Sem apoio financeiro da Prefeitura de Itabira, o réquiem para o Banco do Povo já pode ser encomendado
Há mais de quatro anos, o presidente da Associação de Crédito Popular (Banco do Povo), João Tôrres Moreira Júnior, tem feito um périplo em gabinetes da Prefeitura sem retorno positivo em busca de apoio para liquidar dívidas, principalmente trabalhista, e obter aporte de recursos financeiros para a continuidade da instituição de microcrédito no município de Itabira.
A sua esperança reacendeu quando o prefeito Marco Antônio Lage (PSB), assim que foi eleito, em entrevista a este site Vila de Utopia, acenou com a possibilidade de os micro empreendedores itabiranos voltarem a contar com linhas de crédito subsidiadas para a movimentar e incrementar os seus negócios.
“Precisamos dispor de um sistema que ofereça linhas de crédito a um custo mais baixo e facilitado para estimular o micro e o pequeno empreendedor”, disse o então candidato a prefeito na entrevista, referindo-se também à necessidade incrementar os arranjos produtivos locais.
Para Marco Antônio, essa necessidade é ainda maior para oferecer crédito ao trabalhador “pejotizado”, nova categoria social que surgiu com a precarização do trabalho após a flexibilização da CLT, com a falta de emprego formal – e que se viu obrigado a constituir micro empresas para assegurar a sua sobrevivência e de seus familiares.
Mas o prefeito fez uma ressalva: “Vamos ver qual é a real situação do Banco do Povo. Não sei se vamos reativar o sistema já existente ou se abriremos uma nova instituição para oferecer crédito barato e facilitado. O que sei é que vamos incentivar o micro empreendedorismo local”, comprometeu o prefeito.
Com o projeto que será lido e começa a tramitar na Câmara nesta terça-feira (13), que visa a criar o Fundo de Amparo ao Empreendedor e Microempreendedor (Faeme), o prefeito começa a cumprir parte de sua promessa de oferecer microcrédito aos empreendedores itabiranos.
Só que a saída não vai ser pelo Banco do Povo, mas por intermédio de instituição de crédito já estabelecida na praça, a ser definida por meio de um chamamento público a ser realizado assim que o projeto for aprovado e sancionado.
Apelo aos vereadores
Ainda para tentar salvar o Banco do Povo, João Tôrres, a convite do vereador Weverton “Vetão” Andrade (PSB), fez apelo aos vereadores para que ajudem a salvar a instituição do fechamento definitivo.
Na terça-feira (6), da tribuna da Câmara ele se dirigiu a uma plateia pouco atenta, inclusive por parte dos vereadores, que nada perguntaram para melhor entender a real situação da instituição.
Apenas o presidente Vetão agradeceu a sua presença e colocou o plenário da Câmara às disposição para realizar uma audiência pública, assim como prometeu levar o tema às comissões temáticas da Casa, mas sem estabelecer prazos para que isso fosse feito.
Segundo João Tôrres, desde que foi instituído, em 1999, no governo do ex-prefeito Jackson Tavares (1997-2000), o Banco do Povo realizou 1,2 mil empréstimos a sacoleiros, sapatarias, oficinas com recursos que foram aportados pela Prefeitura, totalizando R$ 250 mil em valores nominais da época, sem correções.
“Peço aos vereadores para intervirem junto à Prefeitura para salvar o Banco do Povo, que muito pode ajudar quem está desempregado e precisa abrir ou dar continuidade ao seu pequeno negócio”, disse ele
João Tôrres lamentou não ter tido retorno positivo ao pedido de novo repasse de recursos pela Prefeitura. “Já fez cinco meses que encaminhamos correspondência à Secretaria de Governo para indicar um representante da Prefeitura para compor o conselho e não obtivemos resposta”, disse ele da tribuna da Câmara.
“Em fevereiro tive reunião com os secretários da Fazenda, Planejamento, Desenvolvimento Econômico e Procuradoria Jurídica e eles me disseram que não há como fazer novo repasse de recurso, que seria ilegal. Como ilegal, se isso foi feito no passado, tendo sido aprovado pela Câmara e pelo Tribunal de Contas?”, questionou.
