Psicólogo estuda a dependência de Itabira à mineração e propõe sessões de debates para exorcizar o fantasma da exaustão
Na sessão legislativa de terça-feira (21), com a pauta vazia, já que nada de importante acontece na cidade para os vereadores acompanharem e fiscalizarem, o psicólogo Frederico Dornellas Martins Quintão apresentou o seu trabalho de conclusão do curso de graduação em Psicologia.
Convidado pelo vereador André Viana (Patriota) para fazer uso da Tribuna, Frederico Quintão apresentou alguns aspectos de sua pesquisa, procurando entender a tal letargia itabirana, a histórica sonolência que por razões atávicas levam o itabirano a cruzar os braços e deixar a vida passar devagar, como descreve Drummond em Vila de Utopia.
Só um psicólogo para tal proeza. Para entender esse “fenômeno”, o pesquisador conta que esse é só o primeiro passo, concluído com a monografia (José tirando a pedra do meio do caminho: Estudo sob a ótica da sociedade civil itabirana para se desvencilhar da minériodependência criada pela Vale).
O próximo passo ele pretende dar com o mestrado em Administração, quando pretende dissertar sobre o mesmo tema, procurando conhecer melhor essa intricada realidade minerosocialeconômicaambiental, que teve o seu ápice com o início da mineração em larga escala, em 1942, mas que vem desde a descoberta de ouro em aluvião no córrego da Penha.
Cidadezinha Qualquer
Para contextualizar o objeto de seu estudo, Frederico assim apresenta a Cidadezinha Qualquer em sua monografia: “Itabira, cidade localizada em Minas Gerais, era um território com fábricas de armas, fundição de ferro e produção de tecidos”, descreve.
“Entretanto, essas atividades foram se perdendo com a fundação e instalação de uma exploradora de minério de ferro chamada atualmente de Vale S/A. Desde os anos 2000, os cidadãos da cidade se mobilizam para que se desenvolva na cidade novas alternativas de catalisador econômico”, anuncia o psicólogo, já contextualizando o objeto de seu estudo.
Para o jovem pesquisador, esse complexo que paralisa o itabirano precisa ser exorcizado com muitas sessões de análise em grupos de debates, exorcizando o fantasma da exaustão com a tão propalada, e nunca realizada, diversificação econômica. Frederico Quintão defende que isso somente será possível com a participação efetiva da sociedade civil organizada.
Para ele, é hora de as decisões que irão definir as diretrizes para diversificar a economia local, com o município se desvencilhando da dependência à mineração, deixarem de ser exclusividade de quem frequenta os herméticos gabinetes de uma “governança” pouco aberta ao diálogo.
“A prefeitura, atua de forma vertical, sem clareza nas propostas apresentadas e com dificuldade para emancipar o município da minério-dependência”, critica o pesquisador, mesmo reconhecendo o esforço das últimas administrações municipais em equipar o campus avançado da Universidade Federal de Itajubá, localizado no Distrito Industrial Maria Casemira Andrade Lage (1828/1929), fundadora da fábrica de tecidos da Pedreira.
“A Unifei e o centro tecnológico, ainda por instalar, por si, não representam o progresso se isso ajudar a perpetuar a desigualdade e a falta de oportunidades sociais. Só a universidade não garante o desenvolvimento de Itabira”, afirma o psicólogo.
Segundo ele, a cidade já conhece as alternativas na educação, saúde e no turismo há algum tempo, mas muitas atividades permanecem dependentes da mineradora. “Isso (a eterna dependência) não sustenta o desenvolvimento futuro.”
Debates devem ser permanentes e com mais envolvimento da Unifei
Frederico Quintão propôs a criação de um fórum permanente de debates das alternativas para Itabira, com participação de todos os segmentos sociais, assim como a criação de uma espécie de Observatório Social da Unifei.
“Ela (a universidade) foi convidada a se estabelecer em Itabira para ajudar a alavancar a diversificação econômica. É preciso saber se está de fato cumprindo esse papel, não só gerando rendas com alugueis de imóveis e compras no varejo.”
Frederico insiste na crítica: “O projeto da Unifei para Itabira é sério, mas está manco. Apresenta lacunas, pois conta apenas com cursos de engenharia que atendem à mineração e não quebram a dependência à Vale, conforme apontaram alguns atores sociais que entrevistei.”
Outro fator que o pesquisador considera crucial para o desenvolvimento sustentável de Itabira passa pela solução da eterna falta de água para abastecer a cidade e atrair novas indústrias. “Essa é outra questão não resolvida e que não pode ficar restrita em negociações à porta fechada entre a Prefeitura e a Vale”, critica.
“O aquífero que seria o legado da mineração está com rejeito em cima dele. Até a coleta de lixo será prejudicada, o hospital Carlos Chagas será prejudicado com o fim da mineração, pois recebe recursos da Cfem, o que é um desvio de finalidade”, relaciona.
O sonho não acabou
A crítica ao acomodamento, à letargia do itabirano, é mais severa quando o pesquisador se refere ao segmento empresarial.
“A cidade está acomodada. Os empresários estão acomodados, não buscam inovação. Não tem indústria em Itabira. No distrito industrial, 80% prestam serviços para a mineração”, ele insiste na critica à dependência que permanece, mesmo com os fartos recursos investidos da Compensação pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) no segmento metalomecânico, predominante no Distrito Industrial de Itabira.
Frederico Quintão pretende aprofundar esses temas com o mestrado em Administração, por meio de uma bolsa de estudo que ganhou. “O governo federal irá financiar a continuidade dessa pesquisa em Itabira e também em Brumadinho, onde reside o meu orientador”, conta.
“Ele (o orientador) desenvolve há dois anos um trabalho de inovação tecnológica em Brumadinho, Vou procurar identificar pontos comuns para o desenvolvimento das duas cidades, ambas atingidas pela mineração da Vale”, explica. “Espero que o resultado final possa contribuir para o debate com a sociedade itabirana.”
Concordo com a necessidade da criação de um fórum permanente de debates com participação da sociedade civil em várias áreas.
Parabéns Frederico.
Parabéns Fredinho. Itabira precisa de pessoas que questionam a dependência da mineração. Pessoas que enxerga além do pico do Cauê.
Em meu livro “A TERCEIRA ITABIRA” , de 2003, em que analiso a evolução política, econômica, socioespacial e a questão ambiental desde o início da cidade até 2003, eu abordei essa dependência, a imobilidade da sociedade itabirana, de seus dirigentes, a falta de consciência social e política da polpulação local (como um todo) quanto às qustões locais. Sinto que a maioria dos políticos e dos dirigentes locais não conhecem a fundo a verdadeira situação/realidade da Itabira. Não sei se eles leram o meu livro para conhecerem essa realidade.