Três anos de Brumadinho: o mar de lamas que soterrou vidas e sonhos

Não se pode esquecer que vidas foram ceifadas por não terem valor diante da busca incessante por produtividade e lucro. É preciso que a humanidade resgate o sentido da vida em toda sua plenitude. Não temos planeta B.

Por Helena Taliberti

EcoDebate – A notícia do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, MG, veio na forma de notificação pela tela do celular. Enviei mensagem para meus filhos que estavam por lá. O tempo passou, mas filho demora mesmo para responder mensagem de mãe. O silêncio com o entardecer transformou-se em inquietação verdadeira.

Há três anos perdi minha filha Camila, meu filho Luiz e minha nora Fernanda, grávida do meu primeiro neto, Lorenzo, arrastados pelo mar de lama como tudo o mais o foi. Era 25 de janeiro. Estavam em Brumadinho para visitar o Museu de Inhotim, animados por estarem juntos e pela chegada do bebê.

As imagens da televisão mostraram que o rompimento se configurou tragédia logo nos primeiros flashs. As mensagens e ligações de amigos e familiares perguntando por eles me deram a certeza de que não houve resposta para ninguém.

O medo e a angústia de que algo muito grave poderia ter acontecido chegaram como taquicardia ao coração, agora inquieto. Mas esperança de mãe é eterna. Deveriam estar sem sinal e ilhados esperando resgate. Eram espertos o suficiente para se protegerem.

De novo, o silêncio. Noite adentro e sem pregar o olho durante toda a noite procurando informações sobre o que estava acontecendo, veio a certeza de que o melhor seria ir até Brumadinho.

E lá, diante de um cenário apocalíptico, percebi que não havia a menor chance de sobrevivência. Só me restava rezar e esperar.

Faltam palavras para descrever os sentimentos e o significado de tamanha perda. A lama arrastou tudo o que eu tinha. Tudo perdeu o sentido diante do vazio. A saudade sem fim me faz encontrá-los em pensamentos, sonhos, coisas que eles deixaram.

Não é um luto normal. A tragédia só começou no dia 25 de janeiro. Investigações posteriores indicaram que o rompimento era iminente e sabido. Uma tragédia anunciada. A indignação se converteu na mola propulsora da busca por justiça.

Mesmo sabendo que caminhos são tortuosos, eu preciso manter a esperança de que os responsáveis serão punidos exemplarmente para que outros saibam que há consequências sérias para atos inconsequentes.

Eu preciso acreditar que a empresa será obrigada a reparar os danos pessoais e ambientais até o último centavo para que o quadro de diretores e os investidores aprendam que dá prejuízo colocar o lucro acima da vida humana.

Eu quero chegar à conclusão de que a morte deles não foi em vão para que tragédias como esta não aconteçam de novo. É preciso mudar. Não é possível a sociedade aceitar calada a impunidade.

A criação do Instituto Camila e Luiz Taliberti é fruto da responsabilidade que temos em não ficar calados. Voluntários juntaram-se não somente para continuar a jornada da Camila e do Luiz na defesa do meio ambiente e das pessoas mais vulneráveis, mas também para ser e dar voz a quem precisa falar, para que tragédias como a de Brumadinho não se repitam no Brasil e no mundo. Afinal, os mortos dependem de nós para serem imortais.

Não se pode esquecer que vidas foram ceifadas por não terem valor diante da busca incessante por produtividade e lucro. É preciso que a humanidade resgate o sentido da vida em toda sua plenitude. Não temos planeta B.

“Tentaram nos enterrar, não sabiam que éramos sementes.” Somos sementes, todos nós!

A força e o poder de transformação da semente dão frutos e sombra, protegem nascentes de água e germinam árvores frondosas e perenes, que preservam o meio ambiente.

Somos sementes de amor e justiça porque temos força para continuar honrando a memória e o legado que Camila, Luiz, Fernanda e Lorenzo nos deixaram.

Helena Taliberti, presidente do Instituto Camila e Luiz Taliberti

 

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