O eterno baterista e pedra estática dos Rolling Stones fecha o ciclo e deixa o rock’n’roll órfão.
Por Tadeu Felipe*
Fhono Brasil – A notícia chegou no meio do expediente e, a partir disso, não consegui me concentrar em muita coisa pelo resto do dia. Só conseguia pensar que o dia fatídico finalmente tinha chegado.
Fez-me lembrar de quando viciei em Rolling Stones – uma banda que possui a fórmula perfeita de fazer rock. Falar do gênero e não colocar os Stones como um dos primeiros nomes da lista nunca soará honesto. Ali a química é perfeita e a música é feita com genialidade, provando que o rock é uma arte fina.
Combinar elementos de forma tão milimétrica, transformando o timbre característico e uma composição de acordes simples em obras imortais, definitivamente, não é para qualquer banda.
A repetição dos riffs de “Satisfaction” e “Brown Sugar”, por exemplo, são de fácil execução, mas criar algo desse nível, com tão poucos acordes, é tarefa de gênios.
É nesse momento que entra Charlie Watts, um rapaz apaixonado por jazz que sonhava entrar na banda de Miles Davis, mas acabou sendo peça indispensável da talvez maior banda de rock de todos os tempos.
Charlie era a antítese do rockstar, um sujeito extremamente low-profile que fazia o contraponto perfeito com o glamour de Mick Jagger e a rebeldia selvagem de Keith Richards.
Com esse caráter discreto, dentro e fora da banda, Charlie foi responsável por criar os grooves simples porém perfeitos e executá-los com uma dinâmica invejável. Charlie possui o que a grande maioria dos bateristas sonham em ter: equilíbrio.
A cadência característica dos Stones que faz Mick Jagger e o público mexer praticamente todos os ossos do corpo vem de Charlie. Sua batida estável, a medida certa de pressão, a velocidade e o feeling que abria o tapete para que o resto da banda ficasse à vontade para trazer a harmonia perfeita do rock dentro da música.
Charlie Watts é insubstituível, tocava com elegância. A assinatura dele em canções como “Honky Tonk Women” e “Can’t You Hear Me Knocking” pulsam como o coração tranquilo que refletia na serenidade do próprio olhar.
Charlie Watts foi o alquimista que conseguiu a dose certa para sintetizar a musicalidade e sonoridade no seu instrumento, criando um som original como é o som dos Stones. Simplesmente único e inimitável!
Jamais esquecerei do momento em que, pela televisão, acompanhei o show da tour do Voodoo Lounge pelo Brasil em 1995 e Charlie Watts foi, de longe, o mais aplaudido da noite. Ele agradeceu com uma modesta e característica expressão de “por que tanto aplauso?”. O motivo é simples: nós amamos você Charlie!
*Tadeu Felipe é baterista e mora na Suécia. Cresceu ao som de bandas de rock clássico e escuta todos os gêneros, preferencialmente em vinil.