Em busca do tempo perdido, Itabira ainda não sabe qual será o seu destino, aponta documentário do professor Júlio Mengueles
O professor Júlio “Mengueles” Batista Mattos está com novo vídeo-documentário nas “nuvens”, concluído depois de meses de gravação – um trabalho jornalístico e documental de extrema relevância, pelo seu conteúdo histórico, didático e bastante atual.
Trata-se do documentário Itabira Cidade Mineradora, com o qual resgata parte da história do município que já foi do Matto Dentro, mas que, por puxa-saquismo do interventor Benedito Valadares (1892-1973), no Estado Novo, decretou que a Cidadezinha Qualquer passaria a se chamar Presidente Vargas.
Essa áulica mudança aconteceu logo depois da criação da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), em 1º de junho de 1942. Mas durou pouco tempo. O povo itabirano se rebelou contra tamanha heresia – e já em 1943 novo decreto estadual restabeleceu o nome de Itabira, agora sem o Matto Dentro.
É que, para a época, esse negócio de mato dentro parecia ser sinônimo de atraso, incompatível com a efervescência que a cidade vivia com a chegada da estatal – essa mesma mineradora que virou Vale S.A, e que, para se estabelecer, precisou do aval e dos empréstimos do doutor Pedro Guerra, além dos subsídios tributários do município, o que prevaleceu até 1964, quando foi instituído o Imposto Único Sobre Minerais (IUM). Leia mais aqui.
Pois é a partir deste corte histórico que se pauta o documentário do professor Mengueles. Destaca em suas narrativas testemunhais a evolução das atividades econômicas e a transformação do espaço geográfico com a chegada da CVRD.
Conjuntura
E aborda, sobretudo, o momento que vive a cidade minerada, ainda com a opulência dos royalties do minério e dos ICMS desfasados que ainda enchem as burras da Prefeitura de dinheiro, mas que historicamente não tem refletido em uma melhor distribuição de riqueza para a sua população trabalhadora.
Segundo o Censo Geográfico do IBGE de 2018, o PIB per capta de Itabira é de R$ 55.544,11 e o município ocupa a 310ª posição entre os 5.570 municípios brasileiros – e é o 31º maior de Minas Gerais.
Entretanto, mesmo com um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,756 numa escala que vai até 1, o indicativo reflete essa má distribuição de renda, com reflexos consequentes na baixa qualidade de vida (educação, saúde e renda) de sua população.
Mas a prova de que toda essa riqueza é mal distribuída se constata pelo salário médio mensal de 2,2 mínimos, o que deixa Itabira na 1.289ª posição no ranking nacional no quesito – e está na 91ª posição entre os 853 municípios mineiros.
Essa conjuntura de aparente tranquilidade econômica, que não se observa nos bairros populares, ainda que nao tenha data exata para acabar, está próxima com o fim do minério que já se escasseia.
Isso ainda que a empresa busque, por motivos econômicos, obviamente, alargar o “horizonte da exaustão mineral” por mais algum tempo além daquele que, desde os anos 1980, com a entrada em cena de Carajás (PA), vem sendo anunciado, com base em suas reservas medidas e indicadas, sem contar com as reservas inferidas que imbricam pelo subsolo abaixo da cidade.
Atraso
“Por Itabira ter o seu desenvolvimento atrelado à mineração, que é um bem não renovável, a diversificação de sua economia está bastante atrasada”, registra o professor Mengueles no documentário, que também expõe, de forma didática, os impactos ambientais em uma cidade minerada há quase 79 anos em larga escala – e de forma ininterrupta mesmo em tempos de pandemia.
O documentário trata dessas questões ainda não equacionadas da convivência histórica da cidade minerada com a grande empresas que rebaixa aquíferos (ai, antes fosse só o lençol freático), com a montanha pulverizada e a serra descaracterizada, as imensas barragens, a utopia que ainda não veio, enquanto o itabirano cruza os braços e deixa a vida passar devagar, cismando com a derrota incomparável. “Acordará algum dia?”, questiona o poeta em Vila de Utopia.
Para assistir ao documentário Itabira Cidade Mineradora, do professor Mengueles, clique aqui. E compartilhe.