Ministério Público Federal aponta falhas na estrutura e falta de monitoramento adequado na barragem Itabiruçu

Carlos Cruz

Na ação em que pediu, na quinta-feira (3), intervenção judicial na mineradora Vale, em decorrência da situação crítica de dezenas de barragens da mineradora, e após os rompimentos das barragens de Mariana e Brumadinho, o Ministério Público Federal (MPF) relacionou vários problemas estruturais e falhas no monitoramento, constatados em vistorias na barragem Itabiruçu.

Os representantes do MPF citam a precária instrumentação de controle da barragem, com falta de checagem dos equipamentos de monitoramento, “que deveriam ser acurados ‘termômetros’ do estado das estruturas de contenção de rejeitos”.

Peritos do MPF, ao realizarem vistoria da barragem de Itabiruçu, no dia 5 de julho do ano passado, constaram o aparecimento de trincas transversais, perpendiculares à extensão da crista da barragem.

Foram essas trincas observadas no aterro novo, que vinha sendo construído para o alteamento da barragem, em uma posição do talude mais próxima à ombreira esquerda, que levaram a justiça da Comarca de Itabira a paralisar as obras de alteamento da barragem.

Segundo o relato dos peritos, uma das trincas transversais teria atingido a profundidade de 1,87 metro. “O monitoramento de uma possível movimentação da estrutura da barragem está sendo realizado em apenas dois momentos durante o dia, quando deveria ser permanente.”

De acordo com a justificativa apresentada aos peritos pela mineradora, isso ocorre por temor de roubo ou depredação do equipamento. Para os peritos, o monitoramento adotado, com apenas duas leituras diárias, restringe a possiblidade de se detectar alguma tendência de deformação da estrutura. Em decorrência, isso diminui o nível da segurança que a instrumentação adequada pode oferecer.

Equipamentos falhos

Para os peritos, a Vale teria optado por não investir em uma base adequada de uma estação de monitoramento da estrutura, e que deveria ser continuamente. Tudo isso em detrimento da segurança necessária, como forma de reduzir custos com a vigilância da estrutura.

Aos peritos, a Vale informou que estaria em curso a contratação de inclinômetros, que são equipamentos utilizados para medir ângulos de inclinação e de elevação das estruturas.

No entanto, por ocasião da vistoria, o monitoramento com os inclinômetros não estava sendo realizado. “Os torpedos (componentes internos dos inclinômetros) não tinham sido adquiridos. A Vale não informou a data que esta instrumentação começaria a funcionar.”

Os piezômetros, que são equipamentos essenciais para medir a pressão da água sobre a estrutura da barragem, também apresentaram problemas. Segundo os peritos, dos 28 piezômetros instalados no corpo de sua estrutura, 11 foram considerados inoperantes. “O teste de vida constatou que eles não apresentavam leituras corretas do nível freático do local em que se situavam.”

Monitoramento inadequado

As fissuras na nova estrutura de alteamento foram identificadas e levaram à suspensão das obras na barragem Itabiruçu (Fotos: Carlos Cruz)

De acordo com os peritos, “dos pontos do corpo da barragem que deveriam ter o nível freático monitorado, 40% deles não apresentavam leituras corretas”.

Aos peritos do MPF a Vale informou que, na execução do aterro a jusante foram instalados oito “Marcos de Recalque”, do tipo placa de medição. O objetivo desses marcos é também monitorar a estrutura da barragem.

“Contudo, as medições não estavam podendo ser realizadas, pois as placas foram danificadas devido à imperícia em sua instalação, quando utilizaram juntas telescópicas rígidas no prolongamento dos tubos, onde as placas são fincadas, quando o correto seriam juntas flexíveis.”

Ainda durante a vistoria, foi constatada a existência de fissuras localizadas na sua crista, próximas à ombreira esquerda. A fiscalização relata ao MPF que, segundo os engenheiros geotécnicos da Vale, essas fissuras estavam sendo monitoradas com instrumentações, utilizando hastes metálicas fixadas nos dois lados da fresta.

E que, de tempos em tempos, mediam a distância de uma da outra medida para se apurar possível avanço da anomalia. “Contudo, esses instrumentos, dois pedaços de vergalhão improvisados, estavam avariados no dia da vistoria.”

