“Vale vai colocar as cartas sobre a mesa e abrir o jogo com Itabira”, diz Marco Antônio Lage

Carlos Cruz

Se for de fato, e não de ficção, que a mineradora Vale está mesmo para apresentar, possivelmente em junho, quando completa 80 anos de extração em larga escala do minério de Itabira, um pacote de projetos a ser implementado com a Prefeitura para assegurar a sustentabilidade do município após a exaustão mineral, é hora também de abrir o jogo e divulgar as informações que dispõe sobre os recursos ainda existentes em seu subsolo e os respectivos planos de lavra.

Marco Antônio espera que a Vale informe todos os dados relativos às minas de Itabira e o seu real horizonte de exaustão (Fotos: Carlos Cruz)

Em entrevista a este site, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) disse que a transparência no relacionamento faz parte dessa nova fase de negociações que espera ter com a mineradora.

“Todos os projetos que a Vale tem para Itabira, assim como as informações que tem prestado à ANM (Agência Nacional de Mineração) serão colocados sobre a mesa para discutir o plano decenal”, é o que espera o prefeito.

A transparência na relação da mineradora com Itabira deve ser posta em prática até mesmo em cumprimento do princípio constitucional da publicização de tudo o que é de interesse público – e a mineração é assim classificada por ser o subsolo uma concessão pública da União.

Responsabilidade social

Cidade sofre, há quase 80 anos, com os impactos da mineração em larga escala, que tem dívida histórica a saldar com Itabira

Mas é também, segundo o prefeito, premissa para que a Vale obtenha certificado de empresa sustentável pela nova moda entre as grandes corporações multinacionais, que é o ESG (Environmental, Social and Governance).

Para alcançar esse objeto, terá que observar em suas operações mais respeito ao meio ambiente, ampliar as ações de apoio social e econômico às comunidades existentes em seus territórios, em consonância com os seus costumes e anseios culturais, que são também históricos.

O ESG teve as suas diretrizes elaboradas por 20 instituições financeiras de nove países – incluindo do Brasil.

Para aderir e ser certificada, e assim ampliar a sua posição no mercado financeiro, a empresa terá que compatibilizar os seus negócios de forma a minimizar os impactos ambientais, contribuir com a construção de uma sociedade justa, tornando-se socialmente mais responsável com os seus procedimentos administrativos e econômicos.

Publicização

Pois se tudo isso é mesmo para valer, está na hora de a Vale tornar público, por exemplo, os últimos Planos de Fechamento de Minas (PFMs) que tem apresentado à ANM – e que devem ser atualizados de cinco em cinco anos, de acordo com a legislação.

Este site divulgou o FPM de 2013. Leia aqui: Cultivo de plantas medicinais e novo hospital constam, em 2013, do Plano de Descomissionamento das Minas de Itabira

Portanto, pressupõe-se que existe o FPM de 2018 e o próximo deve estar sendo elaborado para ser apresentado em 2023.

Então, que se abra a discussão de seu conteúdo com a sociedade itabirana, diferentemente do que ocorreu com os FPMs anteriores, elaborados por empresas de consultoria sem ouvir os diferentes segmentos sociais de Itabira.

Que a Vale divulgue também os resultados das pesquisas geológicas em curso para viabilizar a exploração de hematitas e itabiritos remanescentes.

Leia também aqui: Vale vai investir R$ 26 milhões em pesquisas geológicas para aumentar a vida útil das minas de Itabira

Novo plano econômico para as minas de Itabira

Fonte: ANM/Google

Além disso, como a empresa está com processo em andamento junto à ANM para aprovar o novo plano econômico para as minas de Itabira, que torne público também o que tem sido questionado pela agência reguladora da mineração.

O objetivo desse questionamento, segundo a própria ANM, é melhor instruir o processo de revalidação da licença para a empresa continuar lavrando o minério de Itabira.

Se a ANM quer saber, Itabira também tem o direito de conhecer as respostas apresentadas às questões levantadas pelo órgão regulador – e que este site teve acesso antes de a empresa pedir o sigilo dessas informações. Confira.

