Não será na próxima eleição, dia 22, que o Codema de Itabira terá composição mais representativa da sociedade em defesa do meio ambiente

Carlos Cruz

A nova composição do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema) será conhecida até o dia 22 de abril. Com base na lei municipal 5.186/2020, aprovada no final da gestão passada, embora mantenha a paridade, definida na legislação, entre representantes do poder público e sociedade civil, não será dessa vez que se tornará mais representativo da sociedade itabirana.

Denes Lott, secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano: “vamos abrir essa discussão, mas mudança na composição tem de ser aprovada pela Câmara.” (Fotos: Carlos Cruz)

E assim não sendo, corre-se o risco de repetir o que se viu nas gestões passadas, quando o órgão ambiental municipal não se posicionou em relação à poluição do ar por partículas de minério em suspensão, assim como nunca cobrou medidas mitigadoras em relação à degradação paisagística causada pela mineração, como também não pautou a discussão sobre (in)segurança das barragens de rejeitos.

“Pretendemos mudar essa composição”, diz o advogado Denes Martins da Costa Lott, secretário municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, cuja pasta que ele ocupa voltou a ser uma, quando deveria ser duas pastas distintas, pela importância de ambas e pelo acúmulo de atribuições – e até pela existência de conflitos de interesses na gestão pública.

A secretaria exclusiva de Meio Ambiente foi uma conquista na primeira administração de Ronaldo Magalhães (PTB). Mas foi o ex-prefeito que, no início de sua gestão passada, desfez essa conquista, até por não ter tido memória histórica dos avanços ocorridos em sua administração anterior (2000-04).

Magalhães fundiu as duas pastas, para depois separar novamente, não para dar mais funcionalidade às duas secretarias, mas por força do fisiologismo necessário para abrigar correligionários. E que agora volta a se fundir pela atual gestão sem ter sido sequer aprovada pela Câmara Municipal – o que só deve ocorrer com o projeto de reforma administrativa que está sendo preparada.

A aprovação legislativa é necessária também para mudar a composição do Codema. Mas, para isso, defende o secretário, antes de enviar um projeto para apreciação e aprovação da Câmara, ele pretende abrir um debate sobre o tema.

“A sociedade civil não está bem representada no Codema”, reconhece Denes Lott, para quem a composição está desequilibrada, pendendo mais para o lado empresarial, como demonstrou esse site em reportagens anteriores com essa mesma pauta. Leia aqui, aqui, aqui e aqui.

“Vamos propor uma discussão primeiramente entre os novos conselheiros do Codema, assim que forem empossados, para depois estender o debate com outros segmentos sociais”, adianta o secretário.

Lott acredita que, até o final do ano, a Prefeitura deve enviar novo projeto para mudar a lei que rege o Codema, propondo a alteração de sua composição. A expectativa, com a futura mudança, é para que o órgão ambiental se torne mais representativo e venha refletir o conjunto de interesses da população que sofre com os impactos ambientais e que não são só da mineração.

Distorção

Poeira nas minas da Vale é constante até no período chuvoso, mas tema foi ignorado pelo Codema nos últimos anos

Para se ter ideia da distorção na composição do Codema, o setor mineral em Itabira, que é de longe o segmento econômico que mais impacta o meio ambiente, dispõe de duas cadeiras no órgão ambiental municipal, uma indicada pela Vale, que é cativa, e a outra pela empresa Belmont.

Isso enquanto os sindicatos dos trabalhadores só agora podem ocupar uma cadeira, conforme consta da nova lei que rege o conselho municipal, que tem a função consultiva e deliberativa sobre todos os temas relacionados ao meio ambiente no município.

As entidades patronais estão representadas também por indicação da Associação Comercial (Acita), como ainda por meio dos clubes de serviços (Rotary, Lions, Maçonaria). Essas entidades, invariavelmente, defendem interesses empresariais.

