Itabira tem minério para mais de 60 anos, disse diretor da Vale em 2003

Carlos Cruz

Por essa conta, faltam 45 anos para o minério de Itabira acabar – e não apenas dez anos, como foi anunciado em abril deste ano pela Vale em Nova Iorque, nos Estados Unidos (leia aqui). Nesse primeiro relatório Form20 (F20) apresentado pela mineradora ao Securities and Exchange Commission (SEC), em 2003, diz que, pelas últimas pesquisas geológicas, as reservas das minas de Itabira, ao invés de disporem de 677 milhões de toneladas (Mt) como até então era divulgado, passaram a contar com 1.135 bilhão de toneladas (Bt).

O ex-presidente Roger Agnelli entrega ao prefeito Ronaldo Magalhães cópia do primeiro relatório Form20 encaminhado à Bolsa de Nova Iorque, em 2003 (Foto: Humberto Martins/Vale Notícias. Do destaque: Carlos Cruz)

E mais: os recursos que eram de 2,8 Bt passaram para 3,9 Bt – um salto formidável, que representou um acréscimo de 68% no volume de reservas e recursos. Das reservas, as pesquisas registraram 418,9 Mt de hematita e mais 716 milhões de toneladas de itabirito. Milagre da multiplicação? Não, explicaram os técnicos da Vale. Segundo ele, o aumento teria sido resultado de uma pesquisa mais elaborada, com novas técnicas de modelamento geológico (leia mais abaixo).

O fato foi considerado formidável a ponto de o então presidente da Vale, Roger Agnelli (1959-2016), vir a Itabira anunciar a boa nova. Na ocasião, em junho de 2003, ele entregou ao prefeito Ronaldo Magalhães cópia do primeiro relatório F20. Pela primeira vez, há portanto 15 anos, a mineradora comunicava aos acionistas da Bolsa de Nova Iorque – e para o mundo – o volume de suas minas e de seus negócios transoceânicos.

Ufanismo

O ex-diretor José Francisco Viveiros recebe do prefeito Ronaldo Magalhães o título de cidadão honorário de Itabira (Foto: Taquinho)

“Com as reservas atuais, e com os recursos que serão viabilizados, Itabira tem minério para mais de 60 anos”, disse em tom ufanista o ex-diretor do Departamento de Ferrosos Sul da Vale José Francisco Martins Viveiros, em reunião na mesma ocasião com empresários na Acita.

Depois, mais comedido, em entrevista à imprensa, esquivou-se. “Vamos ficar por aqui por muitos mais anos além do que antes era imaginado”, disse ele, referindo-se ao projeto Itabira 2025, da Acita.

Essa era até então a data projetada no início da última década do século passado para o fim da extração de minério em Itabira, quando enfim estariam exauridos os “1 bilhão e 500 milhões de toneladas de minério com um teor superior a 65% de ferro, que darão para ‘abastecer quinhentos mundos durante quinhentos séculos’, conforme garantia o visconde do Serro Frio”, escreveu Drummond em Vila de Utopia.

Parcerias para o progresso

“Com as reservas atuais, Itabira tem a oportunidade de planejar o futuro com mais tranquilidade, pois vamos ficar aqui por muitos anos”, confirmou Agnelli por ocasião de sua visita a Itabira, em junho de 2003. “Vamos fazer um pacto para a Vale crescer e continuar gerando dignidade com emprego, renda e impostos”, propôs o ex-presidente, apostando no clima de euforia, confiança e colaboração.

“Para se manter competitiva no mundo, a Vale precisa do apoio das comunidades e dos governos. Por isso, eu peço à sociedade itabirana, ao prefeito Ronaldo Magalhães e à Câmara de Vereadores, o apoio necessário para que possamos crescer juntos”, discursou Agnelli, após assinar vários convênios com a Prefeitura, entre eles o que levou à relocação da estação ferroviária e a doação do terreno para a construção de uma “moderna avenida”.

Recursos adicionais divulgados em 2003 revelam outra realidade

Nova planta de beneficiamento de minério em Conceição viabilizou o terceiro ciclo tecnológico do minério (Foto: Carlos Cruz/Notícias)

Conforme detalharam os técnicos da Vale em 2003 para o formulário F20, além das reservas de itabirito e hematita, as minas de Itabira dispunham ainda de 3,9 bilhões de toneladas (Bt) de recursos adicionais, tendo tido um ganho de 1,1 Bt em relação ao que antes era conhecido. “São as nossas reservas futuras”, declarou o ex-diretor Viveiros, entusiasmado com os resultados das últimas prospecções realizadas nas minas locais.

De acordo com técnicos da Vale, recursos são formações ferríferas conhecidas, mas que ainda não contam com plano de lavra. Já reservas são corpos geológicos conhecidos e que dispõem de planejamento de lavra, com viabilidade econômica comprovada.

Técnicos da Vale detalharam os resultados das pesquisas geológicas. Ao fundo, a mina Conceição (Foto: Taquinho/Vale Notícias)

“Os limites da mineração permanecem os mesmos. Não deve haver expansão das minas para além das fronteiras atuais”, tranquilizou o então diretor da Vale, quando perguntado se a expansão demandaria a desocupação de bairros para extrair os recursos adicionais.

Parte desses recursos a Vale já está beneficiando, com o processamento do itabirito compacto nas novas plantas de concentração Conceição e Cauê.

As pesquisas geológicas tiveram início em 1999 e foram concluídas em abril de 2003. Segundo explicaram os técnicos da Vale na ocasião, os novos resultados foram possíveis em decorrência de mudanças tecnológicas e conceituais, juntamente com o desenvolvimento de um novo modelamento geológico e planejamento de lavra de longo prazo.

“Não há mágica. A avaliação mais precisa das minas possibilitou à Vale transformar recursos em reservas. E o que estava escondido apareceu”, explicou na ocasião o então gerente de Planejamento de Longo Prazo, Kléber Souza.

Crescimento acelerado

Desde que foi feito esse anúncio, Itabira teve um forte crescimento urbano, com abertura de novas avenidas e muita especulação imobiliária. Nunca se construiu tanto na cidade até recentemente e nos últimos quinze anos. Resta saber o que fica de tudo isso – e quanto tempo Itabira tem para buscar as tão almejadas alternativas econômicas à mineração.

Moinhos trituram o itabirito compacto: terceiro ciclo (Foto: Carlos Cruz/Notícias)

Alguns indícios já se têm com o desenvolvimento ainda microrregional na área de saúde – e também na educação, com a chegada há dez anos da Unifei e de outras faculdades que se juntam à Funcesi.

Mas ainda é pouco diante da necessidade de substituir uma atividade que gera 4 mil empregos diretos e inúmeras oportunidades de negócios, além de ser responsável por cerca de 80% das receitas municipais.

Antes de tudo é preciso planejar esse futuro imediato, enquanto ainda restam recursos dos royalties e o ICMS do minério. E que a Vale esclareça qual é de fato o tal “horizonte temporal de exaustão mineral”.

Afinal, o que vale, sem trocadilho? O relatado no primeiro comunicado à Bolsa de Nova Iorque em 2003? Ou vale mesmo o formulário Form20, apresentado neste ano, e que prevê a temível exaustão para daqui uma década, se tanto? Com a palavra a direção da Vale.

 

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7 Comentários

  1. Vila Amélia, Camarinha, Três Fontes, Pará, VEC, Campestre, todos eles locais/bairros irão virar buraco!

    Enquanto isso, o retorno social por parte da mineradora inexiste em nossa cidade, mas como dói…

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