O que a ANM quer saber e Itabira também

  • Apresentar as reservas geológicas bloqueadas por cada um dos elementos: 1-usina do Cauê, 2 – área urbana vizinha às Minas do Meio, 3- par de processos 3.951/62 e 833.2906/07, e 4-PDE Periquito junto com as usinas Conceição. Simular reserva lavrável adicional obtida com eliminação teórica de cada elemento de restrição por vez. Informar se a densidade de sondagens sob estes elementos é adequada ou se existe potencial de incremento das reservas com adensamento dela. Simular a reserva lavrável adicional obtida com a retirada da restrição da usina do Cauê em conjunto com a área urbana vizinha às Minas do Meio, uma vez que aquelas estão restringindo a lavra nesta região da cava Chacrinha;
  • Detalhar a lavra prevista no PAE (Plano de Aproveitamento de Estéril) atual (2019-2024) para o processo 820.326/71 e como se dará o aproveitamento futuro das reservas minerais na área desse processo;
  • Informar reservas geológica e lavrável remanescentes nas cavas do Onça e Periquito, onde estão sendo lançados os rejeitos de forma temporária;
  • Detalhar como se dará a transferência de 4 MTA (milhões de toneladas/ano) de minério de ferro das minas de Mariana no período de 2022 a 2024;
  • Apresentar relação de PDEs (Plano de Disposição de Estéril, que licencia a pilha de estéril) e PDERs (Plano de Disposição de Estéril e Rejeito) existentes no Complexo de Itabira, com seus volumes atuais e futuros (capacidades) e finais, segmentando estes volumes em estéril franco, minério com ferro abaixo do teor de corte e rejeito. Para as PDEs e PDERs que contenham minério com ferro abaixo teor de corte e rejeito, apresentar o teor médio de cada uma destas massas, demonstrando, através de mapas, com elas são individualizadas dentro das pilhas. Esclarecer se o minério com ferro abaixo do teor de corte está sendo disposto em separado, de forma a viabilizar um eventual aproveitamento futuro. Informar quanto dos 1,1 bilhão de toneladas de estéril lavrado neste novo PAE é minério de ferro com teor abaixo do teor de corte, o teor médio desta fração do estéril, e seu plano de disposição demonstrando como ele será separado dos demais estéreis;
  • Apresentar uma anotação de responsabilidade técnica (ART) específica para o projeto de estabilidade das cavas de Conceição e Minas do Meio, via definição de seus ângulos de taludes. Acrescentar a instrumentação a ser implantada e a carta de risco associada. Discutir a influência do fim da operação das minas na estabilidade dos taludes finais, prevendo eventuais ações a serem implementadas pós encerramento da lavra. Apresentar estudo equivalente aos das minas de Conceição e do Meio, para o talude do Pico Cauê na Cava Cauê. Nesse estudo, discutir o rompimento passado do talude, esclarecendo se ele está estabilizado e verificando se este oferece riscos para a vizinhança da cava Cauê, em caso de nova ruptura. Este estudo também deverá ser acompanhado de ART;
  • Apresentar a síntese do projeto de drenagens de mina implantada no Complexo Itabira. Apresentar uma planta de detalhe com projeto de drenagem da mina;
  • Informar se a Vale S.A conhece os responsáveis pela realização e a natureza dos trabalhos de mineração realizados nas áreas dos processos 3.951/62 e 833.906/07, no período que vai de 2008 a 2013, conforme sugerem imagens do Google Earth:
  • Apresentar planta topográfica atualizada da área de lavra na fronteira dos ANMs 2.355/41e 831.246/03. Em caso afirmativo, informar o volume do minério lavrado no 831.246/03. Apresentar ART do técnico responsável por estes trabalhos. Discutir também se na fronteira sul do processo 832.558/09, com o 577/36, houve ultrapassagem da lavra de minério dentro da área do 832.558/09 no passado;
  • Confirmar se a lavra que acontece na área do processo 831.930/13 é de recuperação de estéril passado, minério atualmente. Apresentar, se houver, a conclusão do conflito da Vale S.A com o titular do processo 831.930/13. Esclarecer se a recuperação do itabirito compacto na PDE está inserida neste conflito. Informar se existe algum outro conflito equivalente com outro processo vizinho, tais como o 831.441/12, 832.029/11, 833.204/13 e 831.4841/17;
  • Apresentar relação das barragens de rejeito existentes no Complexo de Itabira, com seus volumes atuais, futuros (capacidades) e finais. Apresentar o teor médio de ferro em cada uma destas barragens, individualizando setores (braços) com disposição segregada. Apresentar a situação atual do plano de recuperação destas barragens com seu cronograma de finalização, destacando situações onde o rejeito será reaproveitado. Discutir se a descaracterização das barragens com alteamento a montante, a acontecer em médio prazo, poderá prejudicar eventual reaproveitamento futuro do rejeito;
  • Apresentar o teor de ferro médio anual e a massa gerada dos diferentes rejeitos e lamas gerados nas usinas do complexo de Itabira nos últimos cinco anos. Apresentá-los também agregados por usina e por destinação para disposição;
  • Apresentar em uma planta a zona de autossalvamento (ZAS) dentro do complexo de Itabira da barragem Conceição. Identificar as estruturas produtivas da Vale S.A afetadas por um eventual rompimento dessa barragem, demonstrando que não existe nenhuma das situações previstas no art. 3 da Resolução ANM 13/2019. Apresentar as alterações incorporadas ao Plano de Gestão de Risco (PGR) devido a este perigo;
  • Apresentar anotação de responsabilidade técnica (ART) específica para o projeto de disposição de estéril e rejeito filtrado na antiga cava Cauê, sobre rejeito já disposto hidraulicamente. Acrescentar a instrumentalização a ser implantada e a carta de risco associada. Detalhar como acontecerá a drenagem externa e interna nesta pilha:
  • Apresentar ações diferenciais e cuidados adicionais que serão adotadas no fechamento (plano) das PDERs em relação as PDEs.
  • Relacionar a mão-de-obra que está sendo empregada no empreendimento do complexo de Itabira;
  • Apresentar a revisão da área complementar de servidão requerida ou justificar a necessidade de toda a área requerida, via projeção da área de influência da barragem Itabiruçu em seu alteamento final. Verificar a necessidade de apresentação de novo memorial descritivo, tendo em vista que há um corredor e deslocamento entre a servidão antiga e este novo pedido;
  • Apresentar o cronograma de eventos a acontecer no empreendimento no período 2020-2024, destacando aqueles imprescindíveis para viabilizar a continuidade do aproveitamento econômico do minério no ciclo 2025-2029.
  • Apresentar um histórico da lavra do minério de ouro no processo 577/1936. Discutir a situação atual dos recursos e reservas deste bem mineral na área da poligonal desse processo. Caso seja de interesse da Vale manter esta substância no processo, providenciar a aprovação de uma revalidação de reserva e de um plano de aproveitamento econômico para minério de ouro. Cópias do cumprimento desta exigência deverão ser juntadas aos processos 577/1936 e 930.641/1989.
  • Apresentar o cumprimento da exigência referente à Notificação nº 18/2018 da fiscalização da ANM, realizada em 27/03/2018, e que prescreveu “reconformar os bancos e retirar material objetivando a estabilidade e organização da mina, o projeto de reconformação da cava deve possuir ART” para a cava da mina Onça;
  • Apresentar um resumo dos fatos e decisões jurídicas referentes ao litígio entre a Vale e Itabiriçu Nacional Pesquisa Mineral Ltda, devido ao Alvará de Pesquisa 7471/14 para minério de ferro no processo ANM 831930/2013 de titularidade dessa empresa vizinha.