Para a próxima composição, espera-se do Sindicato Metabase, que reúne os mineiros da Vale, Belmont e de outras mineradoras, a indicação de um representante – e que esteja presente em todas as reuniões.

Já os moradores de bairros, que sofrem com os impactos ambientais não só com os decorrentes da mineração, mas também com novos loteamentos que não apresentam as melhores condições ambientais, como também com a instalação de indústrias que podem poluir nas imediações, só estão representados em uma única cadeira, hoje ocupada pela Interassociação de Moradores.

As instituições de ensino superior têm sido representadas pela Fundação Comunitária de Ensino Superior (Funcesi). Historicamente, de seu representante não há registro de posicionamento crítico em relação à poluição do ar, por exemplo, ou mesmo de outros impactos ambientais causados por empreendedores locais.

O Sindicato Rural, outra entidade patronal, é representado no Codema. Já o Sindicato dos Trabalhadores Rurais não tem representante no conselho municipal, como também não tem representação a Associação dos Produtores da Agricultura Familiar de Itabira (Apafi). Assim como não estão representados no Codema os moradores dos distritos de Senhora do Carmo e Ipoema.

Essa distorção traz como consequência, repita-se, a ausência dos principais temas ambientais nas reuniões do Codema, o que é um paradoxo.

A poluição do ar provocada pela poeira das minas da Vale ou pelas chaminés da usina de ferro gusa, no Distrito Industrial, que impacta sobretudo os bairros vizinhos, não tem sido debatida pelo órgão ambiental.

Foi assim que, na gestão passada, o Codema virou órgão homologador dos interesses da Prefeitura e do setor econômico. Passou todo o mandato licenciando empreendimentos de baixo impacto ambiental (classes 1 e 2) que, em outras cidades, sequer são licenciados. Apenas são fiscalizados para que cumpram as medidas de controle exigíveis em lei.

Consultas

Para propor mudanças na fórmula de composição do Codema, que somente passam ter validades se aprovadas pela Câmara, Denes Lott diz que vai procurar conhecer como se dá a representatividade em órgãos ambientais similares.

“O sistema estadual de recursos hídricos tem uma forma muito interessante e vamos buscar subsídios, inclusive em outros Codemas de cidades mineradoras”, adianta o secretário, que é hoje responsável, cumulativamente, pela gestão do meio ambiente e do desenvolvimento urbano.

Meio ambiente é interesse difuso e coletivo. Em uma cidade mineradora, que tem as maiores minas a céu aberto do mundo tão próximas, ao ponto de engolir a cidade e ameaçar a segurança dos moradores com as barragens, é inadmissível que essa pauta não configure preocupação permanente do órgão ambiental municipal.

Afinal, tudo o que diz respeito à qualidade ambiental e que possa representar risco à saúde e à vida das pessoas, deve ser tratado pelo Codema. Se assim não for, é melhor até que nem exista um órgão ambiental, para não ficar no faz de conta que fiscaliza e delibera com autonomia e conhecimento das matérias pautadas.

Com certeza não é esse o pensamento da atual administração, pelos compromissos de mudanças assumidos em campanha. Mas se o Codema deixasse de existir, ou mesmo que permaneça na mesmice de repetir a omissão vista na gestão passada, bastaria ao prefeito, de ofício, dar anuências e aprovar os licenciamentos por ad referendum do secretário ou do primeiro mandatário, como ocorreu várias vezes no passado recente.

Ao deixar “a boiada passar”, certamente atrairia novos empreendimentos poluidores para diversificar a qualquer custo a economia local. E isso poderia ser feito sem os entraves burocráticos da legislação ambiental e sem confronto com uma sociedade civil organizada e engajada na defesa do meio ambiente, o que ainda, infelizmente, inexiste em Itabira.

Foi tudo isso o que se viu na gestão passada. Certamente não é o melhor para assegurar a qualidade de vida e o controle ambiental em Itabira. Como se espera, essa omissão não deve ser repetida pela atual gestão. Mas isso só o tempo dirá.

 

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