Siga o exemplo, Vale: dê férias coletivas como fez a Volkswagen para ajudar no enfrentamento à pandemia. E compre vacinas

Carlos Cruz

A multinacional Volkswagen anunciou nessa sexta-feira (19) que vai parar a produção de automóveis em todas as suas unidades no país por 12 dias, a partir da próxima quarta-feira (24). A parada será compensada no futuro.

Em nota, a empresa alega como justificativa o agravamento da pandemia com o novo coronavírus e suas variantes, o que tem aumento da taxa de ocupação de leitos de UTI, levando ao colapso o sistema de saúde do país.

“A empresa adota esta medida a fim de preservar a saúde de seus empregados e familiares. Nas fábricas, só serão mantidas atividades essenciais”, diz o comunicado divulgado pela multinacional alemã.

“A vida em primeiro lugar”

Braços cruzados, máquinas paradas: lockout do bem poderia ser decretado pela Vale para ajudar a conter a pandemia (Fotos: Carlos Cruz)

Com o estado de Minas Gerais na onda roxa pelo programa Minas Consciente, a multinacional brasileira Vale S.A deveria seguir o exemplo da Volkswagen – e dar férias coletivas aos seus empregados e terceirizados de todo o país nos próximos dias.

Seria uma decisão em favor da saúde e da vida de seus empregados, assim como das populações das cidades onde ela se encontra presente. Demonstraria de forma contundente que tem, de fato e não de ficção, entre os seus valores “a vida em primeiro lugar”.

Demonstraria também que valoriza quem faz a empresa ser uma grande multinacional de mineração, “que age de forma correta, com paixão pelas pessoas ao transformar recursos naturais em prosperidade e desenvolvimento sustentável”.

Só assim, com atitudes práticas, e não apenas com retórica, é que a empresa poderá, com o tempo, mudar a  triste imagem que ficou após o trágico rompimento de barragem em Brumadinho, que vitimou 270 pessoas, entre trabalhadores, moradores e turistas.

Crise sem precedentes

Fonte: Secretaria Municipal de Saúde/Prefeitura Municipal de Itabira

 

A crise sanitária que o país vive não dá mostra de recuo. Ao contrário, a tendência continua sendo de agravamento, com mais mortes. O colapso do sistema de saúde já é realidade em todo o país.

Sem leitos de UTI suficientes e insumos necessários para tratar os casos mais graves, além da falta de profissionais de saúde, com os trabalhadores da área atuando para salvar vidas no limite desde março do ano passado, é preciso urgentemente ampliar o isolamento domiciliar, assim como o distanciamento social.

E isso somente é possível com paradas por tempo determinado das atividades econômicas.

A mineração, assim como outros segmentos industriais, não é obrigada a parar na onda roxa, uma exceção que não deveria ocorrer, mas que é determinação do governo federal posta em lei.

A situação é gravíssima e está a exigir medidas drásticas além do que preconiza a legislação para conter a pandemia.

Em Itabira, pequeno município com pouco mais de 120 mil habitantes, já são 116 mortes pela Covid-19, com sete mortes ocorridas nas últimas 24 horas, inclusive de pessoas sem comorbidades e fora dos grupos considerados de risco.

O boletim epidemiológico de sexta-feira (19)  registra 11.285 casos confirmados, um aumento de 91 novos casos em 24 horas, fora as subnotificações.

Os hospitais Nossa Senhora das Dores (HNSD) e Carlos Chagas (HMCC) estão com mais de 100% de seus leitos de UTI ocupados desde o dia 7 deste mês.

São 109 pacientes internados em Itabira, sendo que 26 estão em UTIs e 55 nas enfermarias – os outros 28 aguardam vagas no Pronto-Socorro Municipal ou estão sendo atendidos fora de leitos, da maneira como tem sido possível socorrer.

É assim que muitos pacientes graves estão à espera de tratamento intensivo sem encontrar vagas, aguardando novos óbitos para serem socorridos, uma situação macabra nunca vista na cidade.

E a taxa de isolamento em Itabira continua baixa, mesmo na onda roxa. Está em 31% quando o ideal seria que estivesse acima de 50%. Em decorrência, a velocidade da transmissão do vírus continua alta no município.

A RT média dos últimos sete dias ficou em 1,27, tendo tido pico de 1.59. Isso significa que uma pessoa contaminada pode contaminar quase seis pessoas de seu relacionamento, sem que se mantenha o distanciamento social. Saiba mais no portal Itabira no monitoramento da Covid-19.

Altruísmo e empatia

Portanto, é hora de a mineradora Vale ser altruísta. Que dê férias coletivas aos seus empregados, inclusive para os que trabalham em suas empreiteiras. Isso seria um gesto da maior grandeza, de compromisso com a vida.

E assim que for possível, que compre vacinas para aplicar em seus empregados e terceirizados o mais rapidamente possível, doando doses de imunizantes aos municípios em que atua – e também ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Só em Itabira, entre trabalhadores diretos e contratados, a mineradora conta com cerca 8 mil empregados. Com o agravamento da crise sanitária no país, que não tem um comando nacional de combate à pandemia, é hora de grandes empresas, como a Vale, também serem protagonistas no combate a este grande mal do século.

Sem a participação da mineradora nessa cruzada humanitária para conter o vírus, pouco vai valer o esforço dos demais segmentos econômicos da cidade, que tiveram de fechar o seu comércio e serviço considerados não essenciais.

Vale diz tomar as medidas para o controle nos locais de trabalho, mas não são suficientes

Suspender por alguns dias a produção de minério não vai afetar o fluxo de caixa da Vale e o preço da commodity pode subir ainda mais no mercado internacional

A assessoria de imprensa da Vale informa a este site Vila de Utopia que a mineradora, desde o início da pandemia, reduziu o trabalho presencial de seu quadro efetivo administrativo e operacional, mantendo apenas os serviços essenciais para a extração, beneficiamento e transporte de minério no complexo de Itabira.

E que desde 16 de março do ano passado adotou o trabalho remoto para empregados e terceirizados cujas funções podem ser executadas remotamente (home-office). “Trabalhadores com mais de 60 anos ou com fatores de riscos (comorbidades) são mantidos em casa.”

Relaciona ainda uma série de medidas para proteger a saúde e a segurança, como meio de evitar o contágio entre os empregados, de acordo com os protocolos recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Leia mais aqui.

Porém, diante da crise sanitária com a pandemia, só essas medidas não bastam. É preciso reduzir drasticamente o trânsito de pessoas pela cidade, como pede insistentemente o prefeito Marco Antônio Lage (PSB), que não tem poder de paralisar as atividades minerárias na cidade, por ser prerrogativa do governo federal.

Em decorrência, o que se observa na cidade é o grande número de empregados terceirizados da mineradora transitando em grupo e sem que muitas vezes façam uso de máscaras.

São trabalhadores empregados na manutenção de barragens, nas obras de reforço e descomissionamento de diques e fazendo pesquisas geotécnicas para aumentar a vida útil da mineração no complexo – e que continuam em atividades mesmo estando o município na onda roxa.

Resultado: os hotéis da cidade estão abarrotados de trabalhadores da área de monitoramento de barragens, técnicos e geólogos, pilotos e controladores de helicópteros que monitoram as estruturas de contenção de rejeitos, além de outros profissionais.

É certo que a mineração é essencial para o bem-estar moderno. Mas no momento, o mais importante é salvar vidas.

Somente suspendendo, por tempo determinado, as suas atividades operacionais, dando férias coletivas aos seus empregados e terceirizados, a empresa ficará em linha com os seus valores propagandeados – e que têm “a vida em primeiro lugar”.

 

 

 

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