Utopia, devaneio de todos os feitios e sentidos

Altamir Barros*

As palavras com o tempo mudam e ampliam seus significados, se adaptam e modificam a sua forma de escrever. As árvores perdem as suas folhas no outono e renovam com as novas folhas que renascem com outra vitalidade, assim também as palavras renovam e modificam, com a inexorabilidade do tempo. A vida se renova e a história ganha novas interpretações a cada momento, a cada dia, a cada época.


Utopia serve para seguir além do horizonte (foto: Carlos Cruz)

A realidade cansa, precisamos de sonhos para aliviar a dureza da pedra do meio do caminho. Precisamos de utopia para viver, para a gente não deixar de prosseguir. A palavra Utopia, nome de um famoso livro escrito no início do século XVI, pelo escritor Inglês Thomas Morus (1480/1535), está comemorando neste ano 500 anos de sua existência desde a estreia na Inglaterra. E continua vivíssima nos sonhos de um mundo melhor. A Editora Autêntica está lançando uma belíssima edição bilíngue (inclusive em latim, como no original).

Thomas Morus segundo conta a história, teve uma morte utópica e por sinal gloriosa, morreu rindo. Partiu rindo talvez de sua própria utopia, o que não deixa de ser uma ironia, afinal utopia é um lugar imaginário e inexistente.

A Palavra é de origem grega formada de “ ú + topós “significa;a negação do lugar o não lugar, lugar que não existe, lugar imaginário, nenhum lugar. Com o tempo as palavras como as pedras também criam lodo, vai se acrescentando outros escorregões, outras cores, outros significados, assim ficou utopia; mera fantasia, quimera, sonhos perfeitos, ideal, transformação, criação.

Por isso e outras coisas as palavras adquirem nova velocidade e brilho. Utopia passou a apresentar um cometa de aspectos e definições, que se estendem para além do vasto horizonte. Assim como o arco-íris, os matizes são tão variados, que vão muito além das setes cores básicas.

Um real que se rejeita por um ideal, que se espera e deseja.

Vou descrever aqui uma interpretação de Utopia por um artista, por meio de uma charge, de muita imaginação e criatividade. Vi e gostei, foi postada no Facebook:

Trata-se de dois desenhos iguais de uma pia de cozinha, postado lado a lado, frontal ao observador. No primeiro desenho está escrito logo acima em destaque a palavra PIA. Sobre esta pia; pratos, panelas, garfos, facas, copos; tudo empilhado de qualquer maneira, desorganizado, desequilibrado, à revelia, os pratos foram usados, as panelas se encontravam esvaziadas e os talheres sujos. Uma cena de cozinha de pós almoço, uma sensação desagradável de sujeira, como falam na tv. Espera-se como na tv a famosa sensação de limpeza.

A falta de alguma coisa, e esta falta é a falta que faz falta.

Continuando a descrição da charge: ao lado o mesmo desenho da pia com a diferença fundamental, ela se encontra limpa, livre dos vasilhames e tudo; pratos, talheres, panelas. O desenho limpo faz a gente sentir utopicamente o ventinho de limpeza soprando levemente no lugar. O humor repentino da charge aparece sutilmente, inusitadamente, quando o artista acrescenta na palavra PIA do desenho anterior, a palavra UTO PIA do segundo desenho. Muito criativo.

Sentimos e entendemos a charge, rapidamente, com o olhar. O humor escorrega sutilmente pelo desenho, o inesperado, o inusitado, provoca o riso fácil e sutil. Não encontrei o nome deste artista, que deve ter-se divertido muito ao produzir esta charge e poder brincar com a palavra Utopia.

Por hoje, Carlos Cruz, é isso aí! Você que é jornalista da cepa, sempre atuante nesta guerrilha urbana das informações, e que agora está lançando este novo site, com o nome Vila de Utopia, aliás muito bom. Nesta cidade de Itabira onde a corrupção tem sido a regra, quase não sobra esperança para ninguém, nesta cidade que ressuscitou e depois morreu. A utopia aqui nada mais é que incertezas de uma cidade rica e saqueada, parece mais proxima do inferno de Dante.

Parabéns a você Carlos Cruz pela ideia e coragem e criar um site. Que tenha um jornalismo combativo, a cidade precisa de muitas vozes conscientes para tentar se libertar desta corrupção que não chega ao fim. Vida longa para a Vila de Utopia – um copo cheio de cerveja, tem muita utopia e sonhos, vai destilando este sonho com um jornalismo de combate e força. Água mole em pedra dura, somente assim. Não posso esquecer de lembrando saudoso gênio brasileiro, Millôr Fernandes, que disse: Imprensa tem de ser de oposição, ou então, não passa de armazém de secos e molhados com muito bacalhau exposto.

E pra terminar – Outras Utopias

Recentememtae o cantor e compositor Gilberto Gil, no jornal Folha de São Paulo de 09/04, no caderno Ilustríssima de domingo, assim comentou em um trecho da entrevista:

“Deus continua sendo a grande Utopia. O que Deus precisa é se livrar das religiões. Que tentam manipulá-lo, dizer que ele só pertence àquele território, que só o que o povo daquele traduz como a verdade. Deus precisa estar solto como dizia o Caetano na canção, Niestzche dizia que Deus está morto. Caetano disse que Deus está solto, estou com Caetano.“

Vocês também que leram este artigo, assim como Gil, estão com Caetano?

*Altamir Barros é engenheiro urbanista, cronista nas horas vagas

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