Três poemas de Drummond com instalações de Manuel Bersan
Poema da necessidade
Carlos Drummond de Andrade
É preciso casar João,
é preciso suportar Antônio,
é preciso odiar Melquíades,
é preciso substituir nós todos.
É preciso salvar o país,
é preciso crer em Deus,
é preciso pagar as dívidas,
é preciso comprar um rádio,
é preciso esquecer fulana.
-É preciso estudar volapuque,
é preciso estar sempre bêbado,
é preciso ler Baudelaire,
é preciso colher as flores
de que rezam velhos autores.
-É preciso viver com os homens,
é preciso não assassiná-los,
é preciso ter mãos pálidas
e anunciar o FIM DO MUNDO.

Sience fiction
O marciano encontrou-me na rua
e teve medo de minha impossibilidade humana.
Como pode existir, pensou consigo, um ser
que no existir põe tamanha anulação de existência?
Afastou-se o marciano, e persegui-o.
Precisava dele como de um testemunho.
Mas recusando o colóquio, desintegrou-se
no ar constelado de problemas.
E fiquei só em mim, de mim ausente.

Forma
forma
forma
que se esquiva
por isso mesmo viva
no morto que a procura
a cor não pousa
nem a densidade habita
nessa que antes de ser
já
deixou de ser
não será
mas é
forma
festa
fonte
flama
filme
e não encontrar-te é nenhum desgostos
pois abarrotas o largo armazém do factível
onde a realidade é maior do que a realidade.

Carlos Drummond de Andrade (Itabira do Mato Dentro, 31 de outubro de 1902 – Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1987)
Que coisa boa visualmente ver parte da instalação do Manuel Bersan na Vila de Utopia. Eis aí um grande artista, eu amo o Bersan e a obra dele…..