“Tem comerciante devendo R$ 2 mil de conta de luz e pode fechar o seu comércio. Se ele tivesse como recorrer ao Banco do Povo, poderia fazer um empréstimo para saldar a sua dívida e continuar com o seu pequeno comércio funcionando”, exemplificou.
Banco pode ainda recorrer à Faeme, diz secretário
O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Breno Pires, confirma ter recebido o pedido de repasse de R$ 200 mil do Fundesi para dar continuidade da instituição de crédito. Porém, o valor foi considerado insuficiente para pagar as dívidas da instituição e voltar a abrir linhas de crédito.
“Essa conta não fecha. O banco não vai conseguir pagar a dívida e com o saldo financiar microempreendedores a uma taxa de 2% ao mês, que está acima do que é praticado pelo mercado financeiro”, disse o secretário à reportagem, reportando o que teria dito ao presidente do Banco do Povo. “Com essa movimentação, não paga o custo operacional”, avaliou.
Foi então apresentado pela presidência da instituição de microcrédito uma nova planilha à Prefeitura, pedindo um repasse de R$ 2 milhões, quantia essa considerada viável para a continuidade da instituição.
“Ao avaliar o pedido, chegamos à conclusão que nas condições de empréstimos praticados pelo Banco do Povo, com juros a 2%, a instituição não cumpriria o seu papel social e nem mesmo seria competitiva no mercado, uma vez que bancos privados cobram juros de 0,6% com garantia, podendo chegar a 1%.”
A saída para o Banco do Povo continuar existindo, sugeriu Breno Pires, seria a instituição recorrer ao Fundo de Amparo ao Empreendedor e Microempreendedor, que está para ser instituído, com aporte de capital a ser repassado pela Prefeitura da ordem de R$ 12 milhões.
Mas para isso, explicou, terá que apresentar um plano de negócio viável e compatível com o seu objetivo, que é gerar valor para o microempreendedor. “Teria que praticar juros em condições melhores que as existentes no mercado financeiro para se tornar viável e competitivo.”
Perguntado se não haveria como o executivo itabirano repassar recursos para o Banco do Povo saldar as suas dívidas, em sua maior parte com a única empregada da instituição, já demitida, Breno Neves disse que é uma hipótese a ser considerada, embora não seja a Prefeitura, segundo ele, devedora solidária desses débitos.
“Não nos foi apresentada a proposta de se pegar recurso da Prefeitura para quitar a dívida trabalhista e fechar o banco. Se isso acontecer, terei que consultar a Procuradoria Jurídica da Prefeitura e também a Secretaria da Fazenda”, esquivou-se.
Inadimplentes do banco fizeram empréstimos entre 2001 e 2006
Se o Banco do Povo tem essa dívida, principalmente trabalhista, que era de R$ 56.7 mil em abril de 2018, quando um pedido de empréstimo foi apresentado e negado pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico (Codecon), em contrapartida teria a receber empréstimos não quitados de R$ 714 mil.
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Esse montante que não foi cobrado judicialmente e prescreveu, é devido por 12 conhecidos microempreendedores inadimplentes.
De acordo com o presidente do Banco do Povo, a maioria desses devedores pegou empréstimos com o banco entre 2001 e 2006. “Uma minoria deu o calote e prejudicou a maioria que pagou em dia as suas dívidas.”
Perguntado o que levou o banco a não ter cobrado essas dívidas em tempo hábil para não prescrever, o presidente João Tôrres também se esquivou. “Isso tem de ser cobrado dos presidentes anteriores. Se houve negligência, foi deles”, defende-se, alegando que em sua gestão a instituição fez um empréstimo, que já foi quitado.
“É a mesma negligência (para não dizer prevaricação) que ocorreu com os recursos do Fundesi, emprestados a empresários e que também não pagaram as suas dívidas”, compara.
João Tôrres faz referência à inadimplência de R$ 9 milhões, em valores nominais não corrigidos, derivada de linhas de crédito subsidiadas e de longo prazo, abertas no passado para financiar a diversificação da economia itabirana.
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