importa quem seja… o Brasil é um país de gente cruel, cruel, o que está explicito com a pandemia.

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