Economia perigosa

Com todas as irregularidades encontradas tanto na estrutura da barragem, como também no monitoramento de suas condições de segurança, os peritos concluíram que a mineradora vem investindo muito menos do que se faz necessário, deixando de instalar equipamentos modernos, com nível de precisão adequado para a instrumentação da barragem Itabiruçu.

Tal fato, acentuaram os peritos, além de provocar inúmeras incertezas quanto a segurança da operação da barragem, coloca em dúvida os valores informados pela mineradora ao Sistema de Gestão de Barragem de Mineração (SIGBM) no tocante às suas ações de segurança.

O SIGBM informa que a empresa investiu R$ 34,6 milhões, entre os meses de fevereiro e agosto do ano passado, em ações destinadas a garantir a segurança da barragem de Itabiruçu.

No entanto, de acordo com os peritos, “dada a precariedade da instrumentação e do monitoramento verificado na barragem, há, provavelmente, um lapso significativo entre a informação de investimento e sua efetiva realidade”.

E pede que a empresa demonstre efetivamente com quais ações de segurança da barragem de Itabiruçu foram gastos tais recursos.

Governança inadequada.

Para o MPF, essas falhas na estrutura e no monitoramento não são fatos isolados. “Ao contrário, há claramente um padrão que tanto se constata em Brumadinho, como para várias outras barragens da companhia.”

Para o MPF, a comunidade científica, jurídica e, principalmente, a população buscam respostas para esses desastres, não somente em relação à reparação integral dos danos ao meio ambiente e à indenização às vítimas e suas famílias, mas também em relação às causas das ocorrências.

Considera que toda essa insustentável situação, que é abusiva e desrespeitosa aos direitos humanos e ao meio ambiente, coloca em dúvida a própria governança da mineradora.

Vale diz que realiza obras de manutenção em suas barragens e revisa as possíveis áreas de inundação  

Em atendimento à solicitação deste site Vila de Utopia, a Vale informa que vem realizando atividades de manutenção na barragem Itabiruçu desde o início de abril deste ano.

“Essas atividades seguem as recomendações da Aecom, assessoria técnica do Ministério Público de Minas Gerais, assim como recomendações dos órgãos fiscalizadores e demais auditores.”

De acordo com a empresa, as obras de manutenção consistem em regularizações de drenagem superficial. “A empresa de construção civil Empa é a responsável pela atividade, que envolve equipamentos como caminhões, escavadeiras e carregadeiras.”

A mineradora destaca, ainda, que essas atividades não alteram as condições geotécnicas atuais da estrutura.

Ainda de acordo com a empresa, a estrutura é monitorada permanentemente e não requer evacuação da população a jusante.

“A barragem Itabiruçu obteve DCE (Declaração de Condição de Estabilidade) positiva emitida em março deste ano e se mantém em nível 1 de alerta do Plano de Ação de Emergência de Barragem de Mineração (PAEBM)”

Alteamento

A Vale informa também que estão sendo realizadas investigações geotécnicas a fim de determinar as medidas de engenharia para continuidade das obras de alteamento da barragem.

“Todo o trabalho está sendo avaliado pela Aecom. A barragem Itabiruçu não recebe rejeitos desde outubro de 2019 e é monitorada permanentemente”, assegura.

Quanto às áreas que podem ser atingidas, no caso de rompimento da estrutura, a empresa informa que está realizando os estudos de manchas de “dam breack”, designação técnica para a área de inundação, assim como dos planos de ações emergenciais de todas as suas barragens em Minas Gerais.

A revisão, diz, está prevista na legislação e no termo de compromisso firmado com o estado de Minas Gerais e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). “O prazo para entrega da revisão, a partir da nova metodologia desenvolvida com base neste Termo de Compromisso, é janeiro de 2021.”

 

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3 Comentários

  1. Bom, é a Vale S/A, e ela pode fazer o que bem lhe$ apetecer em Minas Gerasi, sobretudo em Itabira que a ama incondicionalmente.
    Poder é Poder e cada Povo tem o Prefeito que merece por ter feito a escolha.
    Destruir tudo, é assim é que é.

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