Sobre esse litígio leia mais aqui Empresa ganha direito de pesquisar rejeito na barragem do Itabiruçu para futura exploração

E também aqui Disputa por rejeitos de minério na barragem Itabiruçu continua. Vale contesta alvará de pesquisa da Itabiriçu Nacional

 

 

Posts Similares

5 Comentários

  1. Tomara que a empresa, leia estes questionamentos e reflita . Será que ainda , que , com estas mudanças de comportamento do mercado , com toda essa vigilância recheada razões incontestáveis, continuará se mantendo em cima do pedestal ? Olha que as coisas já há muito, não estão boas , no que se refere às boas maneiras e a imagem geral desta que ainda é respeitada no mercado internacional . Pode ser que essa coisa de imagem não interfira em negociações . Talvez esse posicionamento indiferente histórico sobretudo sobre Itabira seja estratégico . Mas acredito que vai prevalecer o bom senso mesmo . Até mesmo porque agora diante essa iminência mineral , nossos líderes e representantes também não terão mais escolha a não ser exigir a verdade e transparência. Pelo amor , ou pela dor ?

  2. O prefeito deve aproveitar a oportunidade e inquirir a Vale, a mineradora destruidora da VIDA, onde estão os restos mortais da fábrica de arma da Cidadezinha.
    A compensação ideal para Itabira, seria a retirada da mineradora da cidade, ou melhor, do país, pois nós não precisamos dela

  3. Ou seja ñ só apresentação dos planos ,mais trazer para o município sua base de contratação, operação, compras,transformando as minas desativadas em complexo de natura turística, construir uma concepção de conservação de espécies de peixes, com condicionantes para abastecer os rios com espécie nativas,trazer uma usina siderúrgica com 8 fornos ,trazer industriais de papel,fomentar o distrito industrial em polo de fornecimento para a indústria inclusive a vale,trazer uma indústria de bicicleta para o município, e muito mais .

  4. pode até parecer muita coisa a ser feita, a ser explicada, a ser plajeda, projetada e executada.
    pode e não.
    e com um atraso descomunal.

    mas tem duas palavrinhas de enorme importância. e não é só para Itabira e cidades circunvizinhas de forma direta e indireta atingidas e ainda em Mariana Congonhas Brumadinho e todo o entorno atingido, a região Catas Altas, Santa Barbara, Barão de Cocais, Carajás e etecetera.
    ah, as duas palavras funfamentais: a D.i.v.i.d.a. H.i.s.t.o.r.i.c.a. .

    pra essa precisa muito mais que compensação.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *