MPMG quer que João Izael e Damon devolvam mais de R$ 360 mil à Prefeitura por dívidas com o Fundesi que deixaram de cobrar
São dívidas antigas, que remontam desde a instituição do Fundo Municipal de Desenvolvimento Econômico e Social (Fundesi), no final da administração do ex-prefeito Luiz Menezes (1989/92), e que se avolumaram na gestão de seu sucessor Li Guerra (1993/96).
Pelo que já apurou o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Curadoria de Defesa do Patrimônio Público, pelo menos cinco empresas devedores deram o calote e nada pagaram à Prefeitura de Itabira dos empréstimos que fizeram com o Fundesi.
Por não terem cobrado essas dívidas, ainda em tempo hábil, na sexta-feira (21), os ex-prefeitos João Izael Querino Coelho (2005/12) e Damon Lázaro de Sena (2009/12) foram denunciados pelo promotor Renato Ferreira, por improbidade administrativa, com base na Constituição Federal e na Lei federal 8.429/92.
Os recursos para esses empréstimos saíram da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), os royalties, instituída como indenização prévia pelo fim do minério.
Essa compensação deveria ser empregada para os municípios minerados criarem alternativas econômicas à atividade mineradora, o que até então não aconteceu em Itabira. Mas isso não exclui a dívida histórica da Vale com o município, já que essa “indenização”, mal empregada historicamente no município, só começou a ser paga a partir de 1990.
Enriquecimento ilícito
O promotor Renato Ferreira sustenta que a não cobrança dessas dívidas teria contribuido para o enriquecimento ilícito de empresários responsáveis e ou dirigentes dessas empresas.
São elas: Cooperativa Agropecuária Cauê, Cooperativa de Vestuário de Itabira (Coopervest). Flora Mel, Gráfica Itabira e Nana Neném Artigos para Bebês – todas pequenas empresas e cooperativas, a maioria entrou em concordata.
No total, em valores nominais, não corrigidos, essas cinco empresas deixaram de pagar ao município débitos que somam cerca de R$ 169,4 mil.
De acordo com cálculo do Ministério Público, em valores atuais, mas ainda sem juros e multas, essas dívidas “resultam em danos ao erário no importe de R$ 361,7 mil”.
Já as grandes empresas tomadoras de empréstimo do Fundesi, em boa parte, também deram prejuízos ao município – ou fizeram acertos por meio de dação em pagamento, que podem também ter resultado em mais desfalque ao Fundesi.
Na ação civil proposta, o promotor de Justiça pede a condenação dos ex-prefeitos por improbidade administrativa, obrigando-os a ressarcirem os danos que, por omissão e negligência, causaram ao erário municipal.
Dos fatos
Segundo a denúncia do Ministério Público, em sua gestão administrativa, o ex-prefeito João Izael Querino Coelho, de modo voluntário e reiterado, teria sancionado atos normativos, como ordenador de despesas e chefe do executivo, que lhe conferiam autorização para renegociar, até 31 de dezembro de 2012, as dívidas de pessoas jurídicas em débito com o Fundesi.
Só que deixou de cobrar as dívidas, não tendo adotado os “meios efetivos para impedir danos ao erário”, não tendo ajuizado as respectivas ações de cobrança.
Da mesma forma, por não ter cobrado as dívidas dessas empresas, o prefeito Damon Lázaro de Sena também está sendo acusado por improbidade administrativa.
Ainda segundo apurou o Ministério Público, o Banco do Brasil, que foi um dos agentes financeiros do Fundesi, o outro foi a Caixa Econômica Federal, face à inadimplência dos beneficiários, propôs, em 2005, o encerramento da gestão do fundo.
Com a “desistência”, o banco teria assumido como prejuízo parte dos valores das dívidas referentes a juros e encargos devidos pelas empresas inadimplentes. Já “os saldos devedores referentes ao capital emprestados foram atualizados e contabilizados entre mutuários e o Município de Itabira, através de atos registrados no Cartório do 2º Ofício de Notas de Itabira”, relata a promotoria de Justiça.
