Vale questiona IPTU e gera impacto negativo de R$ 412 milhões na arrecadação da Prefeitura de Itabira

Em destaque, as  instalações do complexo Cauê da Vale em Itabira, que, por estarem na “zona rural”, não pagam imposto territorial urbano, nem mesmo pelos escritórios e restaurantes. Só a poeira é da cidade

Foto: Reprodução

Prefeitura amarga perda de receitas com o IPTU que a Vale não paga e contesta sob o argumento de que está na “zona rural” de Itabira

Conforme já noticiado neste site, a Prefeitura de Itabira tem enfrentado sucessivas quedas significativas na arrecadação tributária de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e com a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), o royalty do minério de ferro.

Outra perda tributária significativa tem ocorrido também com o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), somando R$ 2 milhões a menos na arrecadação deste ano.

Segundo o prefeito Marco Antônio Lage (PSB), um dos principais fatores para essa redução são as contestações apresentadas pela mineradora Vale, que recorre judicialmente para evitar o pagamento do tributo.

A mineradora argumenta que suas instalações, incluindo escritórios e restaurantes, estão em zona rural, o que, segundo ela, a isenta da cobrança do imposto municipal.

Atualmente, os valores judicializados relacionados ao IPTU da Vale somam R$ 412 milhões, reforçando um histórico de impugnações feitas pela empresa para minimizar seus custos tributários.

“Esse tipo de contestação não deveria existir por parte da Vale”, lamenta o prefeito. A população de Itabira, em consequência, perde investimentos sociais e em infraestrutura urbana.

Marco Antônio Lage tem conduzido negociações amistosas com a Vale, porém, no que diz respeito à cobrança de impostos, apenas a via judicial parece ser a solução — sem previsão de desfecho (Foto: Filipe Augusto/Ascom/PMI)
Queda na arrecadação da Cfem

A arrecadação municipal da Cfem também sofreu uma queda expressiva de 40% no primeiro trimestre deste ano, conforme já informado neste site em entrevista com o prefeito Marco Antônio Lage.

Segundo ele, essa redução está ligada à paralisação de operações e à manutenção de algumas minas, além dos impactos do período de chuvas.

“O fechamento da mina do Cauê, em outubro, também contribuiu para a diminuição da receita. No entanto, há expectativa de recuperação no segundo semestre com a retomada das atividades na planta de beneficiamento de minério.”

Com a queda na Cfem, a arrecadação com o ICMS superou, pela primeira vez nos últimos anos, os valores da compensação pela exaustão mineral, sabe-se lá quando.

Segundo as previsões da Prefeitura de Itabira para este ano, a arrecadação da Cfem deve cair de R$ 207,5 milhões para R$ 124,2 milhões, representando uma redução de 40%.

Já o ICMS, que inicialmente tinha uma previsão de R$ 296,1 milhões, deve ficar em R$ 228,2 milhões, uma queda de 23%. Perda maior com esse tributo deve ocorrer nos dois últimos anos da atual administração municipal.

Lei Kandir

Outro impacto negativo na arrecadação municipal vem da Lei Kandir, que isenta de ICMS produtos destinados à exportação.

Embora a mineração seja responsável por cerca de 80% da arrecadação de ICMS em Itabira, com a queda do bolo tributário no estado com essa isenção tributária, o município perde mais em arrecadação sobre a sua principal atividade econômica.

São as tais perdas incomparáveis, historicamente, que ocorrem desde o início da década de 1940 até 1969, quando só então passou a vigorar a tributação sobre a exploração mineral, por meio do Imposto Único sobre Minerais (IUM), extinto com a Constituição de 1988.

O prejuízo acumulado historicamente é incalculável e comprometeu décadas de desenvolvimento local.

Cerca de 80% da hematita extraída do pico do Cauê, mais de 1 bilhão de toneladas de minério de ferro de alto teor  foram exportadas pela Vale sem qualquer imposto pago ao município, transportadas pelo maior trem do mundo, levadas para Alemanha, Canadá e Japão sem pagar impostos ao município, repita-se à exaustão.

A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e a Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (Amig-Brasil), presidida pelo prefeito Marco Antônio Lage, buscam alternativas para minimizar esses impactos e revisar as regras tributárias.

Ações na Justiça que tarda e tem faltado

Além da disputa judicial pelo IPTU, Itabira participa de uma ação da Amig-Brasil que cobra da Vale uma dívida de R$ 20 bilhões, sendo R$ 1,7 bilhão referentes exclusivamente ao município pela perda com a compensação financeira da mineração.

Diante da iminência do fim das atividades minerárias em Itabira, a sociedade local e os políticos precisam se mobilizar para reivindicar uma compensação adequada pelas perdas tributárias.

Dentre elas, incluem-se mais de 1 bilhão de toneladas de hematita extraídas da mina do Cauê e transportadas para Alemanha, Canadá e Japão sem pagar impostos ao município—repita-se à exaustão.

Essas reparações históricas judicializadas, e até hoje sem sucesso na Justiça, seguem como pauta de reivindicação municipal.

A expectativa é que a Procuradoria Jurídica da Prefeitura assuma essas ações e dê prosseguimento às cobranças por compensações tributárias justas e devidas ao município, ao longo de mais de oito décadas de exploração ininterrupta de minério de ferro.

Quem sabe, até 2041 – que é a última data oficialmente apresentada pela Vale para o fim da mineração em Itabira –, o município seja ressarcido.

Ações civis por impactos ambientais
A Serra do Esmeril, vista da pracinha do Pará, teve sua vegetação natural totalmente suprimida na década de 1980 para a abertura das Minas do Meio, sem que até o momento houvesse qualquer compensação ambiental (Foto: Tibor Jablonsky/Ney Strauch/IBGE)

Desde 1985, ações civis públicas buscam reparar os danos ambientais e sociais causados pela mineração. Entre os principais processos, destacam-se denúncias sobre a poeira com o pó preto de minério de ferro que afeta a saúde da população, além da degradação da paisagem da Serra do Esmeril.

Na administração de Li Guerra, a Vale firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Prefeitura e Ministério Público de Minas Gerais, para implementar compensações e controlar os impactos ambientais decorrentes da mineração, dando por encerrados esses processos.

No entanto, o descumprimento de cláusulas desse TAC pode motivar a reabertura dessas ações contra a empresa.

Que a Prefeitura, por meio de sua Procuradoria Jurídica, assuma também essas ações, dando continuidade às demais cobranças por uma compensação justa pelos impactos negativos ao meio ambiente, além dos tributos acumulados ao longo das décadas.

Afinal, um acordo amigável para essas perdas históricas, a depender da mineradora, parece estar destinado às calendas gregas.

 

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