Sem apoio da Prefeitura, Banco do Povo já tem data para fechar as portas em Itabira

Mesmo com todos os discursos oficiais de incentivo à economia criativa, formada por micros e pequenos empreendedores de diferentes áreas, a Associação de Crédito Popular de Itabira (Banco do Povo) já tem data para encerrar definitivamente as suas atividades de fomento à economia popular no município.

Para isso, uma assembleia extraordinária foi agendada para o dia 21 deste mês (quarta-feira), no auditório da Prefeitura, quando os instituidores devem votar pelo fim da instituição de crédito popular.

Assembleia do Banco do Povo reuniu cinco filiados e não teve participação de representantes da Prefeitura e da Câmara Municipal. Na foto em destaque, desempregados na porta do Sine (Fotos: Carlos Cruz)

A decisão foi tomada na assembleia realizada nessa quarta-feira (31), que contou com a participação de apenas cinco associados – a Prefeitura e a Câmara Municipal não enviaram representantes, mesmo tendo sido convocadas por edital publicado no diário oficial do município.

Ficou decidido também que já na segunda-feira (5) a funcionária Isabel Cristina Bravim Oliveira, com quem a instituição tem a maior dívida, receberá o aviso prévio para se desligar da instituição.

Em valores de agosto, o Banco do Povo deve a ela R$ 45.458,11, referentes a salários e obrigações trabalhistas atrasados desde junho do ano passado, incluindo o pagamento do 13º salário, férias, vales transporte e alimentação.

A funcionária Isabel Oliveira deve entrar com ação trabalhista contra o Banco do Povo e Prefeitura

“Com a rescisão, ela (a funcionária) deve ingressar com ação na Justiça do Trabalho contra o Banco do Povo e tendo a Prefeitura como solidária na dívida, uma vez que é a principal instituidora da instituição”, informou na assembleia o presidente do Banco do Povo, João Tôrres Moreira Júnior.

Além do débito trabalhista, o Banco do Povo acumula dívidas que somam, em valores de agosto, R$ 70.856,51. Nesse montante está incluído o não pagamento de tributos diversos e obrigações trabalhistas (GPS, INSS, FGTS, PIS), contas de telefone, entre outras dívidas.

Má vontade

Desde o início do atual governo o presidente do Banco do Povo vem tentando se reunir com o prefeito Ronaldo Magalhães (PTB), mas sem sucesso. “Enviamos também várias correspondências ao secretário de Desenvolvimento Econômico (José Don Carlos), mas só agora, em 24 de outubro, ele nos respondeu, alegando que o estatuto do Banco do Povo proíbe fazer repasses financeiros para a instituição”, contou João Tôrres.

Para o presidente da instituição, o argumento apresentado pela Prefeitura não é verdadeiro. Conforme respondeu o secretário de Desenvolvimento Econômico, José Don Carlos Alves Santos, parecer da Procuradoria jurídica da Prefeitura defende que o próprio estatuto da entidade proíbe o repasse.

Já o presidente do Banco do Povo contrapõe o argumento com o artigo 2º do estatuto, parágrafo primeiro, pelo qual define que na execução de seus objetivos a instituição poderá aceitar doações, celebrar convênios e contratos, além de contrair empréstimos com organismos e entidades. “Eles (secretário e Procuradoria Jurídica) não tiveram sequer o trabalho de ler o nosso estatuto na íntegra”, afirmou João Tôrres.

“A Prefeitura não tem dinheiro para salvar o Banco do Povo, mas tem recursos do Fundesi para doar para o WIN (Workshop de Negócios, promovido pela Acita) e para o Clube do Cavalo a fundo perdido”, protestou.

Repasse negado

No ano passado, uma reunião do Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico (Codecon), que delibera sobre a aplicação dos recursos da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), negou um repasse de R$ 150 mil à instituição, alegando haver “inconsistência” no plano de negócios apresentado.

Sem esse aporte, não há outra saída para a instituição que não seja encerrar as suas atividades. “Nessa crise que vivemos, com tantos desempregados, o Banco do Povo poderia apoiar os microempreendedores”, defendeu o presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos Municipais de Itabira (Sintsepmi), Auro Gonzaga, um dos presentes na assembleia de ontem.

“Hoje estamos vendo de volta menores vendendo balas no sinal de trânsito e gente dormindo nas ruas. Era hora de a Prefeitura incentivar pequenos negócios individuais”, complementou.

“É um absurdo que um pequeno número de devedores prejudique a maioria dos tomadores de empréstimos que saldaram as suas dívidas com o Banco do Povo”, complementou a representante do Clube de Mães, Maria Nicolau Costa.

De fato, segundo números apresentados na assembleia, a inadimplência nominal dos devedores do Banco do Povo soma R$ 250 mil, que corrigida pelo salário mínimo ultrapassa a casa de R$ 750 mil.

Esse montante é devido por 11 tomadores de empréstimos, de um total de 1.046 microempreendedores que recorreram à instituição – e saldaram as suas dívidas.

Quando é o pobre que deve, eles pegam gato, cachorro, o que tiver para pagar a dívida e tomam tudo. Já quando o devedor tem condições de pagar, ficam enrolando e não cobram. Deixam a funcionária sem salário e o banco sem recursos para emprestar para o pobre”, disse a líder comunitária.

Prescrição

Presente em uma reunião anterior para debater alternativas para a continuidade do Banco do Povo, o advogado Ronaldo Caldeira, representante da OAB, disse que é possível rever esses débitos, mesmo estando prescritos. Segundo ele, pelo novo Código de Processo Civil essa recuperação é factível.

“Trata-se de pedir o ressarcimento por ter havido enriquecimento ilícito com dinheiro público, repassado pela Prefeitura ao Banco do Povo”, defendeu. “Se o devedor tiver lastro (recursos), pode ser bloqueado até 30% de seu salário para o pagamento da dívida”, acrescentou.

A responsabilidade sobre essa prescrição recai sobre os presidentes anteriores do Banco do Povo que não cobraram as dívidas – e as deixaram prescrever. Como se trata de omissão e prevaricação, isso pode ser configurado como crime contra a economia popular. Nesse caso, essa responsabilidade pode ser arguida em ação de ressarcimento. O Ministério Público pode – e deve – instaurar um procedimento investigatório para apurar as responsabilidades.

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