No dia 16 de junho de 2016, após negligenciar por algum tempo no atendimento aos pedidos de esclarecimentos, Damon de Sena teria sido novamente questionado pelo Ministério Público acerca dessas dívidas não quitadas.
Entretanto, mesmo com prazo dilatado para responder aos questionamentos, o ex-prefeito “nada disse sobre as providências adotadas quanto aos débitos das empresas”.
Procurado pela reportagem, Damon não quis entrar no mérito da ação até por não ter sido ainda citado. “Não tenho conhecimento da denúncia. Irei me pronunciar nos autos”, disse ele.
“Aquilo (o Fundesi), quando assumi a Prefeitura, estava uma bagunça”, afirma o ex-prefeito, que relembra também das negociatas com terrenos no Distrito Industrial, que teria ocorrido antes de sua gestão, e que foram denunciadas ao Ministério Público pelo seu ex-secretário de Desenvolvimento Econômico Reginaldo Calixto. Leia mais aqui.
Já o ex-prefeito João Izael também foi procurado por telefone. Mas até o fechamento desta reportagem não retornou à ligação.
Dação em pagamento, uma forma de acerto que também pode ter sido lesiva a Itabira
Ainda segundo apurou o Ministério Público, outras empresas que estavam inadimplentes com o Fundesi, fizeram acordo com a Prefeitura por meio de dação em pagamento, que foi questionada como sendo lesiva ao município em reportagem deste site. Leia mais aqui.
Dação em pagamento é um acordo em que o credor e o devedor estabelecem para acerto da dívida, por meio de prestação diversa que não seja o pagamento do que é devido. Geralmente, ocorre em prejuízo ao credor, no caso, a Prefeitura de Itabira.
A maioria desses acertos ocorreu por meio de devoluções de lotes no Distrito Industrial, sem que houvesse pagamento em moeda corrente das dívidas contraídas com o Fundesi.
Posteriormente, esses lotes foram cedidos ou vendidos a outras empresas por preços subsidiados pelo município ou pela antiga Companhia de Desenvolvimento Industrial (CDI), atual Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig).
Os acertos por meio de dações totalizam dívidas de R$ 662.735,64, sempre em valores não corrigidos, assim discriminadas: Bemalart (R$ 32.283,93), DMP do Brasil (R$ 68.722,31); Itaplas (R$ 111.105,35) e Drugon (R$ 450.624,05).
No total, essas empresas deviam, em valores não corrigidos, R$ 954 mil ao município de Itabira. Apenas quatro empresas tomadoras de empréstimos junto ao Fundesi quitaram as suas dívidas, que somaram R$ 291 mil.
Sócios comuns
Um aspecto interessante, e que vale ressaltar, foi a ação de dação firmada entre a Prefeitura e a Tercrom, uma empresa que nunca chegou a funcionar – e que contraiu empréstimo junto ao Fundesi de R$ 1,8 milhão, em valores da época, na administração do ex-prefeito Li Guerra.
Para “quitar” o seu débito, a Tercrom, com o consentimento da Prefeitura, repassou o terreno e o galpão que dispunha no Distrito Industrial à empresa Polikini, que tem, ou pelo menos tinha na ocasião, ex-donos da empresa devedora em seu quadro de sócios
Presidente da Polikini na época, Geraldo Lúcio Santos disse à reportagem deste site que os agentes financeiros (Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil) facilitaram de toda maneira para que os processos de dação em pagamento ocorressem.
“Se não fosse assim (os acertos por dação em pagamento), eles (os bancos) teriam de ressarcir à Prefeitura pelo que foi emprestado e não quitado”, observou.
“A Polikini acertou os débitos com o pagamento dos credores. Fez contrato com a Prefeitura de uso de superfície e pagou uma fração do imóvel mensalmente no prazo de 15 anos. O juiz homologou e encerrou a falência da Tercrom”, explicou à reportagem o ex-presidente da Polikini.
Contrato de gaveta
Geraldo Lúcio Santos está envolvido em outro inquérito instaurado pelo promotor Renato Ferreira, que decidiu dar prosseguimento à investigação sobre a compra e venda de imóvel público com 12.375 metros quadrados, situado na rua Columbita, 765, Distrito Industrial.
A transação ocorreu em 16 de setembro de 2011, entre a empresa Trend Locação e Serviços e a granja Avelândia.
Oficialmente, o imóvel da rua Columbita foi vendido pela Trend por R$ 120 mil. Só que o valor real da transação pago pela Avelândia foi de R$ 890 mil, como consta no contrato particular e nas notas promissórias encaminhados ao Ministério Público, aos quais a reportagem deste site teve acesso.
Na transação, que está sendo novamente investigada, há fortes indícios de enriquecimento ilícito às custas de um patrimônio público, por parte dos sócios da Trend. Está sendo investigado ainda se houve crime de falsidade ideológica, o que pode envolver também os proprietários da Avelândia.
Com os documentos recebidos, o promotor de Itabira dá prosseguimento às investigações, mesmo tendo o caso sido arquivado pela Promotoria de Justiça de Belo Horizonte.
No inquérito arquivado, o Ministério Público apurou se houve ou não improbidade administrativa por parte dos funcionários da Codemig, por só terem cobrado comissão pela interveniência, devida à estatal, sobre o valor de R$ 120 mil, quando deveria ter sido de R$ 890 mil.
Já a transação superfaturada, como de fato ocorreu por meio de “contrato de gaveta”, às custas de um patrimônio municipal, essa ainda não foi devidamente esclarecida.
Em tese, o promotor Renato Ferreira admite que a transação imobiliária pode ter ocasionado “eventuais prejuízos atinentes a pagamento de tributos, além de enriquecimento ilícito”.
Ou seja, o promotor deve apurar se houve ou não sonegação fiscal. “Entendo ser pertinente a continuidade do feito, evitando o seu arquivamento, ao menos por ora, eis que pairam vícios aptos a macular a negociação”, foi que manifestou o curador do Patrimônio Público da Comarca de Itabira.
Defesa
O empresário Geraldo Lúcio de Oliveira, um dos proprietários da Trend, sustenta que a negociação imobiliária foi legal. “Não houve irregularidade na transação”, defende-se.
Diretor da Acita e conselheiro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico (Codecon), órgão deliberativo que define as políticas públicas de diversificação da economia itabirana, ao ser confrontado com os documentos que atestam o real valor da transação, Geraldo Lúcio admitiu: “É um procedimento regular e comum no mercado.”
Conforme ele tentou explicar, a diferença de valor na transação se deve à “valorização do imóvel”. “Está tudo explicado. Foram custos inerentes também ao projeto, ao serviço de terraplenagem que fizemos.”
O empresário disse ainda que o valor real da transação foi devidamente declarado ao Imposto de Renda. E que o plano de negócios, que havia apresentado para adquirir o terreno, só não se concretizou por haver impedimento ambiental. É o que tem dificultado, inclusive, a transferência do abatedouro da Avelândia para o Distrito Industrial.
Fundesi emprestou mais de R$ 8 milhões a empresários para diversificar a economia local
No total, desde que o Fundesi foi criado, em 1991, foram emprestados R$ 8.087.946,43, sempre em valores não corrigidos, a 52 empresas de Itabira – e também de outras praças.
Com os empréstimos subsidiados, a expectativa, de acordo com os planos de negócios apresentados, era que se estabelecessem ou ampliassem os seus negócios no município.
O objetivo era diversificar a economia local, gerando emprego, renda e impostos, para que Itabira se tornasse independente da mineração.
Entretanto, passado todos esses anos, esse objetivo ainda não foi alcançado. O dinheiro sumiu com as inadimplências e com a má gestão e desvio de finalidades dos recursos dos royalties do minério.
É barra pesada, isto vem ocorrendo há décadas e todo o mau uso do nosso dinheiro do FUNDESI.
Muito bem fez o Jackson Tavares quando foi prefeito, pegou o dinheiro do FUNDESI e aplicou na eletrificação rural do município de Itabira.